FOLHA DE SP - 14/04
SÃO PAULO - Os governantes culpam os céus. Falta chuva, a lavoura padece, a comida encarece, a inflação perturba, e as represas das águas de beber e de energizar se esvaziam, dizem. Mas a história não é bem essa. Muita areia e pouco caminhãozinho, os males do Brasil são.
Quando o mau clima restringe a oferta de alimentos, eles ficam mais caros e empurram o custo de vida, certo? Nem sempre. Depende da reação do consumidor.
O salário estagnado, a escassez de crédito na praça e a perspectiva de ficar desempregado promovem um certo tipo de comportamento. Se o tomate encareceu, evito o tomate. Se gastei mais no supermercado, deixo de ir ao cabeleireiro. O somatório desses ajustes domésticos inibe a escalada inflacionária.
A conduta selecionada, contudo, é diferente em momentos de baixo desemprego, acesso fácil aos empréstimos e alta dos vencimentos. Não deixo de comprar tomate nem de cortar o cabelo e coloco lenha na fogueira da inflação. O Brasil ainda está mais próximo desta situação hipotética que da descrita no parágrafo anterior.
O apetite pelo consumo também influencia o nível dos reservatórios, que é a diferença entre a água que entra e a que sai. Falta chuva, mas o quadro preocuparia menos se o consumo de água e energia não tivesse avançado rapidamente nos últimos anos, como efeito da alta na renda e no crédito dos brasileiros.
No caso da eletricidade e da água, entretanto, os preços ao consumidor não refletem o progressivo gargalo na oferta. Governos estaduais e o federal se endividam e arrocham empresas estatais para mascarar o efeito da cavalgada de custos. O cidadão não recebe estímulo para reduzir o consumo, e a situação piora.
O remédio, dizem os economistas mais informados, passa por anos de crescimento baixo, mas dificilmente por uma recessão. Será? Começo a ter dúvidas.
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