segunda-feira, agosto 29, 2011

FERNANDO ABRUCIO - A eleição municipal e o relógio político

A eleição municipal e o relógio político
FERNANDO ABRUCIO
Revista Época

AS MAIORES DIFICULDADES PARA DILMA TÊM MAIS CHANCES DE APARECER NA SEGUNDA PARTE DO MANDATO

A política sempre pode trazer surpresas, tal qual o futebol. Mas, se não houver nenhum fato novo de grandes proporções, os congressistas da base governista não gerarão uma crise de governabilidade até a eleição municipal. Escândalos e lutas entre aliados podem continuar a ocorrer, como já tivemos em outros governos. O estranhamento em relação ao estilo da presidente Dilma também pode produzir ruídos. Só que a maior parte dos políticos não fará movimentos abruptos antes do pleito de 2012.

Como mostraram os escândalos nos Transportes e no Turismo, o que estava em jogo era, além da corrupção em si, a criação de benefícios às bases locais dos parlamentares. Este é um dos principais eixos da carreira dos congressistas. Muitos concorrerão a prefeito e outros, em maior número, terão de se posicionar em relação à competição em seus redutos. Seguindo essa linha de raciocínio, as eleições municipais, que ocorrem exatamente na metade do mandato do presidente e dos deputados, constituem um momento-chave para definir estratégias para 2014. Um erro muito grande na disputa pelas prefeituras pode ser fatal aos que pretendem se reeleger.

O caráter estratégico das eleições municipais recomenda cautela aos políticos com mandato federal. Obviamente que eles têm alianças históricas em seus redutos e tentarão mantê-las ou ampliá-las. No entanto, também é preciso levar em conta o peso das ações dos outros níveis de governo. Assim, a situação econômica nacional, a influência das políticas federais e estaduais sobre os municípios, o clima de apoio ao presidente e ao governador são questões que afetam o cálculo dos congressistas em sua participação na disputa local.

O governo Dilma tem boa popularidade e, salvo surpresas catastróficas, deverá manter um nível semelhante até o período próximo às eleições de 2012. É bem verdade que a economia pode ser afetada com maior intensidade pela crise internacional, mas o mais provável é que o Brasil ainda possa aguentar razoavelmente bem essa pressão. Ademais, as políticas federais atingem uma parte considerável dos municípios. Uma briga maior contra o Executivo pode transformar um político num aliado não muito desejado pelos prefeituráveis. Não se pode esquecer, por fim, que o presidente Lula fará campanha em grande parte do país. E ele continua sendo, em vários lugares, um poderoso cabo eleitoral.

Quem pode se contrapor mais ao ímã do poder federal é a oposição partidária e, sobretudo, os governadores. Os primeiros são fortes em determinados colégios eleitorais, mas por ora não há uma onda política que permita antever um grande crescimento dos oposicionistas em 2012. O mais provável é que cresçam onde seus governadores conseguirem ser eleitoralmente mais efetivos.

Os governadores são peça-chave na eleição municipal. Mas não se pode adotar a premissa segundo a qual eles estariam, necessariamente, num lado oposto ao governo federal. Muitos deles apoiam e dependem dos recursos da União, em particular nos dois primeiros anos de governo, momento propício ao ajuste das contas, com o propósito de se gastar mais no final do mandato. Mesmo as governadorias comandadas por oposicionistas não pretendem criar muita animosidade com o Executivo federal neste momento.

A moral da história é que os governistas não teriam nada a ganhar agora, véspera da estratégica disputa pelas prefeituras, com um afastamento radical da base de apoio à presidente. Ao contrário, tenderiam a perder discurso e/ou recursos – as duas armas principais da política. Uma mudança maior só poderá ocorrer no dia seguinte das disputas municipais, dependendo dos resultados eleitorais.

A preocupação com a governabilidade não deve nunca ser negligenciada. Não obstante, as maiores dificuldades para a presidente Dilma têm mais chances de aparecer na segunda parte do mandato. Isso pode advir da piora da situação econômica, de novas demandas sociais, do crescimento da oposição e do surgimento de um novo queremismo, com os políticos da situação pedindo a volta de Lula.

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