sábado, fevereiro 23, 2013

Mãe drogada - WALCYR CARRASCO

REVISTA ÉPOCA

A pensão financiava as drogas, os filhos não tinham comida, ela não deixava os parentes tirá-los de casa


"Meu pai morreu quando eu tinha 5 anos e meio. Estava voltando pra casa do trabalho, à noite, e foi assaltado numa rua de Niterói. Reagiu e foi morto. Ainda lembro minha mãe telefonando para os parentes, porque ele não voltava pra casa. Só encontraram o corpo um dia depois, no Instituto Médico Legal. Minha mãe nunca tinha trabalhado. Meu pai era tudo pra ela. Ficou comigo e meu irmão um ano mais velho que eu. Foi aí que tudo desandou.”

Ouço o motorista do carro que peguei no aeroporto Santos Dumont, do Rio de Janeiro. O trânsito estava ruim, começamos a conversar, e ele me contou sua história. Tem 22 anos, voz calma. Desabafou.

“Minha mãe começou a usar drogas. No início como usuária. Depois se envolveu mais, inclusive com traficantes. Eu sentia falta do meu pai, precisava de apoio. Meu irmão e eu, crianças, é que tínhamos que segurar a barra lá em casa.”

Já escrevi uma peça de teatro sobre viciados, Êxtase, e um livro sobre o uso de crack na adolescência, Vida de droga. Nunca havia pensado sobre o tema do ponto de vista do filho de uma drogada. À medida que ele falava, fui construindo um retrato assustador: a pensão de viúva era gasta com drogas e homens, os meninos muitas vezes não tinham o que comer, o clima doméstico era pura violência e a mãe desaparecia durante dias. Voltava machucada. Os parentes queriam retirar as crianças. A mãe não permitia. Gostava, principalmente, de cocaína. Vendeu móveis, não pagava as contas, viveram semanas sem energia elétrica, no escuro.

Os dois irmãos cresceram nesse clima. Na adolescência, cada um se refugiou na casa de uma tia. Com remorsos. “Eu pensava que devia estar lá, pra ajudar minha mãe. Não conseguia mais. O pior é que meus estudos e de meu irmão ficaram comprometidos.”

Demorou muito mais tempo que o usual para ele concluir o ensino fundamental. Tentou vários cursos técnicos, com o apoio financeiro de parentes. Matriculava-se, mas não comparecia sequer a uma aula. “Desistiram de me ajudar.” Finalmente, cada um dos irmãos recebeu, de uma tia mais bem de vida, um pequeno apartamento num bairro periférico de Niterói. Ainda morando com parentes, o motorista queria alugar o seu para pagar um curso profissionalizante. Não pôde. A mãe não tinha mais onde morar. “Cedi meu apartamento a ela. Mas morar junto ficou impossível.” Aparentemente, a mãe deixou as drogas. Os sentimentos continuam embaralhados. “Meu irmão mora no apartamentinho dele e não quer nem falar com ela. Eu visito, mas a gente não se entende.”

Ele me confessa que gostaria de tentar uma faculdade. Pretende trabalhar como motorista uns dois anos para juntar dinheiro. Também trabalha em eventos. Ainda busca equilíbrio para realizar seus planos. “Sinto falta do meu pai, mas não lembro exatamente as feições dele. Com tudo o que aconteceu, ainda estou tentando tomar pé na vida.”

Para quem teve uma família comum, como eu, onde no máximo os pais ficavam emburrados um com o outro, sua história mexe comigo. Simplesmente não consigo imaginar o que é ter uma mãe drogada, nas mãos de traficantes – que, segundo ele deu a entender, também se envolveu na venda de drogas. Recentemente, quando o governador Geraldo Alckmin, do PSDB paulista, instituiu a internação compulsória de viciados em crack, minha reação foi de revolta. Tive a sensação de que as liberdades individuais seriam violadas. Ao ouvir o relato do rapaz de Niterói, tive outro sentimento. Quando se fala em drogas, pensa-se só no viciado. Mas essas pessoas têm pai, mãe, marido, mulher, filhos. São suas vidas que se tornam dramáticas. Atos de violência e problemas financeiros são inevitáveis. O pior é a falta de compromisso. De qualquer laço. O usuário rouba a própria mãe. Adolescentes drogados vendem objetos de valor da casa e põem a culpa na empregada. O viciado perde a noção de humanidade. A mãe drogada perdeu o carinho pelos filhos, que deveria proteger.

Chego a meu destino. Ao me despedir, o rapaz ainda me conta que a namorada mora na mesma rua em que o pai morreu. Triste coincidência. “Quando passo por lá, penso que, se meu pai fosse vivo, nada disso teria acontecido.” Pergunto se pretende se casar logo. Ele responde que sim. “Quero ter a família que nunca tive. Ficou um vazio dentro de mim, uma falta de amor que preciso preencher.”

Ele parte e me deixa com uma sensação melancólica. A dor desse filho, nunca vou esquecer.

A missionária nua - IVAN MARTINS

REVISTA ÉPOCA

Uma mulher que ensina o prazer é santa ou é puta?


Eu a conheci na faculdade. Baixinha, sorridente, era muito sensual sem ser bonita. Gostava de mim, mas também gostava de outro sujeito, mais velho, e provavelmente de mais alguns, de quem eu nunca soube. Era generosa. Aguerrida. Uma vez, conversando sobre sexo, me disse que, num mundo sem preconceitos, seria prostituta. Não apenas pelo prazer de transar, que era enorme nela, mas pela possibilidade de ajudar. “Tem tanto homem triste por aí”, ela me disse. “Gente feia, doente, mas que é bonita por dentro. Essas pessoas precisam de carinho.” Ela achava que seu corpo poderia ser usado para reduzir as dores do mundo.

Ontem, vendo As sessões – o filme em que Helen Hunt interpreta a terapeuta que ajuda um homem paralisado a perder a virgindade – eu acho que entendi, 30 anos depois, o que a minha amiga queria dizer. E que tipo de pessoa era ela.

A terapeuta do filme, inspirada numa mulher de verdade, ajuda as pessoas com dificuldade sexuais a descobrir o prazer. Conversa com elas, toca e se deixa tocar, transa. Trabalha em conjunto com uma psicóloga, discutindo as necessidades e dificuldades do paciente. Uma dessas profissionais, que ainda hoje atua na Califórnia, deu entrevistas recentes à imprensa brasileira e disse já ter atendido mais de 900 pessoas, homens em sua maioria. Não deve ser gente particularmente bonita. Muitas nem serão agradáveis. Mas a terapeuta se despe e se deita com elas do mesmo jeito. É um trabalho, mas também uma missão.

Há um pouco da minha amiga nessa terapeuta do sexo, mas talvez haja um pouco dela em cada mulher.

Por essas razões, e por outras que não entendo inteiramente, o filme me deixou terrivelmente comovido. As mulheres fazem sexo porque gostam, mas fazem também porque nós, homens, precisamos disso desesperadamente. Fazem por carinho e às vezes por pena. Fazem para ver – eu já ouvi isso – os nossos olhos brilharem de satisfação. Elas nos dão de presente seus corpos macios e nós, muitas vezes, abrimos o pacote com pressa, famintos, sem sequer perceber que há um bilhete com dedicatória. Ao contrário do paralítico do filme, que entende o tamanho da graça que recebe, nós não choramos felizes e comovidos. Mas talvez devêssemos. Assim como na profissional descrita pelo filme, há um quê de santa (e de puta, naturalmente), em cada mulher que nos recebe entre as suas pernas - com as nossas dores e os nossos medos, com as nossas vaidades e injustificadas aspirações.

Talvez porque eu ainda sinta, como um garotinho impúbere, que as mulheres que se deixam despir, tocar e penetrar realizam um ato de profunda e impagável generosidade para com os homens. Talvez porque eu me perceba, como o paralítico do filme, como todos os homens que eu conheço, assustadoramente dependente da atenção, do corpo e do afeto femininos. Talvez, ainda, porque, assim como personagem do filme, e como todos, homens e mulheres, eu seja capaz de antever, no momento mesmo em que o prazer explode, a iminência da perda e a profundidade da separação que se insinuam. O sexo que acabou nunca é o bastante, nunca é suficiente, nunca é exatamente o que buscávamos. Queremos amar e ser amados. Queremos tudo.

Minha amiga, aos 20 e poucos anos, intuía isso tudo. Por isso sonhava em colocar o seu corpo a serviço das almas e dos corpos doentes. Se vivesse em outro país, talvez isso virasse uma carreira. Aqui, é provável que essa vocação tenha simplesmente adormecido, como tantas coisas que a gente sufoca na juventude para nos tornarmos adultos produtivos. Mas, onde quer que esteja, tenho certeza que se minha amiga vir o filme reconhecerá, naquela mulher que goza com o corpo sofrido de um bom homem, a possibilidade de sentimentos que estão muito além do hedonismo e do moralismo. Tomara que ela veja o filme – e que o papa Bento XVI veja também. Nunca é tarde para se perceber certas coisas.

A manhã de Boninho - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 23/02

Os programas de entretenimento das manhãs na TV Globo terão uma direção artística unificada.
“Encontro com Fátima Bernardes” passará ao núcleo de Boninho, que já dirige “Mais Você”, com Ana Maria Braga.

Segue...
Maurício Farias, que implantou o programa de Fátima, vai se dedicar à volta de “Tapas & beijos” e a novos projetos.

Agora vai

Após acordo entre Furnas e Ministério Público, começa hoje o enchimento do reservatório de Simplício, hidrelétrica 100% construída por Furnas, entre Minas e Rio, que pode gerar 330MW e abastecer uma cidade de 800 mil pessoas.
Ação na Justiça iniciada por uma moradora da comunidade atingida emperrou sua inauguração.

Garota de Ipanema
A blogueira cubana Yoani Sánchez realiza amanhã um sonho. Conhecer o Rio.
Ela pediu ao deputado Otavio Leite, seu cicerone na cidade, uma agenda de turista.

BBB
Candidatíssimo ao governo do Rio em 2014, o vice Pezão tem seus passos registrados por duas câmeras de vídeo, que o seguem para cima e para baixo.
É para um banco de imagens.

Bomba voadora

A trágica morte do boliviano Kevin, de 14 anos, atingido por um rojão lançado pela torcida do Corinthians, deixa uma pergunta no ar: como o artefato chegou à Bolívia?
É que é proibido transportar esse
tipo de material em aviões comerciais.

Custo Brasil
O “New York Times”, o jornalão americano, mostrou ontem que Montevidéu virou um polo de “startups”.
São aquelas enxutas empresas de tecnologia que fazem videogames e aplicativos para smartphones.

