sexta-feira, outubro 30, 2009

LUCY KELLAWAY

Não dá para ser relaxado e bem sucedido ao mesmo tempo

Valor Econômico - 30/10/2009


Uma noite dessas, perguntei ao meu filho mais novo, que cursa o ensino médio, o que ele estava achando de sua nova escola. Ele pensou sobre o assunto e então disse: "É meio puxada."

Num primeiro momento, achei engraçado ele esperar que uma escola tradicional e cara fosse moleza e julgou ser um defeito ela não ser assim. Respondi que não estava gastando 15 mil libras por ano para ele aprender a relaxar, como ele parecia já ter percebido. Ele me olhou com um sorriso desconsertado.

Mas então, a coisa parou de ser engraçada. Como deixei ele chegar aos 12 anos sem saber sobre esse fato tão importante da vida? O de que relaxar-ou "sossegar" como ele chama de uma maneira irritante- não deveria ser a primeira coisa em que ele deveria pensar, e sim a última. Somente quando uma pessoa fez tudo é que chega a hora de relaxar.

Mesmo assim, relaxar- ou vegetar, como eu prefiro chamar- é hoje uma coisa vista pelas crianças como parte da ordem natural das coisas. Muitas delas (os meninos em particular) ainda acreditam que a vida será maneira quando entrarem no mercado de trabalho. Esse é um risco muito maior para os empregadores do que outras coisas que eles repreendem nas pessoas quando elas deixam a escola como a incapacidade de escrever de maneira correta ou fazer contas.

Na semana passada li em algum lugar que banqueiros da City de Londres estão sendo encorajados a visitar escolas locais para falar sobre "aptidão para o trabalho" e "liderança escolar" para os alunos. Não tenho ideia do que sejam essas coisas, mas espero que isso sirva para incutir medidas antirrelaxamento nos alunos. Os banqueiros deveriam tentar ensinar aos alunos o que pais como eu notoriamente não estão conseguindo com seus filhos: que relaxar não é uma coisa legal nem virtuosa. O motivo é simples: para ganhar dinheiro é preciso esquecer o "ficar frio" e dar atenção às habilidades e à vontade.

Esta lição incrivelmente óbvia é considerada bastante audaciosa nos círculos administrativos. Quando Robert Rosen publicou recentemente o livro "Just Enough Anxiety", que afirma que a pressão é vital para o sucesso, todo mundo ficou espantado.

Mas está bem claro: embora relaxar possa ser uma coisa muito zen, não leva ninguém ao sucesso. Para ser bem sucedido na vida corporativa- ou em qualquer campo competitivo- é preciso ser motivado, obsessivo e trabalhar duro.

Para tentar descobrir se há alguma exceção a esta regra, entrei no Google e digitei "CEO relaxado" (chilled CEO em inglês) . Tudo o que encontrei foi o presidente de uma companhia chamada Chill International, anunciando o lançamento de uma toalha refrescante para mulheres na menopausa- que não era exatamente o que eu estava procurando.

Como relaxar leva inexoravelmente ao fracasso, é importante estabelecer de onde isso vem. Suspeito que seja uma mistura de natureza e educação: alguns bebês nascem mais tranquilos do que outros e a menos que sejam submetidos a um treinamento antirrelaxamento, eles tendem a não mudar.

Se dividirmos a população ativa em relaxados e não relaxados, padrões interessantes emergem. Os jovens são mais relaxados que os mais velhos, e os europeus do sul são mais relaxados que os do norte.

Na semana passada, passei dois dias em uma reunião de conselho na Espanha. Em um jantar após uma reunião, percebi que os espanhóis continuavam pedindo comida à meia-noite e parecendo cada vez mais relaxados, enquanto os britânicos ficavam cada vez mais agitados. Isso me fez imaginar se o fator relaxar não seria uma barreira maior a um trabalho realizado por duas nacionalidades do que o idioma.

E mais interessante ainda, é que seja qual for a posição que as pessoas ocupam no espectro dos relaxados/não relaxados, elas tendem a classificar aqueles que estão dos dois lados de deficientes. Não sou nem um pouco relaxada, por disposição e por escolha; classifico qualquer pessoa mais relaxada do que eu como preguiçosa, passiva e negligente, e aquelas poucas que são ainda menos relaxadas do que eu como tensas e obsessivas.

Quando entrei para o "Financial Times" há muitos anos, sentava perto de uma mulher que era espetacularmente agitada. Embora eu gostasse bastante dela como pessoa, como colega eu a achava neurótica, controladora e ambiciosa demais. Certo dia saímos para tomar algo e ela disse que me invejava por eu me "contentar em ir tropeçando com as coisas". Em outras palavras, ela não me invejava por eu ser tranquila; ela me achava uma idiota e uma candidata a fracassada.

O fator relaxamento é uma área em que a diversidade simplesmente não funciona: é melhor trabalhar com pessoas que possuem um apetite parecido pela tranquilidade. Durante minha carreira, me deparei com chefes relativamente relaxados, que me fizeram sentir ansiosa e pouco orientada, e chefes profundamente agitados, que me fizeram sentir perturbada e perseguida.

Assim como é difícil trabalhar com pessoas com um fator de relaxamento diferente, é doloroso fazer um trabalho que exige um nível maior ou menor de relaxamento daquele que a pessoa está acostumada. De fato, na reunião de conselho da semana passada houve uma longa discussão sobre as prováveis recomendações do relatório Walker para os reguladores dos riscos corporativos, que me fez ter uma pontada de simpatia pelo meu filho: aquilo não foi nada sossegado.

Enquanto escrevo, estou consciente de que há um grande contra-exemplo a essa teoria. Barack "no drama" Obama exerce o cargo mais poderoso do mundo, mas também parece muito tranquilo. Mesmo assim estou preparada para apostar minha própria casa de que ele não chegou à Casa Branca sendo relaxado. Obama usou o truque definitivo: ser motivado e parecer relaxado. É um exemplo perigoso para os jovens. Quando eles veem Obama na televisão, deveriam ser informados: não tente fazer isso em casa.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada quinzenalmente na editoria de Carreiras.

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