sexta-feira, janeiro 21, 2011

VINICIUS TORRES FREIRE

Juro, dólar e o silêncio dilmiano
VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SÃO PAULO - 21/01/11

Alta de juros deve solapar parte das medidas contra a valorização do real adotadas no final do governo Lula

DESDE QUE ficou "combinado" o aumento de pelo menos 1,5 ponto percentual da taxa básica de juros, o real voltou a se valorizar em relação ao dólar. Ou melhor, firmou-se num degrau mais alto de valorização. Pode ter sido só coincidência, pois o câmbio tem mumunhas.
Ainda assim, excetuadas outras alterações maiores na política econômica ou na economia mundial, a alta contratada da Selic vai compensar parte do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras de outubro passado. No caso dos investimentos de não residentes ("estrangeiros") em renda fixa, o IOF passou de 4% para 6% em 18 de outubro. É verdade que o IOF já havia subido de 2% para 4% 15 dias antes, mas o fato mesmo de ter havido uma rodada dupla de aumento indica que o IOF a 4% parecia inócuo mesmo para os economistas do governo Lula, que são praticamente os mesmos do governo de Dilma Rousseff.
Lembre-se ainda que o governo tomou outras medidas com o fim de reduzir as apostas de queda do dólar, no mercado futuro, uma das quais na prática entra em vigor apenas em abril. No entanto, tal iniciativa tampouco manteve o dólar na casa do R$ 1,70, aparentemente um nível que causa alarme no governo federal. Além do mais, há a ameaça de que o Tesouro, por meio do Fundo Soberano, compre dólares. Isto é, estão ainda apenas engatilhadas algumas das balas contra a valorização adicional do real.
Porém, se a diferença das taxas de juros no Brasil e no resto do mundo pode mesmo influenciar ainda mais a valorização da moeda brasileira, há uma pressãozinha adicional na praça. O mercado na prática por ora acredita que a rodada de aumento de juros iniciada na quarta-feira será de pelo menos dois pontos percentuais, talvez dois e meio, embora a maioria das melhores projeções de economistas de bancos e consultorias ainda esteja na casa de ponto e meio. Mas há cada vez mais contratos apostando na queda do real no curto prazo, e o dinheiro grosso voltou a entrar no Brasil, talvez até devido à boateira que se voltou a ouvir a respeito da possibilidade de o governo tomar outras medidas relativas ao câmbio.
No mais, os fatores mais genéricos, digamos, a influenciar a alta do real continuam onde faz tempo estão. O governo Dilma ainda não fez nenhum anúncio ou deu qualquer indício claro de como vai conter o crescimento do gasto público. Mesmo que os resultados fiscais de janeiro venham "duros", com muito contingenciamento, tal número sozinho não vai fazer o verão da responsabilidade fiscal dilmiana.
O front externo estará sujeito aos solavancos recorrentes da crise da dívida europeia, mas por ora a coisa anda calma, e seria preciso um tropeço feio de um país PIIG para que o real balançasse, o que de resto não seria boa coisa de modo algum.
Os preços das commodities continuam subindo em direção aos recordes de 2008, o que ajuda a reduzir a velocidade do aumento do deficit externo brasileiro, aumento que, muito rápido, poderia ser um alertazinho sobre o fim próximo da valorização do real. O deficit de 2010 foi menor que o da maioria das previsões devido ao aumento do preço das commodities, que exportamos (como minérios e comida).
O silêncio do governo Dilma continua a deixar a praça do mercado meio desnorteada.

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