Já no Brasil...
A reportagem observa que estúdios de videogames também têm surgido no Rio e em São Paulo.
A diferença para o Uruguai, segundo o jornal, é que no Brasil há uma “regulação bizantina de impostos” e leis trabalhistas que tornam mais cara a contratação de empregados.

Flor do Caribe
A novela “Flor do Caribe”, que será lançada hoje, em coquetel no Garden, em São Paulo, falará também sobre a história de nazistas e judeus na Segunda Guerra.
O ator Sérgio Mamberti, de volta à TV após dez anos, leu dezenas de livros sobre Hitler e a Alemanha para interpretar o empresário Dionísio. Na trama de Walter Negrão, ele é um nazifascista que esconde o passado.

História do Rio

Esta maquete aí ao lado é do Teatro Municipal do Rio. Ela estará na exposição “Rio de imagens: uma paisagem em
construção”, que inaugura o Museu de Arte do Rio, o MAR, dia 5 agora.
É o modelo original, assinado por H.Lavoie.

Racha na Mocidade
Baluartes e fundadores da Mocidade de Padre Miguel farão um protesto, hoje, no Ponto Chic, no bairro, contra o presidente Paulo Vianna.
A turma quer a renúncia do chefão da verde e branco.

Ea ex...
À frente do movimento está Célia Vianna, ex-mulher de Paulo Vianna.

Residência médica
O governo ainda não anulou o processo seletivo nacional de residência médica no Rio para o preenchimento de 470 vagas, feito no dia 16 de dezembro.
É aquele que virou alvo de uma série de denúncias. Entre elas, a de que houve erro na contagem dos pontos dos 22 primeiros classificados, que gabaritaram quatro das cinco provas do concurso.

Mas...
O Ministério da Saúde alega que a anulação ainda não foi publicada no DO porque precisa anexar “toda a documentação para fazer a rescisão formal do contrato”.

Monalisa, monacrespa
Um salão na Zona Norte do Rio oferece um alisamento chamado Monalisa.Diz que é inspirado no famoso quadro de Leonardo da Vinci.

PINTURA PURA - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 23/02

A Galeria Nara Roesler abriu anteontem duas exposições: "Pintura e Pureza", com obras inéditas de Tomie Ohtake, e "Assembleia", do artista plástico hondurenho Paul Ramirez Jonas.

SABER JURÍDICO
O deputado João Paulo Cunha (PT-SP) foi aprovado no vestibular. Ele vai estudar direito no IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público). A escola tem entre seus sócios o ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que condenou o parlamentar no julgamento do mensalão.

SABER 2
Cunha já tinha estudado direito numa faculdade de Osasco (SP), mas trancou a matrícula há alguns anos. Faltam apenas dois para se formar. Caso seja preso no meio do curso -ele tem que cumprir pelo menos um ano e seis meses em regime fechado-, pretende estudar à distância, de dentro da cela.

SOMA
Se ele conseguir estudar e trabalhar, Cunha pode ter a pena reduzida. A lei prevê que, para cada três dias "produtivos", um seja descontado do tempo de prisão.

DE OLHO
O governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP) quer colocar Marcos Mendonça no lugar do economista João Sayad no comando da TV Cultura. Já está cabalando votos entre conselheiros da Fundação Padre Anchieta, que elegem o presidente da emissora. A troca pode ocorrer em maio.

JARDS, 70
Depois de Gilberto Gil, chegou a vez de Jards Macalé ser festejado por chegar aos 70 anos. Ele fará show no Auditório Ibirapuera no próximo dia 10, com entrada gratuita. O convite foi feito pelo Itaú Cultural. No dia será também exibido "JARDS", filme-poema sobre o músico dirigido por Eryk Rocha e produzido pelo instituto.

QUERO VER ANIMAÇÃO
A Secretaria do Audiovisual deve lançar neste ano editais de incentivo a produções que incorporem "novas tecnologias", como games, aplicativos e animação, diz o secretário Leopoldo Nunes.

CAFÉ COM LEITE
Celso Russomanno (PRB) e o presidente do PTB-SP, o deputado Campos Machado, vão tomar café hoje, na padaria do ex-candidato a prefeito, em Moema. À mesa, política. "Em 2014, sou candidato", diz Russomanno. Governo e Senado são opções. "O Marcos Cintra [presidente do PRB] me lançou a governador. Sou um cara de partido. O que for melhor."

VONTADE DIVINA
Ele diz que manterá aliança com o PTB, "se Deus quiser" -em 2012, o petebista Luiz Flávio D'Urso foi seu vice. "A relação com o Campos é de muita amizade, mais de 30 anos. Ele era amigo de um tio meu que faleceu, a gente tem se encontrado sempre."

LUZ, CÂMARA, AÇÃO!
E Russomanno critica o prefeito Fernando Haddad (PT), que o derrotou no ano passado: "No lugar dele, com essas enchentes todas, eu ia para a rua, não ia deixar a coisa solta do jeito que está".

PROCURA-SE TETO
Delegações da França e da Coreia do Sul estão em SP para conhecer centros de treinamento candidatos a receber seleções durante a Copa de 2014. Representantes da Bélgica também já visitaram locais de hospedagem e concentração no Estado.

CARTEIRINHA
Massami Uyeda, 70, ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), recebeu a carteira de advogado das mãos do presidente da OAB-SP, Marcos da Costa. Com 35 anos de magistratura, Uyeda se aposentou no ano passado.

NOITE ESCURA

Gisele Bündchen aparece como uma vampira sensual na campanha da Sky que estreia segunda no intervalo do "Jornal Nacional". As gravações com a modelo, em Los Angeles, duraram oito dias e envolveram 110 profissionais. Bruce Fuller, maquiador dos filmes "Exterminador do Futuro 2" e "Alien Vs. Predador", foi quem cuidou da caracterização da gaúcha. A produção é da O2 Filmes.

UMA CASA PORTUGUESA
Pedro Burmester, um dos maiores pianistas portugueses da atualidade, se apresentou anteontem na Sala São Paulo, a convite do Consulado de Portugal e da Secretaria de Estado da Cultura. A escritora Maria Adelaide Amaral, a vice-prefeita Nádia Campeão e a ex-vice-prefeita Alda Marco Antônio assistiram ao concerto.

CURTO-CIRCUITO


Neka Menna Barreto criou cardápio "nordestino-guatemalteca" para a festa de lançamento de "Flor do Caribe".

Tulipa Ruiz canta amanhã, às 15h, no Parque Villa Lobos. Grátis. Livre.

O Música em Trancoso, festival internacional de música erudita e MPB, começa hoje na Bahia.

A empresária Ana Maria Maluf Sayegh faz festa de aniversário beneficente.

Obesidade: mitos e fatos - DRAUZIO VARELLA

FOLHA DE SP - 23/02

Independentemente do emagrecimento, qualquer aumento da atividade física faz bem para o organismo


Receitas e dietas para emagrecer são como o capim, estão em toda parte. Talvez não exista campo da medicina com tantos mitos e pressuposições divulgadas pelos meios de comunicação, sem evidências científicas que lhes deem suporte.

O "New England Journal of Medicine" publicou uma revisão na qual foram avaliadas as informações sobre obesidade transmitidas pela internet, imprensa escrita e literatura científica.

O estudo identificou sete mitos divulgados como verdades científicas:

1 - Pequenas reduções do aporte calórico diário ou pequenos aumentos do gasto energético provocam emagrecimento significativo mantido por períodos longos.

A sugestão de que devemos esperar grandes reduções de peso em resposta a pequenas mudanças no estilo de vida, deriva da regra das 3.500 kcal (calorias, popularmente) estabelecida há meio século, segundo a qual cada redução dessa quantidade de calorias na dieta faz perder 450 gramas de peso corpóreo.

Levantamentos recentes mostram que existe grande variabilidade individual nessa perda, porque, quando o peso cai, as necessidades energéticas básicas do organismo diminuem. Em outras palavras, quando a pessoa emagrece, a energia que o corpo precisa para funcionar em repouso também diminui.

Essa relação explica porque as dietas funcionam bem no início, mas vão perdendo a eficácia à medida que o peso diminui.

2 - Estabelecer alvos modestos, mais realistas, funcionam melhor do que pretensões de perder muitos quilos.

Embora evitar a frustração por haver fracassado em atingir metas de emagrecimento mais ambiciosas tenha certa lógica, as evidências científicas apontam na direção oposta: programas que propõem perdas substanciais apresentam resultados melhores.

3 - Emagrecimento rápido e acentuado está mais associado ao efeito sanfona do que o lento e gradual.

Nos estudos clínicos, o emagrecimento rápido tem sido associado à manutenção do peso mais baixo por tempo mais prolongado.

Embora não esteja claro por que algumas pessoas obesas têm uma perda inicial mais rápida do que outras, recomendar pequenas reduções mais lentas pode comprometer o sucesso do tratamento.

4 - Nos programas de emagrecimento, é importante que um profissional avalie periodicamente a dieta ingerida.

Cinco estudos envolvendo 3.910 pessoas submetidas à reeducação alimentar que tiveram suas dietas avaliadas em intervalos regulares não mostraram benefícios desse cuidado. Quem entra voluntariamente num programa para perder peso, de modo geral está minimamente disposto a mudar a dieta.

5 - Aulas de educação física nas escolas contribuem para combater a obesidade infantil.

As aulas convencionais não produzem gasto energético suficiente e continuado para evitar a obesidade.

6 - A amamentação protege contra a obesidade.

Um estudo conduzido com 13 mil crianças acompanhadas por mais de seis anos não encontrou evidências de que crianças amamentadas no seio materno engordem menos.

7 - A atividade sexual queima até 300 calorias.

Nas fases de excitação e orgasmo, um homem de 70 kg queima cerca de 3,5 calorias por minuto. Como a média de duração de uma relação sexual é de 6 minutos, o total consumido seria de 21 calorias. Se estivesse no sofá assistindo à televisão nesse período, ele teria gasto 7 calorias.

Agora, vamos aos fatos:

1 - Embora fatores genéticos tenham papel importante na obesidade, hereditariedade não é destino.

2 - Mudanças no estilo de vida são mais eficazes do que os remédios para emagrecer.

3 - Dietas ajudam a perder peso, mas não é fácil mantê-las por longos períodos.

4 - Independentemente do emagrecimento, qualquer aumento da atividade física faz bem para o organismo.

5 - Manter no dia a dia as mesmas condições que provocaram perda de peso colaboram para a manutenção da perda.

6 - Crianças obesas se beneficiam de programas que envolvem a família inteira.

7 - A substituição de refeições por produtos dietéticos com baixo teor calórico colabora para a perda de peso.

