sexta-feira, maio 15, 2009

ELIANE CANTANHÊDE

Santo "pânico"


Folha de S. Paulo - 15/05/2009
 

A manifestação da gripe suína começou no México, pulou o muro para os EUA e ganhou as manchetes dos jornais de todo o mundo como ameaça de "pandemia". Não chegou a tanto, e o pior (aparentemente) já passou. A disseminação do vírus, da doença e das mortes parece estar... sob controle. 
A expressão "sob controle" é fundamental em medicina preventiva, e a discussão sobre a ação da OMS (Organização Mundial da Saúde) é fora de propósito. Lê-se daqui e dali que a OMS se precipitou, ou exagerou, ou ficou à beira de criar o pânico. Besteira. O mais importante órgão de saúde do mundo simplesmente fez o que tinha de fazer. 
É como a relação entre paciente e médico. O paciente se deve o direito de sempre pensar no melhor e mais fácil, já o médico tem a obrigação de trabalhar com o pior e o mais difícil, até afastar qualquer dúvida. Foi o que a OMS fez e, assim, acionou a imprescindível colaboração de governos e da mídia. Informação é fundamental contra vírus. 
Até por isso a gripe suína, ou A (H1N1), gerou uma operação de guerra, inclusive no Brasil. Chegou a vários continentes, mas está saindo de fininho das páginas e do ar sem os milhões de mortes temidos. Em vez de críticas, a OMS deve ouvir elogios e até ser imitada, tanto em prevenção de doenças transmissíveis -ainda um grave problema no Brasil, por exemplo- como em caso de calamidades como as de Santa Catarina e agora as do Nordeste, sobretudo em Alagoas. 
Alertar e tensionar não é gerar pânico, é seguir um conceito básico: "Melhor prevenir do que remediar". O Brasil demonstrou reação de ponta para enfrentar a Aids, bem ou mal segurou a febre amarela e agiu com firmeza contra a gripe, mas ainda sofre com doenças endêmicas ultrapassadas e deixa muito a desejar no atendimento de massa da população carente. 
Em suma, avançou muito, mas prevenir e remediar doença de pobre e tragédias que atingem os mais fracos ainda não é o forte brasileiro.

Um comentário:

Lorenzo Gomes disse...

Murilo,

É isso mesmo! O brasileiro exalta e derruba ídolos com uma velocidade impressionante! Ele tem uma crueldade tão absurda na hora de destruir as pessoas, um recalque que corrói por dentro e o faz odiar aquele que amava 15 segundos antes...

Nunca encontrei muita razão pra esse fenômeno, mas exemplos não faltam! Todos que foram ou eram esperanças de heróis, na primeira falha, viram os vilões. Nosso esporte está cheio deles: os Ronaldos depois do fiasco na Copa de 2006, o Dunga, depois da Copa de 90, o Barbosa, na Copa de 50... Acho que é um que talento o brasileiro tem: falar mal, aliás, crucificar, esculhambar, destruir a imagem, a personalidade, a auto-estima de outros brasileiros. è de uma crueldade inacreditável.

Por que eu digo isso? Porque é um sintoma disso a descrença que ele carrega consigo. Justamente por não aceitar a decepção - ou por ter medo de sofrer com a tristeza de uma nova -, o brasileiro se prepara antes e já vai criticando, desacreditando toda nova boa perspectiva que lhe aparece à frente: "ah, alguém tá levando um por fora!" ou "isso é mentira! Não vão fazer nada disso!"...

Brasileiro parece não ter maturidade para simplesmente acreditar quando o Brasil dá um bom exemplo, quando, de onde ele menos espera, vem um alento, quando aqueles que ele sempre ri irônicamente são capazes de surpreendê-lo positivamente e fazer algo que ele julgava impossível.

A verdade é que, dessa vez, o Brasil se preparou e acabou com a brincadeira preferida do brasileiro. Aí, ele virou a vizinha faladeira que fica inventando histórias sobre a vizinha gostosa da casa da frente...