quarta-feira, maio 23, 2012

Silêncio revelador - EDITORIAL - ZERO HORA


ZERO HORA - 23/05

Personagem central do esquema de corrupção de agentes públicos e privados desbaratado recentemente pela Polícia Federal, o empresário Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, protagonizou ontem uma previsível pantomima na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do Congresso Nacional. Com o semblante abatido em relação ao homem que transitava com desenvoltura nos bastidores do poder e ladeado por seu advogado Márcio Thomaz Bastos, ex-ministro da Justiça do governo Lula, o depoente usou e abusou do direito constitucional de permanecer calado - o que, no caso, equivale a uma explícita confissão de culpa. Em torno dele, deputados e senadores integrantes da investigação parlamentar jogaram para a torcida, a maioria aproveitando o momento de visibilidade para expor suas ideias sobre o caso e para fustigar adversários políticos com insinuações. 
Apesar das tentativas sensatas de transferência da inquirição para depois da audiência do contraventor na 11ª Vara da Justiça Federal de Goiâ-nia, prevista para o próximo dia 31, os parlamentares levaram adiante a encenação por mais de duas horas, até que uma intervenção veemente da Senadora Kátia Abreu (PSD-TO) conseguiu transformar a sessão de inquérito em reunião administrativa. "Esta sessão está sendo ridícula. O que as pessoas vão pensar de nós, se estamos aqui perguntando para uma múmia? Não estamos aqui para fazer papel de bobos diante de um chefe de quadrilha" - disse a parlamentar. E parecia isso mesmo: a cada questionamento, o depoente respondia de forma monocórdia: 
- Calado, senhor! 
O silêncio do acusado, ao mesmo tempo em que amplia as suspeitas de sua participação no esquema criminoso, também revela a inoperância de uma CPI que começou promissora, com a convocação de 51 pessoas e 36 quebras de sigilo bancário, fiscal e telefônico, mas não consegue superar vícios políticos e partidários de seus integrantes, mais interessados em proteger correligionários do que em promover uma verdadeira depuração ética na administração pública. Na semana passada, esta estratégia ficou escancarada quando um acordo de líderes livrou de depoimentos os governadores Agnelo Queiroz (PT-DF), Marconi Perillo (PSDB-GO) e Sérgio Cabral (PMDB-RJ), além de restringir a investigação sobre a empreiteira Delta à Região Centro-Oeste. 
Todos ficaram devendo à nação. Do acusado já se esperava o silêncio espertamente planejado para dificultar a verdade. Dos parlamentares, porém, os brasileiros ainda esperam um pouco mais de seriedade, um pouco mais de responsabilidade com os seus mandatos, um pouco mais de compromisso com o país. Não foi uma boa largada, mas ainda há tempo para uma virada de rumo nesta investigação. 

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