8 - Alguns medicamentos ajudam a perder peso e a mantê-lo mais baixo, mas apenas enquanto estão sendo utilizados.

9 - Em casos selecionados, a cirurgia bariátrica provoca emagrecimento duradouro, reduz a incidência de diabetes e a mortalidade.

Vender legenda, um bom negócio - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S.Paulo - 23/02


O Ministério Público Estadual (MPE) do Rio Grande do Sul abriu investigação para apurar a venda de legendas pelo Partido Humanista da Solidariedade (PHS) para a disputa de cargos nas eleições municipais de 2012 em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O inquérito dá sentido concreto a uma expressão antes tida apenas como metafórica: "legendas de aluguel". Chama também a atenção para a enorme distância existente entre as aparentemente nobres intenções dos partidos e a real motivação da existência dessas siglas.

O inquérito foi instaurado a partir de denúncias feitas por filiados e ex-filiados que perderam vagas de candidato a prefeito e a vereador por não pagarem taxas de até R$ 100 mil cobradas pela direção do PHS em municípios de médio porte e da cobrança de prestações mensais de até R$ 20 mil. Os promotores investigam a possibilidade de terem sido cobrados valores ainda mais altos em municípios de maior densidade eleitoral, como as cidades fluminenses de Nova Iguaçu, Volta Redonda e Petrópolis. A primeira denúncia foi encaminhada em abril de 2012 à Superintendência Regional da Polícia Federal (PF) de Goiás pelo então candidato do PHS a prefeito de Porto Alegre, o ex-secretário de Segurança Pública e policial federal aposentado José Francisco Mallmann, que tinha desistido da disputa. Na ocasião, ele acusou o atual presidente nacional do partido, Eduardo Machado, de haver determinado a cobrança de valores entre R$ 50 mil e R$ 200 mil a outros partidos interessados em formar coligações para o pleito. Tais quantias seriam pagas em troca de tempo no horário da propaganda eleitoral obrigatória no rádio e na televisão. Também de acordo com a acusação, candidaturas a prefeito e vereador pela legenda podiam ser compradas.

A negativa de pagar os valores exigidos seria, de acordo com a denúncia do desistente, punida com a destituição da executiva municipal e a nomeação de uma comissão provisória, também passível de vir a ser substituída no caso de as prestações mensais não serem pagas como combinado.

A 7.ª Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Porto Alegre tem a incumbência de investigar todos os casos denunciados depois da denúncia feita por Mallmann. "O caso corre em segredo de Justiça. Há provas contundentes", disse o promotor Frederico Schneider de Medeiros. Segundo os responsáveis pelo inquérito, as provas estão contidas em gravações de negociações para venda de diretórios encaminhadas à PF e ao MPE.

De acordo com o que foi relatado por outro denunciante, o presidente do PHS em Petrópolis (RJ), Marcus Curvelo, o acusado Machado fixou em R$ 100 mil mais R$ 20 mil por mês durante a campanha o custo do apoio de seu partido ao candidato do PT à prefeitura daquele município. Segundo ele, a direção municipal recusou-se a cobrar e os petistas negaram-se a pagar o que foi exigido. "Os dirigentes nacionais já haviam arrecadado mais de R$ 15 milhões essencialmente com a venda do controle de municípios, capitais e até Estados", relatou Curvelo em documento registrado em cartório.

O ex-prefeito de General Câmara (RS) Paulo Roberto Rame saiu do PHS por discordar da cobrança de mensalidades de R$ 3 mil para ele ser mantido no comando do diretório municipal e de mais R$ 25 mil para seu candidato ter direito à legenda.

A defesa do principal denunciado é bem um retrato de como alguns dirigentes partidários encaram a atividade política. "Não é ilícito. A lei dos partidos permite que as legendas criem receitas próprias. O PT, por exemplo, arrecadou de R$ 12 milhões a R$ 15 milhões em receitas próprias. Os filiados pagam taxas. Posso até concordar que isso seja imoral, mas não é ilegal", disse o presidente Eduardo Machado.

Oportunismo e cinismo à parte, a principal causa do bom negócio da venda de legenda é o desinteresse dos legisladores de combater a promiscuidade de nosso sistema partidário, com 30 partidos. Uma fórmula eficiente para limitar esse total, que induz a conluios indecentes, seria adotar a cláusula de barreira. Mas ninguém parece interessado em fazê-lo.

Oscar! Melhor DVD pirata! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 23/02

Três são os motivos do fracasso da Revolução Cubana: café da manhã, almoço e jantar!


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E diz que o novo estádio do Palmeiras vai se chamar TORRESMÃO! E amanhã é dia de Oscar! Merece um Oscar quem conseguir assistir o Oscar até o fim!

Pra mim, o melhor filme é "Django Livre". Devia levar todas as estatuetas. A revista "Vanity Fair" contou quantas pessoas morreram nos filmes do Tarantino: 560! SÓ?!

E o Ciro Botelho já sabe quem vai levar o Oscar 2013! Melhor direção: Thor Batista! Melhor roteiro adaptado: Sérgio Cabral com o roteiro Rio-Paris! Com o filme "Meia-Noite em Paris". Ops, Todas Noites em Paris! Melhor ator: Thammy Gretchen! Melhor atriz: José de Abreu! Rarará!

E se a Angelina Jolie emagrecer mais um grama ela some no tapete vermelho! E é sempre assim: prêmio de melhor atriz sai às 2h30. Sendo que nesse horário toda mulher é uma grande atriz. Rarará!

A grande polêmica da semana: Cuba! O chargista Néo Correia acha que cota de xampu pode ter gerado guerra entre blogueira e governo cubano. Eu acho que ela veio pro Brasil pra se encontrar com a mãe dela: a Heloísa Helena! Mamita Helena!

Vou botar uma vassoura atrás da porta. Pra ela ir embora logo! Celebridade não pode ficar muito tempo no Brasil. Quando chega é a defensora da liberdade, a guerreira da internet. Passou três dias e "lá vem aquela chata daquela cubana, essa pentelha devia ter um blog de moda, ela é mais chata que um spam"!

Se a Yoani não fosse blogueira, ela seria funileira! Os melhores funileiros do mundo são os cubanos! Aqueles carros americanos anos 1960 rodam até hoje! Funileiro cubano transforma uma batedeira anos 1930 num Oldsmobile anos 1960! Cubano é bom de gambiarra!

E existe coisa mais chata que petista atacando tucano e tucano atacando petista? Um saco!

E torno a repetir que três são os motivos pra vitória da Revolução Cubana: saúde, educação e habitação. E três são os motivos do fracasso da Revolução Cubana: café da manhã, almoço e jantar!

E o Fidel uma vez mandou fechar a boate gay chamada "El Periquitón". E os gays em represália abriram outra boate gay: "Che Gayvara!". Rarará!

E eu insisto que no Oscar tem que ter mais esta categoria: melhor DVD pirata! No ano passado, o DVD pirata de "Vidas Cruzadas" vinha na capa como "Vidas Cuzadas". Rarará! Nóis sofre, mas nóis goza! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

Rancor, ganância e esnobismo universitário - MARCELO RUBENS PAIVA


O ESTADO DE S. PAULO - 23/02

É difícil detectar como surgiram alguns achados brasileiros: 

1. O Chorinho. Não a música, mas a dose extra que nos é servida na maioria dos bares e restaurantes. Quando começou? Peça um uísque. O garçom trará a garrafa, para você conferir a procedência, exigência de uma economia que convive há séculos com contrabando e pirataria, servirá a dose numa pequena cuia de alumínio de 15 a 60 ml chamada dosador, ou medidor, passará o maltado para o copo com ou sem gelo, e em seguida banhará da própria garrafa as pedras que flutuam. É lançado o sorriso cúmplice, vem a piscada: "Só pra você, que é exclusivo".

Se você é da casa, sabe para que time o garçom torce e até o apelido dele, a dose extra é "no capricho", outra expressão brasileira dúbia, pois indica que há doses e porções que não vêm caprichadas, já que existem aquelas especiais para clientes preferenciais.

Com um chorinho, o cliente se sente mimado, qualificado. O estabelecimento aparenta ofertar mais do que o usual, fugir à regra, tratar você com devoção, sem mesquinharia, sem se importar com os lucros, pois foi com a sua cara, gostou do seu jeito,você é um cara bacana, que merece a quebra de protocolos. Ambas as partes ficam satisfeitas. Pode-se dizer que, como em Casablanca, é o começo e a prova de uma longa amizade.

No entanto, é evidente que a dose extra já está embutida no preço, que os R$ 20 em média que você paga por uma dose de um bom escocês envelhecido é exorbitante, já que a garrafa de um litro custa perto de R$ 100, dependendo do fornecedor - se não atravessou o Rio Paraná numa balsa improvisada, proveniente das destilarias do Chaco -, garrafa em que vem muito mais do que quatro ou cinco doses, talvez 30, talvez 40, ou 66,6 doses, se utilizado o medidor de 15 ml, cuja matemática tira do coma alcoólico o mais dedicado dos boêmios: está-se pagando R$ 1.320 por garrafa, 13,2 vezes mais. Portanto, o chorinho não é um favor,é um truque ilusório que entorpece e ilude o brasileiro.

Outro exemplo: o milk-shake que vem acompanhado pela sobra. O garçom deposita o copo de vidro e o de alumínio em que o sorvete foi batido.

Em lanchonetes, a sobra dá outra dose.

E tem aquela que a sobra é maior do que a dose original, como o prato "que dá pra dividir", outra invenção brasileira.

É verdade que é difícil dosar a quantidade de cada cliente. O que um surfista adolescente bebe ou come é diferente daquilo que uma modelo que fará teste para o próximo desfile deixa no prato, ou moças com colesterol alto e rapazes com glicemia alta evitam.

Mas se você se encanta com a generosidade de quem serve, relaxa. Está tudo embutido no preço.

2. Sertanejo Universitário. Universitário por quê? Tem pensamento pré-socrático,semiótica, behaviorismo,sociobiologia, antropologia e darwinismo social, niilismo e hipóteses do pensamento ocidental debatidas nas letras? Algum indício das contradições do pensamento marxista? Marx aparece como historiador ou economista? A dialética é retratada num rasta pé ou bate-coxa com diploma? Mimesis, de Auerbach, dá para ser anunciado. Rola a letra "Auerbach é das mais significativas referências, nos estudos de cunho hermenêutico, eu, eu, eu, de exegese literária, ai, ai, ai, fez uma abordagem original da questão da representação, sai do chão!"? Nada disso. Sertanejo universitário retrata o pensamento que rola fora das salas de aula nas baladas estudantis.

