domingo, abril 03, 2011

ALON FEUERWERKE Para completar a coisa



Para completar a coisa

ALON FEUERWERKE

CORREIO BRAZILIENSE - 03/04/11

Sem máquina partidária ou orçamentária, e sem poder buscar dinheiro na sociedade, não haverá como alguém de fora competir. E aí a obra estará arrematada 

Escrevi outro dia que, apesar do bom número de partidos, a tendência era surgirem novos. Por cissiparidade, a forma reprodutiva na qual um ser nasce da bipartição do anterior. Aritmeticamente, há excesso de partidos no Brasil.
E pelo ângulo da política? A esmagadora maioria das siglas não é propriamente partido. São tendências, facções de um megapartido, o do governo (PG).
Se você acha que alguém está fazendo um novo partido, olhe bem para ver se não é só uma sublegenda do PG.
Alianças são normais e desejáveis em sistemas multipartidários, mas o Brasil não tem coalizões de governo. O fenômeno é mais perceptível na União, mas se reproduz em estados e municípios.
No Brasil, nos diversos níveis, uma facção concentra o poder e as posições estratégicas. Às demais reserva situações orçamentárias com possibilidade de garantir alguma sobrevivência eleitoral. E só.
A dinâmica é unipartidária, não multipartidária.
Um bom exemplo é a União. Dilma Rousseff governa com um cacho de siglas, mas o PT é a única que conta quando entram em debate os assuntos decisivos.
Sobre inflação, política econômica, planejamento, política externa, defesa, educação, saúde, só dá o PT.
Os outros aparecem no noticiário atrás de cargos ou tentando escapar das confusões.
Por que a dinâmica unipartidária é hegemônica?
Porque a opinião pública concluiu que a desorganização e os vínculos privados são os principais problemas da política brasileira. Foi uma dura jornada de convencimento, mas a opinião pública chegou lá.
Todas as pressões são para organizar. E estatizar. Prazo de filiação, fidelidade partidária, poder de vida e morte outorgado às cúpulas dos partidos, constrangimentos crescentes ao financiamento privado da política. Os ingredientes estão todos aí.
Um sistema completamente organizado e estatizado vai reforçar o poder, nunca a contestação do poder.
A oposição nasce do desejo de desorganizar a ordem vigente. O sistema brasileiro vem sendo aperfeiçoado, cuidadosamente, para retirar o oxigênio de toda contestação. Contestar está cada vez mais perigoso e desestimulante.
Esta semana a comissão da reforma política do Senado aprovou o que será, se referendado pelo Congresso Nacional, o arremate no modelo. As listas fechadas e o financiamento exclusivamente público das campanhas eleitorais.
Na lista fechada, o eleitor vota na sigla. Ela elege para as câmaras municipais, as assembleias legislativas e a Câmara dos Deputados “n” cadeiras. E manda ao Legislativo os “n” primeiros nomes de uma lista elaborada pelos dirigentes partidários.
Vale a pena olhar para uma consequência do financiamento exclusivamente público. Parece que os donos do clube decidiram que está na hora de colocar limite à entrada de novos sócios.
Quem está fora não deve se atrever a tentar entrar. E quem está dentro deve pensar duas vezes antes de fazer besteira.
Marina Silva, por exemplo, enfrenta dificuldades no PV. A cúpula do partido vai embicada para aderir a alguma outra candidatura em 2014. Deve ser a do PT, se o governo estiver bem. Mas nada impede que adira ao PSDB.
Como a lei brasileira oferece o monopólio da representação, além de dinheiro público, aos partidos, mas não exige deles qualquer democracia interna, e como Marina precisará estar filiada pelo menos um ano antes da eleição, é prudente que ela saia do PV e forme uma nova legenda.
A alternativa seria mendigar aos pés de algum dono de cartório. Concorrendo com o imbatível poder de atração orgânica do governo, ou de uma oposição que só consegue existir por ser governo em outras esferas.
E sem nenhuma garantia.
O financiamento exclusivamente público vai prever verba aos partidos novos, que não disputaram a eleição anterior? Não seria lógico. Até para não instituir, aí sim, uma linha de montagem de siglas.
Sem dinheiro público, sem máquinas orçamentárias e sem poder buscar dinheiro na sociedade, não haverá como alguém de fora nem pensar em competir.
E aí a obra estará completa. 

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