A fala de Meirelles
O GLOBO - 08/05/09
Esta ata foi diferente. Assim que foi divulgada a ata do Copom, ontem, caíram as taxas de juros no mercado futuro. Os analistas entenderam que o recado do Banco Central era claro: a inflação vai cair mais e os juros também vão cair mais. O presidente do BC, Henrique Meirelles, me disse que nada é por acaso na ata do Copom. “Tudo é muito bem pensado.“
Henrique Meirelles, numa entrevista que me concedeu ontem, contou que o stress cambial que houve no Brasil a partir da quebra do Lehman Brothers acabou. Disse que a economia brasileira deve ter um nível de atividade maior no segundo semestre. Ele contou que a decisão sobre a poupança ainda não foi tomada, mas admitiu que mudar o redutor da TR é uma decisão que cabe ao Banco Central por delegação do Conselho Monetário.
“Qualquer mudança na remuneração tem que passar pelo Congresso, e qualquer decisão de tributação tem que respeitar a anuidade. O leque de opções é grande, mas não é uma coisa com a qual o poupador deve se preocupar, porque a poupança vai continuar a ser o grande instrumento de poupança do Brasil.”
O presidente do BC informou que o recado que está na ata do Copom sobre a necessidade de “mudança no arcabouço institucional herdado da época da inflação” não se refere só à poupança, mas também aos fundos de pensão.
“Vários fundos têm em seus estatutos uma obrigação de remuneração alta que era o que se achava que era o mínimo que se conseguiria. Mas isso numa outra realidade. A economia mudou muito. Eles terão que mudar este estatuto porque, senão, não terão onde investir.”
Meirelles negou que a preocupação seja com a dificuldade de rolagem da dívida pública.
Ontem foi um dia particularmente intenso. O resultado do teste de estresse dos bancos americanos mostrou que a maioria precisará de mais capital. Meirelles me disse que o caminho escolhido pelos Estados Unidos pode ser mais longo, mas é mais compatível com a economia de mercado.
“A Inglaterra foi pelo caminho mais rápido, estatizou alguns bancos. A partir daí ninguém tinha dúvidas de que haveria dinheiro e garantia. O problema é como ter gente preparada no setor público para administrar o mercado financeiro.”
Meirelles acha que a economia americana vai deslizar ainda mais antes de melhorar, e que o problema dos bancos permanecerá por algum tempo. “Mas no final, se os bancos não conseguirem captar no mercado o que precisam, o governo dará dinheiro público, o que for necessário. No fim do processo, em novembro, os bancos estarão capitalizados.”
Para a economista Mônica de Bolle, da Galanto Consultoria, como o Tesouro e o Fed disseram que os bancos que precisam se capitalizar são viáveis, o governo dos EUA terá que, de alguma forma, suprir a necessidade de capital dos bancos.
“Uma coisa é o mercado receber bem o resultado do teste. Outra coisa é ter espaço para os bancos se capitalizarem sem o governo. Se eles não conseguirem captar recursos no mercado, o dinheiro virá do governo. Até porque o governo disse que os bancos são viáveis. Ou a instituição é viável, precisa de um aporte, mas pode sobreviver por um período, ou a instituição não é viável”, disse ela.
Sobre a situação cambial, o presidente do Banco Central disse que a dívida do Brasil no passado foi muito dolarizada, porque era necessário. Depois, o BC passou a reduzir o passivo cambial. Em seguida, passou a ter uma posição comprada no futuro.
“No início da crise estava com US$ 22 bilhões e isso foi fundamental, porque o Banco Central pôde vender dólar. Vendemos mais do que tínhamos, e passamos a resgatar essas posições. Agora, zeramos nossa posição.”
Para Meirelles aquele estresse cambial já acabou. “Por todas as indicações de hoje, já passou sim. Ainda há muita incerteza, estamos preparados para reversões, mas aquele estresse passou.”
Sobre a ata do Copom, ele não quis falar muito. “Ata de Copom não se explica, se publica. Até porque, se for explicar virá outra ata. Cada frase lá é discutida, cada palavra, a sequência, tudo para ter uma comunicação explícita. Nada está na ata por acaso. Tudo foi bem pensado.”
O mercado entendeu, e ele não contraditou, que os juros vão cair mais rapidamente, porque o nível de atividade está mais fraco e os riscos inflacionários são menores. Para o economista José Márcio Camargo, da PUC, o Banco Central está vendo uma provável retomada da atividade, mas de forma bastante lenta.
“O BC chama a atenção, em vários pontos da ata, para o elevado grau de ociosidade na indústria, com o desemprego aumentando e pessoal subutilizado. O Banco Central está prevendo pouca pressão inflacionária para o restante de 2009 e para 2010.”
Quando perguntei sobre carreira política, ele disse que é precipitado porque está inteiramente focado no Banco Central e na crise econômica. “Num certo momento decidirei ou pela carreira política ou por voltar ao setor privado.”
Com Leonardo Zanelli
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