terça-feira, dezembro 17, 2013

Dinheiro falso - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 17/12

Quando a carga tributária atinge seu limite e a dívida pública está alta, a tentação de cobrir o excesso de gastos com emissão de moeda é sempre grande


Em linguagem jurídica, dinheiro falso é aquele fabricado por alguém que não tem autorização legal para fazê-lo. Quanto às notas de papel e à moeda metálica, somente o governo, por meio do Banco Central (BC), pode emiti-las e colocá-las em circulação. Qualquer pessoa que tente fazer o mesmo comete um crime e, se for pega, o destino é a cadeia. A razão é simples: comprar coisas com dinheiro falso equivale a furtá-las, pois o dinheiro não foi obtido ou ganho pelas formas legítimas e legais previstas no sistema econômico.

Mas, além da moeda física, existe outra forma de criação de dinheiro, que os economistas chamam de “moeda escritural”, aquela que pode ser emitida pelo sistema bancário nos limites e condições fixados pela lei e sob controle do BC. Nesse sentido, os bancos também podem emitir dinheiro, desde que o façam dentro das normas legais. A função do BC é controlar o estoque de moeda em circulação e definir o volume de dinheiro a ser emitido a cada ano, cuja base é o Produto Interno Bruto (PIB), já que a principal função da moeda é servir como instrumento de trocas, e estas resultam de quanto o país produz em bens e serviços.

É legítimo haver aumento do estoque de moeda circulante quando o PIB aumenta, mas também pode ser necessário expandir a moeda em função da elevação dos preços, ainda que o PIB não cresça. Até aqui, nada de anormal, pois trata-se de teoria monetária de certa forma fácil de entender. A distorção desse sistema começa a partir do momento em que o agente responsável pela gestão da emissão de dinheiro – o governo – torna-se imprudente e passa a ser, ele próprio, uma fonte de problemas.

Ao gastar mais do que arrecada (e, portanto, realizar um déficit), o governo tem somente três saídas: aumentar impostos, tomar dinheiro emprestado ou emitir dinheiro. Do ponto de vista econômico, se usar a fabricação de dinheiro para cobrir seus déficits, o governo estará sendo exatamente igual àquele que fabricou dinheiro de forma fraudulenta, pois, embora o governo tenha autorização legal para fazê-lo, os males para a economia são os mesmos.

Em um país no qual a carga tributária já atingiu seu limite e a dívida pública esteja alta, a tentação de cobrir o excesso de gastos com emissão de moeda é sempre grande. O Brasil usou desse artifício danoso durante muito tempo e somente deixou de fazê-lo a partir de 1994, com o Plano Real. Até então, a inflação crônica, que teimava em não ir embora, tinha como causa principal a emissão de moeda pelo governo sem o correspondente aumento da produção.

Quando o governo imprime dinheiro para pagar seus furos de caixa – seja moeda manual ou moeda escritural por meio dos bancos –, a consequência mais básica é o aumento da inflação. E a inflação é um imposto sem lei que, além de desorganizar a economia, deixa as pessoas mais pobres. Por causa desses efeitos, vários economistas ao redor do mundo pregam que o governo deixe de ter poderes sobre o estoque de moeda circulante – pois o governo, para eles, seria parte do problema –, passando ao Banco Central e a um comitê monetário a responsabilidade sobre a gestão da moeda, subordinados a uma lei votada pelo parlamento e sob o controle deste.

Pelos males que acarretam, o déficit público e a dívida governamental são fontes de preocupação e são assuntos sobre os quais a sociedade deve exercer vigilância. Os governantes no Poder Executivo e os políticos nos parlamentos têm dado provas de irresponsabilidade no controle do déficit e da dívida pública, além de pouca instrução em assuntos financeiros. Em boa parte das vezes, os políticos vêm elevando os gastos públicos e aumentando os impostos para pagar vantagens e benefícios a si mesmos e aos burocratas do governo.

Os exemplos vindos dos Estados Unidos e dos países europeus são preocupantes. O volume de dinheiro emitido para cobrir os rombos de suas crises – em geral fabricadas por sucessivos maus governos – irá cobrar das gerações futuras alto preço em mais inflação, mais impostos e mais pobreza. Quando a dívida pública não mais puder ser aumentada, ficará fácil para os governantes ceder à tentação de fabricar moeda para pagar os déficits que eles mesmos promovem. Na sequência, ao empobrecerem a população pelos efeitos de suas políticas, buscarão inimigos externos, culparão o capitalismo pelo sofrimento dos pobres e jamais reconhecerão que os impostos, a inflação, a dívida pública e a fabricação de dinheiro estão na raiz da pobreza.

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