O GLOBO - 15/12
Madame Natasha fez as provas de administração e ciências econômicas do Enade e concluiu que o Ministério da Educação estimula a criação de um dialeto no qual os professores ensinam (e cobram) conhecimentos num idioma que não falam em casa. A senhora entende que há expressões técnicas que devem ser ensinadas e aprendidas, mas "empresa potencial entrante" é a popular "concorrente", "estatisticamente não significante" é apenas "insignificante", uma "asserção" é uma "afirmação" e "fator explicativo" é "uma das explicações".
Se um diretor de uma companhia disser que talvez seja obrigado a enfrentar uma empresa potencial entrante mas está tranquilo porque ela virá com uma produção estatisticamente não significante e que essa asserção é um fator explicativo da sua esperança de ganhar o bônus no fim do ano, será mandado ao manicômio.
Natasha acredita que, estimulando-se os alunos a aprender um dialeto incompreensível, consegue-se apenas fazer com que professores que não se fazem entender propaguem, com a ajuda do MEC, um blá-blá-blá de empulhação.
Por coincidência, Eremildo, o Idiota, fez a mesma prova. Como vive num quarto alugado nos fundos de uma pensão, sonha em se credenciar para um cargo na diretoria da Petros. Numa pergunta relacionada com economia brasileira dos anos 30, ele achou a expressão "indústria capitalista". O cretino acha que em Pindorama só havia essa, pois a socialista estava sob os cuidados de Stálin.
A dupla até hoje tenta decifrar o seguinte enunciado, relacionado com as novas formas de organização das empresas. Segundo o texto, elas são vistas também "como aperfeiçoamento da abordagem contingencial da administração. Os estudos realizados carecem, entretanto, de aprofundamento para que se possa considerar as chamadas organizações pós-modernas ou como expressão da ruptura qualitativa com a modernidade ou como versão especificamente histórica das organizações modernas".
Umas das alternativas de resposta era a seguinte: "De acordo com a compreensão sistêmica e comportamental da administração, as novas formas organizacionais revelam a ruptura com a racionalidade instrumental, caracterizando o paradigma pós-modernista".
Ganha uma viagem de ida a Pyongyang quem souber o que isso quer dizer. Indo-se ao gabarito, vê-se que essa alternativa estava errada. Era uma pegadinha, em blá-blá-blês.
Um professor com títulos e desempenho empresarial suficientes para dar inveja aos educatecas do MEC testou-se respondendo às oito questões de formação geral. Valendo-se de seus conhecimentos e de sua opiniões, errou quatro. Numa nova tentativa, colocou-se no modo "politicamente correto" e deu as respostas que intuiu serem as desejadas. Acertou seis. Num enunciado em que se descreve a influência dos jogos domésticos sobre as crianças, reduzindo seu interesse por questões ambientais, pedia-se aos estudantes que escolhessem um título para o texto. Uma das alternativas dizia: "Preferências atuais de lazer de jovens e crianças: preocupação dos ambientalistas". Errado. O título certo seria: "Engajamento de crianças e jovens na preservação do legado natural: uma necessidade imediata". Isso é título de manifesto.
POESIA
Os doutores Sérgio Cabral e Eduardo Paes apresentam-se como construtores de um novo Rio de Janeiro. Diante da cena do portão do novo Maracanã alagado, coisa que jamais ocorreu, vale relembrar o poema de Cacaso num período de euforia cívica:
Ficou moderno o Brasil,
Ficou moderno o Milagre:
A água já não vira vinho,
Vira direto vinagre.
PERNAS
De um empresário de nove dígitos:
"Se o problema da economia brasileira fosse o fato de estar com duas pernas mancas, talvez um ortopedista ajudasse. Como o problema está no cérebro, o caso é para psiquiatra."
PT CALMO
Uma parte do comissariado espera que a solidariedade coletiva oferecida ao mensaleiros presos seja a última. Nos últimos anos o partido ameaçou botar seus militantes nas ruas e Lula prometeu percorrer o país discutindo o caso. Nenhuma das duas coisas aconteceu.
ROSA WEBER
Se as decisões da ministra Rosa Weber no caso do cartel das fornecedores de equipamentos e de seus vínculos com os governos do PSDB paulista contrariarem o tucanato, virá a grita de que foi a doutora Dilma quem a nomeou.
Tudo bem, mas quem nomeou Joaquim Barbosa foi Lula.
OUTRA PONTA
Há um ponto cego nas inves-tigações das propinas cobradas por fiscais da Prefeitura de São Paulo. Quando empresários decidem enfrentar os achacadores e resolvem ir à Justiça, descobrem que nesse caso terão que lidar com uma nova quadrilha.
Isso acontece em vários Estados.
EDUARDO CAMPOS E O ATENTADO DE GUARARAPES
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, tinha um ano de vida quando aconteceu o primeiro atentado terrorista de vulto da década. No dia 25 de julho de 1966 explodiu uma bomba no saguão do Aeroporto de Guararapes, onde centenas de pessoas esperavam pelo marechal Arthur da Costa e Silva, que sucederia seu colega Castello Branco na Presidência da República. A explosão matou um almirante, um jornalista e feriu 14 pessoas, inclusive uma criança.
Durante a cerimônia em que Ricardo Zarattini foi justamente inocentado de qualquer responsabilidade pelo episódio, Campos relembrou uma velha desconfiança: o atentado teria sido "um episódio utilizado para dividir a resistência ao golpe".
Sem o esclarecimento de que o atentado foi obra de militantes de esquerda, sobra a suspeita de que os militares tiveram algo a ver com a coisa. Lenda desonesta. Naqueles dias explodiram no Recife três bombas. Todas colocadas por um grupo ligado à Ação Popular, a AP. Quem montou e colocou o explosivo no aeroporto foi Raimundo Gonçalves Figueiredo, o "Raimundinho". Vindo para o Rio, e militando na VAR-Palmares, detonou mais duas bombas e foi assassinado em 1971.
Eduardo Campos já tinha 25 anos quando Jacob Gorender esclareceu que Zarattini nada tinha a ver com o atentado. Gorender sabia a identidade do autor. O governador tinha trinta anos quando o "Jornal do Commercio" do Recife publicou uma reportagem definitiva sobre o assunto. Nela havia uma entrevista do ex-padre Alipio de Freitas, que teria sido o mentor do grupo, ao repórter Gilvandro Filho. Nas palavras de Alipio: "Morreu gente, nós lamentamos. Mas aquilo era uma guerra, tinha que haver vítimas".
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