terça-feira, novembro 06, 2012

Jornais não vão acabar - PEDRO DORIA

O GLOBO - 06/11

Com o fim do ‘JT’, voltou à tona uma questão antiga. Em 2008, a crise da imprensa era séria. O pior já passou


Um dos velhos bordões do colunista Tutty Vasques trata da notícia enguiçada. Vira e mexe ela volta às páginas, nem reformatada é. Na semana passada, quando o paulistano “Jornal da Tarde” publicou sua última edição, uma destas notícias reemergiu. Os jornais vão acabar e está lá o corpo no chão que o prova. O surpreendente no retorno desta conversa é que se trata de uma discussão velha que nem no epicentro da crise dos jornais, os EUA, continua a ser encarada desta forma.

Ninguém sabe se jornais acabarão ou não. Mas, embutida nesta conversa, há inúmeras discussões, umas particularmente importantes para todos nós. Nos EUA, em 2007, fechou um jornal. Em 2008, 41. Em 2009, 112. E, não à toa, manchetes borbulharam em todo o mundo: os jornais acabarão. Até a sisuda revista britânica “The Economist” levou a previsão à capa. Mas, aí, fecharam 29 em 2010. E 21 no ano passado. O número continua diminuindo. Seu ápice não tem a ver com mudança tecnológica. Tem a ver com uma profunda crise econômica que os EUA enfrentaram. Não só jornais fecharam.

Não quer dizer que não exista uma mudança tecnológica. Há. Ela afeta todos os negócios que lidam com informação. Imprensa logo vem à mente: afinal, por aqui produzimos informação todos os dias. Mas indústrias que lidam com informação são todas. Encaremos uma loja de departamentos. Informação pura: controle de inventário, distribuição, preço pago, valor de câmbio para produtos importados. Uma loja destas faz dinheiro quando consegue equilibrar tempo, câmbio e espaço. Se conseguir circular rápido o produto que vende, dinheiro no cofre. E gerir tanto número ao mesmo tempo, de trivial, não tem nada. Ponha uma internet no meio e a questão do espaço repentinamente muda. Não é preciso ter uma loja no bairro nobre, basta um galpão no interior desde que a estrada ao lado seja boa. Amazon, pois é.

No auge do papo sobre o fim dos jornais, a conversa era muito diferente da atual. Jornalismo digital era sinônimo de web. Fora dos jornais econômicos, não havia qualquer história de sucesso na cobrança por conteúdo online. E muitos estavam convencidos de que haveria substituto para o jornalismo produzido pelos diários.

De lá para cá mudou muito. A economia melhorou. Não consertou, mas melhorou. Vai melhorar mais, cedo ou tarde. Até lá, outras empresas frágeis por questões de gestão vão quebrar. Em todos os setores. As leis da economia são implacáveis e isso nada tem a ver com tecnologia.

A tecnologia também mudou, e muito, com a introdução dos tablets. O leitor fica, em cada visita, uma hora e meia em média no aplicativo para iPad aqui do GLOBO. Nos melhores sites de notícias, a visita média não passa dos 10 minutos. Nos tablets, a lógica é diferente da web. Há espaço para informação bem editada, organizada, diagramada, pensada. Reúne as vantagens multimídia do digital com o processo de edição do papel. E, em todo o mundo, o produto final tem se mostrado algo pelo qual o leitor se apresenta disposto a pagar. Percebe o valor.

A percepção de valor também, lentamente, aparece na web. O exemplo capital é o do “New York Times”. Os problemas da empresa não estão resolvidos, a crise movida pela queda de renda publicitária ainda é relevante nos EUA, mas o “Times” tem meio milhão de assinantes digitais lá. Há alguns anos, ninguém tinha ideia de que algo assim seria possível.

O problema mais sério é que não houve substituto. Nos EUA, na Europa ou aqui, basta circular os olhos pela web. Opinião tem aos montes. Gente convicta de um lado e do outro. Mas informação, que realmente dá trabalho, continua vindo de poucas fontes. Quem acompanha Executivo, Legislativo e Judiciário, levanta escândalos, explica dilemas, antecipa projetos, são redações. O melhor jornalista não é capaz de fazer o que, coletivamente, faz uma redação experiente. O blogueiro solitário não resolve. Sem a produção das redações, não temos o necessário para votar.

Em 2008, o cenário parecia sombrio. Em 2012, não mais. Jornais continuarão a existir, seu público total só aumenta. Talvez, apenas talvez, o papel deixe de circular. Mas isso é mero detalhe.

O que separou a família brasileira - FABRÍCIO CARPINEJAR

ZERO HORA - 06/11


Eu sei o que desuniu a família brasileira.

O momento em que ela abandonou o tradicional almoço em casa e procurou a rapidez do restaurante a quilo.

Quando ela se desinteressou por completo da residência. Quando trocou a diarista pela faxineira duas vezes por semana.

Quando começou a comprar comida congelada e economizar com os talheres. Quando abdicou do pãozinho da padaria do final da tarde.

Quando as saídas ao supermercado tornaram-se frequentes. Quando o intervalo do trabalho diminuiu consideravelmente.

Quando a vassoura sumiu de trás da porta. Quando o avental desapareceu do seu gancho.

Quando ter uma horta passou a ser irrelevante. Quando o pai não mais visitou sua oficina de marcenaria na garagem.

Quando a tabuleta de bem-vindo acabou dispensada. Quando o capacho se divorciou da porta.

Quando a mãe adiou o jardim. Quando a vista de fora superou o carinho da decoração.

Eu sei eu sei eu sei o instante exato da transformação. Foi na hora em que a gente parou de vestir o botijão de gás.

Aquele ato mudou a mentalidade da classe média.

Cuidar do botijão significava zelar pelos detalhes, pela aparência e ordem doméstica. Mostrava uma preocupação com o olhar das visitas. Um carinho com os coadjuvantes da rotina. Um capricho com as gavetas e despensas e forros e fundos e cantos e quinas.

Não se podia deixar o gás daquele jeito sujo e engraxado no coração de azulejos da cozinha. Correspondia a um ultraje, a falta de educação, a ausência de asseio.

Ele precisava estar agasalhado. Todos os objetos do mundo mereciam uma capa: os cadernos de aula, o filtro de barro, o liquidificador, os ternos no armário, os carros na garagem.

Os objetos tinham que durar: geladeira era para a vida inteira, o fogão era para a vida inteira, máquina de lavar era para a vida inteira. Não se pensava em trocar, não se guardava o certificado de garantia, absolutamente dispensável.

Minha mãe não largava os pedais da Singer nos finais da tarde, elaborava tampas coloridas para as compotas de doces ou revestimentos para penduricalhos.

É óbvio que costurava, mensalmente, uma saia de renda para o gás, aproveitando sobras dos tecidos da cortina.

Eu achava que o botijão fosse uma irmã.

Meu irmão caçula já considerava um menino e chamava sua roupa de poncho.

– Mas é floreado! – eu dizia. – Não existe poncho floreado.

Vestir o botijão revelava o quanto nos importávamos com o desnecessário.

O quanto tínhamos tempo livre para amar.

Tempo livre para amar a família.

Tempo livre.

Viver com fé - JAIRO MARQUES

FOLHA DE SP - 06/11


Faltam atitudes que remetam a elementos ligados ao amor ao próximo, à paixão pela construção de virtudes


Fiquei desolado quando o escapulário dado pela minha mãe havia dois anos escorreu do mármore da pia diretamente para o ralo. Não que eu o considerasse um instrumento poderoso de sorte ou de proteção, mas ali residia um pensamento constante de fé.

Tentei recuperar o símbolo de todas as formas. Dava para ver um pedacinho de Nossa Senhora, com o Menino Jesus no colo, no meio daquela escuridão do cano que sabe Deus onde descambaria. Em vão. Foi para o além de meus olhos, dedos e pescoço.

Fiquei triste. Mamãe calou-se após conhecer detalhes do ocorrido, mas antes soltou aquele "Ahhhhh, filho" que me deixou com o sagrado coração apertadíssimo. O detalhe é que, naquele dia, eu iria visitar o Vaticano. Estava em viagem à Itália.

Por onde olho, atualmente, noto que faltam escapulários, fitinhas do Bonfim, guias. Faltam pensamentos e atitudes que remetam ao ambiente, às pessoas, às atitudes, a elementos ligados ao amor ao próximo, à paixão pela construção de virtudes e de uma sociedade mais fraterna.

Como me disse um motorista aqui do jornal, o Benê: "Não importa se seja pelo candomblé, pela Seicho-No-Ie, pela Igreja Católica, pelo espiritismo, as pessoas precisam agir mais, pensar mais positivo para melhorar o lugar onde vivem. Não dá para ser cada um por si em torno da sua religião".

O foco está direcionado demais aos resultados, ao melhor desempenho no trabalho, ao que fazer com o 13º salário. Junte-se a isso o trânsito do cão das grandes cidades, as dívidas do cartão de crédito e a violência. Pronto, acabou o espaço para pensar na fé.

Não quero provocar a fúria daqueles que não botam fé em valores imateriais como crer em uma força intangível, mas, para mim, muitas e muitas dores, dissabores, injustiças, desigualdades, preconceitos e outras desgraceiras só sucumbem a partir do momento em que se acredita.

Não é à toa que tenho devotado um pouco do meu tempo de descanso para apreciar o "Viver com Fé", um programa de TV que, estrelado pela atriz Cissa Guimarães, vai entrar em sua segunda temporada pelo canal pago GNT. Um bálsamo.

Com uma fórmula bem simples, gente desabrochando seus testemunhos do poder da fé, independentemente da sigla que se professa, o programa é inspirador para motivar reflexão em torno do espaço exaustivo que se costuma doar ultimamente para demandas que nem é preciso ir muito a fundo para caracterizar como pífias.

