sexta-feira, outubro 19, 2012

Fundo soberano: o fiasco - GUILHERME ABDALLA

BRASIL ECONÔMICO - 19/10


Quem não se lembra dos anúncios e propagandas pirotécnicos (marketing mesmo) quando da criação do Fundo Soberano do Brasil-FSB, em 2008? Pois bem, passados quase quatro anos da promulgação da Lei nº 11.887/08, que o cunhou, o resultado formalmente apresentado semana passada pelo Ministro de Estado da Fazenda Guido Mantega ao Senado Federal é indigesto, para não dizer risível. Parece mais um manual de como não devem ser gerenciados recursos públicos ou, no raciocínio inverso, um roteiro de como queimar o dinheiro do povo brasileiro.
Na teoria, o FSB foi pomposamente instituído como um “fundo especial de natureza contábil e financeira, vinculado ao Ministério da Fazenda, com as finalidades de promover investimentos em ativos no Brasil e no exterior, formar poupança pública, mitigar os efeitos dos ciclos econômicos e fomentar projetos de interesse estratégico do país localizados no exterior”. Na prática, no entanto, o FSB gastou quase todo seu capital na compra de ações de companhias comandadas—igualmente na prática—pelo próprio governo, quer dizer, Petrobras e Banco do Brasil.
Vamos aos tristes números: o FSB teve como aporte inicial a emissão de 10.201.373 títulos do Tesouro Nacional, em dezembro de 2008, totalizando R$ 14,2 bilhões a preço de mercado. Na mesma data do aporte, o FSB promoveu a respectiva integralização de cotas do Fundo Fiscal de Investimentos e Estabilização( FFIE), um fundo multimercado, exclusivo e especialmente criado. Já em 2010, a União houve por bem adquirir, por meio do FFIE, substancial posição no BBAS3, PETR3 e PETR4 (praticamente todo o seu capital foi endereçado a essas empresas à época). O resto foi direcionado a operações prefixadas.
Resultado? Ao fim do segundo trimestre de 2012, a parcela de ativos com renda variável do FFIE caiu para 76,91%, em razão da redução dos preços de mercado de ações no período, enquanto a parcela então ínfima de ativos de renda fixa aumentou para 22,94%. Quanto ao valor dos ativos do FFIE, quer dizer, nosso dinheiro, tem os um total de R$ 13,8 bilhões em junho de 2012, representando uma rentabilidade negativa de -16,84% no trimestre e -17,91% nos últimos 12 meses. Note-se: aportou-se R$ 14,2 bilhões em 2008 e temos hoje, após quatro anos, R$ 13,8 bilhões.
Ora, a lei que criou o FSB e seu decreto regulamentador não obrigam—nem de longe e nem de perto — que seus aportes devam ser destinados somente a estatais ou sociedades de economia mista. Muito pelo contrário, poder-se-ia entender que o privilégio dedicado à Petrobras e ao Banco do Brasil deturpa a essência do próprio FSB, que deve necessariamente ter uma visão mais ampla dos interesses estratégicos do país. A mitigação de “ciclos econômicos” objetivada pelo FSB — a bem da verdade, não é um objetivo, mas um dever — não pode se resumir a essas duas empreitadas. Como está, o povo perde nas duas pontas: na captação, pois os recursos são remunerados pela taxa aplicável ao título do Tesouro Nacional; no investimento, pois nitidamente destinados exclusivamente a empresas de interesse político-particular.

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