domingo, dezembro 02, 2012

O crescimento sob Lula, parte 2 - SAMUEL PESSÔA

FOLHA DE SP - 02/12


Existe um paralelismo entre o período FHC-Lula e os governos militares Castello Branco-Médici


Na coluna da semana passada, argumentei que a aceleração do crescimento que houve da passagem do governo FHC para o governo Lula não resultou da aceleração da taxa de crescimento das horas trabalhadas nem de uma aceleração da taxa de crescimento da acumulação de capital físico.

Toda a aceleração que houve de 2,7% ao ano em média no segundo mandato de FHC para 4,0% ao ano na média dos oito anos de Lula resultou de a economia ter sido capaz de transformar as mesmas taxas de crescimento dos insumos, capital e trabalho em maiores taxas de crescimento da produção.

Ou seja, a aceleração do crescimento no período Lula foi um fenômeno de elevação da produtividade ou eficiência da economia.

Um primeiro motivo lembrado pela maioria dos analistas para justificar essa melhora é dado pela melhora das condições internacionais.

O forte crescimento da Ásia, e da China em especial, produziu forte elevação dos termos de troca, o que justificaria esse crescimento.

É necessário fazer duas qualificações com relação aos ganhos de termos de troca. Primeira: esses ganhos ocorrem quando o preço unitário da pauta exportadora cresce acima do preço unitário da pauta importadora. Até 2008, os ganhos de termos de troca foram relativamente baixos, na casa dos 6%, porque nesse período a pauta importadora também ficou muito cara.

A segunda qualificação: alteração de preços não muda a forma como a produção é calculada pelas contas nacionais do IBGE. Assim, não há um impacto direto dos ganhos de termos de troca sobre o PIB.

Mas a elevação dos preços dos bens que exportamos permite crescimento com elevação da produtividade, em razão da maior especialização da economia nos bens exportados. A economia cresce elevando a produção dos bens exportados, pois a demanda mundial por eles se elevou -são os bens cuja produtividade da economia é maior.

Cálculos preliminares que fizemos no Ibre, por outro lado, sugerem que houve no período forte elevação da produtividade do setor de serviços. Assim, o crescimento da produtividade foi disseminado nos diversos setores da economia, não só em razão do maior nível de produção dos bens que exportamos.

Apesar de os ganhos das exportações explicarem parte do fenômeno, o que produziu a maior parcela da aceleração da produtividade nos oitos anos do governo Lula?

Minha suspeita é que temos um caso clássico de defasagem entre a implantação de políticas e resultado das políticas. Muito do crescimento da produtividade nos oito anos do governo Lula deve ter sido colheita das reformas institucionais do governo anterior e das reformas microeconômicas implantadas no período em que Palocci esteve à frente do Ministério da Fazenda.

Há uma literatura recente que elabora o argumento e tenta arrolar evidências empíricas de que há forte relação entre fenômenos de crescimento e reformas que alteram as instituições na direção da elevação da eficiência econômica.

O argumento é que as instituições constituem as regras do jogo em uma economia de mercado. Sempre que elas induzem comportamentos dos indivíduos que sejam positivos do ponto de vista da sociedade, a economia passa por um processo de aceleração do crescimento.

Nesse sentido, há paralelismo, com as adaptações de praxe, entre o período FHC-Lula e os governos militares Castello Branco-Médici.

As acelerações do crescimento nos períodos Médici e Lula resultaram da conjunção de uma situação internacional extremamente favorável associada à colheita do esforço reformador dos períodos Castello Branco e FHC, respectivamente.

É curioso que os dois períodos terminaram com uma crise internacional: triplicação dos preços internacionais do petróleo em 1973 pela Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) e crise do "subprime" em setembro de 2008 com a quebra do banco de investimento americano Lehman Brothers.

É curioso também que a resposta dos governos que sucederam aos governos do crescimento -Geisel após Médici e Dilma após Lula- foi aumentar em muito a presença do Estado na economia. A boa notícia é que o funcionamento de nossa sofisticada democracia impedirá que se cometam agora os excessos que foram cometidos no passado.

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