O Estado de S. Paulo - 28/11/2011
O governo do caudilho Hugo Chávez - que além de autoritário é desastrado - resolveu jogar a culpa pela inflação que devasta a economia da Venezuela, já chegando a 27,7% em 12 meses até outubro, segundo analistas independentes, sobre os ombros dos fabricantes de 20 produtos básicos de consumo, congelando seus preços a partir de 2012. Entre esses produtos estão alimentos diversos e artigos como pasta de dentes, água mineral e detergentes, em sua maioria importados. Quanto aos produtos fabricados na Venezuela, os seus fabricantes passarão por uma auditoria para "evitar a especulação" e "dar aos produtos o preço justo", como anunciou Hugo Chávez. Se porventura o caudilho venezuelano fosse capaz de aprender o que quer que seja, saberia que congelamento de preços não funciona em lugar nenhum, nem em economias de livre mercado nem em economias centralmente planejadas. É o que mostra sobejamente a experiência histórica, e é o que se constatará no proclamado "socialismo do século 21".
A medida é mais uma evidência do desastre a que Chávez levou a economia da Venezuela, que mal vem se recuperando em 2011 de dois anos seguidos de recessão (queda do PIB de 3,3% em 2009 e de 1,4% em 2010).
Nos últimos anos, a inflação naquele país tem ficado sempre acima de 25% e, com o congelamento, os índices oficiais de preços poderão ser manipulados à maneira argentina - ou seja, para que o governo possa exibir o resultado mais conveniente, do ponto de vista eleitoral. Mas o expediente só aumentará o descompasso existente entre a inflação oficial (22,7% no período anual até outubro, segundo o Banco Central de Venezuela) e a medida por fontes independentes.
Em nome do que ainda resta do setor privado na Venezuela, o presidente da entidade empresarial Fedecámaras, Jorge Botti, depois de ponderar que "a estabilidade dos preços não pode ser obtida com controle, mas com políticas econômicas assertivas", disse que a entidade estuda a possibilidade de entrar com ações judiciais contra o decreto de congelamento, que se baseia em uma lei de 2003. Como Chávez tem poderes excepcionais e comanda o Judiciário, essas ações não terão mais que um efeito simbólico.
Quase toda a economia venezuelana - indo de instituições financeiras a estabelecimentos de varejo - já está sob o controle do governo. E é previsível que, depois da auditoria prevista em empresas que terão seus preços congelados, o governo decida também estatizá-las. O resultado dessa aventura já é conhecido pelos venezuelanos e somente se agravará no futuro: o desabastecimento, seguido de prósperas atividades de câmbio negro dos produtos constantes da tabela de preços congelados, a ser divulgada dentro de um mês.
Segundo Karlin Granadillo, diretora da Superintendência Nacional de Custos e Preços Justos (Sundecap) - a Sunab local -, "há uma disparidade importante de preços na Venezuela em comparação com o exterior", o que seria evidência de "uma carga especulativa muito forte". Mas não foi divulgada qual é a taxa de câmbio nem o índice de inflação tomados para esse cálculo, para não falar do volume da oferta em relação à demanda. E o desabastecimento já é grave, obrigando os consumidores a enfrentar filas para comprar produtos em falta, como azeite e açúcar.
Em sua auditoria de custos, a Sundecap não levará em conta custos indiretos, como os decorrentes das incertezas jurídicas e econômico-financeiras geradas pela socialização progressiva dos meios de produção, nem as ineficiências dos setores já estatizados e que se projetam sobre o conjunto da economia nacional.
Como de hábito, Hugo Chávez tentará mascarar as consequências perversas de sua incapacidade gerencial. Não se afasta, por exemplo, a possibilidade de o governo subsidiar os produtos básicos de consumo ou de valorizar o bolívar fuerte em relação ao dólar para baratear os importados. Em ambos os casos, isso afetaria o déficit orçamentário, que já chega a 5,1% do PIB.
O fato é que o congelamento é um embuste. O caudilho acredita que, mantendo os preços artificialmente congelados por algum tempo, será mais fácil ganhar as eleições presidenciais de dezembro de 2012.
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