sexta-feira, junho 07, 2019

EUA decidem examinar o crescente poder das plataformas digitais - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 07/06

Há reclamações de invasão de privacidade e de manipulações para afastar concorrentes em potencial


Não é novidade, nos Estados Unidos, onde o capitalismo alcançou estágios avançados, o acionamento da legislação que serve de antídoto contra um dos efeitos colaterais deste sistema, a concentração de poder em poucas empresas privadas.

Desde o século XIX, os americanos têm antídotos contra este efeito colateral do livre mercado. Logo no início do século XX, houve a histórica divisão da gigantesca Standard Oil. Em 1982, chegou a vez de dividir a megatelefônica AT&T, surgindo as “baby bells”.

Agora, parece ser a hora das enormes plataformas digitais, que captam volumes crescentes de publicidade, usando o conhecimento cada vez maior dos hábitos de bilhões de pessoas, quase sempre por meio da invasão de privacidade. Devido à veloz expansão dessas plataformas, criando distorções na concorrência em vários mercados, em escala planetária, o Departamento de Justiça (DOJ) e a Comissão Federal de Comércio (FTC) anunciaram que investigarão alguns desses gigantes, para posteriormente decidir se abrirão processos. O DOJ tratará da Google e Apple, enquanto a FTC, do Facebook e da Amazon. Já não era sem tempo. Há reclamações não apenas de invasão de privacidade, mas também de manipulações para afastar concorrentes em potencial. Mesmo em serviços formalmente gratuitos, uma novidade neste tipo de investigação, que sempre tratou de avaliar como a fixação de preços é usada para distorcer a concorrência.

Neste campo, a Europa está à frente dos Estados Unidos. Faz tempo que alguns países como a Alemanha e seus poderes legislativos tratam do assunto. Autoridades da União Europeia têm coibido com multas práticas anticoncorrenciais destes gigantes. No ano passado, a Google recebeu multa de US$ 5 bilhões por abuso de poder no mercado de telefonia celular, em que a empresa atua com o sistema operacional Android, o mais usado no mundo. O Facebook também tem estado sob a mira americana e europeia, principalmente depois de comprovado o uso da rede para manipulações na eleição americana de 2016, em favor de Trump, e, no mesmo ano, na Grã-Bretanha, no referendo sobre o Brexit, a favor da saída do país da União Europeia. Dois objetivos compartilhados pela extrema direita mundial.

Em maio, em outro avanço para conter o poder dessas plataformas, o Parlamento Europeu aprovou uma diretiva, ainda a ser submetida aos legislativos nacionais, em defesa dos direitos autorais, frequentemente desrespeitados no mundo digital.

Um problema persiste: enquanto os Estados nacionais e suas instituições se movem em velocidade analógica, a atuação dessas plataformas nos mercados se valem da rapidez da tecnologia digital.

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