domingo, outubro 06, 2013

O conselho do ministro Joaquim Barbosa - JOAQUIM FALCÃO

CORREIO BRAZILIENSE - 06/10
Perguntado por Ricardo Boechat sobre o conselho que daria ao próximo presidente da República em relação ao JudiciárioJoaquim Barbosa respondeu: reúna-se com os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo tribunal Federal, para buscar simplicidade, objetividade e eficiência na administração da Justiça.
Ou seja, o ministro Barbosa não defendeu um determinado modelo de Judiciário, uma determinada lei, ou propôs novo código. Propôs simplesmente um pacto político, entre poderes, de caráter não governamental, não partidário e nacional. Pacto de Estado. Sem este pacto político, o Judiciário continua como está. E a desconfiança popular também. A última pesquisa da Faculdade de Direito da Fundação Getulio Vargas, de São Paulo, indica que mais de 60% dos brasileiros não confiam no Judiciário. Por que priorizar um pacto?

Provavelmente, por alguns motivos. Primeiro, por que não faltam - no Congresso, no Judiciário, no Ministério da Justiça, nas universidades, nas associações, na mídia - projetos de todos os tipos, uns ótimos, outros irreais, outros corporativos, para combater o que o ministro Barbosa aponta de bacharelismo barroco, confusão processual, ingerência política, medo de aplicar a lei.

O que falta é disposição, convergência e forca política para escolher os melhores projetos, adotá-los e implementá-los. E por que falta, já que todos estão de acordo que é preciso mudar?

Por razão simples. O modelo atual, com morosidade, barroquismo e medo, tem seus beneficiários, seus defensores ocultos. Em outras palavras, o modelo atual é lucrativo econômica e politicamente para alguns setores do Judiciário e da sociedade. Esses setores praticam o discurso da mudança, encobrindo a prática da manutenção. São poderosos e hegemônicos. Influenciam ainda decisivamente a Presidência da República, o Congresso Nacional e o próprio Supremo. Alguns exemplos.

Quem inunda a Justiça Federal e a estadual é o próprio Poder Executivo, com questões fiscais e previdenciárias, com privilégios processuais que geram ineficiências nas cobranças. Transferem os custos de cobrança do Executivo para o orçamento do Judiciário. Sem falar nos precatórios que legalizaram a moratória dos tesouros. Reformar a Justiça significaria o Tesouro Nacional e os tesouros estaduais e municipais reformarem suas relações com o Judiciário.

Quem inunda as justiças estaduais são as concessionárias de serviços públicos e as empresas de consumo de massa, ao conflitar com os direitos do consumidor, a ponto de fazer com que os juizados especiais sejam hoje uma das maiores fontes de processos que chegam ao Supremo. Patologia maior não há. Reforma da Justiça significa apenas o próprio Supremo e juízes e tribunais estaduais se autodefenderem. Barrarem demandas temerárias, protelatórios e de má-fé.

Em vez de criarem uma jurisprudência que cada dia beneficia mais a morosidade, criarem uma rigorosa e economicamente punitiva jurisprudência antimorosidade.

Faltam estradas no Brasil. Mas quem mais constrói estradas desnecessárias no Brasil é a jurisprudência do Judiciário, para o mero passar de processos indevidos que não pretendem chegar à Justiça. Nem deixar que cheguem. É a estrada ao contrário. Em vez de ser de alta velocidade, é quase de velocidade nenhuma.

Bacharelismo barroco, como denuncia o ministro Barbosa, não é apenas um estilo de fazer advocacia. São interesses econômicos e políticos concretizáveis. Não é um adorno cultural e profissional. Quando a lei estabeleceu que divórcio consensual não precisaria de juiz, bastava registro em cartório, bem como certos tipos de inventário, em pouco tempo se notou que as exigências barrocas dos cartórios tornavam mais caro e demorado o processo trazido pela lei simplificadora. A morosidade do Judiciário era mais célere e barata.

O pacto sugerido pelo ministro Barbosa implica numa radical mudança de pauta. Hoje, todos discutem novos códigos: processual civil, penal, comercial. Nenhum com análises de impacto de custos que viabilizam o operacional. Se aprovados, vão ser aplicados da mesma maneira que os atuais. Vale a pena? Lidar com interesses corporativos faz parte da democracia. Deixar que eles comandem a pauta do Estado, não.

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