Enquanto uns agem com brutalidade com quem erra, há outros pacientemente agradecendo pela oportunidade de voltar a jogar; ao passo que enquanto uns se enervam pelo negócio perdido, pessoas sorriem grande por ganhar novas oportunidades.

Viver com fé ajuda a incentivar as crianças a gostar mais do arco-íris e a ter menos medo de tempestades. E crianças são as construtoras do sonhado e tão surrado "mundo melhor".



Na semana passada, chegou lá em casa um pacote embrulhado em papel pardo cuja remetente era "minha santa". Dentro, afora muitos papéis amassados, um novo escapulário. Mamãe não mandou nenhum recado, nem colocou cartão. Mas é certo que não precisava. Ela botou ali a fé de que eu entenderia sua mensagem.

Ser feliz por um momento - DAVID COIMBRA

ZERO HORA -06\11


A felicidade é diária. Não é semanal, não é mensal, não é anual, nem é o resultado de uma vida.

Não. A felicidade é uma obra das horas. Você consegue passar um par de horas felizes vendo um filme no fundo do sofá, trinchando um churrasco com a família, sorvendo um chope com os amigos, lendo um livro? Consegue?

Você tem talento para ser feliz.

Porque as semanas jamais serão perfeitas, como não serão perfeitos os meses ou os anos e muito menos uma vida. Até mesmo um único dia dificilmente será perfeito. Mas uma hora, sim, você pode fazer com que uma hora seja perfeita, e beber daquela hora aos pouquinhos, como quem bebe licor de nozes.

O CHOCOLATE DO GORDO

Você já viu um gordo comendo chocolate? Coisa bem linda de se ver.

Havia um gordo na redação do jornal, uma vez. Era um gordo muito gordo, impermeável a regime. Um gordo convicto.

Bom.

Todas as tardes ele comia um Chokito. Por volta das quatro horas, ia até o bar, pedia o Chokito, recitava a propaganda, leite condensado, caramelizado, com flocos crocantes... Mas não comia no balcão. Voltava para sua mesa. Então, confortavelmente sentado, ele olhava para aquele Chokito e sorria.

Segurava a barra com uma mão e, com a outra, descascava a embalagem, como se estivesse despetalando uma flor delicada. Quando o Chokito estava com o torso nu, ele lhe lançava mais um olhar de contentamento. Analisava-o detidamente, virando-o para um lado e para outro e, por fim, metia-lhe uma dentada. Enquanto mastigava, o gordo ficava olhando para o Chokito mordido. Mastigava e olhava e dava outra mordida e vez em quando suspirava. Ao cabo da operação, ele dobrava criteriosamente a embalagem vazia e a depositava na cesta de lixo com carinho. Só aí retomava ao trabalho.

Eu via aquele gordo fazendo isso todas as tardes e pensava: eis um homem que, por um momento, foi completamente feliz.

O PRIMEIRO GOLE

A felicidade é assim. É o Chokito do gordo, é o sorriso do filho, é o primeiro gole no chope gelado, é um gesto de afeto.

Schopenhauer dizia que a felicidade é a ausência de dor. E é. Depois dele, um homem que bebeu dele, Sigmund Freud, disse numa entrevista que não canso de recordar e citar:

“Não permito que nenhuma reflexão filosófica me tire a alegria das coisas simples da vida”.

Aí está. As coisas simples da vida. A hora do dia. O momento.

Esse é o meu recado para os colorados, depois dos 3 a 0 para o Náutico do fim de semana: o que importa a imensidão do futuro, se a felicidade pode ser colhida no balcão de vidro da lancheria?

A vida inteira pode ser mais simples do que um campeonato de futebol.

A dupla em 2013

O que poderá ser aproveitado de 2012 para Grêmio e Inter em 2013? Os dois goleiros são bons. Os quatro laterais nem tanto, mas Júlio César e Fabrício podem resolver os problemas do lado esquerdo.

Zagueiros? Werley é uma afirmação. Moledo ainda não. Índio e Gilberto Silva são ótimos, porém veteranos.

O meio-campo do Grêmio é muito bom, mas não tem reservas, nem meias de penetração. O do Inter também pode ser muito bom, desde que se defina quem vai jogar lá.

No ataque o Inter tem mais recursos – Dagoberto, Damião, Forlán, Cassiano, He Man. Ao Grêmio falta de tudo na frente, apesar dos esforços de Moreno e Kléber.

Olhando assim, o Inter parece mais bem equipado do que o Grêmio para 2013. Então, como explicar 2012?

A dor dos filhos - ELIANE BRUM

REVISTA ÉPOCA

Há um momento mais importante do que a primeira palavra ou o primeiro passo de uma criança: a descoberta do vazio. O que fazemos diante dele é também o que nos torna pais e mães



No livro “Os enamoramentos”, de Javier Marías (Companhia das Letras, 2012), uma das personagens diz:

- Os filhos dão muita alegria e tudo o mais que se costuma dizer, mas também, e isso não se costuma dizer, dão muita pena, permanentemente, o que não creio que mude nem quando forem maiores. Você vê a perplexidade deles diante das coisas, e isso dá pena. Vê a boa vontade deles, quando estão a fim de ajudar e acrescentar algo próprio mas não podem, e isso também dá pena. Dá pena a seriedade deles e dão pena suas brincadeiras elementares e suas mentiras transparentes, dão pena suas desilusões e também suas ilusões, suas expectativas e suas pequenas decepções, sua ingenuidade, sua incompreensão, suas perguntas tão lógicas e até a ocasional má intenção que possam ter. Dá pena pensar quanto lhes falta aprender e no longuíssimo percurso que têm pela frente e que ninguém pode fazer por eles, apesar de estarmos há séculos fazendo e não vejamos a necessidade de que todos os que nascem devam começar outra vez desde o início. Que sentido tem cada um passar pelos mesmos desgostos e descobertas, mais ou menos eternamente?

O fragmento é parte das quatro páginas mais belas deste livro traduzido para o português por Eduardo Brandão. Se você for ler “Os Enamoramentos”, talvez encontre outros momentos de que goste mais. Para mim, o que acontece da página 68 a 71 é, neste livro, o ápice da escritura tão singular de Javier Marías. Não se trata de uma obra sobre o sentimento dos pais diante dos filhos, embora este também seja um “enamoramento”, mas esse pequeno trecho me capturou porque trata de algo que fala aos pais e às mães. E que poucas vezes foi tão bem dito.

Lembro-me do momento exato em que olhei para a minha filha e senti essa dor, que era a dor que eu achava que pudesse ser a dela ou que tinha a certeza de que um dia seria a dela. Tive minha filha aos 15 anos, o que não me deu tempo de esquecer das dores da infância ou da perplexidade da infância, como pode acontecer com aqueles que se tornam pais em idades consideradas mais recomendáveis. Eu me lembrava tanto da dor quanto da perplexidade, e aos 15 anos ainda não tinha feito o luto de nenhuma das duas.

Minha filha tinha uns três ou quatro anos e estava sentada no chão tentando brincar. Eu via o seu esforço e via o seu fracasso. Ou talvez apenas estivesse projetando nela o que sabia que seria seu embate mais ou menos eterno. Mas creio que não, acredito que já era angústia o que havia no seu rostinho redondo, já era perplexidade diante da aridez de alguns dias. Lembro-me de que, naquele momento, as lágrimas pingaram dos meus olhos, como de uma torneira mal fechada. Eu soube ali que jamais poderia tapar aquele buraco, que teria de testemunhar para sempre aquela luta íntima na qual cada um de nós está só. Sempre só. Eu assistia a ela desde já, tão pequena, tão frágil, tão confiante no meu poder ilusório, debatendo-se com a vida. E para sempre diante dela eu pingaria como uma torneira mal fechada. Era um momento silencioso entre nós – e as cartas já estavam dadas muito antes de nós.

Penso que todos os pais que se tornaram pais na modernidade sentem isso – consciente ou inconscientemente. E talvez tornar-se pai e tornar-se mãe se dá também na escolha do que fazer com esse sentimento. Tornar-se pai e mãe porque ser pai e mãe não é algo dado, algo que acontece a partir de um ato biológico, sempre mais explícito para as mulheres do que para os homens. Tampouco basta estar no lugar de pai e de mãe, para além dos laços biológicos. É preciso efetivamente ocupar esse lugar – tornar-se pai e mãe é um processo que não está nem dado nem garantido, exige um contínuo movimento de vir a ser, raramente fácil ou simples.

É conhecida a dificuldade atual de exercer a função paterna e a função materna, porque é mesmo muito mais difícil ocupar um lugar em um mundo movediço, no qual a tradição já não determina o que devemos fazer acima de qualquer questionamento. E aqui não há nenhuma nostalgia das amarras da tradição, embora ela tenha o seu papel, apenas a constatação de que é previsível que nos percamos quando a pergunta de quem somos deixa de ter uma resposta óbvia. Embora tantos pais busquem nos infindáveis manuais as respostas que já não há tradição para dar, talvez esteja na literatura não as respostas, mas a complexidade das perguntas. Por paradoxal que pareça, me parece que tudo fica mais claro quando se complica.

Mas não protegemos nossos filhos deste vazio, não há como protegê-los daquilo que é uma ausência que nos completa. Penso que este é o momento crucial da maternidade e da paternidade. Cada um de nós, que se sabe faltante, diante da falta que grita no filho. Quando me vi diante desse abismo, como a personagem de “Enamoramentos”, ela num momento muito diverso e muito mais limite do que o meu, lembro-me de me sentir envolta em melancolia. Eu soube ali, naquele instante prosaico em que minha pequena filha procurava por algo que talvez não pudesse ser encontrado em nenhum lugar além dela mesma, que eu haveria de conviver com uma falência dali em diante. Minha melancolia não se devia às dificuldades de uma maternidade precoce – mas à certeza de que proteger minha filha era uma missão desde sempre fracassada. E eu sabia porque eu lembrava – e esta talvez seja uma duvidosa vantagem de ser mãe adolescente. É pelo consumo – e aí possivelmente nunca antes como agora – que se tenta tapar esse buraco aberto no peito dos nossos filhos. Um objeto seguido de outro objeto, a ilusão de que algo foi preenchido com duração cada vez mais curta, o desejo pelo produto seguinte cada vez mais imperativo, a frustração sempre abissal entre um e outro. Com alguma imaginação, é possível enxergar um filme de zumbis nas cenas de shopping, pequenos arrastando grandes por corredores iluminados, em busca não de cabeças humanas, mas de mercadorias para triturar com dentes que não estão na boca.

