segunda-feira, fevereiro 27, 2012

Monólogo - AÉCIO NEVES

FOLHA DE SP - 27/02/12



O governo da presidente Dilma encena um monólogo a dois no qual uma das partes -o governo- fala e determina, e a outra -o Congresso- cala e obedece.

O corte no Orçamento, de R$ 55 bilhões, que extirpou todas as emendas parlamentares, reforçou o traço autoritário existente na relação entre os dois Poderes, sinalizando a manutenção de uma política baseada na barganha.

Conhecemos esse filme: cortam-se todas as emendas para que possam ser liberadas em conta-gotas a alguns escolhidos ou em épocas de votações de interesse do governo.

Se há que condenar os casos em que as emendas servem a interesses escusos e em que existem as que são destinadas a investimentos supérfluos, não tem como desconsiderar que, quando corretas, são instrumentos importantes. Representam, muitas vezes, a única chance de centenas de municípios brasileiros terem necessidades atendidas, pois nem sempre os investimentos do Executivo pautam-se por critérios republicanos.

O ano passado já havia sido marcado por demonstrações de autoritarismo do Executivo sobre o Legislativo. A decisão do governo de retirar do Legislativo a prerrogativa de fixar o valor do salário mínimo -sem entrar no mérito ou na legalidade da iniciativa, mas me atendo ao seu sentido político- foi um marco triste na história do Congresso.

É possível imaginar qual teria sido a posição do PT se a mesma iniciativa tivesse partido de um governo do PSDB.

O mesmo aconteceu com a PEC 11, que cria novo rito de tramitação para as MPs editadas pelo Executivo e reconstitui parte do papel constitucional do Legislativo no exame das medidas. Aprovada no Senado por meio de acordo, a base governista acabou repreendida pelo Palácio do Planalto em função do apoio dado ao que é consenso na Casa. Não por acaso, a PEC adormece, desde agosto, no esquecimento da Câmara dos Deputados.

Blindada pela muralha das alianças de conveniência, o governo ignora o Congresso como instituição e apequena a relação entre os Poderes. Sou um dos que se perguntam até quando os próprios aliados resistirão em silêncio ao desrespeito continuado.

Nesse momento, em que o Legislativo prepara-se para discutir temas importantes como o pré-sal, os royalties sobre minérios e o código florestal, não interessa à sociedade que tal debate ocorra em um Congresso fragilizado. São temas que pertencem à agenda do futuro dos brasileiros e não podem estar submetidos aos interesses imediatos ou à conveniência de um governo, qualquer que seja ele.

Só um Congresso em pleno exercício das suas prerrogativas pode garantir ao país as salvaguardas necessárias para que prevaleça o interesse nacional.

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