Como o forró universitário, que nasceu no Remelexo, casa de Pinheiros frequentada pela juventude dourada da USP, que queria em São Paulo aquilo que dançava nas férias de Trancoso, Itaúnas e Canoa Quebrada, o sertanejo universitário se apresenta como uma releitura distanciada do modelo anterior. É influenciado pelo sertanejo de raiz, de Tonico & Tinoco, Alvarenga & Ranchinho, e pelo sertanejo mullets, de Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo, mas com um conteúdo que recupera a futilidade do novo pagode e detalha os efeitos macroeconômicos da expensão da fronteira agrícola e do lulismo - como exaltação do consumo, facilidade do crédito e mudanças na pirâmide social.

O Camaro, símbolo das pistas de corrida Nascar do Meio-Oeste americano, é retratado como uma arma para a vingança na batalha da luta de classes da sedução amorosa no sucesso de Munhoz & Mariano, Camaro Amarelo: "Agora eu fiquei doce igual caramelo, tô tirando onda de Camaro amarelo, e agora você diz "vem cá que eu te quero", quando eu passo no Camaro amarelo. Quando eu passava por você na minha CG, você nem me olhava. Fazia de tudo pra me ver, pra me perceber, mas nem me olhava. Aí veio a herança do meu véio, e resolveu os meus problemas, minha situação."

O antigo motoqueiro de uma humilde,mas eficiente CG 125 cilindrada, modelo da Honda de motor 4 tempos monocilíndrico arrefecido a ar, cuja potência máxima é de 11,6 cavalos e custa em torno de R$ 5,5mil, ficou doce e rancoroso ao adquirir um carro da Chevrolet, que custa a partir de R$ 200 mil, V8 de 406 cavalos, com câmera de estacionamento com visualização através de uma tela de LCD de sete polegadas.

"Do dia pra noite fiquei rico, tô na grife, tô bonito, tô andando igual patrão. E agora você vem, né? Agora você quer. Só que agora vou escolher, tá sobrando mulher", finaliza o novo-rico.

Já a dupla Ronny & Rangel, do sucesso Puxa, Agarra e Chupa, que virou obrigatório em formaturas universitárias, deu um troco mais ambicioso no projeto da dupla anterior. Camaro?

"Todo mundo fala de carrinho, mas meu negócio é outro, comprei jatinho, a playboyzada sai de caminhonete, meu avião lotado só de piriguete. Estoura uma champanhe pra gente comemorar, o clima tá gostoso, o bicho vai pegar. Vai se acostumando que ninguém é de ninguém. Ai meu Deus do céu, ram, hoje tem!"

Se Puxa, Agarra e Chupa era o reflexo de um evidente caso de transferência do desejo pela mãe, que impedia o autor de tomar atitudes, expor suas vontades ao viver encolhido num espectro de castração ("com as palavras eu me perco, eu não sei falar direito, e quando eu tô a fim, timidez é meu defeito"), Festa no Jatinho acredita no sonho sem limites, no projeto de redistribuição de renda, proveniente de um novo sertão rural irrigado, terra do agronegócio, de oportunidades que proporcionam inversão da pirâmide social aliada ao Prouni e sistema de cotas que oferece chances antes remotas de ascensão.

E pensar que Menino da Porteira e Chico Mineiro, compostos pela universidade da vida, deram em ganância e esnobismo "universitários".

"Luz! Mais Luz!" - WALTER CENEVIVA

FOLHA DE SP - 23/02

Goethe manteria elegante diálogo com a presidente Dilma Rousseff para pedir "mehr Licht!" (mais luz!)


A CARTA Magna de 1988 se rege por princípios e fundamentos orientadores da aplicação de seus artigos. O fundamento básico está no art. 1º: "Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".

A plena compreensão do preceito precede a busca dos responsáveis pela constante interrupção do fornecimento de energia elétrica durante horas, sobretudo à noite, no período das chuvas e em várias partes do país. Por isso, o título cita palavras atribuídas a Goethe, no leito de morte, em 1832, para aplicá-las ao drama da falta de luz.

O fornecimento da energia elétrica ao consumidor urbano distingue etapas da produção, do transporte aos centros de consumo e da distribuição. Cada etapa se vincula a critérios de competência da União.

Com as faltas reiteradas de eletricidade, os habitantes de várias cidades do Brasil vêm sendo perturbados nos fundamentos da paz de sua vidas.

Hoje, a energia elétrica é essencial para o ser humano, com agravado viés perverso para aqueles que, na maioria dos casos, não têm como contornar a falta de fornecimento para seus lares.

Goethe, que viveu entre 1749 e 1832, não avaliaria distinções ou distâncias entre as energias hidráulica e elétrica, com seus meios de produção. Modernizado, verificaria que a Constituição brasileira (art. 20, VIII) inclui, entre os bens da União, "os potenciais de energia hidráulica".

Mais ainda: invocaria o art. 22, no inciso IV, no qual se lê que à União compete legislar privativamente sobre águas e energia, ainda que divida os encargos com Estados e municípios, os quais não afastam a reserva da União para estabelecer normas sobre fornecimento de energia, nas várias acepções do vocábulo.

A Constituição assinala mais uma área crítica, que também convém repassar. Trata-se do inciso XII do art. 21. Nele se esclarece melhor a questão da competência para a atuação de cada segmento, se o leitor quiser voltar à inspiração goethiana.

Isso porque é da União o setor administrativo capacitado para explorar diretamente ou mediante autorização, a concessão ou a permissão dos "serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água".

A última verificação do paulistano (e dos que vivem nas muitas cidades atingidas pelas chuvas) terá complicações.

Constatará que "o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação" tem base federal.

O Estado e o Município têm o dever de defender seu povo, defesa que se estende até o capítulo das "condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão" (art. 175 da Constituição).

Quer o defeituoso fornecimento de energia elétrica seja diretamente praticado pelo Poder Público, quer tenha sido passado para empresas privadas, não se exclui, por esse motivo, a vigilância dos governantes sobre o assunto a bem da população, em face da União.

Goethe manteria elegante diálogo com a presidente Dilma Rousseff para lhe pedir "mehr Licht!" (mais luz!). Afinal, no roteiro das apurações, é do Poder Público o dever fundamental de proteger o habitante de São Paulo e de todas as outras cidades brasileiras, ou seja, de seu povo. É o que está faltando.

A quem interessa? - LEONARDO CAVALCANTI

CORREIO BRAZILIENSE - 23/02

Antecipar a campanha só interessa aos marqueteiros e, por tabela, aos próprios políticos. Pouco ou nada contribui para o debate sobre as mazelas nacionais. É só avaliar os discursos do governo e da oposição


É quase um acinte que, a mais de 18 meses das eleições, a cabeça dos políticos esteja voltada para outubro de 2014. Cada coisa com o próprio tempo, senhores, afinal o governo atual ainda tem muito chão a percorrer. E, de mais a mais, há assuntos urgentes a serem discutidos. Dito isso, a agenda eleitoral da semana se materializou de uma forma que a fez parecer forte. A marquetagem venceu e nos levou às urnas nos últimos sete dias. Fomos embalados por uma campanha antecipada. O ponto é que, por mais precoce, o tema parece inevitável pelo cenário inédito de 2014. Explico, pois.

Os quatro principais nomes para o Planalto estão postos, por mais que o quadro ainda não esteja montado por completo. E isso muda tudo — ou pelo menos difere de eleições passadas, como a de 1998, por exemplo. Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Marina Silva (Rede Sustentabilidade) são pré-candidatos de torcidas prontas a defendê-los. Estão ali, sempre a levantar bandeiras. Eduardo Campos (PSB) segue a mesma trilha, apesar de um ou outro discurso evasivo. E por mais que, a cada dia, pareça se envolver numa trama inevitável de campanha, estimulada por ele mesmo, diga-se.

Aqui, permita-me uma rápida pausa na política. Uma vez alguém disse que o brasileiro não gosta de esportes. Ele aprecia a competição, quer ganhar. Pronto. Assim torcíamos para carros de corrida porque um piloto nascido no Brasil vencia as provas. Isso também explica a razão de, a partir da década de 1990, o basquete perder não apenas nas quadras, mas no número de torcedores — o inverso ocorreu com o vôlei. Por sorte, o basquete tem recuperado público e, nos últimos anos, voltou a empolgar.

O mesmo se deu com o tênis, quando escolinhas se multiplicaram e, em seguida, minguaram depois do sucesso e da saída de cena de Gustavo Kuerten. Com eleição presidencial, a história deveria se repetir na cabeça dos políticos. Não por culpa do eleitor, mas da marquetagem. Se a disputa empolga as torcidas organizadas — não necessariamente a população em geral —, que se antecipe o jogo, diriam os marqueteiros. Vide o caso da blogueira cubana Yoani Sánchez, envolvida voluntariamente numa guerra vexaminosa entre petistas, tucanos e demistas. Torcida, doutor, quer jogo, mesmo uma partida amistosa. E nada como uma personagem internacional para dar mais visibilidade ao racha.

Interesses
Voltemos aos nossos pré-candidatos e aos temas de fato nacionais. Adiantar uma campanha só interessa aos marqueteiros e, por tabela, aos clientes. Pouco ou nada contribui para o debate sobre as mazelas de um país. Um exemplo está nos próprios discursos rasteiros, quando petistas e tucanos são incapazes de reconhecer avanços do adversário. Assim, antecipam uma campanha por antecipar. Testar forças ou mesmo discursos — ou até reagir de forma legítima —, nada além. Há uma perda substancial de energia e dinheiro com a preparação de palanques, festas e assessores para nada. Ou quase nada. É improvável que algum eleitor decida o voto ou mude de preferência agora com base nos discursos de ataques. Algo simplório, como “o meu é melhor do que o seu” não interessa ao eleitor, não agora.

Congresso
Existem outras dificuldades. Com a campanha na rua, aumentam as pressões sobre alianças e cargos, tanto na esfera federal quanto nas estaduais, o que aqui vale também para os oposicionistas ao Palácio do Planalto. O próprio Congresso, normalmente travado, tende a piorar com mais e mais negociações. Mas e daí, existe alguma solução de tal quadro mudar e o país seguir sem debates eleitorais nesse momento? Esqueça. Até porque o próprio palanque foi montado primeiramente pelos aliados de Dilma Rousseff, em alto e bom som, numa festa para comemorar os 10 anos do PT no poder. Uma festa com dois meses de atraso, mas que serviu para os governistas tirarem as atenções de Marina e do novo partido.

Por último, por mais que a campanha antecipada atrapalhe o próprio governo federal, Dilma não pode reclamar. Nos últimos dias, a presidente é que mais tem se aproveitado de eventos para soltar frases feitas, pensadas e repensadas pelo marqueteiro João Santana. Chegamos em 2014, pois.