Em outro livro, “Noites Azuis” (Nova Fronteira, 2012), este autobiográfico, Joan Didion descreve lindamente essa condição que só se tornaria clara para ela depois da morte da filha. Ao folhear um diário de Quintana, Joan descobriu que o medo da menina era “cair no vazio”. Em vez de aceitar este medo, conectar-se com ele, escutá-lo, a mãe escritora se pôs a corrigir a gramática. Impotente, mas sem aceitar a impotência, mesmo depois da tragédia, ela eliminou furiosamente as vírgulas em lugar errado no texto da adolescente. Quintana já tinha partido, mas ainda era tudo o que a mãe se sentia capaz de fazer diante do pavor da filha de “cair no vazio”.

Esta mesma menina, muito antes, aos 5 anos, havia ligado para a clínica psiquiátrica mais famosa da região onde a família vivia para fazer uma pergunta devastadora: “O que devo fazer se estiver enlouquecendo”? Durante muitos anos Joan não conseguia compreender por que a filha temia que ela não pudesse protegê-la. Até entender que a pergunta estava errada. A pergunta correta era: “Como ela podia sequer imaginar que algum dia eu poderia tomar conta dela?”

Ao olhar para minha própria filha naquele momento em que eu sabia que a máquina do mundo se abria diante dela para mostrar seu enorme estômago vazio, lembro-me de que, por um momento, pensei em alcançar talvez um outro brinquedo ou lhe oferecer um chocolate (nos anos 80 ainda era possível ser considerada uma boa mãe mesmo dando doces a uma criança pequena, e não uma serial killer nutricional). Mas meu pensamento não virou gesto. Eu sabia que tudo o que eu podia fazer era me manter em silêncio. Que ser mãe, naquele momento, era ser capaz de vê-la debater-se com o vazio, testemunhar o início de seu longo embate vida adentro. E acho que ali, como deve acontecer com os pais e mães que percebem esse momento exato, uma fissura nova se abriu em mim. Esta que para sempre me faria pingar como uma torneira mal fechada.

“Que sentido tem cada um passar pelos mesmos desgostos e descobertas, mais ou menos eternamente?”, pergunta a personagem de “Enamoramentos”, diante da fragilidade dos filhos que, naquele momento, por uma circunstância trágica, lhe era insuportável. E a resposta talvez seja a de que não exista sentido. E exatamente por não existir, só podemos mostrar aos nossos filhos, porque isso é algo que se mostra, não que se diz, que a tarefa de uma vida humana, desde sempre e para sempre, é criar sentido onde não há nenhum. Inventar uma vida é a tarefa que faz de todos nós ficcionistas. E, em geral, uma vida que faz sentido é aquela em que os sentidos são construídos para serem perdidos mais adiante e recriados mais uma vez e sempre outra vez. É o vazio, afinal, que nos faz inventar uma vida humana – e não morrer antes da morte.

É o que fazemos como pais neste momento em que um filho descobre o vazio, um momento mais importante do que a primeira palavra ou o primeiro passo ou o primeiro dente, que também nos torna pais. É preciso aguentar. Saber aguentar e escutar a dor de um filho, sem tentar calar com coisas o que não pode ser calado com coisa alguma, é um ato profundo de amor. Um momento sem palavras em que nosso silêncio diz apenas que a tarefa de criar uma vida que faça sentido é dele, pessoal e intransferível. E tudo o que poderemos fazer é estar mais ou menos por perto, ainda que nada possamos fazer.

E um dia, talvez, receber uma carta/email na qual está escrito: “Mãe: o que eu sempre vi em você era uma pessoa que não desistia do próprio desejo. E que nunca deixou a vida matar a vida”.

Afinal, o que legamos a um filho é o nosso movimento em busca de sentido. E este não pode ser um arrastar-se de zumbi.

Meu rol de amigos - PAULO SANT’ANA

ZERO HORA - 06/11


Não sei se isso acontece com meus leitores, mas comigo é o que ocorre: em levantamento que fiz, a maioria esmagadora das ótimas coisas que aufiro e dos péssimos danos que sofro é por culpa minha, da minha exclusiva responsabilidade.

Por exemplo, uma grande alegria se apossou de mim ontem quando li na página 2 de Zero Hora o resultado do levantamento do nosso call center sobre a preferência dos nossos leitores no fim de semana passado: fiquei em primeiro lugar, com 25,4%, na frente das matérias “Novidades do verão” e “Feriadão de tempo aberto nas praias”. Elas com 16,9% e 15,3%, respectivamente.

Fui eu que consegui esse feito.

Já sobre os danos que sofro, cuidem como são da minha responsabilidade exclusiva: tive câncer na rinofaringe porque fumo. Se não fumasse, não teria adquirido a doença.

Ou seja, os males que me afetam são da minha culpa, são relativos aos meus erros de escolha.

Fui eu quem escolheu as minhas duas mulheres, queria o quê?

Estou tentando trocar ideias com meus leitores e leitoras. Quero chegar à conclusão de que colhemos exatamente o que plantamos.

Entre os meus grandes danos, existe a tontura terrível que sinto e que me tirou a alegria de viver.

Examino atentamente os passos da minha tontura incapacitante e não encontro responsabilidade minha nessa tontura. Ela é fruto das minhas circunstâncias, do meu genoma, da minha vocação fisiológica. Eis aí um grande sofrimento meu sobre o qual não tenho qualquer responsabilidade. Ou pelo menos não a percebo.

Por motivos da minha privacidade, não posso dizer o que me aconteceu recentemente e que me abalou profundamente. Mas foi por culpa exclusiva minha, fui eu que descuidei, fui eu que estava avisado de que aquele meu proceder poderia me levar à catástrofe a que me levou e insisti no erro, é claro que em busca do lazer prazeroso, mas eu rocei o abismo e acabei caindo no despenhadeiro.

O que quero demonstrar, não sei se com acerto, é que quase tudo que nos acontece de bom ou de ruim tem a nossa marca. O acaso, a sorte, o azar, esses são os menos importantes protagonistas do nosso destino, nós somos os maiores responsáveis pelos desígnios da vida que levamos.

A finalidade desta coluna é inculcar nos meus leitores que não tem erro, é bater e valer: aqui se faz e aqui se paga, ou aqui se faz, aqui se recebe.

Porque é bom saber que nós podemos construir os nossos destinos. Não é bem assim, mas eu tenho visto que é bem assim.

E, dentro desse quadro, a melhor visão que tenho, o maior sentimento que nutro é o de que tenho conseguido fazer bastantes amigos nos últimos tempos.

Tenho amigos que me adoram, adoram estar comigo, adoram conversar comigo, adoram me ler, adoram que eu participe de suas dores e alegrias, que eles me põem a par de como elas lhes ocorrem.

Tenho amigos, isso é a minha maior felicidade.

E, agora, ao lerem isso, eles vão perceber nitidamente que estão incluídos neste meu rol.

A antiga nova de Valério - JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SP - 06/11


Marcos Valério está hoje em situação única no Brasil: pode dizer o que quiser, a favor ou contra quem quiser


SÃO DIAS ainda de tardes insípidas. Não que os ministros do Supremo deixassem de tentar salvá-las. Só o tema da tentativa já o comprova. Nada menos sombrio do que o amianto, proíbe ou não proíbe, se envenena ou se civilizou. Como sempre dá para puxar uma divergência, e nisso o ministro Marco Aurélio Mello não falharia. Não faltaram mesmo sinais de irritação. Se ao menos o ministro Gilmar Mendes estivesse em dia de Gilmar Mendes, algo ainda iria adiante. Não, as discussões ficaram foscas como o próprio amianto.

Boas-vindas, pois, ao ministro Joaquim Barbosa. Amanhã as tardes voltam a desprezar limites -verbais, penais, convivenciais, o que importa é o rumo dado pelo relator. Agora com uma expectativa a mais. Espera-se que o ministro relator diga alguma coisa sobre o pedido de Marcos Valério que, é o único dado seguro neste assunto até agora, lhe foi repassado pelo presidente Ayres Britto em setembro. Antes, porém, que o faça, se o fizer, pode-se dizer também alguma coisa a respeito.

Por exemplo, que Marcos Valério está hoje em situação única no Brasil: pode dizer o que quiser, a favor ou contra quem quiser. Encontrará quem o apoie e propague de imediato e quem o negue e acuse. Nas últimas semanas, nem precisou dizer. Bastou-lhe o que o jargão do jornalismo chama de plantar. No caso, até um pouco menos: apenas insinuou ou sugeriu de leve, e como anônimo. A vontade alheia fez o complemento, por ele desejado.

O advogado de Marcos Valério é um dos notáveis da advocacia criminal. Condição que inclui, a par do saber jurídico e da competência técnica, a seriedade pessoal. E o que diz o advogado Marcelo Leonardo sobre o depoimento a que Marcos Valério se propõe, segundo as notícias, em troca da redução ou eliminação de suas condenações? Diz o suficiente para ficar claro que o pedido de delação premiada baseia-se no dito por Marcos Valério nas inquirições, anos atrás, do processo já sob julgamento. Ou seja, matéria já utilizada nas acusações feitas por Joaquim Barbosa.

