quinta-feira, maio 17, 2012

As Diretas da Verdade - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 17/05




Faltou a senhora Verdade para acompanhar o senhor Diretas, nos anos 1980. Espera-se que agora, ela surja linda e majestosa por essa comissão que leva seu nome. Só assim fecha-se o ciclo aberto pelo Movimento Diretas Já

No ano que vem, o Movimento Diretas Já completa 30 anos. Ali, os personagens que tanto lutaram pela democracia encheram as ruas, as praças, os palanques. Eram brasileiros lutando de corpo e alma pelo direito de escolher seus representantes pelo voto direto e pôr um fim à farsa promovida pelos militares que indicavam o candidato e ponto. Naqueles palanques, estavam na linha de frente Ulysses Guimarães, conhecido como o “senhor Diretas”, e Tancredo Neves. Ao lado deles, dois personagens que ontem desceram a rampa interna do Palácio do Planalto, meio que escoltando a presidente Dilma Rousseff. À direita de Dilma, Luiz Inácio Lula da Silva, a quem ela deu o braço. À esquerda, Fernando Henrique Cardoso.

Ok, você do PT vai dizer que os dois ex-presidentes estavam nos lugares errados em termos ideológicos, os petistas vão dizer que Lula está à esquerda e Fernando Henrique Cardoso, à direita. Isso hoje pouco importa. Os três sempre estiveram do mesmo lado da política, embora seus partidos tenham promovido um “divórcio” na luta pelo poder, que, invariavelmente, deixa em lados opostos quem deveria estar junto. Eles choraram juntos a derrota da Emenda Dante de Oliveira, no Congresso Nacional. O PT ficou tão revoltado que decidiu não votar em Tancredo no Colégio Eleitoral.

Mas voltemos ao simbolismo da solenidade de ontem no Planalto. Poucos passos atrás de Lula, Dilma e Fernando Henrique desceram José Sarney e Fernando Collor. Há 29 anos, quando começou o movimento das Diretas, não compunham aquele palanque com Ulysses e Tancredo. Sarney, entretanto, logo se juntaria ao grupo quando foi construído o Partido da Frente Liberal, o PFL. Foi o que deu a maioria que Tancredo precisava para vencer Paulo Maluf no Colégio Eleitoral. Ufa! Finalmente os militares estavam fora.

Por falar em Sarney…
O governo Sarney consolidou a democracia, mas não democratizou os arquivos. Collor saiu antes de poder pensar em qualquer atitude nesse sentido. Fernando Henrique Cardoso e Lula também não o fizeram. O máximo que se conseguiu até agora foi que cada um conhecesse a sua ficha no Dops ou documentos vazados aqui e ali que garantem prêmios a muitos jornalistas estudiosos do assunto. Mas fantasma das versões — tanto do lado daqueles que lutavam pela redemocratização, quanto daqueles escritos por quem comandava o país — continua perambulando. O Movimeto Diretas Já derrotou a ditadura — ainda que com a primeira eleição pós-militares tenha sido por vias indiretas —, mas não se concluiu. Faltou a senhora Verdade para acompanhar o senhor Diretas. Espera-se que agora, ela surja linda e majestosa por essa comissão que leva seu nome. Não por acaso, Dilma falou em liberdade para trabalhar, um recado aos militares dito de viva-voz pela chefe suprema das Forças Armadas, a presidente da República.

Por falar em militares…
A presença dos quatro ex-presidentes também é cercada de simbolismos. Eles fizeram questão de comparecer para que fique claro aos militares, em especial, os da reserva que não querem revelar o passado, que apoiam a Comissão da Verdade. Estavam ali como escudeiros de Dilma, um recado claro de que a Comissão da Verdade não é obra de uma ex-guerrilheira que, vez por outra, é irascível com alguns de seus ministros, assessores e presidentes de estatais. Mas é algo que vem de uma geração que precisa saber da sua vida. No Alvorada, ela aproveitou o almoço para agradecer e reforçar esse gesto. Juntos, os ex-presidentes também fizeram uma análise da situação mundial, das apreensões com a situação da Europa, da doença do venezuelano Hugo Chavez, oportunidade em que Lula aproveitou para dizer que sua saúde está em dia, salvo por uma tendinite no pé.

Por falar em irascível…
A presidente Dilma não consegue ficar seis meses sem mexer no primeiro escalão. Numa roda de políticos no Planalto, um deles deixou escapar que tinha ouvido de gente ali de dentro que o ministro de Relações Exteriores, Antonio Patriota, deixou de integrar a lista de preferidos. É fato que o PT sempre reclama que ele não é político como o era Celso Amorim, hoje ministro da Defesa. Diz-se que a sucessora — isso mesmo, mais uma mulher no governo! — viria de Washington. Se não for boato, em breve saberemos. Mas essa conversa rola nas salas onde muitos se encontram ao entrar e sair de audiências palacianas.

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