FOLHA DE SP - 09/02
O monopólio da contratação de mão de obra no porto público é um cartel de privilegiados
São notórias a ineficiência e a falta de competitividade que dominam os portos brasileiros. Privatizados no governo Fernando Henrique Cardoso, são operados na pretensão de manter a exclusividade eterna, como se fossem um fechado clube de amigos: quem está fora não entra, quem está dentro não sai.
E, nesse modelo, contêineres das mais diversas mercadorias, que circulam com velocidade por todo o mundo, adormecem em navios e portos brasileiros, elevando o preço da carga às alturas.
É explosiva a combinação de burocracia e corporativismo. Isso vale para o setor empresarial, quando não consegue viver sem o Estado, e para a esfera sindical trabalhista, quando faz do bloqueio da livre concorrência a lei de ferro para manter privilégios.
Verdadeira vanguarda do atraso, os dois setores se unem para construir uma reserva de mercado que conspira contra a modernização do processo de movimentação de cargas em nossos portos.
Articulados, hoje pressionam o governo contra essa nova abertura dos portos. "Não mais às nações amigas, mas às forças produtivas do país e à iniciativa privada", como bem disse a presidente Dilma, ao lembrar feito de D. João 6º.
Dois séculos atrás, o rei pôs fim ao monopólio comercial do Brasil com Portugal, desencadeando o processo que culminou com a a nossa independência.
É inegável que a abertura dos portos para o capital privado, prevista na Medida Provisória 595 de 6 de dezembro de 2012, representa significativo avanço, ao eliminar a distinção entre movimentação de carga própria e carga de terceiros.
É isso que tem limitado a exploração de instalações portuárias autorizadas e impedido que empresários se associem para construir e operar novos portos.
O monopólio da contratação de mão de obra no porto público, feito pela mais arcaica organização sindical trabalhista -o Órgão Gestor de Mão de Obra (OGMO)-, é um cartel de privilegiados.
Esse cartório arranca do empresário e do Estado tantas regras que, ali, a exceção é carregar ou descarregar contêineres.
Aqui, o preço para atracar um navio médio (de 20 mil a 30 mil toneladas) atinge a impressionante cifra de US$ 14 mil para uma operação que leva cerca de duas horas.
Já em portos dos Estados Unidos com características semelhantes aos nossos, o preço da atracação não chega à metade.
No Brasil, os práticos que atracam os navios formam uma casta de cerca de 400 milionários.
Recebem salários mensais situados majoritariamente na faixa dos R$ 150 mil a R$ 300 mil, como se habitassem um mundo acima da realidade da economia e da razoabilidade do mercado.
Visto que tudo é transferido ao preço das mercadorias, os exportadores perdem competitividade e os importadores repassam a nossos consumidores a conta do absurdo. Mas nem assim o prático vem à luz do dia se explicar.
A livre contratação de mão de obra sempre foi uma das maiores lutas de trabalhadores mundo afora. Um porto competitivo, além de empregar mais, pode pagar mais a seus trabalhadores.
Os que agora se insurgem contra a MP dos portos são contra o desenvolvimento econômico e a melhoria de vida dos portuários.
É estranho que uma forma nova de gestão em um porto privado incomode tanto um setor que não estará impedido de seguir mantendo a gestão privada e o regime especial de trabalho (OGMO) em um porto público.
Afinal, por mais exótico que pareça, o OGMO está mantido no texto da MP. Além disso, a estrutura fiscalizadora e arrecadadora do Estado estará presente nos dois modelos, igualando os custos fixos de seu funcionamento.
Ao ameaçar greve contra a Medida Provisória, entidades patronais e de trabalhadores que operam os portos públicos ameaçam fazer greve contra o futuro. E não escondem a realidade.
Como não se constrói um porto da noite para o dia, o atual monopólio que a MP derruba reage, em verdade, contra sua única possibilidade de justificação: a obrigação de ser melhor que a concorrência que quer evitar.
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