terça-feira, novembro 03, 2009

MARCOS NOBRE

Copenhague e a China

FOLHA DE SÃO PAULO - 03/11/09


EM POUCO MAIS de um mês terá início a CoP-15, 15ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, em Copenhague. Mas o que está em jogo parece ter pouco que ver com meio ambiente.
As discussões públicas têm se resumido a um jogo de empurra para decidir quem é o culpado pelo fracasso da conferência antes mesmo de ela acontecer. E as duas figuras que se alternam no papel de vilões são os EUA e a China.
A China resolveu fazer da conferência um campo de testes para um futuro exercício efetivo de seu papel de liderança global. A condição para isso, entretanto, é colocar a própria crise climática em segundo plano.
A conferência de Copenhague é de fato a primeira queda de braço global em relação à crise de 2008 e seus desdobramentos. EUA e China ainda não se sentaram para negociar uma saída do mar de liquidez que ameaça afogar o mundo nos próximos dois anos. Isso significaria, antes de qualquer coisa, negociar acordos informais sobre a administração da taxa de câmbio. Especialmente em relação à moeda chinesa.
Só que a China não dá sinais de que vai se colocar em posição negociadora. Parece preferir tentar esticar ao máximo a corda da crise e tirar o máximo proveito para conquistar territórios ao domínio dos EUA.
A conferência de Copenhague é um interlúdio nessa disputa. É um bom palco para a China medir forças com os EUA, porque o tema não é diretamente regulação econômica. Mas também porque os outros dois parceiros habituais de uma negociação sobre regulação internacional -Alemanha e Japão- têm compromissos firmes e duradouros com o meio ambiente e não querem entrar na queda de braço de nenhum dos lados. Uma neutralização providencial. Se o tema não fosse oficialmente meio ambiente, os dois países estariam com certeza ao lado dos EUA na negociação.
A China tem se escondido até agora atrás de G20s, Brics, G77s e outros clubes de fotografia justamente para não negociar diretamente com os EUA. Já em uma conferência sobre o clima pode mostrar os seus dentes sem ameaçar essa tática de esconde-esconde.
Difícil saber se e quando a China vai se colocar na posição negociadora que já lhe cabe como potência econômica e militar. Mas, independentemente de seus interesses estratégicos mais amplos, o fato é que a sua atitude em relação à conferência de Copenhague autoriza os EUA a brincar de esconde-esconde também. Como não há acordo climático global sem os EUA, o jogo não tem vencedor. De modo que o prêmio do desastre ambiental será dividido graciosamente com o mundo inteiro.

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