quinta-feira, maio 14, 2009

DORA KRAMER

Seis por meia dúzia

O ESTADO DE SÃO PAULO - 14/05/09

A reforma anunciada pelo Senado com base no estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas ao longo de um mês e cinco dias muda o nome das coisas, mas não altera em nada a essência das coisas que há três meses produzem um escândalo atrás do outro no Congresso.

No fundamental, o que revolta a sociedade e desmoraliza a instituição é o privilégio, a impunidade, o desrespeito com o dinheiro público. E nisso a reforma nem trisca. Se era uma resposta satisfatória ao país, a abertura de um caminho para a indispensável reconciliação entre representantes e representados o que buscava a Casa, suas excelências continuam em dívida.

Como de resto estão desde 1995, quando o Senado encomendou o mesmo tipo de trabalho à mesmíssima Fundação Getúlio Vargas e não fez absolutamente nada, a não ser permitir que a situação se agravasse.

Recomendaram-se restrições de toda sorte, mas o que se viu foi a ampliação da estrutura sem a devida justificativa nem correspondência na prestação de serviços. O fato de o presidente do Senado da época ser o mesmo de agora chega a ser irrelevante. A coincidência só impõe mais crueza ao quadro de desmandos e descontroles cuja responsabilidade não pode ser personalizada na figura de José Sarney. Ele encarna o anacronismo. Mas o mal está presente no consciente coletivo.

E este acredita ser possível prescindir do profissionalismo, do estrito respeito às regras, da eficácia, da impessoalidade, da transparência, da probidade, em prol do amadorismo das relações baseadas na troca de favores, na suposta habilidade das atitudes ladinas, na esperteza rastaquera de agrupamentos cuja sustentação se dá na base da reciprocidade na obtenção de vantagens.

De 1995 para cá, o Senado teve outros presidentes. Ademais, é um colegiado e, como tal, movimenta-se pela força da maioria. A leniência desta é que foi indiferente não apenas ao diagnóstico feito há 14 anos, mas também aos constantes alertas sobre os malefícios das constantes demonstrações de que a Casa se “lixava” para a opinião pública. Operações-abafa, acordões em CPIs e em processos por quebra de decoro comandando o espetáculo.

As alterações até agora propostas deixam tudo como está. Mas a maioria tem tempo ainda para se mexer. O cavalo ainda está selado na porta do Senado. A Casa escolhe: ou parte para o bom combate propondo uma reforma séria ou deixa estar para ver como é que fica e transforma sua chance numa boa dose de sorte para o azar.

É a política

O debate sobre as alterações nas regras de remuneração da poupança pode até começar na seara da economia, mas vai migrar rapidamente para o terreno da política. O tema é socialmente sensível, envolve imposto (de Renda para aplicações acima de R$ 50 mil) e tem todos os elementos para se transformar num embate semelhante ao da CPMF.

Governo e oposição disputarão no campo onde se travam as famosas batalhas da comunicação. Erros de parte a parte serão fatais, dada a natureza do assunto.

Mau cabrito

O líder do governo no Senado, Romero Jucá, parece ter se dado conta do quanto seu embate com o ministro da Defesa faz bem à saúde política de Nelson Jobim. Depois de reclamar da “forma truculenta” como foi tratado no caso da demissão de um irmão e uma cunhada junto com outros indicados por motivação política na Infraero, Jucá disse que não teve a intenção de retaliar.

Deve ter sido informado de que ser atacado por demitir apaniguados – notadamente por alguém que já precisou renunciar ao posto de ministro da Previdência por causa de processos por desvio de verbas e crime contra o sistema financeiro – equivale a uma homenagem. Tanto que Jobim notou e “cresceu” para cima de Jucá.

Segundo o líder do governo, sua proposta de emenda constitucional definindo que o cargo de ministro da Defesa deve ser ocupado por um militar não é fruto de vingança, mas do desejo de “profissionalizar a pasta”. Criada, diga-se, justamente para dar ao poder civil o controle das Forças Armadas.

Antecedentes

Na essência, não há diferença entre o que pensa o deputado que se “lixa” para a opinião pública sobre a irrelevância da imprensa – “vocês batem e a gente se reelege” – e o pensamento presente naquela declaração do presidente Lula a respeito dos “problemas de azia” que lhe acentuam as notícias dos jornais.

Mais semelhança ainda com a lógica de Sérgio Moraes guarda a tese difundida pelo governo logo após a reeleição de Lula, em 2006, segundo a qual os meios de comunicação haviam “perdido”, pois o resultado eleitoral comprovaria a pouca importância dada pelo público aos – então recentes – escândalos de corrupção.

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