Golpe contra novos rumos - CACÁ DIEGUES

O GLOBO - 23/02

Brasileiros sectários, supostamente em defesa de Cuba, provocam uma reação que só faz prejudicar o projeto de abertura daquele país



Não é muito fácil, para uma pessoa da minha idade, falar sobre Cuba. Para minha geração, Cuba foi um modelo de sonho, esperança de um inédito socialismo democrático, com liberdades individuais, direitos e oportunidades iguais para todos, liderado por rapazes como nós, com menos de 30 anos de idade, num país miscigenado como o nosso, ao som de rumba, mambo e bolero.

Nada poderia nos produzir mais euforia que a noite de Ano Novo em que Fidel Castro entrou em Havana e tomou o poder com seus guerrilheiros barbudos. Eu tinha 18 anos e estava nas ruas, com meus colegas da UNE e os companheiros do futuro Cinema Novo, celebrando a vitória da beleza e da justiça, como diria Paulo Martins em “Terra em transe”. Isso ninguém esquece. Mesmo que o sonho se transforme em pesadelo, permanece em nossos corações na sua forma original.

Nossa proximidade afetiva e cultural com o cinema cubano alimentou, durante anos, nossa tolerância com o que de errado víamos acontecer na ilha. Os cineastas brasileiros sempre tiveram a absoluta solidariedade dos cineastas cubanos liderados por Alfredo Guevara, Tomás Gutierrez Aléa e Julio Garcia Espinoza. Nos piores momentos da ditadura militar no Brasil, nunca nos faltaram moralmente (apoiando nossos filmes e nossos projetos cinematográficos) e materialmente (recebendo alguns de nós em exílio ou na escola de cinema de San Antonio), sem nada em troca.

Mas, ao longo do tempo, foi ficando desconfortável defender Cuba. Era como se a mulher amada estivesse fugindo com outro, a dor de corno reprime o amor.

A agressão na Baía dos Porcos, a desumanidade do embargo comercial, a barbárie de Guantánamo, o terrorismo de estado (vejam “A hora mais escura”, de Kathryn Bigelow), os cubanos presos em Miami, todos os erros e crimes da política externa americana não podem justificar o silêncio diante da falta de liberdade, do controle da vida dos cidadãos, da perseguição aos homossexuais, das misérias da ditadura de Fidel Castro. Não quero viver num mundo em que seja obrigado a escolher entre dois males. Prefiro continuar sonhando.

Em dado momento, a União Soviética se ocupou de Cuba, garantindo sua sobrevivência ao embargo. Com isso, o regime pôde investir correta e fartamente em educação e saúde, com resultados gloriosos. Mas de que serve ser alfabetizado se não posso ler o que bem entender? De que serve estar fisicamente bem se não posso levar meu corpo para onde bem quiser?

Quando a União Soviética desmoronou, deixando Cuba à deriva, o regime cubano tentou resistir por sua própria conta e o resultado foi um período de extrema miséria, cujas consequências eram o desejo de fuga em massa da população e o endurecimento do regime para conter o desagrado geral. Aí começou a história de Yoani Sánchez.

Embora não seja nenhum Hermano Viana (um dos meus heróis do pensamento contemporâneo), uso a web com alguma frequência. Mas não tenho muita paciência, concentração e habilidade para estar acessando os muitos blogs interessantes ou que poderiam vir a me interessar. Não é que eu subestime a tecnologia, a tecnologia é que me superestima.

Assim, nunca li uma só linha do blog de Yoani Sánchez, o Generácion Y. Mas, independentemente do que pudesse achar dele e dela, todos devem ter o direito de se manifestar pacificamente, em qualquer país ou circunstância, mesmo que sejam agentes do demônio (em Cuba, agentes da CIA são presos ou talvez fuzilados, não é provável que recebam passaporte). Essa é aliás uma grande contribuição da internet à civilização — ser quase incontrolável.

Aí a moça vem ao Brasil e é recebida a pedra e pau. Como relataram os jornais, as TVs e o próprio senador Eduardo Suplicy, puxaram-lhe os cabelos, jogaram-lhe objetos, bloquearam sua locomoção, impediram que se projetasse o filme de Dado Galvão em que ela aparece (nem sei direito do que trata o filme, mas é uma pena que nossas associações de classe cinematográfica não se tenham manifestado a propósito dessa censura informal e selvagem contra um cineasta brasileiro).

Os manifestantes, que também têm o direito de dizer o que quiserem, preferiram fazê-lo a cassetete, lembrando vulgares policiais da repressão. Como disse o senador Suplicy, deviam ter tido mais coragem de ouvir.

É evidente que a autorização do governo cubano para que Yoani Sánchez viajasse, depois de suas 20 tentativas fracassadas, é sinal de um processo de abertura política gradual e de lenta transformação econômica. Estranho é que brasileiros sectários, supostamente em defesa de Cuba, provoquem uma reação que só faz prejudicar esse projeto de novos rumos no horizonte político do país.

Impedir pela força que a blogueira se manifeste, pondo em risco sua integridade física, não é só inaceitável gesto de intolerância, como também um golpe traiçoeiro nesse projeto de reaproximação de Cuba com a democracia, em convivência com o resto do mundo. É isso o que deviam desejar aqueles que ainda têm Cuba no coração.

O pastor e os gays - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 23/02

SÃO PAULO - Psicólogos podem tentar curar gays? A guerra de abaixo-assinados contra e a favor da cassação do registro profissional de psicólogo do pastor Silas Malafaia devido a suas declarações sobre o homossexualismo coloca essa candente questão na ordem do dia.

Em minha opinião, enquanto cidadãos, reverendos e despiciendos podem dizer o que pensam, pouco importando se o conteúdo das declarações é politicamente correto ou verdadeiro. Defender a liberdade de expressão é defender a possibilidade de os outros afirmarem exatamente aquilo que não queremos ouvir.

A coisa muda um pouco de figura quando o indivíduo fala na condição de psicólogo ou membro de outra categoria profissional que se apoie, ainda que imperfeitamente, numa ciência. Do mesmo modo que um médico não pode sair por aí dizendo que cura doenças incuráveis, um psicólogo não pode proclamar que possui terapias efetivas contra o que seu ramo de saber nem sequer considera moléstia. Não se pode bater de frente e em público contra os consensos da disciplina. Diversas disposições do Conselho Federal de Psicologia proíbem seus profissionais de "patologizar" o homossexualismo.

Se o pastor crê que a psicologia está errada, pode tentar demonstrá-lo através de trabalhos científicos, apoiados em argumentação técnica, nos fóruns adequados. Ao menos em teoria, se ele convencer os seus pares, mudará o consenso da área e, se não for, precisa resignar-se e abandonar o assunto ou a profissão.

O que complica o caso de Malafaia é que ele é a um só tempo clérigo e psicólogo e costuma restringir suas declarações polêmicas às ocasiões em que se manifesta como sacerdote. Se isso basta para limpar sua barra, é o que o conselho de psicologia do Rio, onde corre um processo ético, terá de decidir. Se fosse eu a julgar, no mínimo exigiria que ele avisasse que não fala como psicólogo quando se refere ao homossexualismo.

Redes, partidos e política - MARCO AURÉLIO NOGUEIRA

O ESTADÃO - 23/02

Compreensível o interesse despertado pelo lançamento da Rede Sustentabilidade, o novo partido articulado pela ex-senadora Marina Silva, entre outros políticos e ativistas. Se o quadro partidário brasileiro provoca tédio e desesperança, nada como uma proposta recheada de boas intenções para que se espalhe a sensação de que algo pode ser feito para que se melhore a política hoje prevalecente.

O novo partido surge propondo-se a ser diferente na estrutura (uma rede), nos procedimentos e nas ideias. Não partiu da arregimentação de lideranças expressivas ou bancadas parlamentares preexistentes. E não está poupando energia para convencer a opinião pública de que veio para valer, não é mero capricho de seus idealizadores. Lançou-se, porém, com uma meta clara: dar abrigo e sustentação à futura candidatura presidencial de Marina Silva, principal justificativa para que a operação fundacional fosse desencadeada agora, quando já é nítido o rufar dos tambores das eleições de 2014, um frenesi eleitoral aparentemente intempestivo e prematuro, mas que tem sua razão de ser, como observou nesta mesma página o cientista político Luiz Werneck Vianna (16/2).

Tal justaposição de objetivos - criar um novo modo de fazer política e tornar viável uma candidatura - fará, portanto, com que os articuladores da proposta tenham de agir para demonstrar que terão disposição para amassar o barro da política dura, que não se sujeita nem obedece a princípios vagos, chefes supremos ou calendários eleitorais. Não à toa o discurso de Marina insiste em enfatizar que o novo partido existirá "para questionar a si, não para disputar uma eleição" - não terá "espírito de manada".

Cercada de expectativa, a Rede chamou a atenção pelo inusitado de algumas de suas ideias. Não aceitará, por exemplo, contribuições financeiras que provenham de negócios que agridam ou prejudiquem a saúde e o meio ambiente (bebidas alcoólicas, cigarros, armas, agrotóxicos), o que mostra uma face simpática e sensível, mas pouco clara quanto a seus efeitos efetivos. A hipótese certamente é que o partido consiga sobreviver eleitoralmente graças à contribuição expressiva de seus militantes e simpatizantes, o que parece romântico demais. Vale o mesmo para a pretensão de limitar a reeleição de seus futuros parlamentares - uma em cada Casa legislativa - e de organizar um conselho de cidadãos que monitore com independência a sigla e seus dirigentes. São ideias interessantes, mas de efeito impreciso, com a agravante de que podem sugerir que o partido pretende estacionar fora da política institucionalizada, feita e vivida pelos brasileiros. Tanto a questão é delicada que alguns de seus propositores, a começar da própria ex-senadora, têm procurado deixar claro que o novo partido não fugirá das alianças (desde que sejam "pontuais e em torno de ideias") e trabalhará para criar novas correlações de forças no País, em vez de deixar tudo como está.

O mais importante, porém, é a proposta abrangente da nova legenda, antes de tudo sua disposição de funcionar como uma rede que promova a articulação entre políticos de diferentes orientações partidárias e, ao mesmo tempo, impeça que o partido concentre todas as decisões políticas e fique engessado em torno de seus próprios interesses. A perspectiva tem potência, especialmente porque proclama que é mais importante privilegiar aquilo que une e é comum do que aquilo que distingue e opõe. Se a questão é agir "pelo bem do País" ou por uma causa magna que esteja acima de partidos e facções, a estruturação em rede faz total sentido. Foi mais ou menos assim que Joaquim Nabuco definiu a estratégia do abolicionismo nos anos 1880: ativar um movimento, uma opinião, uma agitação para "desagregar fortemente os partidos existentes, até certo ponto constituindo uma igreja à parte composta dos cismáticos de todas as outras".