Com a proposta de prêmio por colaboração, apresentada em setembro, Marcos Valério fez declarações ao Ministério Público, sim. O noticiário diz que aí estão acusações a Lula, dado como chefe do esquema chamado de mensalão, e a denúncia de uma chantagem a propósito do assassinato de Celso Daniel, então prefeito de Santo André. Que veracidade tem isso ou, ao menos, foi isso mesmo que Marcos Valério ofereceu ao Ministério Público? Marcelo Leonardo não se compromete fora do silêncio. Não é difícil admitir que haja dito mais do que se falasse.

A conclusão não se altera, porém. Até agora, não é em novidade alguma, é mesmo nos depoimentos dados lá por 2005, e conhecidos e já integrados ao processo em julgamento, que se baseia a reivindicação de tratamento especial de Marcos Valério.

O ALVO

A descoberta, conforme informação policial, de uma lista de PMs a serem atacados nega a repetida tese do secretário paulista de segurança, Antonio Ferreira Pinto, de aumento da criminalidade em São Paulo por enfrentamento entre bandidos rivais. O ataque é mesmo e só à polícia. Por que, eis a questão.

O comércio exterior carece de dinamismo e inovação - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 06/11


O que mais se destaca na análise do movimento do comércio exterior nos dez primeiros meses deste ano é a pouca mudança, tanto nos bens exportados e importados quanto no destino e origem de exportações e importações. É o quadro da acomodação de um país que não procura oferecer inovação e mantém os mesmos clientes e fornecedores, por falta de dinamismo. A única diferença, de um ano para outro, é que as importações crescem um pouco mais do que as exportações, acentuando o déficit da balança de comércio.

As exportações estão em situação precária, pois dependem muito da venda de produtos básicos, cujo preço é variável e influenciado pelo contexto internacional, e a China é o maior cliente. Neste ano, o resultado mensal variou de um mínimo de US$ 16,1 bilhões a um máximo de US$ 23,2 bilhões. Nosso governo insiste muito sobre os efeitos da crise nos países ricos, mas nos dez primeiros meses do ano nossas exportações para os EUA cresceram 9,6% e diminuíram 8,4% para a União Europeia; 6,1%, para a China; e 20,6%, para a Argentina.

A estrutura de nossas importações ficou ainda mais estável que a de nossas exportações. Bens de capital continuam a participar com 21,9%, mas as matérias-primas e bens intermediários ocupam o maior espaço entre nossas importações, com pouco mais de 45%.

Isso mostra que a nossa indústria importa bens intermediários (num valor de US$ 83,4 bilhões) que poderiam ser produzidos em parte no Brasil, mas, por serem muito mais baratos no exterior, acabam sendo importados. Participam, assim, do processo de desindustrialização que afeta todo o setor manufatureiro e nos coloca praticamente na marginalidade quando se trata de bens de alto conteúdo tecnológico, o que se reflete negativamente nas vendas externas e tende cada vez mais a tornar o Brasil um país exportador de commodities.

Havia a expectativa de que o Brasil rapidamente se tornaria um grande exportador de petróleo. Nesse campo, nossas exportações nos dez primeiros meses foram de US$ 16,4 bilhões e nossas importações, de US$ 10,5 bilhões, mas as de outros combustíveis chegaram a US$ 17,4 bilhões. Portanto, o País continua dependendo da importação.

O crescimento do parque industrial vai depender muito de uma mudança em face dos mercados externos: temos de apresentar inovações e aumentar o conteúdo tecnológico dos bens oferecidos ao exterior, e para isso é imprescindível reduzir os nossos custos.

A distribuição de cargos e o crime de corrupção - VÍCTOR GABRIEL RODRÍGUEZ


Valor Econômico - 06/11


Um jornalista de Brasília certa vez me comentou, acerca da nomeação, pelo então presidente, de um deputado para o Ministério da Agricultura, que o parlamentar indicado lhe haveria confessado não saber sequer como regar uma samambaia. E ocupou o cargo, porque, claro, seu conhecimento técnico importava quase nada diante da magnitude de seu apoio político ao Executivo, o qual passaria a compor. O relato, verdadeiro ou não, me veio à lembrança ao considerar a tese, levantada por alguns, sobre uma certa falta de isonomia no julgamento do mensalão. Pode ser assim enunciada: se todos os partidos que ocuparam o Planalto tradicionalmente adotaram atitudes moralmente condenáveis para garantir a aprovação de seus projetos nas Casas Legislativas, o pagamento em dinheiro para deputados em troca daqueles mesmos votos de sempre não seria algo em essência diverso das outras tradicionais medidas de escambo. Logo, em uma Justiça isonômica, as condenações na Ação Penal nº 470 seriam um desequilíbrio.

É quase inviável abordar o tema sem deixar-se cair nas profundezas das diferenças partidárias, mas pode-se tentar. Fixa-se então a premissa de que todos os nossos presidentes da República, inclusive (ou até em maior medida) os ditadores negociaram cargos nos ministérios ou nas pastas de poder para os representantes das forças aliadas. Em tempos democráticos, com a imprensa livre, a cada reforma de ministério a mídia divulga os motivos meramente políticos que regem as nomeações em busca da mesma simpatia do Congresso. Quando se leva em consideração que os cargos mais disputados são os que manejam maior orçamento, não é difícil suspeitar que a indicação de controle das pastas aos partidos aliados supõe, para ser eufêmico, o uso futuro não muito adequado do orçamento público.

Caso essa premissa seja aceita tal como está, não é tão descabido pensar que o ato final do mensalão - a entrega de dinheiro vivo a deputados - tem a mesma natureza que a tal histórica distribuição de cargos, apenas, por dizer algo, com maior liquidez. Ou em mera antecipação, como se fora uma simples operação de empréstimo bancário. Frente à criminalização do mensalão apenas, sobraria a questão: em que medida o direito penal consegue alcançar todas as ações moralmente condenáveis?

A coincidência entre crime e moral jamais poderá ser exata, dado o intenso conteúdo ideológico desta, a qual, se colocada sob controle direto do Estado, sufoca perigosamente as liberdades. Entretanto, é impossível julgar crimes como a corrupção sem recorrer a elementos da moral vigente, e isso ocorre por imposição da lei. Foi-se o tempo em que os penalistas imaginavam o tipo penal como uma descrição meramente objetiva da conduta, pois hoje se reconhece que vários elementos não tão palpáveis integram essa descrição, alguns com referência direta a valores sociais. Mais concretamente, no delito de corrupção criminaliza-se o recebimento, pelo exercício do cargo, de uma "vantagem indevida". Atribuir significado a essa locução obriga o juiz a consultar a moral vigente, e não uma ética imutável.

Assim é dispensável que se altere a legislação para que se possa entender que um deputado que, sem conhecimento técnico específico para exercer uma pasta, venha a receber um ministério unicamente por contraprestação a seu apoio político, esteja a aceitar uma "vantagem indevida" à causa de seu cargo público, o que caracteriza exatamente a corrupção do artigo 317 do Código Penal. Para tal enquadramento haveria também que abandonar o consenso atual de que tal vantagem deve ser econômica (o que não está na lei), mas nesse sentido surgem dois caminhos: ou simplesmente se alarga a interpretação do vocábulo "vantagem" ou se propõe que o interesse voraz pelo controle de uma pasta alheia a seu domínio técnico indicia o futuro desvio de dinheiro.

Tudo isso para dizer que, em alguns casos, a relação é recíproca: se a moral é o que orienta o legislador para compor as proibições, tipos penais que trazem relação direta com a moralidade e a ética dependem também destas para viger. Talvez seja até um sinal de evolução social se, no futuro, considerar-se o fisiologismo político escancarado como ato criminoso, e para isso é desnecessária alteração legislativa. Assim como não há como defender, hoje, que entregar dinheiro a um deputado para que vote com o governo seja ato tolerável da política, no futuro distante talvez vejamos um urbano ministro da Agricultura denunciado por corrupção, por aceitar o cargo em troca de um favor imoral. Dependerá do espírito dos tempos.

Os 40 anos de prisão de Valério - MARCELO LEONARDO

FOLHA DE SP - 06/11


É errado dizer que Valério foi condenado a 40 anos de prisão. Quatro fatores podem reduzir a pena, entre eles o fato de o réu ter colaborado na investigação



Vem-se divulgando, equivocadamente, com base em informações incompletas, que o STF teria condenado Marcos Valério a 40 anos de prisão, na ação penal 470.

Ocorre que o julgamento, quanto à fixação de penas em relação a ele, não se completou -quatro razões distintas podem modificar significativamente o resultado divulgado.

Primeiro, a votação está incompleta. O ministro Marco Aurélio ainda não votou em relação a duas condenações: corrupção dos partidos da base aliada e evasão de divisas, o que impediu fosse anunciado pela presidência do tribunal o resultado final.

Segundo, pelo menos cinco ministros, durante os dois últimos dias de votações sobre penas, deixaram entrever, em suas manifestações, que o cálculo final de penas de Valério pode ser revisto para baixo caso o STF acolha um pedido da defesa.

O pedido: que as cinco condenações relativas a corrupções e peculatos, enquanto crimes da mesma espécie (crimes contra a administração pública), sejam reunidas numa só aplicação de pena, observadas as regras do crime continuado.

Isto é, que seja imposta a pena do crime mais grave com aumento máximo de dois terços, pois as infrações foram praticadas nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e maneira de execução, sob o mesmo desígnio (desvio de recursos e seu repasse para comprar apoio parlamentar), como já reconheceu o plenário do STF ao julgar o mérito da causa.

Terceiro, ficou, ainda, ressalvada a possibilidade do STF reconhecer que a agravante de ter Marcos Valério exercido papel de liderança ou comando no núcleo publicitário tenha incidência limitada à fixação da pena da quadrilha. O tribunal entendeu que os crimes não foram praticados em concurso de pessoas, excluindo-se sua aplicação em cascata, de forma linear (aumento de um sexto), em todas as penas relativas às oito condenações impostas, o que importaria em redução daquelas provisoriamente estabelecidas.

