Ontem fez uma semana que o líder do PSDB diz todos os dias da tribuna do Senado que, descontadas as exceções de praxe, quem não é corrupto ou conivente entre seus pares é covarde.
No primeiro grupo estariam os participantes "ativos" da rede de ilicitudes e favorecimentos chefiada por Agaciel Maia, a quem o senador José Sarney abriu as portas do poder, ao nomeá-lo diretor-geral 14 anos atrás, quando assumiu pela primeira vez a presidência do Senado.
Do segundo, fariam parte os "passivos". Potenciais vítimas da munição de chantagem armazenada por Agaciel na forma de favores prestados - muitos constrangedores, alguns francamente ilegais - ao longo desse período, esses senadores estariam intimidados pelo receio de ter seus pecados revelados.
Basicamente é isso o que tem dito o senador Arthur Virgílio sem que ninguém o conteste. No máximo, um ou outro faz reparos à "agressividade" do tucano, mas de nenhum deles se ouviu até agora um "alto lá, nobre colega, veja como fala", a fim de se excluir daquelas categorias de parlamentar por ele aludidas.
É atitude semelhante à adotada pela direção do PMDB, quando o senador Jarbas Vasconcelos referiu-se ao partido como um centro de interesses ilícitos e/ou ilegítimos. Ali, a opção por não confrontar tinha a finalidade de deixar o dissidente falando sozinho até o efeito da denúncia se dissipar ou, quem sabe, aparecer algum fato capaz de desacreditar o senador.
Tentou-se dar dois ou três passos nesta trilha do descrédito, mas Jarbas Vasconcelos denunciou a manobra e acabou prevalecendo a tese do silêncio como o melhor remédio. Em boa medida sustentada pela ideia de que, sem a apresentação de provas, o testemunho do pemedebista não passava de difamação.
Isso, não obstante as evidências em contrário.
Muito bem. No caso agora dos desafios diários de Arthur Virgílio no plenário do Senado, a situação é bem mais complicada. Impossível de ser ignorada.
Para início de conversa, as acusações são lançadas sobre uma Casa cuja lisura está sob suspeição em virtude de fatos divulgados, sendo vários deles comprovados e a maioria incontestáveis.
O movimento dos partidos em prol do afastamento de Sarney da presidência é a prova material.
Por essa e muitas outras evidências será uma temeridade o Senado fingir que não está ouvindo nada. Todos estão vendo e ouvindo perfeitamente bem. Diante disso, urge alguma atitude.
Se os senadores pretendem continuar simulando indiferença, terão de deixar claro que o fazem com base em um de dois pressupostos: ou o senador Arthur Virgílio enlouqueceu ou tenta se defender do abrigo que deu a um funcionário fantasma difamando o restante da Casa.
Em nenhuma das duas hipóteses ele serviria para ser senador, muito menos líder de um partido que tem chance de ganhar a presidência da República no ano que vem.
Se está louco e delira, deve ser interditado. Se mente e avilta a instituição, merece abertura de processo no Conselho de Ética por quebra de decoro parlamentar.
Agora, se continua na liderança é porque priva da confiança de sua bancada. Se não é alvo de processo, é porque a Casa recebe seus desafios como adequados e concorda com a divisão do Senado em duas categorias de parlamentares: os que se calam por covardia e os que silenciam por assumida vilania.
Este último grupo não tem jeito. Só sobrevive se jogar na linha do menor prejuízo possível. A indispensável virada estaria, portanto, nas mãos daquela outra ala. Mas, para isso, ela precisaria sair da toca e se dispor a enfrentar as dores de uma ruptura mais profunda.
Desse modo é inusitado que um senador suba diariamente à tribuna para apontar a existência de corruptos e covardes no colegiado sem que se sinta ofendido o suficiente para contestá-lo nem indignado o bastante para apoiá-lo.
À MODA DA CASA
A absolvição do deputado Edmar Moreira no Conselho de Ética corrobora a tese do "vício insanável" da amizade por ele defendida quando no posto de corregedor da Câmara e reforça a proposta de que os julgamentos por quebra de decoro sejam feitos na Justiça e não mais no Parlamento.
Pelo pior dos motivos: a perda da legitimidade e de autoridade do Legislativo para julgar a conduta dos parlamentares.
O relator Nazareno Fonteles pediu a condenação do deputado por uso indevido da verba indenizatória com base na quebra dos princípios constitucionais da probidade e impessoalidade.
A maioria do conselho o absolveu tomando como referência o regimento interno, que à época não explicitava o que era proibido ou permitido fazer com aquele dinheiro.
Entre a Constituição e o regimento interno, a Câmara dos Deputados manda às favas o artigo primeiro da Carta: "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição."
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