domingo, março 05, 2017

Vamos acertar a microeconomia? - MARCOS LISBOA

FOLHA DE SP - 05/03

A economia apresenta importantes sinais de melhora. Existem, porém, obstáculos para a retomada sustentável do crescimento, sobretudo na indústria.

No começo de 2016, a crise fiscal, o forte crescimento da dívida pública, a trajetória dos gastos com Previdência e a agenda ambígua do governo anterior resultaram na maior probabilidade de insolvência do setor público em alguns anos.

A consequência foi o aumento das taxas de inflação, juros e câmbio.

O novo governo tem demonstrado seu compromisso com as reformas. A agenda será longa, afinal foram muitos os equívocos desde 2009, além dos problemas estruturais que postergamos enfrentar, como as regras da Previdência.

A mudança na política econômica reduziu a probabilidade de insolvência. A consequência tem sido a redução da taxa neutra de juros, aquela associada à estabilidade da inflação.

Zeina Latif tem apontado que a taxa neutra pode apresentar uma queda similar à observada no primeiro mandato do governo Lula e pode cair para cerca de 8%. Isso permitiria uma redução acentuada da Selic em simultâneo à queda da taxa de inflação.

A macroeconomia conspira para que o país venha a recuperar ao menos parte da queda de quase 10% da renda per capita nos últimos anos.

Existem, porém, obstáculos a serem superados para que a melhora da macroeconomia resulte na retomada do crescimento nos anos à frente.

Primeiro, a agenda fiscal apenas se inicia. Além da reforma da Previdência, existem outros desafios, como o difícil e grave problema dos Estados.

Segundo, as intervenções setoriais do governo anterior resultaram em empresas pouco competitivas em vários setores. Muitas, talvez, não sobrevivam.

Paradoxalmente, setores que tiveram seus pedidos de incentivo e proteção atendidos pelo antigo governo agora enfrentam severas dificuldades. Deve-se ter cuidado com o que se deseja. Afinal, os pedidos podem ser atendidos.

Terceiro, diversas decisões judiciais têm protegido as empresas em dificuldades em detrimento das garantias previstas nos contratos de crédito. A consequência será o menor, e mais caro, crédito para as demais empresas no futuro.

Por fim, a estrutura tributária, que já não era boa, piorou significativamente. As seguidas alterações nas normas e a sua complexidade crescente geram insegurança sobre as regras do jogo, consomem recursos impensáveis nos demais países e resultam em um contencioso tributário que prejudica a retomada do investimento, sobretudo na indústria.

A melhor trajetória da macroeconomia se beneficiaria de uma agenda microeconômica que reduza distorções, simplifique as regras e garanta maior segurança jurídica.


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