Quarto, o Supremo não apreciou, também, no cálculo de penas, o pedido formulado por Marcos Valério desde as alegações finais, escritas em setembro do ano passado, no sentido de se reconhecer sua condição de réu colaborador. Ele forneceu, voluntariamente, em julho de 2005, a lista com nomes e valores de todos os beneficiários dos repasses feitos a pedido do Partido dos Trabalhadores para integrantes da base aliada e fornecedores da campanha eleitoral de 2002, acompanhada dos respectivos documentos e recibos. Na mesma época, forneceu também as informações e dados sobre os empréstimos bancários.

Tudo isso possibilitou as investigações da Polícia Federal e viabilizou a denúncia do procurador-geral, que, apesar do exagero dos 40 acusados, não foi além dos nomes e dados fornecidos naquela atitude de colaboração com a Justiça, o que assegura direito à redução de pena.

Por tudo isto, pode se esperar que a pena definitiva a ser imposta a Marcos Valério não será de 40 anos, mas bem diversa e menor, quando o STF concluir a dosimetria, no ajustamento dos cálculos, mesmo se mantidas as elevadas penas-base propostas pelo relator.

A repercussão dos fatos no meio social não interfere na disciplina legal da aplicação das penas segundo o Código Penal, muito menos constitui obstáculo à aplicação das regras invocadas para sua redução, como decidiu o próprio Supremo, no caso da chacina de Vigário Geral, onde se cuidou de criminalidade violenta contra a pessoa.

Todo acusado tem direito a pena justa, consideradas as circunstâncias judiciais e legais na sua fixação, sem agressão aos princípios constitucionais da individualização, da proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana.

O lorde e o mordomo - CARLOS HEITOR CONY

FOLHA DE SP - 06/11


RIO DE JANEIRO - Creio já ter contado por aí, em livro ou em crônica, a história do lorde inglês e seu mordomo, que devia se chamar James, como todo mordomo que se preze. Os dois estavam diante do janelão, olhando a paisagem da verde e querida Inglaterra, quando James, hierático, ao lado da cadeira de rodas onde ficava seu amo e senhor, disse para dizer alguma coisa: "Acho que teremos chuva, my lord".

O lorde continuou olhando a paisagem, mas colocou as coisas em seu devido lugar: "Não, meu caro James. Eu terei a minha chuva. Você terá a sua chuva".

Não sou lorde nem tenho mordomo. Mas tenho minha própria chuva enquanto todos os outros, o papa, o Valério, o Barack Obama, o Joaquim Barbosa, sobretudo todas as mulheres que me conheceram mas que eu não consegui conhecer, toda essa gente tem a sua chuva -eu tenho a minha.

Por mais que lamentasse a tragédia do furacão Sandy e lesse enfastiado as previsões sobre a eleição nos Estados Unidos, por mais solidário com as baleias ameaçadas de extinção e não tenha opinião sobre a dosimetria aplicada pelo STF aos réus do mensalão, tudo isso faz parte da chuva do tal James -um James coletivo, metáfora do inferno que são os outros, de acordo com um dos meus mordomos preferidos, J.P. Sartre.

Embora não seja lorde de porra nenhuma, volta e meia uso uma cadeira de rodas para deslocamentos maiores, problema recente com o maior osso do meu esqueleto: o fêmur.

Não preciso dos verdes campos da Inglaterra para saber se vai chover. Um cadeirante, mesmo provisório, vê o mundo de forma até certo ponto divertida.

Furacão em Nova York, guerra civil na Síria, crise do euro, os novos rumos da MPB são problemas que deixo de bom grado para os James da vida.

Pesadelos - LUIZ GARCIA


O GLOBO - 06/11


O combate ao chamado crime organizado - que costuma ganhar esse adjetivo quando se revela mais diabolicamente eficiente do que os órgãos públicos que devem combatê-lo - é um dos pesadelos das grandes cidades de todos os continentes. No momento, ele tira o sono das autoridades de São Paulo, a ponto de provocar pesadelos também na esfera federal.

Ainda bem. A criminalidade em larga escala - principalmente no estado mais rico do país e que, por isso mesmo, deveria ser o mais eficiente na manutenção da ordem pública - é um problema nacional. Se existe em São Paulo, deve-se considerar, sem qualquer exagero, que estamos diante de um pesadelo para o país inteiro.

Até alguns dias atrás, como não é raro acontecer, autoridades estaduais e federais aparentemente tinham como prioridade jogar a culpa para o outro lado da cerca. Mas a semana terminou com um acesso de bom-senso, justificado pelos números recentes da violência. Desde o começo do ano, 88 policiais militares foram assassinados por bandidos. E o número de cidadãos mortos nos confrontos entre marginais e policiais chegou a quase 80.

Certamente estava mais do que na hora de autoridades federais e estaduais descobrirem que não poderia continuar desorganizado o combate ao crime organizado. A presidente Dilma Rousseff telefonou para o governador Geraldo Alckmin e ofereceu participação federal na guerra aos bandidos.

Antes disso, ocorrera apenas uma troca de versões: o ministro da Justiça disse que desde junho oferecera ajuda federal para enfrentar um esperado agravamento da violência em São Paulo. Curiosamente, não se informou como as autoridades de Brasília sabiam disso e a polícia local nem desconfiava. Mais espantoso ainda, o secretário de Segurança de São Paulo nega ter recebido a oferta de ajuda. Pode ser um simples mal-entendido. Na verdade, um desastroso mal-entendido.

Agora, pouco importa: Brasília e São Paulo finalmente estão falando a mesma língua e já está decidido que bandidões hoje presos no estado serão transferidos para penitenciárias federais. Se isso contribuir para diminuir a violência local, convém que ninguém se esqueça: é óbvio que as prisões estaduais estão precisando de uma limpeza em regra. Pelo menos, para ficarem tão eficientes quanto o chamado - com boas e lamentáveis razões - crime organizado.

O fator Valério - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 06/11


Há realmente um movimento, incipiente ainda, entre os ministros do STF, para reduzir as penas de Marcos Valério e Roberto Jefferson pelo papel que tiveram no processo da Ação Penal 470. Ao dar informações que ajudaram nas investigações, os dois teriam direito a uma benevolência da Corte, embora em nenhum momento do julgamento essa hipótese tenha sido aventada em relação a Valério. Há dúvidas sobre se a lista de receptores do dinheiro desviado dada por Valério foi relevante ou se ele a entregou porque já estava tudo desvendado.

Quanto a Jefferson, o ministro Luiz Fux chegou a defender redução da pena por ter sido ele o denunciante do esquema, sem o qual não teria sido possível o processo. Seu caso é mais fácil, pois suas penas ainda não foram definidas e, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, deve ser punido com menos anos que Valério. Embora seu advogado o considere um "réu colaborador", ainda não há formalização dessa situação, e em nenhum momento o relator Joaquim Barbosa se referiu a essa condição quando definiu as penas para o principal operador do mensalão. Ao contrário, pediu penas duras para Valério, e os ministros o seguiram. Soa estranho que agora decidam reduzir a pena por uma colaboração que não foi levada em conta na sua definição.

A questão mais importante é haver, na Corte, quem queira organizar movimento nesse sentido, pois qualquer ministro pode levantar a hipótese enquanto a dosimetria não chegar ao fim. Embora não tenha nada a ver com as novas versões que Valério teria dado em depoimento ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel, em setembro, a eventual redução de sua pena total, que hoje chega a 40 anos, pode indicar boa vontade do STF em relação a novos julgamentos em que ele será réu.

Outro aspecto que terá que ser avaliado cuidadosamente pelos ministros é a segurança de Valério, que se consideraria ameaçado. Gurgel ontem disse que, pelas informações que tem, não há motivo para dar segurança a ele por enquanto, mas já há ministros que estão entendendo seu pleito de entrar no programa de proteção a testemunhas como "pedido de socorro". Há outros, no entanto, que consideram que tudo não passaria de um golpe do publicitário para se livrar da cadeia, e há indicações de que até o momento não deu garantias de que o que já disse, ou tem a dizer, pode ser apoiado por provas. Na verdade, há uma espécie de queda de braço entre o Ministério Público e a defesa de Valério, cada um tentando saber até onde o outro pode ir.

A questão mais delicada politicamente é a que envolve o ex-presidente Lula, não incluso na Ação Penal 470, mas que é acusado em representação do procurador regional da República Manoel do Socorro Tavares Pastana de crime de responsabilidade por suposta atuação beneficiando o banco BMG no crédito consignado a aposentados e pensionistas do INSS. O juiz Paulo Cezar Lopes, da 13ª Vara Federal, ainda não decidiu se recebe a denúncia. Não há provas que atestem "categoricamente" vínculo entre o suposto auxílio ao BMG e o mensalão, mas a ação tem indícios claros de que o BMG foi beneficiado pela burocracia federal, o que pode indicar favorecimento em troca dos empréstimos, considerados fictícios pelo STF, dados pelo banco ao PT e a Valério.

Relatório do TCU de 29 de setembro de 2005, por exemplo, acusa o BMG de ter sido a instituição financeira cujo processo no INSS ocorreu de forma mais célere. Teriam sido cinco dias entre a publicação do decreto que abria a exploração do crédito consignado para todas as instituições financeiras e a sua manifestação de interesse, e outros oito dias para a celebração do convênio, quando um processo desses leva em média dois meses. Essa agilidade teria permitido, segundo a denúncia, que o BMG fosse a única instituição não pagadora de benefício previdenciário a atuar só no mercado de empréstimos consignados a aposentados e pensionistas por quase dois meses, de agosto a outubro de 2004.

As informações que eventualmente Valério tiver sobre essa questão e outras podem favorecê-lo em processos abertos ou futuros, agora já com a figura da delação premiada, que não pode ser usada para a redução da pena no processo do mensalão.

