segunda-feira, dezembro 17, 2012

Ou fala ou mofa - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 17/12


"Eu não tolero a corrupção, e meu governo também não."
Dilma Rousseff


Ou fala ou mofa

Entretanto, deu tudo errado. Marcos Valério acreditou que o Supremo Tribunal Federal não condenaria os mensaleiros como lhe haviam garantido seus amigos do PT. O julgamento se arrastaria. E, quando terminasse, estaria prescrita a maioria das penas reservadas aos crimes cometidos. Condenado ficaria livre da cadeia. Existe regime aberto de prisão para quê? E semiaberto? Sem falar de penas alternativas.

QUEM NOMEOU A MAIORIA dos ministros do Supremo? Lula. Coube a Dilma nomear dois. Contaram a Valério que vários dos ministros haviam ganhado a toga sob o compromisso de matar no peito e livrar o PT do estigma do mensalão. Caixa 2 para pagar despesas de campanha? Fechado. Lula concordara com a saída soprada pelo ministro Márcio Thomaz Bastos, da Justiça. Caixa 2 é visto como crime menor.

MAS PAGAMENTO DE PROPINA para que deputado votasse como queria o governo? Mensalão com dinheiro público? E gerenciado pelos auxiliares de maior confiança do presidente da República e que junto com ele subiram a rampa do Palácio do Planalto? Fora os tolos, os idiotas e os cúmplices, quem acreditaria que o mensalão fora montado sem o aval de Lula?

EXERCÍCIO DE FICÇÃO: um dia, Delúbio, tesoureiro do PT, procura José Dirceu, chefe da Casa Civil, e fala sobre um publicitário mineiro com experiência em forjar empréstimos bancários e interessado em ajudar o PT. Preocupado com a frágil base de apoio do governo no Congresso, Dirceu tem a ideia de usar as artes do mineiro para comprar votos na Câmara e apoio de partidos.

CONVERSA A RESPEITO com cabeças coroadas do PT. Mas combina com todas elas esconder o assunto de Lula. Logo de Lula! Ninguém ousou dar um passo importante dentro do PT sem antes consultar Lula. E ninguém deu sem o consentimento dele. Os que ignoraram a vontade de Lula acabaram expulsos do PT ou saíram. Ora, sempre foi assim! Fim do exercício de ficção.

DE VOLTA A VALÉRIO. Não. Lula jamais se arriscaria a ter o último capítulo de sua biografia escrito por algozes. Valério, portanto, não deveria se preocupar com o pior. Viveria apertado por um bom tempo. Mas o companheiro Okamotto não o deixaria passar necessidades. Já lhe dera provas de que estaria sempre por perto para socorrê-lo. A um gesto de Lula, entraria em ação.

AINDA NO SEGUNDO SEMESTRE de 2005, por exemplo, quando Lula fora obrigado a pedir desculpas aos brasileiros e a se dizer traído;mesmo naquela ocasião, acuado por todos os lados, ouvindo de amigos o conselho para que abdicasse do sonho do segundo mandato, Lula não encontrou tempo para ordenar a Oka-motto que ajudasse Valério? Bastou que Valério procurasse um senador do PT, que procurou Lula, que...

É A MINHA HISTÓRIA FAVORITA! Foi assim: o senador disse a Lula que Valério estava sem dinheiro e ameaçava contar parte do que sabia sobre o esquema do mensalão. A princípio, Lula nada respondeu. Em silêncio, por meio das paredes envidraçadas do seu gabinete, admirou uma fatia dos jardins internos do Palácio do Planalto. Em seguida, perguntou: "Você procurou Okamotto?" O senador respondeu que não. Ponto final.

AQUELA NÃO FOI A PRIMEIRA VEZ que Valério chantageou Lula. Mas só chantageia com sucesso quem é dono de segredos. Passou para Valério a fase da chantagem. Condenado a 40 anos de reclusão, ele só poderá obter benefícios em outros processos se revelar o que esconde. Ou o que diz esconder. Se estiver blefando, azar o seu. Mofe atrás das grades.

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