domingo, outubro 06, 2013

Os fundamentos do pessimismo - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 06/10

Inflação, baixo crescimento e deterioração fiscal fazem prever reavaliação do Brasil por agências de risco e dão razão à ‘Economist’



A imagem do Cristo Redentor decolando na capa da “Economist”, prestigiada revista inglesa, de quatro anos atrás, foi usada na edição na semana retrasada para simbolizar o contrário, as dificuldades do país. O mesmo Cristo metamorfoseado em foguete caia em parafuso ilustrado pelo título sugestivo:“O Brasil estragou tudo?”

Os sorrisos que em 2009 recepcionaram, em Brasília, aquele número da revista desapareceram, e a forma mais elegante de governistas rebaterem a “Economist” foi dizer que se, há quatro anos, os ingleses exageraram no otimismo, agora erraram na mão no pessimismo. Mas é incontestável que, independentemente de maior ou menor ênfase no pessimismo, a revista acertou no sentido do diagnóstico.

No quesito investimentos em infraestrutura, um dos mais frágeis pés de barro do Brasil, a “Economist” traz números inquestionáveis: enquanto o país investe 1,5% do PIB no setor, o mundo, em média, despende 3,8%; e muito mais precisaria ser investido pois toda a infraestrutura brasileira equivale a apenas 16% do PIB, quando o índice em grandes economias é de suntuosos 71%.

Eis porque — cita a publicação inglesa — o produtor de soja no Mato Grosso gasta 25% do valor da carga para transportá-la até o porto contra competitivos 9% do agricultor americano de Iowa.

Um dos blocos do conjunto de textos sobre o Brasil trata, também com acerto, da gravidade do problema do sistema previdenciário do assalariado da iniciativa privada, colocado em xeque pela conjugação da inevitabilidade do envelhecimento médio da população com as aposentadorias em idades relativamente baixas no Brasil, por não haver limite etário para a obtenção do benefício.

Além disso existe um sistema de pensões pouco encontrado no mundo, outra das molas de propulsão do sistema rumo a sérios e maiores desequilíbrios. A ausência de normas que protejam o Tesouro e o contribuinte, neste aspecto, também chama a atenção dos ingleses. Se uma jovem de 25 anos casar com um cinquentão nada impede que, se ela ficar viúva ainda como força de trabalho ativa, receba pensão integral pelo resto da vida. Por isso, essas pensões já equivalem a 3% do PIB brasileiro, enquanto nos países desenvolvidos filiados à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) são menos de 1%. Daí pensões e aposentadorias no Brasil pesarem no PIB tanto quanto em países de população mais madura — pouco mais de 10%.

Quando os brasileiros ficarem mais velhos, o índice, se nada for feito, irá às nuvens. Como o campo político no poder, com o PT à frente, não quer encarar esta e outras reformas, o pessimismo da “Economist” está bem fundamentado.

E, no curto prazo, a inflação, o baixo crescimento e a degradação do quadro fiscal — esta não disfarçada pela “contabilidade criativa” — já fazem agências de avaliação risco sinalizarem uma redução na nota do Brasil. Não é um bom momento para o país.

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