Dar uma oportunidade à Lei dos Portos - ANTONIO DELFIM NETTO

Valor Econômico - 06/11


Ao longo da primeira década deste século, o Brasil experimentou uma retomada do crescimento econômico em patamares mais próximos dos níveis mundiais. Particularmente, no período de 2006 a 2011, a taxa média anual de crescimento do PIB brasileiro (4,2% ao ano) tem-se mantido ligeiramente superior àquela verificada em nível mundial (3,6% ao ano).

Para isso, é provável ter havido contribuição dos novos marcos regulatórios implantados no Brasil, entre eles a Lei 8.630/93, referida como Lei de Modernização dos Portos.

Contudo, a efetiva maturação do quanto nela preconizado enfrentou dificuldades tanto interna quanto externamente. No front interno, após quase duas décadas de crises econômicas, o planejamento público estratégico resultou negligenciado, com carência de políticas capazes de assegurar um ambiente favorável à ação empreendedora dos agentes econômicos privados, que só agora parece renascer com a Empresa de Planejamento e Logística (EPL). Externamente, tanto parceiros comerciais como concorrentes já vinham preparando-se, muito antes de 1993, para a notável expansão do comércio internacional, em ambiente tutelado pela exigência de crescente competitividade. Mas a grande verdade é que o modelo de gestão portuária nela contemplado ainda carece de implementação completa e eficaz - especialmente no que concerne às funções do poder público.

Debate sobre a ineficiência dos portos está mal informado

Em ambiente concorrencial de excelência e competitividade, o mercado de transporte marítimo e seu irmão siamês, o portuário, tornaram-se crescentemente solicitados. Do primeiro, altamente intensivo em capital, é exigido o emprego de navios cada vez maiores, transitando por rotas comerciais capazes de garantir taxas de ocupação remunerativas. Do segundo, o portuário, também intensivo em capital, exige-se investimentos capazes de habilitar cada porto à operação eficiente e competitiva da moderna frota de navios.

O fato é que os maiores e mais modernos navios porta-contêineres passam ao largo da costa atlântica da América do Sul, por duas principais razões: a) o volume comercial na rota norte-sul de comércio internacional (onde o porto de Santos é o mais importante, na ponta sul) é comparativamente muito inferior ao registrado na rota leste-oeste; e b) a infraestrutura, responsabilidade do setor público, está aquém daquela indispensável à operação dos navios porta-contêineres mais modernos.

O forte aumento da atividade portuária brasileira, na última década, reflete em certa medida uma consolidação do modelo de gestão proposto pela Lei 8.630/93, que preconiza distintas competências para os setores público e privado, respectivamente, na construção, manutenção e operação da infraestrutura portuária do país. No modelo, iniciativa privada e poder público devem atuar complementarmente. Aquela, responsável pela operação portuária propriamente dita, em regime concorrencial. Este, cuidando do planejamento estratégico e regulação, de modo a prover ambiente adequado à livre iniciativa, à simetria de concorrência e, consequentemente, ao resguardo do interesse público.

O espírito contemplado na Lei 8.630/93, se assemelha ao modelo (Land Lord Port) que muito antes já regulava a gestão do porto de Roterdã e, de resto, a de outros portos de excelência no mundo. Enquanto nesses a estrutura de gestão portuária já estava voltada para as necessidades logísticas que a globalização iria impor aos mercados, a partir dos anos 80 do século passado, só em 1993, com a sua promulgação o Brasil iniciou a caminhada para suprir uma logística portuária eficiente e competitiva nos portos da costa nacional - com o arrendamento de áreas portuárias à iniciativa privada e os investimentos modernizadores que daí fluiriam. Entretanto, a falta de planejamento público consistente, de gestão eficiente e uma notória carência de segurança jurídica inibem a continuidade ou a aceleração de investimentos privados - contribuindo para acentuar as diferenças qualitativas entre portos brasileiros e seus congêneres em países mais desenvolvidos.

O modelo Land Lord Port, vigente nos principais portos do mundo, tem como característica fundamental que o Estado forneça a infraestrutura, ficando a iniciativa privada responsável pela superestrutura e pela operação portuária. No Brasil o modelo foi corrompido, diante de uma injustificada - mas notória - incapacidade do Estado para investimentos indispensáveis em infraestrutura. Como consequência, para capitanear uma operação minimamente eficiente, a iniciativa privada viu-se obrigada a investir, também, em infraestrutura.

Em todo sistema econômico organizado, os portos são instrumentos de política pública. Ao Estado cabe tudo - planejamento estratégico, zoneamento, localização e finalidade, metas, segurança, regulação etc. -, exceto a operação dos terminais, transferida à iniciativa privada. A preocupação não deve ser revogar ou modificar a Lei 8.630/93, para desfigurar o desenho original nela proposto, que é adotado com sucesso nos portos internacionais de primeira linha. O debate atual sobre a ineficiência dos portos está muito mal informado. Não se trata de "inventar" um novo modelo ou, mais trágico, "repetir" o velho. É mais razoável e mais eficiente atacar os problemas que até agora se opõem à apropriada implementação da lei.

A nova corrida no PT - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE  - 06/11

A entrega da Ordem do Mérito Cultural ontem no Palácio do Planalto foi muito além de uma simples solenidade a reunir artistas com a presidente Dilma Rousseff; o presidente do Senado, José Sarney; e os ministros da Cultura, Marta Suplicy; e da Educação, Aloizio Mercadante. Nos bastidores, era visível a movimentação de dois futuros candidatos a governador de São Paulo. Marta, no papel de coanfitriã, sentou-se ao lado de Sarney. A Mercadante coube o lugar ao lado da presidente Dilma.

Alguns convidados notaram um certo clima político, sem entender muito bem a presença de Mercadante. Mas ele integra o conselho nacional de Cultura. Na solenidade, entretanto, ficou longe de ter um papel de mero ator coadjunte. Até porque, tão logo a presidente terminou sua fala, dando por encerrada a cerimônia, Mercadante foi cercado por uma profusão de jornalistas interessados em repercutir o andamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O ministro, há muito tempo, não se mostrava tão efusivo com o sucesso da prova: “4 milhões e 175 mil pessoas vão receber a redação de volta”, disse, feliz da vida, prestes a juntar mais um “nunca antes na história desse país…”.

Ao grupo que o cercava, Mercadante contou as histórias da prova recolhida no calor do momento, do menino que seria preso e que ele, enquanto ministro, determinou que o aluno só seria detido depois do exame. Falou ainda da moça grávida de um acampamento sem terra que ele fez questão de localizar a mãe para garantir o direito da aluna realizar a prova daqui a um mês. Não deixou, claro de mencionar aqueles que fotografaram as provas, algo que é proibido pelo regulamento.

Ele retornará ao Planalto ainda esta semana para lançar o pacto pela alfabetização na idade certa, um projeto ambicioso que envolverá 5,3 mil municípios brasileiros no sentido de baixar as tristes estatísticas do país, em que estados do Norte e do Nordeste chegam a ter 35% das crianças até 8 anos sem saber ler ou escrever. No Nordeste, a média é de 28%.

Atrás do bolo em que se encontrava Mercadante, outro grupo cercava a ministra Marta Suplicy (uma das “adversárias” na corrida pelo governo paulista), que alguns apostavam que brilharia sozinha na solenidade de ontem. Se Mercadante tem agora o sucesso do Enem como marca de seu primeiro ano no cargo, Marta prepara o vale-cultura, um projeto ao qual deseja se dedicar “com calma”, ainda sem data para lançamento. “Não faremos nada de forma atabalhoada.” Sobre a presença de Mercadante, ela foi direta: “Bem… Ele integra o conselho”.

Enquanto isso, do outro lado da Esplanada…

Outro que silenciosamente vai construindo seu espaço na política paulista é o ministro da Saúde, Alexandre Padilha. No ano passado, quando das filiações partidárias para os candidatos às eleições de 2012, o Correio fez uma reportagem sobre as andanças dele pelo interior do estado, marcando presença. Padilha tem uma vantagem sobre os demais. É “novidade” dentro do PT. Mas, no momento, Marta, a grande apoiadora de Fernando Haddad, tem mais pontos perante Lula. E Mercadante hoje é um dos ministros mais queridos da presidente Dilma.

Nada disso, entretanto, terá valor eleitoral para disputar o governo do estado se logo ali na frente Lula preferir colocar para enfrentar o governador Geraldo Alckmin, do PSDB, alguém do coração do ABC. Nome, o ex-presidente já tem. Luiz Marinho, prefeito de São Bernardo (SP), reeleito no primeiro turno. Marinho é um dos melhores amigos de Lula e há quem diga que a ideia de Lula é fazer dele candidato a governador. Mas, como esse jogo ainda está em movimento, a fase é de aquecimento global, ou seja, ninguém está completamente fora da partida.

Por falar em partida…

Chamou a atenção a presença de artistas nordestinos. O pernambucano Alceu Valença, a paraibana Elba Ramalho e, ainda, a orquestra popular Bomba do Hemetério, do Maestro Forró, famosa no Recife, que colheu seu nome num dos bairros da cidade. A alguns senadores atentos, soou como se a presidente estivesse, assim, começando a pescar na praia do governador Eduardo Campos, do PSB, citado atualmente como um possível pré-candidato contra o PT em 2014. Daqui para frente, leitor, não se engane: essa corrida aos nordestinos e a da vaga pelo direito de concorrer ao governo de São Paulo terá a cada dia um circuito. Ontem, foi o do mérito cultural. Outros virão.

TODOS DANÇAM - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 06/11

Sérgio Ignácio e Rubens Oliveira criaram e dirigem o espetáculo de dança "Carretel", que será apresentado até amanhã no Tuca, às 21h.
O projeto reúne no palco 33 pessoas, com idade entre 20 e 62 anos. Muitas delas sem formação em dança. A coreografia foi baseada em um caso descrito por Sigmund Freud, em que a criança brincava com um carretel de linha quando sentia saudade de sua mãe.