Em seu discurso no ato de lançamento do partido, Marina Silva pareceu emular essa posição de Nabuco: "Não seremos nem oposição nem situação ao governo de Dilma Rousseff. Se a presidente estiver fazendo algo bom para o Brasil, nossa posição será favorável". A Rede pretende "quebrar de fato o monopólio dos partidos na política", substituindo-o pela ação da cidadania. É um palavrório vago. A questão é saber se esse caminhar no fio da navalha será viável diante da natureza "partidária" da política, de sua essência agonística de luta pelo poder, da falta de gente que trabalhe desinteressadamente por uma causa maior.

Apresentar-se como novidade é fácil. Difícil é dar corpo e vida à nova proposta, traduzi-la em termos políticos, intelectuais e organizacionais. Não será simples criar um partido numa época de homens partidos e pobres de ideias políticas. Parecem faltar espaço e oxigênio para que se agregue a essa criação um projeto de sociedade, sustentado por uma análise criteriosa do mundo e do País, que não só revele a estrutura dos problemas, como os acomode numa agenda articulada. Em política, não é novo o que se proclama como tal, mas o que produz coisas novas a partir da transformação daquilo que existe. Será preciso propor soluções positivas a partir de uma análise concreta do existente. Sem isso a Rede vai girar em círculos.

Mas é ainda mais fácil falar mal daquilo que se propõe como novidade. De um modo ou de outro, querendo ou não, o novo incomoda o que está estabelecido e desafia hábitos mentais, rotinas e posições consolidadas. Difícil mesmo é submeter o novo à crítica ponderada e criteriosa, ver se o que se propõe é algo de aproveitável, concedendo-lhe algum crédito de confiança para mostrar a que veio. Se isso não é feito, tudo se resume a bate-boca, a torcida contra ou a favor. E não se avança em direção nenhuma, ficando todos recolhidos ao mesmo ramerrame de sempre.

O papa e a semântica - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 23/02

Esquerda e direita devem ser motivo de horror, e não de orgulho para quem quer que seja


Há temas que, por sua magnitude e transversalidade, perpassam diversos outros, que aparentemente lhe são estranhos. É o caso da renúncia do papa Bento 16.

À parte as numerosas teorias da conspiração que a mídia mundial quis lhe atribuir, indiferente às explicações que ele próprio deu, constata-se que o entendimento do tema está contaminado por um despropósito: o conflito ideológico direita x esquerda, modernidade x ortodoxia. É intolerável que assim o seja -mas é.

Tal reducionismo, que chegou ao interior da Santa Sé, há muito inferniza a vida política e econômica dos países e se faz fortemente presente na América do Sul e, em especial, no Brasil.

Se já é uma distorção em relação aos países, impensável é que se tente estendê-la à religião.

Não existe religião progressista. Esse termo, altamente questionável na sua essência, não se aplica a uma instituição que tem por missão exatamente conservar um legado que se pretende eterno.

É, pois, uma contradição em termos classificar um religioso de moderno ou reacionário. São categorias estranhas ao tema.

No Ocidente cristão, ninguém é obrigado a ter uma religião. Se a tem, deve aceitar seus pressupostos; se não a tem, não faz sentido pretender moldá-los, menos ainda a partir de paradigmas que lhe são inteiramente alheios.

A terminologia direita-esquerda surgiu na Revolução Francesa, no fim do século 18, quando a Assembleia Nacional ganhou assento na Sala do Trono. O representante da aristocracia sentava-se à direita do rei; o da Assembleia, à esquerda.

Marx valeu-se desse simbolismo para atribuir à esquerda as questões de interesse popular e à direita os da elite dominante.

Quem dera fosse tão simples. Discutir temas como economia, ambiente e até valores morais a partir desses pressupostos conspira contra o bom-senso e a eficiência.

Por que, por exemplo, a economia de mercado seria de interesse apenas da elite se é ela, comprovadamente, a que gera riquezas e, por extensão, empregos a todos os segmentos sociais?

Não há um só país que, ao adotar o socialismo, tenha erradicado a pobreza ou melhorado a vida do povo.

Países que embarcaram nesse equívoco -e a Rússia é o exemplo mais evidente- saíram ainda mais pobres. Não obstante, a esquerda fez de temas como justiça social, direitos humanos e até defesa do ambiente sua reserva de mercado.

A história registra algo em torno de 100 mil cubanos mortos na sequência da Revolução Socialista, num país que, à época, tinha aproximadamente 8 milhões de habitantes. Foram cerca de 17 mil fuzilamentos e mais 80 mil assassinados em tentativas de fuga.

A ditadura chilena de Augusto Pinochet contabiliza cerca de 40 mil opositores tombados -menos da metade dos cubanos- e as estatísticas oficiais falam em cerca de 3.200 mortos e desaparecidos. No entanto, Pinochet é um monstro (e não discordo disso), enquanto Fidel Castro é, na visão de alguns, um herói. O que os diferencia? Um é de "direita" e o outro de "esquerda". Os dois são detestáveis.

Na questão do ambiente, a contradição é ainda mais berrante. Conspira-se contra o produtor rural, em meio a uma demanda mundial por aumento na produção de alimentos.

A ONU (Organização das Nações Unidas) avisa que, se a produção não aumentar 20% nos próximos dez anos, haverá escassez. E o Brasil é peça-chave nesse processo.

Mas a esquerda -sobretudo a ambientalista- insiste em demonizar o produtor rural. Arvora-se como única e legítima defensora dos direitos do povo, mas defende inocentemente a fome... do povo.

Esquerda e direita são, na verdade, um outro nome para extremismo e radicalismo irracionais, que já causaram muito desastre e muita dor à humanidade. Devem ser motivo de horror, e não de orgulho para quem quer que seja.

Como supor, no cristianismo, um sacerdote ou um pastor esquerdista se no Apocalipse de são João está dito que os justos sentarão à direita do Pai e os condenados à esquerda? Por aí se vê o despropósito dessa terminologia, sobretudo no âmbito religioso.

O Papa e o meteoro - CRISTOVAM BUARQUE

O GLOBO - 23/02

Seria bom saber que todos os políticos eleitos usam os mesmos serviços públicos de seus eleitores



Ao mesmo tempo em que em Roma o Papa Benedito XVI renunciava ao seu pontificado, na Sibéria caía um meteoro. A renúncia foi um destes fatos que nos surpreendem com o passado. E a queda do meteoro desperta temor no futuro. São temores que nos fazem sonhar com notícias que nos surpreendam ao longo da vida futura.

Sonho ler notícia de que a economia é orientada para a redução da pobreza e a construção da igualdade social, com respeito ao equilíbrio ecológico; que o consumo está subordinado ao bem-estar, e este à felicidade das pessoas. Sonho ler a informação de que todas as crianças do mundo estão em escolas com a mesma alta qualidade, e nenhum pai ou mãe no analfabetismo; que a corrupção passou a ser tema limitado a estudo nos cursos de História; e que todos os políticos são comprometidos com utopias, propondo ações para todo o planeta e as próximas gerações. Gostaria de ver que os principais recursos da Terra passaram a ser regidos por normas do interesse de toda a humanidade e que a água do mar pode ser dessalinizada a baixo custo energético e com a mesma qualidade da água potável.

Será muito bom saber que todos os políticos eleitos usam os mesmos serviços públicos de seus eleitores; ter a surpresa de ver os mapas-múndi sem fronteiras separando países, todos integrados em uma mesma comunidade de seres humanos, com os mesmos compartilhados sonhos, e saber da desativação da última arma e do último reator nuclear. Será muito bom saber que os porta-aviões seriam usados apenas para fins turísticos e os bombardeiros para viagens de jovens pelo mundo.

Espero me surpreender ao saber da notícia da cura definitiva de todas as formas de câncer; da recuperação ou o atendimento daqueles que têm deficiências; da previsão e cura do Mal de Alzheimer; e do envelhecimento sem a perda do vigor, nem da saúde, nem da memória do passado ou dos sonhos para o futuro. Gostaria de ver publicidade de chocolate descafeinado, uísque sem álcool, massa sem engordar, sal que não eleva pressão arterial. No esporte, quero ver um jogador de futebol ainda melhor do que Pelé.

Sonho ver com deslumbrada surpresa a descida do primeiro homem ou mulher em Marte; quero que ainda em minha vida a ciência seja capaz de criar chips injetáveis no cérebro para fazer cada pessoa ler, entender e falar qualquer idioma; quero usar aeroportos sabendo que não há polícia de fronteira, nem revista ou demora na espera.

Sonho com acordo dos líderes mundiais para desativar o meteoro que explode dentro da civilização industrial, desigualando a sociedade e depredando a natureza. Ver a notícia de que a tecnologia espacial já dispõe do poder de destruir asteroides a caminho da Terra, garantindo, assim, que a humanidade não terá o destino dos dinossauros e que terá milênios para continuar com boas surpresas, como a de um Papa com dignidade suficiente para abrir mão de seu cargo, nos provocando a lembrar as surpresas do passado e a desejar imaginar sonhos para o futuro.

Sem caixa? - SONIA RACY

O ESTADÃO - 23/02

Divergências entre Santander, Itaú, Bradesco e a AES Eletropaulo impedem que clientes paguem a conta de luz na boca do caixa. A Eletropaulo rescindiu o contrato com os três por discordar do reajuste de tarifa pedido pelos bancos.

Segundo Mariana Alves Tornero, do Idec, a prática é considerada abusiva, uma vez que concessionária e bancos não - poderiam recusar prestação de serviço mediante pagamento: "Se o cliente for impedido de pagar, pode reclamar com o Banco Central e na Justiça".

Sem caixa 2
O BC não pensa assim. Diz que, pela regulamentação do CMN, um banco só pode receber contas de um prestador de serviços se houver acordo - que, nestes três casos, foi rompido.

Sem caixa 3
Procurada, a AES Eletropaulo avisa: os clientes podem fazer o mesmo pagamento nos caixas eletrônicos, débito automático, por meio da internet e telefone.

Torpedo
O Detran começa, segunda, a enviar SMS para alertar motoristas sobre o vencimento da CNH. Até agora, 200 mil pessoas cadastradas autorizaram o recebimento do alerta.

Coletivos
Marina Silva colhe assinaturas, hoje, em Brasília, para a criação de seu novo partido. O mutirão será na Feira do Guará.

