sexta-feira, janeiro 11, 2013

Ode pela cidade agora do Haddad - IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO


O Estado de S.Paulo - 11/01



Caro Haddad, esta é a cidade que 60 prefeitos te deixaram como legado.

Os relógios de rua estão cegos há muito.

Não dizem mais também a temperatura.

Choveu, a luz apaga.

A cidade alaga.

Os semáforos não funcionam.

A CET tem gente para multar, não para consertar.

Os buracos da Martha (Rebouças e Cidade Jardim) inundam,

o buraco do Adhemar, hoje Erundina (Anhangabaú), vira lagoa, o túnel do Maluf (Juscelino) enche.

O lixo corre com as águas (não há cestos, não há educação), os bueiros entopem.

as árvores caem.

As calçadas são armadilhas, alegria dos ortopedistas, que agradecem por tantos buracos, vãos, desvãos, onde nossos pés se encaixam quebrando ossos, rompendo ligações e articulações.

Nas ruas, asfaltadas porcamente, para que se asfalte e 'reasfalte' outra vez (superfaturando) ao desviar do buraco da esquerda, você cai no buraco do centro, isso quando não cai na cratera à direita.

Se for jantar fora, se for ao show, ao hospital, ao teatro, ao cinema, ao bar, se for a um casamento ou qualquer evento, pague ao manobrista que largará seu carro na esquina, pague ao flanelinha, perito em extorquir.

Pague a quem se aproximar, ou na volta encontrará a lataria riscada, pneus vazios.

Se entregar no estacionamento, verifique se o estepe está no lugar, se não levaram os CDs, que costuma ouvir no trânsito.

Eles não se responsabilizam por qualquer coisa que esteja dentro do carro e a lei aceita isso.

E para estacionar em noite de grande show?

Como enfrentar as quadrilhas de flanelinhas e taxistas desonestos?

Se for estacionar e for idoso, desista, alguém (não idoso) está no seu lugar, ou um não cadeirante.

Somos uma nação de mal-educados e infratores das leis do cotidiano.

Marque uma reunião de trabalho por dia, nas outras horas você estará no congestionamento.

Para ir ao trabalho ou dele voltar, ir almoçar, ir a uma festa, ir para a praia, visitar amigos, ver um doente, enfrente os que pedem esmolas nos cruzamentos, os que pedem nos bares, nos restaurantes, esquinas, porta de nossas casas, próximo aos shoppings, aos cinemas, praças, ou mesmo nas igrejas sejam quais forem, sem falar nos dízimos que devem pagar os que estão lá dentro.

Pedem com receitas médicas esfarrapadas, pedem para completar a passagem (até a esquina), pedem para o lanche (só que não aceitam o lanche), pedem porque 'acabaram de ser assaltados', pedem para pagar o pastel na feira, ou o caldo de cana, pedem no banco que você faça um titulo de capitalização, ou um seguro.

Nunca sabemos se nossos filhos voltarão vivos da balada, mesmo que não resistam.

Não sabemos se nossa mulher ou filhos não serão sequestrados no caixa eletrônico, mesmo que não resistam.

Não sabemos se nosso jantar terminará com sobremesa ou arrastão.

Não sabemos se um de nós voltará vivo para casa neste dia, mesmo que não resistamos.

Não sabemos se o nosso ônibus não será incendiado.

Se a linha do metrô estará funcionando.

Se o trem da CPTM não vai descarrilar ou bater de frente ou na traseira do outro.

Não sabemos se o alegre ciclista que corre pela ciclovia não estará morto antes do crepúsculo.

Não sabemos se o motoqueiro que leva mensagens, encomendas, comida, não será esmagado por um veiculo antes de chegar ao destino.

Não sabemos se o motoqueiro que emparelha com nosso carro não vai nos assaltar.

Andamos com vidros fechados, portas travadas, vivemos atrás de grades, protegidos por jaulas, câmeras, alarmes, cães, seguranças.

E mesmo assim somos todos inseguros, Inquietos, neuróticos, assustados.

O rico tem medo mesmo no carro blindado, o classe média tem medo,

o emergente tem medo, temos medo do bandido, da polícia, de todos.

O medo é nossa segunda pele.

Sem falar na poluição sonora, apitos, buzinas, alto falantes, etc.

Governe, prefeito, se a câmara deixar, se os partidos deixarem, se os secretários e os fiscais e a policia (que policia?) concordarem.

Se a população colaborar.

4 comentários:

Anônimo disse...

Não sei se coloco brilhante antes de triste ou triste antes de brilhante. Parabéns por um texto que exprime o que gostaríamos de dizer.

Anônimo disse...

Não sei se coloco brilhante antes de triste ou triste antes de brilhante. Parabéns por um texto que exprime o que gostaríamos de dizer.

Anônimo disse...

Não sei se coloco brilhante antes de triste ou triste antes de brilhante. Parabéns por um texto que exprime o que gostaríamos de dizer.

Vânia disse...

Perfeito.