EM NOME DE DEUS
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) instalará um grupo de trabalho só para investigar a atuação das igrejas católica e evangélica no período da ditadura. Serão apurados não apenas o papel de religiosos na resistência à repressão e proteção a vítimas como também o daqueles que colaboraram com os militares.

RETIRO FORÇADO
O grupo se reúne pela primeira vez nessa quinta. E um dos primeiros a prestar depoimento deve ser Anivaldo Padilha. Evangélico, ele foi delatado por pastores da igreja que frequentava. Foi preso, torturado e partiu para o exílio. Sua mulher estava grávida de Alexandre Padilha, hoje ministro da Saúde -que só conheceu o pai quando tinha oito anos.

EQUIPE
As apurações do capítulo religioso serão coordenadas por Paulo Sérgio Pinheiro, um dos integrantes da CNV. Pesquisadores autônomos e teólogos foram convidados a participar dos trabalhos.

CANETA JUSTA
Caso os vereadores aprovem até dezembro o fim da cobrança da taxa da Controlar, o prefeito Gilberto Kassab (PSD-SP) pode até vetar a lei. Isso evitaria que Fernando Haddad (PT-SP) começasse o ano já com uma perda de receita da ordem de R$ 200 milhões. Kassab só teria uma exigência a fazer: que ficasse claro que estará barrando a lei a pedido do PT.

CANETA JUSTA 2
Para Haddad será difícil assumir tal pedido: ele passou a campanha prometendo acabar com a taxa.

SÓ NO SAPATINHO
Marieta Severo passou por sufoco na cerimônia da Ordem do Mérito Cultural, com a qual foi agraciada, ontem. O salto de seu sapato quebrou -e ela teve que se equilibrar na ponta do pé.

DILMA, TE AMO
O vereador Agnaldo Timóteo (PR), que não se reelegeu, diz que inscreverá projeto na Lei Rouanet: o show do CD "A Força da Mulher". "Gravei em homenagem a Dilma, com 14 músicas com nomes de mulheres."

VIROU MANCHETE
A Cátedra de Jornalismo Octavio Frias de Oliveira do Fiam-Faam Centro Universitário promove hoje palestra do jornalista Arnaldo Niskier. Ele falará sobre a história das Empresas Bloch. Na ocasião, também autografará o livro "Memórias de Um Sobrevivente", no qual relata os 37 anos em que trabalhou no grupo e o convívio que teve com os responsáveis pela revista "Manchete". Será às 19h, no auditório Ulysses Guimarães, na avenida Liberdade, 899.

CASAMENTO À VISTA
O lutador de MMA Rogério Minotouro comprou um anel de brilhante para a namorada, a modelo Aline Zermiani, no sábado, na joalheria Tiffany do shopping Iguatemi de São Paulo.

GALERIA PARTICULAR
A maioria dos convidados da festa de aniversário que Bia Antony, mulher de Ronaldo, deu no sábado, em SP (fotos ao lado), fotografava o grafite feito pela dupla Osgemeos em uma das fachadas da casa.

RITMISTA
A aniversariante, que tocou tamborim junto com os músicos, ganhou o instrumento de presente do cantor Pretinho da Serrinha. A roda de samba contou com Mano Brown, Seu Jorge e Mariana Aydar, entre outros.

BLACK POWER
Os shows em comemoração do Dia da Consciência Negra em SP acontecerão no parque da Juventude.

Entre as apresentações marcadas para o próximo dia 20 está a da cantora Fabiana Cozza com a velha guarda da Camisa Verde e Branco.

SONHO COLORIDO

A fotógrafa Claudia Andujar lançou neste fim de semana a instalação "Sonho Verde Azulado", em que obras suas são projetadas em paredes. O escritor Ignácio de Loyola Brandão, a produtora Luciana Farias e a stylist Chiara Gadaleta foram à festa de abertura, no prédio dos Correios.

FESTA TAMANHO RONALDO
Bia Antony, mulher do ex-jogador Ronaldo Nazário, comemorou aniversário em sua casa, nos Jardins. A produtora Paula Lavigne, o casal de grafiteiros Otávio e Nina Pandolfo, o jornalista Gustavo Antony e o apresentador Gominho foram dar os parabéns, no sábado.

CURTO-CIRCUITO

A Daslu apresenta coleção de alto verão, hoje, às 18h, com desfile no shopping Cidade Jardim.

O chef Alberto Landgraff recebe hoje o colega americano Sean Brock para jantar do evento Semana Mesa SP, no Epice.

A artista Cristina Sá inaugura exposição, hoje, às 17h, na KCase.

Prata da casa - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 06/11

O PP de Paulo Maluf fez chegar ao QG de transição de Fernando Haddad que deseja indicar o presidente da Cohab, executora da política habitacional paulistana. A companhia é vinculada à Secretaria de Habitação, cobiçada pelo grupo do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), refratário à ingerência de Maluf. A explicação "técnica" para o pleito é que é natural que o PP assuma área com "sinergia" com o Ministério das Cidades, pilotado pela sigla, que gere o Minha Casa, Minha Vida.

Reintegração Aqueles que advogam outro destino para os aliados de Maluf lembram a dificuldade de cumprir a promessa de Haddad de entregar 55 mil moradias em sua gestão. "Esse desafio exige uma equipe afinada, sem ruídos", diz um petista.

Condomínio A inclusão da Cohab na lista de desejos de Maluf guarda coerência com a participação do deputado no governo Geraldo Alckmin, onde um afilhado seu comanda a CDHU -em conflito constante com tucanos da Secretaria de Habitação.

Solitária 1 Entre as propostas de cooperação contra o crime organizado que serão discutidas hoje entre Alckmin e o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) a que mais interessa ao governo paulista é a transferência de presos envolvidos em assassinatos de PMs e agentes penitenciários.

Solitária 2 O destino ideal, pelo entendimento do Bandeirantes, seria a penitenciária de Mossoró (RN).

Vista... Preocupado em vitaminar seu PSD no interior paulista para 2014, Gilberto Kassab reúne os 34 prefeitos que a sigla elegeu no Estado em almoço no sábado, no Terraço Itália.

... panorâmica À ocasião, os reeleitos Marco Bertaiolli (Mogi das Cruzes) e Dárcy Vera (Ribeirão Preto) anunciarão a criação de um banco de projetos bem-sucedidos em seus governos a ser compartilhado com os novos gestores da legenda.

Vestibular Antes da sabatina na Assembleia para a vaga de conselheiro do TCE-SP, prevista para amanhã, Sidney Beraldo, chefe da Casa Civil de Alckmin, enfrenta teste hoje: será inquirido pela bancada do PT.

À moda... Dilma Rousseff vai assoprar as velinhas de seus 65 anos no gélido fim de outono russo, com a possível presença da filha, Paula. A presidente estará em Moscou no dia 14 de dezembro.

... russa Ela se reunirá com Vladimir Putin e levará, a tiracolo, comitiva de empresários organizada pela CNI. Ainda não está definido se haverá espaço na agenda para uma festa discreta.

Boleira Também em dezembro, a presidente inicia uma série de eventos ligados à Copa das Confederações, que acontece em 2013. No dia 1º, participa do sorteio dos grupos da competição e, antes do fim do ano, pretende inaugurar duas arenas: o Mineirão, em Belo Horizonte, e o Castelão, em Fortaleza.

Certeza É tido como certo, no Planalto, que Lula será alvo de investigação assim que o julgamento do mensalão for encerrado, devido às novas declarações de Marcos Valério. Como o ex-presidente não tem foro privilegiado, qualquer promotor pode pedir abertura de inquérito. Nesse caso, cabe à Advocacia Geral da União defendê-lo.

Toga justa Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa, atual e futuro presidentes do STF, participam hoje do maior evento do CNJ, o Encontro Nacional do Judiciário, em Aracaju (SE). Também hoje, a presidente do TSE, Cármen Lúcia, convocou os representantes dos TREs para uma reunião em Brasília.

com FÁBIO ZAMBELI e BRENO COSTA

tiroteio

"Com essas dicas, Aécio pode se candidatar à próxima edição do 'Big Brother', mas para ser presidente é preciso falar aos pobres."

DO DEPUTADO ANDRÉ VARGAS (PT-PR), sobre FHC ter aconselhado o senador e presidenciável tucano a se aproximar de empresários, artistas e celebridades.

contraponto

Cada um com seus problemas

Terminada a coletiva de imprensa sobre o Enem na sexta-feira, véspera da prova, cinegrafistas pediram ao ministro Aloizio Mercadante (Educação) para fazer um resumo do que foi dito, para os canais de televisão.

-Vamos gravar? -, questionou um deles, apressado.

-Eu estou fazendo o que aqui até agora? -, se surpreendeu o ministro, que já falava havia uma hora.

Ao notar que passava das 13h, Mercadante brincou:

-Ah, entendi. A turma do MEC vai trabalhar aqui o dia inteiro no feriado, mas ele quer comer uma feijoada...

Os demais cinegrafistas riram, sem graça.

O STF e o crime de lavagem - FÁBIO TOFIC SIMANTOB


O ESTADÃO - 06/11


O Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Penal 470, examinou com profundidade um dos temas de maior polêmica: a extensão do crime de lavagem de dinheiro. A Lei de Lavagem, que está em vigor no Brasil desde 1998, sofreu alteração no último mês de julho, mas há um princípio sagrado no Direito Penal, o princípio da anterioridade, que proíbe a utilização de lei nova para fatos anteriores a ela. Assim, apesar de a nova lei ter entrado em vigor antes do começo do julgamento, o STF julgou o caso à luz da lei antiga.

Entretanto, a única modificação substancial é que na lei de 1998 só o lucro de pouquíssimos crimes podia configurar lavagem, ao passo que agora não há mais nenhuma distinção quanto a isso, de modo que até o lucro da contravenção penal poderá configurar lavagem. Essa é, aliás, uma das maiores polêmicas surgidas com a nova lei, pois em alguns casos a conduta acessória (a lavagem) é punida com mais rigor do que a principal (no caso da contravenção).

