O quadro inflacionário preocupa pela união de várias pressões. A política fiscal é expansionista e alimenta expectativas de descontrole; a política monetária está frouxa; autoridades estimulam bancos a emprestarem mais, num cenário de inadimplência alta; o mercado de trabalho está com muita demanda; os eventos climáticos continuam fazendo vítimas em safras de outros países.
A grande esperança do BC é de que a produção agrícola este ano seja tão boa que evite a elevação dos preços de alimentos. A maior parte dos alimentos é commodity e, portanto, os preços daqui e do mundo estão interligados. A nossa boa safra é insuficiente numa conjuntura de baixo estoque, na qual tem havido eventos climáticos na Austrália e nos EUA.
Na Austrália, as previsões de trigo são de queda de 8% neste início de ano, mas o plantio está 26% menor do que nesta safra. Choveu muito no oeste do país, a maior região produtora, que é o segundo maior exportador de trigo. O algodão da Austrália foi prejudicado pelas enchentes do ano passado e pela seca deste ano. A seca nos EUA está cedendo, mas as previsões do governo são de que a produtividade do trigo será afetada e a qualidade também. Como o preço está elevado, a previsão do Departamento de Agricultura americano é de exportação recorde, não em volume, mas em valor. A safra de trigo da Argentina foi menor, e as exportações da Rússia devem encolher. No Canadá, também as expectativas em relação ao trigo não são boas.
Em alguns casos, os fatos não são climáticos, mas derivados de outros problemas. Na Argentina, a incompetência que perdura por anos no relacionamento com produtores de carne derrubou a capacidade do país de produção, que hoje é um terço do que produzia em 1990. A Argentina deixou de ser um grande fornecedores mundial de carne. Como o Texas tem sofrido muito com eventos climáticos, o rebanho americano também despencou. No caso do trigo, soja e milho, a dramática quebra de safra dos EUA reduziu os estoques, tornando os preços mais vulneráveis a qualquer choque de oferta.
Dois dos instrumentos de manutenção da inflação sofreram avarias. Na área fiscal, não há mais credibilidade. A excessiva utilização das manobras contábeis convenceram analistas que os números das contas públicas não valem o que está escrito. A Fazenda tem sido uma fonte de expansão de gastos, quando em outras equipes foi a fonte de contenção de despesas. Na área monetária, a despeito do declarado compromisso do BC com a manutenção da inflação dentro da meta, há um temor de que ele não possa usar sua principal ferramenta se necessário: a taxa de juros.
A tentativa de aquecer o consumo através de endividamento é uma fórmula esgotada. Mesmo assim, esta semana, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi dizer aos banqueiros que o crédito está crescendo muito devagar para o gosto dele. Cresceu a 16% em 2012. O país, a continuar nesse ritmo, corre o risco de overdose de crédito com tudo o que isso significa de perigo.
O quadro internacional está mais tranquilo e isso contém a volatilidade dos ativos, própria de períodos de muita turbulência e incerteza. Mas, se houver uma recuperação mais forte, um ponto que não está no cenário pode entrar: a elevação dos preços de commodities. E isso é imediato: ontem de manhã saiu notícia do saldo comercial chinês acima do esperado e imediatamente o petróleo começou a subir.
O mercado de trabalho aquecido - que é uma ótima notícia para os trabalhadores e para o consumo - representa custos para as empresas. A indústria encolheu no ano passado, mas o valor da folha de pagamentos no ano subiu 4,3% em termos reais.
O quadro inflacionário está batendo na atividade. A inflação reduz poder de compra e não ajuda a recuperação. O Itaú soltou relatório analisando que a recuperação está mais lenta do que previa, e por isso está revendo o PIB de 2013 para 3%, e o de 2014, para 3,5% .
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