É preciso o apoio de meio milhão de pessoas para a Rede Sustentabilidade sair do papel

Defesa grátis
Com a posse de 120 novos defensores públicos, ontem, SP terá, pela primeira vez, pelo menos um profissional em cada comarca onde há presídios. Eles atuarão em 61 municípios para acompanhar o cumprimento de pena de presos sem dinheiro para pagar advogado.

A lei, sancionada por Alckmin em dezembro, prevê, ao todo, 400 novos cargos em 4 anos.

A tiracolo
Sérgio Cabral deu uma de cabo eleitoral, ontem, na inauguração do Centro Estadual de Transplantes, no Rio. Apresentou o vice a todos os médicos e enfermeiras. Pezão, sabe-se, é o nome do governador para a sucessão estadual.

Back Home
O juiz Sérgio Moro está de malas prontas: vai voltar para o Paraná. Um dos maiores especialistas do País em lavagem de dinheiro, ele auxiliou Rosa Weber, do STF, no julgamento do mensalão.

Quem vem
Joseph Jackson, pai de Michael Jackson, vem ao Brasil. Chega dia 8, exclusivamente para falar sobre o musical Forever King Of Pop - que estreia por aqui em abril e é o único chancelado pela Fundação Michael Jackson.

Ele aprovou o espetáculo após assisti-lo na Europa e se encantar com a produção.

Suspense
O STJ retoma, terça-feira, o julgamento da maior disputa societária brasileira - sobre a validade da arbitragem prevista no acordo de acionistas firmado entre os Odebrecht e os Gradin.

Samba no pé
Maurilio Biagi, presidente da Agrishow, articula apresentação da campeã carioca Unidos de Vila Isabel para abrir a feira, em Ribeirão Preto, no fim de abril.

A escola de Martinho da Vila homenageou o agronegócio na Marquês de Sapucaí este ano.

Skindô não!
Em pleno feriado de carnaval, produtor rural trabalhava na floresta amazônica. Só que o Ibama também estava de prontidão.

Resultado? Dois tratores, que iniciavam desmatamento no interior do Mato Grosso, foram apreendidos - além de correntão (usado para derrubar árvores) e carreta-tanque com 5.000 litros de combustível.

Lista de dispensa - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 23/02

Em mais um gesto de contestação à herança de Gilberto Kassab, Fernando Haddad exonerou 400 funcionários de confiança instalados pelo antecessor nas 31 subprefeituras cumprindo cotas de indicações de vereadores e partidos aliados. Os cargos serão preenchidos gradativamente, mas o prefeito proibiu apadrinhamentos para funções de coordenação e supervisão. Pela lógica do governo Haddad, só as chefias de gabinete serão ocupadas por servidores de perfil político.

Geopolítica 1 Salvo alteração de última hora, Recife, capital do Estado governado por Eduardo Campos (PSB), está excluída do mapa das caravanas do PT e de Lula, que começam na quinta-feira, em Fortaleza. O roteiro prevê nove escalas até o encerramento em Salvador, em maio.

Geopolítica 2 Organizados pela Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, e pelo instituto do ex-presidente, os seminários serão temáticos. O de Cuiabá (MT), em 15 de março, abordará a agricultura. O evento de Manaus (AM), previsto para 20 de abril, tratará de sustentabilidade.

Hortifrúti Em busca de adesões para fundar seu novo partido, Marina Silva percorrerá hoje a feira do Guará, no Distrito Federal. A ex-ministra levará a tiracolo o deputado federal José Antonio Reguffe (PDT-DF), que dá suporte à criação da Rede.

Subliminar De um pessebista, sobre a "rinha" entre PT e PSDB apontada por Eduardo Campos: "Que marketing é esse do Aécio que reforça o 13, número do PT?".

Diplomacia 1 Após a polêmica sobre Yoani Sánchez, o embaixador de Cuba no Brasil, Carlos Zamora Rodríguez, se reuniu anteontem com membros da assessoria internacional da Presidência.

Diplomacia 2 O Planalto diz que o embaixador, que liderou ação para difamar a blogueira, pediu a audiência na semana passada.

Nada feito Além das exigências que conseguiram emplacar para evitar greves futuras, as federações petroleiras tentaram que o governo desistisse da multa arbitrada pelo TST para a paralisação de ontem. Consultado, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, disse não.

Sujou A Câmara de São Paulo mudou as regras da Ficha Limpa para contratação de funcionários. Portaria da Mesa Diretora permite que o servidor ateste de próprio punho que não tem pendências judiciais para ser admitido. Antes, era exigida a apresentação de certidões negativas.

Alvo fácil Enquanto insiste na discussão de emenda que restringe o poder de investigação do Ministério Público, a Assembleia paulista passará a debater projeto recém-apresentado por Vitor Sapienza (PPS) que cria o "Dia Estadual do Ovo".

Guardanapos... O ex-procurador-geral de Justiça do Rio Cláudio Lopes arquivou procedimento que investigava as viagens do governador Sérgio Cabral com Fernando Cavendish, dono da Delta. A decisão foi tomada em 9 de janeiro, oito dias antes de Marfan Martins Vieira assumir o lugar de Lopes.

... limpos No despacho, Lopes afirma que não há indícios de improbidade nas viagens do governador com o empresário. Cabral esteve com Cavendish em Mônaco, em viagem particular, e em Paris, durante missão oficial.

No atacado Pré-candidato à reeleição, Beto Richa (PSDB) reunirá prefeitos e secretários das 399 cidades paranaenses segunda-feira, no museu Oscar Niemeyer, em Curitiba. Anunciará repasse de R$ 39 milhões para saúde preventiva, incluindo campanhas e vigilância sanitária.

com FÁBIO ZAMBELI e ANDRÉIA SADI


TIROTEIO

"Com o preço estratosférico e a especulação que corre solta no Rio de Janeiro, o jogo deveria se chamar Bando Imobiliário."
DO DEPUTADO MARCELO FREIXO (PSOL-RJ), sobre a versão do tradicional jogo de tabuleiro "Banco Imobiliário", que destaca ações do governo Eduardo Paes.


CONTRAPONTO

Fora de área


Durante as negociações sobre a MP dos Portos, Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) pediu que o ministro Leônidas Cristino (Portos) não executasse multa judicial de R$ 200 mil pela greve no setor. Ao perceber que o governo não queria negociar, o dirigente da Força Sindical disse:

-Vou telefonar agora e pedir para a greve, de sete horas, continuar até completar 24 horas, já que multa refere-se ao valor de um dia.

Cristino decidiu consultar o Planalto. Na volta, disse:

-Aceitamos não cobrar a multa, mas o senhor nem pegue neste telefone durante a reunião!

De Dilma para Dilma, nova herança maldita? - ROLF KUNTZ

O Estado de S.Paulo - 23/02

Candidata à reeleição, a presidente Dilma Rousseff poderá legar uma herança maldita a si mesma se continuar apostando na maquiagem da economia e cometer o erro do autoengano. Ela pode ter desprezado outros sinais, mas fará algo bom para seu governo, e para o País, se levar a sério o alerta disparado pela pesquisa mensal de emprego do Ministério do Trabalho. Foram criados em janeiro 28.900 postos de trabalho com carteira assinada, de acordo com o primeiro levantamento. Esse número - diferença entre admissões e demissões - é muito menor que o de um ano antes por qualquer das comparações possíveis. É 75,7% inferior ao dado preliminar de janeiro de 2011 e fica 84% abaixo do corrigido com as informações enviadas fora do prazo.

Ainda ontem dois outros dados bem ruins foram divulgados. O IPCA-15, indicador de inflação fechado no meio do mês, subiu 0,68% em fevereiro. Foi um resultado melhor que o do mês anterior, 0,88%, mas ainda muito alto e, além disso, atenuado pela redução da conta de eletricidade. Também na manhã de ontem o Banco Central (BC) publicou as contas externas de janeiro, indicando uma piora nas transações correntes: o déficit acumulado em 12 meses chegou a US$ 58,57 bilhões e subiu de 2,4% para 2,58% do produto interno bruto (PIB). Esse déficit ainda foi financiado com folga pelo investimento estrangeiro direto, mas a tendência, a julgar pela experiência brasileira, é preocupante por mais de um motivo.

Mais preocupantes que esses números tem sido a reação das autoridades às más notícias. A inflação tem resistido nos últimos tempos, mas deverá recuar no segundo semestre, disse na quinta-feira o presidente do BC, Alexandre Tombini. A boa safra e o crescimento menor da massa de salários, a seu ver, devem contribuir para uma desaceleração dos preços. Na sexta-feira, o diretor do Departamento de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho, Rodolfo Torelly, também realizou seu ato de fé. Já em 2o12 o menor dinamismo do mercado de trabalho havia sido notado, disse ele, mas deverá haver recuperação nos próximos meses, acrescentou. As medidas econômicas tomadas pelo governo "vão surtir efeito ainda no primeiro semestre", garantiu. O secretário do Tesouro, Arno Augustín, também participou do coro do otimismo. Medidas como a redução da conta de energia, o corte de juros, a desoneração da folha de salários e o lançamento do plano de transportes devem permitir um 2013 parecido com 2010, "um ano de recuperação".

Neste momento, no entanto, a recuperação prevista pelo governo é um crescimento na faixa de 3% a 3,5%, com inflação anual próxima de 5,5%. Para isso ainda será necessária, é claro, uma boa acomodação. A alta do IPCA-15 acumulada em 12 meses ainda ficou em 6,18%, com índice de difusão de 71% (proporção de bens e serviços com elevação de preços). Além disso, a conta de luz ficou 13,45% mais barata, por iniciativa do governo, e isso retirou 0,45 ponto porcentual do resultado geral. Medidas como essa podem frear o avanço dos indicadores, mas de nenhum modo se confundem com política anti-inflacionária. Podem ser positivas para o consumidor e beneficiar a produção e o consumo, mas a inflação é determinada por outros fatores, como a expansão do crédito, o gasto público e, como consequência, o descompasso entre a demanda e a oferta de bens e serviços.

Fora do governo ninguém pode dizer com certeza se haverá algum esforço para controlar esses fatores, embora o ministro da Fazenda e o presidente do BC admitam a hipótese de uma elevação dos juros. Nenhum deles indica, no entanto, quando essa intervenção poderá ocorrer e, além disso, ambos parecem dispostos a tolerar por vários meses uma inflação bem acima da meta oficial de 4,5%.

O BC poderá agir depois de conhecer os números de fevereiro e de março, segundo uma interpretação corrente no mercado, mas conversas desse tipo ainda são meras especulações.

