domingo, janeiro 20, 2013

2013 não começou bem - JOSE ROBERTO MENDONÇA DE BARROS


O ESTADÃO - 20/01

O crescimento do ano passado decepcionou. Embora ainda vá demorar para que o IBGE divulgue os números oficiais, é seguro que o PIB cresceu algo como 1%. Este resultado mostra o esgotamento, ainda que por um tempo, da estratégia de alavancar o consumo como carro-chefe do crescimento.

Sérgio Vale, economista chefe da MB Associados, fez um exercício muito interessante. Ele calculou a contribuição para o crescimento acumulado nos oito anos do governo Lula e nos dois anos do governo atual. Lá podemos ver que as exportações líquidas foram negativas, isto é, as importações substituíram parte da produção nacional, especialmente industrial, como se sabe. Durante o primeiro período o consumo do governo respondeu por 17% do crescimento, enquanto nos dois últimos anos o valor subiu para 22%, refletindo um consistente crescimento nos gastos públicos.

O consumo das famílias representou 75% da taxa de crescimento no período Lula, número que sobe para nada menos que 87% no período recente. Em contraparte, os investimentos (Formação Bruta de Capital Fixo), que haviam respondido por 37% do crescimento no primeiro período, caem para 2% nos dois últimos anos. Se lembrarmos que as famílias estão endividadas e que a receita pública vem crescendo menos, fica evidente que ou aumentam os investimentos ou o crescimento seguirá muito modesto.

A questão fica mais complicada porque as autoridades claramente trabalhavam coma hipótese de que a baixa da taxa de juros e a desvalorização do real estimulariam o chamado espírito animal dos empresários e produziriam uma retomada importante dos investimentos, o que, evidentemente, não aconteceu. Ante esta grande frustração, governistas e heterodoxos passaram a dizer que tudo é uma questão de tempo, fator sempre escasso. De minha parte, não tenho dúvida, e já escrevi neste espaço, que duas coisas estão sendo grandemente subestimadas. De um lado, a máquina pública não consegue levar adiante os projetos de investimento. Ao contrário, são inúmeros os casos de elevações extraordinárias de custos e de atrasos que se medem em anos e não meses (Transposição do São Francisco, Refinaria Abreu de Lima, Comperj, duplicação da BR 101 em Santa Catarina e Transnordestina são apenas alguns dos inumeráveis projetos que têm atrasos superiores a3-4anos). Embora, em tese, seja perfeitamente possível que a retomada do crescimento possa ser puxada pelo investimento estatal, a tentativa realizada nos últimos anos tem se frustrado, por razões que não tem nada a ver com juros e câmbio (aparelhamento e loteamento político dos órgãos estatais e projetos básicos de má qualidade, por exemplo). Ademais, os investimentos, mesmo os privados, têm sido travados por conta de uma piora da qualidade regulatória, dos custos elevados, da falta de mão-de-obra e outras causas bastante discutidas. O resultado é a ausência das inversões que se mencionou no início deste artigo.

O ano corrente começa com duas dificuldades adicionais: um expressivo crescimento da inflação e expectativas ainda ruins por conta de novos fatores, como a intensa contabilidade criativa do final do ano passado e o impacto das dificuldades e incertezas relativas à oferta de energia elétrica.

A inflação de janeiro enfrentada pelo consumidor tem sido mais elevada do que se esperava. Por exemplo, o último IPCS atingiu 0,89%, fortemente pressionado por alimentos, educação e despesas diversas. Pior que isso, o número de categorias de preços que sofreram reajuste, o chamado índice de difusão, está muito elevado, acima de 70%, ou seja, há uma generalização do aumento dos preços. As projeções para o ano foram revistas para cima e é muito provável que a inflação deste ano atinja 6% em algum momento. Isso quer dizer que existe hoje um "piso" superior a 5,5% na inflação, que não tem a menor perspectiva de convergir para a meta. Pior que isso, corremos o risco de ver esse piso migrando para uma faixa de 6%, uma vez que nos últimos três anos a inflação foi de 5,9%, 6,5% e 5,8%. Quem conhece um pouco da história da inflação brasileira tem de ficar particularmente preocupado com essa situação, uma vez que, no passado, consolidado um determinado piso, a inflação não caiu mais. Infelizmente, o que estamos vendo é a tentativa cada vez mais generalizada de administração do índice, desde quando em dezembro de 2011 apenas o adiamento do reajuste dos cigarros permitiu que a inflação ficasse encostada no limite superior da meta, de 6,5%. Nesta semana, noticiou-se, que, a pedido das autoridades federais, os reajustes de metrô e ônibus de São Paulo e o ônibus do Rio de Janeiro tiveram seus reajustes postergados para o fim do primeiro trimestre. Adiar reajustes é como adiar o pagamento de uma dívida: alivia o caixa no curto prazo ao custo de comprometer a situação num futuro próximo. Já vemos isso no caso dos combustíveis, cujo reajuste foi sendo postergado, mas que tem de ser concedido necessariamente, dado o estrago feito no caixa da Petrobrás.

Ao mesmo tempo, novos fatores mantêm as expectativas ruins, estimulando o adiamento dos investimentos. Duas novidades ocorreram em janeiro: em primeiro lugar, o violento surto de truques aplicados ao cálculo do déficit público, tão disparatados que mereceram fortes reparos até da área governista. O argumento de defesa que menciona a necessidade de respeitar a LDO é risível no país das medidas provisórias. O fato concreto é que a descrença nos números fiscais cresceu muito e que é evidente que nosso regime fiscal está sendo lentamente erodido.

O segundo fato a afetar as expectativas foi a percepção de risco com relação à oferta de energia, que inclui não apenas a questão de eventual racionamento, mas também a sucessão de apagões dos últimos meses. Só no fim do verão saberemos qual terá sido a intensidade de chuvas e o nível dos reservatórios na entrada do período seco. Entretanto, dois efeitos são seguros: uma elevação do custo de energia pela utilização das térmicas - que ficarão ligadas, ainda, por muitos e muitos meses - que eliminará boa parte dos benefícios da redução da tarifa do setor elétrico e a elevação das dúvidas dos empresários sobre a realização de investimentos.

Caso não exista uma resposta adequada à questão inflacionária e a maior indução ao crescimento do investimento privado, vamos mesmo crescer pouco.

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