domingo, junho 06, 2010

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO

Demagogia no ensino superior
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 06/06/10

Das 13 universidades federais criadas nos dois mandatos do presidente Lula - o que lhe permite afirmar que é o governante que mais investiu na expansão do ensino superior público desde a descoberta do País - 2 chamam a atenção por terem sido especialmente criadas com o objetivo de reforçar sua imagem externa e reafirmar as "novas responsabilidades" que o Brasil vai assumindo no cenário internacional.

Sediada em Foz do Iguaçu, na fronteira com a Argentina e o Paraguai, uma delas é a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), que está funcionando provisoriamente num prédio da Usina Binacional de Itaipu. A outra, que será erguida em Redenção, a 55 quilômetros de Fortaleza, é a Universidade Federal de Integração Luso-Afrobrasileira (Unilab). Com cerca de 27 mil habitantes, a cidade foi escolhida por ter sido a primeira a libertar todos os seus escravos antes da Lei Áurea, de 1888. Esse critério dá a medida das intenções do governo.

Como a criação das duas instituições decorreu mais de marketing político do que de critérios acadêmicos, as autoridades educacionais querem implantá-las o mais rapidamente possível, a fim de criar um fato consumado. Há o receio de que, se a oposição ganhar a eleição de outubro, o próximo governo possa cancelar essas iniciativas que, além de caras, primam pela demagogia. Ao justificar a criação da Unilab, assessores de Lula invocam a necessidade de resgatar uma "dívida histórica com a África" e reforçar a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), por meio de intercâmbio acadêmico e oferta de ensino superior gratuito a alunos vindos de Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e até do Timor Leste e de Macau. No caso da Unila, que pretende valorizar a adaptação de novos conhecimentos à "realidade regional" e os "elementos centrais da problemática latino-americana", os assessores de Lula enfatizam a necessidade de um "projeto político-pedagógico" destinado a aumentar a influência do País na região do Mercosul.

Das 5 mil vagas que a Unilab pretende oferecer em seus cursos de graduação, nas áreas de produção de alimentos, saúde pública, proteção ambiental, gestão de pequenos negócios e formação de docentes para educação básica, metade será para alunos brasileiros e metade para estrangeiros. O mesmo critério também será adotado na Unila, cujas aulas deverão começar no próximo semestre, com professores recrutados em toda a América Latina ? e não só no Brasil. Na Unila, cujos prédios começarão a ser construídos em setembro num terreno de 40 hectares, com base num projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer, o reitor será sempre brasileiro, enquanto o vice-reitor virá dos países da região, com a condição de que tenha o título de doutor. O primeiro reitor será o cientista político Hélgio Trindade, da UFRGS, e o vice-reitor será o sociólogo uruguaio Gerónimo Sierra.

Nas duas instituições não haverá cobrança de taxas e mensalidades e os alunos receberão bolsas para alimentação, alojamento e transporte. Na Unila eles serão selecionados com base numa prova que, além de não ser eliminatória, será realizada em seus respectivos países de origem. Na Unilab a ideia é conjugar políticas de "inclusão social" com "distribuição étnico-socioeconômica dos países da CPLP", tomando-se por base as notas obtidas no Enem pelos estudantes da região do Maciço de Baturité, onde se situa a cidade de Redenção.

Além da Unilab e da Unila, o governo estuda a criação de mais uma instituição "temática" ? a Universidade Federal da Integração da Amazônia Continental. Em matéria de ensino superior, o governo continua atirando para todos os lados. Tentou promover uma reforma universitária, em 2004, e fracassou. Tentou usar o Enem para unificar os vestibulares das universidades federais, em 2008, e desmoralizou esse mecanismo de avaliação. E, enquanto a maioria das universidades federais enfrenta déficit de equipamentos e de professores motivados, desperdiçam-se recursos escassos com iniciativas demagógicas.

Um comentário:

Sustentabilíssimo disse...

Gente aproveitando a matéria gostaria apenas de expressar minha satisfação em saber que o Globo Repórter desta semana é sobre São Tomé e Príncipe, que passará em rede Nacional aqui no Brasil, possibilitando aos brasileiros conhecer um pouco melhor este país que apesar de todas as suas dificuldades é tão lindo e apaixonante. Para mais informações: http://principesaotome.blogspot.com/