quarta-feira, maio 23, 2012

Crédito começa a fluir - CRISTIANO ROMERO


Valor Econômico - 23/05


A maior preocupação do governo neste momento é que, mesmo com a queda das taxas de juros e as medidas de estímulo adotadas, consumidores e empresas não se animem a tomar crédito. Sem crédito, a economia não anda. Embora a demanda, impulsionada pelo forte aumento do salário mínimo em janeiro, siga aquecida, a produção industrial patina. A boa notícia é que há sinais de que o crédito, depois das seguidas rodadas de redução dos spreads, começa a fluir.

Aparentemente, tanto pessoas físicas quanto empresas estão reagindo positivamente à queda dos juros. O vice-presidente de Negócio de Varejo do Banco do Brasil (BB), Alexandre Abreu, revela que, nas linhas com maior impacto sobre a economia, as concessões têm crescido de forma acelerada no último mês e meio.

As operações com pessoas físicas mostram isso claramente. Na linha de crédito direto ao consumidor (CDC), a taxa média de juros cobrada pelo BB caiu de 2,41% para 2,19% ao mês entre março e maio. Nessa modalidade, o banco emprestou, em março, R$ 190,4 milhões por dia útil. Em abril, a média diária saltou para R$ 294,3 milhões e, em maio (até o dia 15), para R$ 322,4 milhões. O incremento por dia útil foi de 70%.

No caso de financiamento de veículos, segmento que, por causa do aumento inadimplência, tornou os bancos mais conservadores na concessão de novos empréstimos, também começa a haver um certo desafogo, algo que pode ser intensificado graças às últimas medidas adotadas pelo governo - ontem, em resposta à liberação de depósitos compulsórios para financiamento de carros novos e à diminuição do Imposto sobre Operações Financeiras incidente sobre crédito, o BB reduziu a taxa média de 1,29% para 1,09% ao mês.

Antes dos novos estímulos, a concessão de empréstimos já vinha melhorando, conforme atestam dados oficiais que o Banco do Brasil divulgará nos próximos dias. De qualquer forma, em março o BB liberou, em média, apenas R$ 11,1 milhões por dia útil para compra de automóveis. Em maio, a média diária mais do que triplicou - foi para R$ 34,1 milhões; agora, com a liberação de R$ 2 bilhões de seu compulsório, o banco acredita que a média diária crescerá para R$ 45 milhões até o fim de junho.

É possível que, nos próximos dias e semanas, haja um incremento nesses valores. Além da redução do custo financeiro, os carros ficaram mais baratos graças à decisão do governo de reduzir as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Ademais, o BB conta com o fato de ter uma inadimplência média, nesse segmento, inferior à do mercado - 2,6%, face a 5,9%.

No crediário, o BB também tem registrado avanços. A média por dia útil cresceu de R$ 396,1 mil em março para R$ 2,3 milhões em maio (sempre até o dia 15), um pulo de 481,64%. O desembolso total ainda é acanhado se comparado ao de outras linhas - R$ 8,7 milhões em março e R$ 23 milhões nos primeiros 15 dias de maio -, mas a tendência, graças à forte queda dos juros nessa modalidade - de uma taxa média de 3,42% para 1,94% ao mês -, é positiva.

No crédito consignado para aposentados do INSS, os desembolsos diários cresceram quase 60% entre março e maio. A taxa média de juros recuou de 2,02% para 1,79% ao mês no período, e os desembolsos por dia útil avançaram de R$ 7,7 milhões para R$ 12,2 milhões.

Alexandre Abreu explica que, com o "BomPraTodos", programa com que o banco pretende conquistar clientes dentro da realidade de spreads mais baixos, o BB quer mostrar que é mais vantajoso tomar um CDC (juro médio de 2,23% ao mês) do que usar o cheque especial (8,01%) ou o crédito rotativo do cartão de crédito (13% ao mês). De fato, o cheque especial é uma aberração dos tempos de inflação crônica no Brasil. Como o custo de vida corroía diariamente o poder de compra dos salários, o cheque especial funcionava como um crédito automático ao qual o assalariado recorria até o dia de recebimento do salário.

Com o "BomPraTodos, e os bancos privados estão adotando modelo parecido, o BB quer convencer os atuais e novos clientes a migrarem para produtos mais baratos. Três milhões, dos 33 milhões de correntistas do BB, usam cheque especial regularmente. Como a inadimplência nessa modalidade é altíssima - 15% na média do mercado, 11% no Banco do Brasil -, o juro é o mais alto, perdendo apenas para o do cartão de crédito.

Se o cliente adere ao "BomPraTodos", toda vez que ele usa mais de 50% do limite do cheque especial, durante 60 dias, no 61º dia ele recebe uma mensagem pelo celular (SMS) informando que aquela dívida será parcelada automaticamente em 24 meses, ao custo de 3,94% ao mês (taxa máxima do CDC). É um preço salgado, mas bem inferior ao do cheque especial. A mesma regra vale para o crédito rotativo do cartão de crédito.

Abreu justifica o aumento da tarifa nesse programa, alegando o fato de o banco incorrer em novos custos - um deles, o envio de SMS. Além disso, argumenta, o cliente passa a ter uma espécie de assessoria financeira. Nada se compara, no entanto, diz ele, aos custos incorridos antes por causa de juros bem mais altos. O dirigente do BB conta que, com o tempo, a tendência é que o cheque especial desapareça ou se torne menos relevante - o banco estima que, em um ano, a carteira nessa modalidade diminuirá de R$ 3,2 bilhões para R$ 1,6 bilhão.

Embora o cheque especial e o cartão de crédito sejam mecanismos "populares" de acesso a crédito, eles têm relevância econômica menor que a de outras formas de crédito. Da carteira de crédito de R$ 120 bilhões de pessoa física do BB, cheque especial responde por apenas R$ 3,2 bilhões (2,6%) e crédito rotativo de cartão de crédito, por R$ 2,5 bilhões (2%). É muito menos que crédito consignado (37,5% do total), financiamento de automóvel (16,6%) e CDC (20,8%).

"Em apenas um mês, a migração de clientes para o "BomPraTodos" chegou a 200 mil. É um número expressivo", comemora Abreu, que não teme o impacto dos juros mais baixos sobre a saúde financeira do BB. Ele lembra que a iniciativa de reduzir juros é generalizada e assegura que o BB está fazendo isso de forma responsável. "O grande medo do banqueiro é baixar os juros e na ponta o cliente não pegar o recurso. Nossos clientes estão pegando empréstimos."

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