A análise dos números do Tesouro Nacional divulgados esta semana mostra que o governo está numa armadilha difícil de sair. Há as dificuldades estruturais, as da recessão, e aquelas criadas pelas decisões tomadas no primeiro mandato. Receitas que o governo havia antecipado agora fazem falta aos cofres públicos. O corte de 37% no investimento este ano torna o ajuste de 2016 ainda mais incerto.
De janeiro a agosto do ano passado, o BNDES recolheu R$ 8,6 bilhões ao Tesouro como dividendo. Este ano, não pagou nada porque depois de vários anos antecipando receitas o banco não teve o que recolher. A Petrobras, que era outra fonte de antecipações de recursos ao Tesouro, não está pagando a nenhum acionista. O resultado é que as estatais, que nos oito primeiros meses do ano passado engordaram os cofres em R$ 17,5 bilhões, corrigidos pela inflação, este ano recolheram apenas R$ 5,4 bilhões.
O economista Mansueto Almeida acha que o governo não conseguirá continuar reduzindo investimentos. Este ano já cortou bastante e não poderá simplesmente zerar esse gasto. Isso torna mais difícil o ajuste fiscal no ano que vem, porque as despesas que tiveram a maior contração em 2015 não poderão mais continuar encolhendo.
O Ministério da Saúde cortou R$ 3,2 bilhões de despesas de janeiro a agosto, na comparação com o mesmo período do ano passado, em termos reais. A tesoura no Ministério da Educação foi maior: corte de R$ 4,3 bi. Os investimentos do Governo Federal, que já são baixos, caíram mais 37%, com uma redução de R$ 22 bilhões. O Ministério das Cidades cortou R$ 2,83 bilhões em investimentos, o dos Transportes reduziu em R$ 1,99 bi, e a Educação, em R$ 2,88 bilhões.
O Programa Minha Casa, Minha Vida, que financia moradias populares, ficou mais magro, assim como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Em ambos, o governo gastou R$ 23 bilhões a menos este ano. Já as despesas de custeio da máquina pública subiram R$ 4,2 bilhões por causa das desonerações da folha de pagamento.
Ao mesmo tempo, a conta de subsídios dados em anos anteriores chegou muito pesada. Os gastos com o Programa de Sustentação do Investimento, que ficaram congelados por 24 meses por conta de uma determinação do então secretário-executivo da Fazenda Nelson Barbosa, em 2012, estão disparando. Subiram R$ 7,3 bilhões este ano. A equalização de crédito agropecuário subiu R$ 1 bilhão. Ou seja, houve desembolso para reduzir os juros de empréstimos subsidiados para agricultura em anos anteriores. A mesma coisa acontece com a rubrica "Operações de Crédito e Reordenamento de Passivos", que subiu R$ 13 bilhões. Tudo isso é conta antiga, do primeiro mandato, que está sendo paga no governo Dilma II. O governo está "despedalando", depois de ter empurrado despesas e puxado receitas. Além disso, distribuiu subsídios cuja conta pesa agora.
O buraco fiscal que o governo cavou tem quatro elementos: há despesas do primeiro mandato que estão sendo pagas agora; há perdas de receitas porque elas foram antecipadas; há a queda da arrecadação que acontece em toda recessão; há os rombos estruturais que ficaram ainda maiores com decisões tomadas nos últimos anos, como as que se referem à Previdência. Por ação ou omissão, o governo piorou o que já era difícil, e o país está vendo uma escalada do déficit previdenciário.
Alguns problemas pioram a contabilidade pública, como os swaps cambiais, mecanismo através do qual o Banco Central oferece seguro contra a variação cambial. O gasto com os swaps entra no déficit nominal, mas o ganho das reservas só é contabilizado na dívida líquida - indicador do qual desconta-se da dívida os ativos que o país tem. O problema é que ninguém mais olha esse indicador porque o governo o desmoralizou ao incluir como ativos os empréstimos de baixa liquidez como os feitos ao BNDES.
Mansueto Almeida acha que é muito difícil reequilibrar as contas a curto prazo sem recriar a CPMF. Apesar de todos os problemas, ele se diz mais otimista hoje do que no ano passado porque acredita que agora o debate sobre a necessidade de medidas estruturais evoluiu no Brasil. Neste momento, no entanto, ele admite que qualquer proposta que dependa de consenso político para cortes profundos não conseguirá avançar.
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