Se as condições de emprego continuarem piorando, os consumidores poderão ser levados a uma atitude mais cautelosa. Nesse caso, a pressão da demanda será atenuada e os preços tenderão a se acomodar. Então, o BC poderá evitar uma nova elevação, embora pequena, dos juros básicos. A política monetária continuará, portanto, cumprindo uma das determinações mais firmes da presidente Dilma Rousseff e os empresários mais preocupados com os juros e o câmbio do que com a eficiência produtiva poderão aplaudi-la por mais tempo.

Mas mesmo essa hipótese é um tanto mal ajambrada. Atenuar a pressão inflacionária pela piora das condições do emprego, enquanto o governo continua gastando muito, investindo mal e concedendo incentivos errados e ineficientes a uma indústria emperrada, está longe de ser um caminho promissor. Além disso, a piora das contas externas vem sendo causada em boa parte pela deterioração do saldo comercial. Até a terceira semana de fevereiro o País acumulou um déficit de US$ 4,6 bilhões na conta de mercadorias, com exportações 7,3% menores que as de um ano antes e importações 12,5% maiores, pelas médias diárias. Mas esse resultado ainda é maior do que seria se as compras da Petrobrás fossem contabilizadas com menor atraso.

Apesar de todo o falatório do governo e das desonerações parciais, a indústria continua com baixo poder de competição e esse é o dado mais importante para a avaliação das perspectivas de crescimento em médio prazo. A política econômica permanece mal definida, os estímulos são remendos mal costurados e há pouca segurança para investir. O investimento encolheu em 2012 e terá de aumentar muito além das previsões correntes para o País crescer no ritmo de seus vizinhos mais dinâmicos.

A balança comercial tem sido tão maquiada quanto a inflação (atenuada pela contenção política de vários preços) e as contas públicas. Já no meio de seu mandato, a presidente Dilma Rousseff tem pouco tempo para limpar a cara da economia nacional, mudar o jogo e cuidar do legado para o próximo governo.

O outro lado - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 23/02

E, se em vez de insistirmos na comparação entre os governos petistas e os do PSDB dos últimos 20 anos, fizéssemos uma análise mais abrangente, com as comparações da performance brasileira nos últimos dez anos com a própria performance dos governos ao longo da nossa História e, além disso, com as demais economias do mundo, inclusive dos países emergentes? O professor titular de Economia Internacional da UFRJ Reinaldo Gonçalves se propôs a se distanciar da polarização PT-PSDB para analisar a economia brasileira e os avanços sociais nos dez anos de governos petistas, e encontrou quadro bastante desolador, distante da propaganda oficial, a que deu o título "Brasil negativado, Brasil invertebrado: legado de dois governos do PT".

A"negatividade" é informada por inúmeros indicadores de desempenho da economia brasileira que abarcam o país, o governo, as empresas e as famílias. O "invertebramento" envolve a estrutura econômica, o processo social, as relações políticas e os arranjos institucionais. Essa trajetória é marcada, segundo Gonçalves, na dimensão econômica, por fraco desempenho; crescente vulnerabilidade externa estrutural; transformações estruturais que fragilizam e implicam volta ao passado; e ausência de mudanças ou de reformas que sejam eixos estruturantes do desenvolvimento de longo prazo. Na avaliação do crescimento da renda durante os governos do PT, o professor classifica de "fraco desempenho pelo padrão histórico brasileiro e pelo atual padrão internacional". A taxa secular de crescimento médio real do PIB brasileiro no período republicano é 4,5%, e a taxa mediana é 4,7%. No governo Lula, a taxa obtida é 4%, enquanto as estimativas e projeções do FMI para o governo Dilma informam taxa de 2,8%.

O resultado é claramente negativo: no ranking dos presidentes do país, Lula está na 19ª posição, e Dilma tem desempenho ainda pior (24ª), em um conjunto de 30 presidentes com mandatos superiores a um ano. Resultados que não são compensados pelo fato de o governo Fernando Henrique estar em 27ª posição, com o crescimento médio de 2,3%.

O Brasil negativado dos governos do PT também é evidente quando se observam os padrões atuais de desempenho da economia mundial, ressalta Gonçalves. Durante os governos petistas, a taxa média anual de crescimento do PIB (considerando as estimativas e projeções do FMI para os dois últimos anos do governo Dilma) é 3,6%. No período 2003-2014, a estimativa é que a economia mundial cresça à taxa média anual de 3,8%; no caso dos países em desenvolvimento, essa taxa deverá ser de 6,4%.

Portanto, salienta Gonçalves, o Brasil negativado é evidente quando se constatam não somente essas diferenças como dois outros fatos: em seis dos 12 anos do período 2003-14, a taxa de crescimento da economia brasileira é menor do que a taxa média mundial; e, em todos os anos, a taxa de crescimento do PIB brasileiro é menor do que a média dos países em desenvolvimento.

O Brasil negativado também é evidente quando se compara o crescimento do PIB brasileiro durante os governos petistas com a média simples e a mediana das taxas de crescimento dos 186 países que são membros do FMI e que representam um painel muito representativo da economia mundial.

A taxa média durante os governos Lula e Dilma (3,6%) é menor que a média simples (4,6%) e a mediana (4,4%) das taxas de crescimento dos 186 países. A taxa de crescimento brasileiro é menor que a média simples e a mediana da economia mundial em dez e sete anos dos 12 anos, respectivamente.

O fraco crescimento da economia brasileira durante os governos petistas está diretamente associado às baixas taxas de investimento, ressalta Gonçalves. A taxa média de investimento do Brasil no período 2003-14 é 18,8% enquanto a média e a mediana mundial (painel do FMI) são 23,9% e 22,5%, respectivamente. Em todos os anos de governo petista, a taxa de investimento é menor que a média e a mediana do mundo. No painel de 170 países o Brasil ocupa a 126ª posição, média para o período 2003-14. (Amanhã, o social)

O futebol e a política - FERNANDO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 23/02

BRASÍLIA - É inquestionável a melhora do Brasil com a sequência de FHC, Lula e Dilma no Palácio do Planalto. Agora, PT e PSDB têm duelado para saber quem fez o país avançar mais. Esse debate só interessa aos políticos.

Petistas e tucanos fariam melhor se refletissem sobre o que preocupa os brasileiros no dia a dia. Por exemplo, a persistência de um certo bolsão de incivilidade e intolerância entre torcidas de futebol nos estádios e em suas redondezas.

A violência das torcidas não é exclusiva dos brasileiros, mas o país poderia dar o exemplo para o mundo. Essa não parece ser uma preocupação de quem comanda o país, pois nenhuma política eficaz foi adotada por tucanos ou petistas nas últimas décadas.

Agora, os brasileiros chegaram ao paroxismo. Exportaram a violência. Há indícios de que foram torcedores do Corinthians os responsáveis pela morte de um boliviano de 14 anos durante um jogo no país vizinho.

O amor pelo futebol é uma das marcas mais vibrantes da cultura brasileira. Os jogos da seleção nacional são um dos raros momentos em que o país parece virar uma nação. Ao mesmo tempo, fãs desse esporte -as chamadas torcidas organizadas- demonstram seus instintos mais primitivos quando assistem a um jogo.

Um levantamento do jornal "Lance" em 2012 indicava que a violência ligada ao futebol já havia provocado 191 mortes no Brasil desde 1988. A maioria, jovens de até 30 anos.

Vou a estádios desde os anos 70. A situação só piora. Governadores, deputados, senadores, prefeitos e a presidente da República têm o dever de propor políticas eficazes que reduzam esse tipo de violência.

Até ontem, apenas o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, havia manifestado pesar pela morte do jovem boliviano. É pouco. E demonstra como a política está desconectada da vida real das pessoas.

Fora da linha - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 23/02

O embaixador Roberto Abdalla retorna hoje ao país após investigar o cônsul do Brasil em Sydney (Austrália), Américo Fontenelle. Já afastado do cargo, Fontenelle vai responder a processo disciplinar por assédio moral contra seus funcionários. Promovido por ter sido assessor do ex-ministro José Dirceu, ele tinha por hábito fazer chacota do embaixador na Austrália, Rubem Antonio Correa Barbosa.

Tricô diplomático
A intervenção determinada pelo ministro Antonio Patriota ocorreu pelo volume de denúncias contra o embaixador Fontenelle, que já fora alvo de sindicância no Canadá. Um relato recebido pela Comissão de Ética do Itamaraty conta sobre “longas reuniões diárias para recriminar funcionários, comentar decote das funcionárias, gabar-se dos amigos importantes, injuriar minorias sociais”. O processo envolve o conselheiro Cezar Cidade, que entrou de licença médica. Ele tinha o hábito de distribuir agulhas e novelos de lã aos servidores e os obrigava, no expediente, a terem com ele aulas de tricô. (No blog, trechos de uma das cartas-denúncia.)

“O conteúdo do discurso do senador Aécio Neves (PSDB-MG) não foi o importante, o relevante é que ele deu ordem-unida nas tropas da oposição” 

José Agripino, Presidente do DEM e senador (RN)

Termômetro
O que calou mais fundo na oposição no discurso de Aécio Neves (PSDB-MG), quarta-feira, no Senado, foi a forma pela qual o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) manifestou seu apoio à fala do candidato tucano à Presidência da República.

Pedem arreglo
Em reunião ontem com a Casa Civil, o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva
(PDT-SP), foto, pediu para o governo “maneirar” com os sindicalistas, pois estão sendo demonizados por
criticarem a MP dos Portos. O Planalto não cede porque não mexeu em direitos trabalhistas e acusa sindicalistas de agir em favor de empresários.

Cabo eleitoral
A presidente Dilma levou em sua comitiva à África o candidato do Brasil a diretor-geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), o embaixador Roberto Azevêdo. Ele está participando de todas as reuniões bilaterais.

Saia justa na Corte
Há mal-estar no STJ por causa de acordo feito pelo presidente, Felix Fischer, com partidos para aprovar o nome de Sérgio Kukina a ministro em troca da escolha posterior do procurador de Justiça do Acre Sammy Barbosa, candidato do governador Tião Viana (PT). O acordo foi feito em nome do STJ e desagradou a ministros, que não foram consultados e não aceitam os termos.

Na linha de frente
O vice Michel Temer teve papel fundamental, nestes dias, ao convencer os ministros do STF a resolver logo a questão da votação dos vetos pelo Congresso. A missão, que visa permitir a votação do Orçamento, foi dada pela presidente Dilma.

Monitor
Eleito presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, Lindbergh Farias (PT-RJ) terá na sua equipe um colaborador do ministro Guido Mantega (Fazenda), Élvio Gaspar, que era diretor de Inclusão Social do BNDES.

O MENSALÃO
A expectativa no STF é de que o Acórdão do julgamento seja publicado na semana que vem. Depois vem o capítulo dos embargos.