Agora, o que já causava polêmica na lei antiga e não foi solucionado pelo legislador de 2012 é a enorme amplitude e obscuridade do tipo penal: "Ocultar ou dissimular origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal". Por sinal, lendo-o, tem-se a impressão de que a lei penal vem sendo redigida só para juristas entenderem. Neste caso, ainda pior, porque, ao que tudo indica, nem os juristas parecem entendê-la.

Feuerbach, considerado o pai do princípio da legalidade, concebia-o como um instrumento de coação psicológica, e não como ideia - mais aceita hoje - de garantia da liberdade do cidadão. Todavia, ainda que Feuerbach estivesse correto, quem se sentirá coagido psicologicamente por um tipo penal que não pode compreender? Poderão dizer que o STF terá arrumado uma forma de acomodar melhor o entendimento sobre o crime. Então, o que nos protege não é mais a lei, mas a vontade do funcionário público incumbido da função de julgar. E todos nós sabemos que a vontade do julgador pode mudar ao sabor dos ventos.

Só para lembrar, em Cuba é crime "subverter, de qualquer modo, a revolução". O que é subverter? O que é "de qualquer modo"? O que é a revolução? Tudo isso fica a cargo do intérprete e, então, quem garante a liberdade das pessoas não é mais a lei, mas o agente estatal ocasionalmente investido no cargo.

Veja-se que, com estas críticas, não se está advogando a desnecessidade de uma Lei de Lavagem de Dinheiro. O problema não é tanto se devemos ou não incriminar, mas como incriminar. Porque é no como que costumam ocorrer os abusos do poder punitivo. Tipos penais amplos são próprios de Estados totalitários.

Fenomenologicamente falando, há certo consenso entre estudiosos de que a lavagem de dinheiro é o processo destinado a conferir aparência de licitude a bens ou valores obtidos com a prática de crime. Ora, e por que, então, a lei não diz simplesmente isso, em vez de optar pela indecifrável fórmula "ocultar ou dissimular a origem, localização, disposição..."?

Dirão alguns que essa aparente distorção se deve ao fato de que a lei não pune apenas o fenômeno em si, mas também as várias etapas do processo de lavagem. Desse modo, a ocultação ou dissimulação da origem, propriedade, disposição seriam punidas como etapa do processo de lavagem, já que para converter o dinheiro em ativo lícito o criminoso precisaria primeiro escondê-lo.

Mas como é possível olhar para a ocultação de um bem ou valor e profetizar que aquilo visaria à sua posterior reinserção na economia com aparência de licitude, sendo, portanto, etapa da lavagem? Só mesmo de forma especulativa poderíamos dizê-lo.

Os pontos cegos, contudo, não param por aí. Como separar a natural ocultação do bem obtido com o crime de algo maior, que é a lavagem? Para tal seria necessária, pelo menos, uma ruptura temporal entre o recebimento do valor e uma nova conduta, repleta de novos e próprios significados. Assim, quando o STF condena por lavagem o réu que usou de dissimulação para receber o valor ilícito, inaugura uma nova figura, inédita na doutrina internacional, a da lavagem precoce, praticada antes mesmo de terminado o crime principal.

Seja como for, os verbos ocultar e dissimular dizem muito pouco - ou dizem demais -, até mesmo porque é próprio das atividades econômicas, ilícitas ou não, a extrema discrição nas transações financeiras (fato lembrado por vários ministros do Supremo), assim como os predicativos "origem, localização, movimentação, disposição, propriedade, direitos ou valores" esgotam uma gama tão grande de situações que fica difícil saber não "o que é lavagem", mas "o que não é lavagem".

Será que qualquer transação monetária envolvendo dinheiro proveniente de um ilícito configura lavagem? Isso pode, num primeiro momento, parecer justo, porque as pessoas tendem a projetar a hipótese no outro, jamais em si mesmas. Mas quando paramos para pensar que pelo simples fato de alguém prestar um serviço lícito e receber por ele - caso o cliente seja suspeito de enriquecer ilicitamente - poderá ser enquadrado no tipo penal, a situação começa a ficar mais preocupante.

Será, por exemplo, que o dono do restaurante deverá recusar-se a servir refeição ao suspeito de um crime? O hotel deverá recusar a sua hospedagem? A escola deverá expulsar os filhos desse sujeito, para não correr o risco de responder por lavagem de dinheiro? E se o sujeito for inocentado depois? Quem resgatará, ademais, a dignidade das crianças?

Todas essas dúvidas mostram que, no frigir dos ovos, quem sai com a imagem arranhada desse julgamento, além, é claro, dos acusados, é a própria Lei de Lavagem, de tal modo que, muito embora uma nova redação tenha acabado de entrar em vigor, nasce já no momento de se pensar outro diploma para substituí-la.

Pressão em Zarattini - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 06/11

O Planalto pressiona o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) a mexer no parecer sobre os royalties, separando texto e tabela de divisão dos recursos das áreas já licitadas e dos royalties futuros. Justifica que votar os dois temas separados é a única forma de sancionar o projeto, garantindo a realização dos leilões, mesmo que o Rio entre na Justiça pelos royalties dos blocos já concedidos.

Cargo na jogada
Para o deputado Carlos Zarattini (PT-SP) mudar seu relatório sobre os royalties, incluindo o que quer o governo, está sendo negociada sua volta à Secretaria de Transportes de São Paulo, cargo que ocupou na gestão de Marta Suplicy.

“O governo isenta automóveis de impostos e não isenta remédios. Isso é a corrupção das prioridades”
José Antônio Reguffe Deputado (PDT-DF)

Balanço da Copa empaca
O governo adiou o lançamento do balanço das obras da Copa, que estava previsto para outubro, porque as obras de mobilidade urbana estão muito atrasadas. Dos R$ 11,8 bilhões previstos, os estados-sedes contrataram até agora, faltando apenas um ano e meio para a realização do evento, menos de 5% dos recursos, um total de R$ 542 milhões. Segundo a CGU (Controladoria Geral da União), três estados não contrataram absolutamente nada de obras de mobilidade: Manaus, que tem previsto R$ 1,8 bilhão; Brasília, com orçamento estimado em R$ 103 milhões; e Natal, com R$ 440 milhões aprovados e nada contratado e executado até agora. O balanço deve acontecer este mês, mas não há data definida.

Firme e forte
O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), deve permanecer no cargo em 2013 por falta de interessados. Quanto à ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais), que esteve na corda bamba, fortaleceu-se no período eleitoral. Despachou com a presidente Dilma uma média de quatro horas por dia.

PSD recua e apoiará PMDB
A pedido do presidente do PSD e prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, a bancada pessedista desembarcou da candidatura do deputado Júlio Delgado (PSB-MG) a presidente da Câmara e anunciará semana que vem apoio ao deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).

CPI adiou trabalhos para nada
A CPI do Caso Cachoeira prorrogou seus trabalhos por 45 dias, mas, na prática, para nada. Esta semana e na próxima não ocorrerá qualquer reunião da comissão. Não há previsão de novos depoimentos nem de envio de novos dados. Espera-se apenas a leitura do relatório do deputado Odair Cunha (PT-MG), que está sendo finalizado e já tem mais de duas mil páginas.

Todos querem
O secretário-executivo do MEC, José Henrique Paim Filho, está sendo alvo de disputa entre a presidente Dilma e o prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad (PT). Dilma quer mantê-lo no cargo, e Haddad quer levá-lo para o secretariado.

Bermuda-fantasma
A presidente do TSE, Cármen Lúcia, exonerou um servidor flagrado pelo circuito interno de câmeras indo ao tribunal no fim de semana, vestindo bermuda, só para registrar o ponto. O tribunal estava fazendo hora extra nas eleições.

MP do Setor Elétrico está motivando reuniões entre Planalto, Petrobras e Ministério de Minas e Energia. Querem impedir aprovação de emendas.

A democracia americana - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 06/11


SÃO PAULO - Os EUA vão hoje às urnas e alguns analistas mencionam a possibilidade de um candidato ser escolhido presidente mesmo sem obter a maioria dos votos populares. Essa distorção seria uma cortesia do colégio eleitoral, o sistema indireto de votação estabelecido pelos fundadores do país há mais de 200 anos e hoje considerado obsoleto e até antidemocrático.

Concordo com a avaliação, mas, antes de cravar que os "founding fathers" erraram, convém perscrutar melhor o que tinham em mente. "O modo de escolha do magistrado-chefe [presidente] é praticamente a única parte do sistema [constitucional] que escapou de censuras [...]. Não hesito em afirmar que, se a maneira não é perfeita, é pelo menos excelente". Essas palavras foram escritas em 1788 por Alexander Hamilton.

Por paradoxal que pareça, os autores da mais longeva Constituição democrática do mundo faziam parte daquela categoria de democratas aristocráticos que tem horror a povo. Hamilton diz temer a possibilidade de "tumulto e desordem" num pleito direto e proclama que o sistema foi desenhado para evitar dar força aos demagogos, que ele descreve como "talentos para a baixa intriga e as pequenas artes da popularidade". Elbridge Gerry foi ainda mais explícito, citando a "ignorância do povo".

Se há um conceito que se sobressai na democracia norte-americana, é o dos "checks and balances" (freios e contrapesos), a noção de que ninguém, nem mesmo a população, pode deter poderes absolutos e que a todo poder concedido corresponderá também um controle externo.

Com o benefício da visão de retrospecto, podemos dizer que os "founding fathers", muito embora tenham feito lambança com o sistema eleitoral, acertaram na orientação geral. A profusão de "checks and balances" é um dos principais motivos pelos quais a democracia dos EUA vem funcionando razoavelmente bem e sem interrupção há dois séculos.

O difícil prognóstico da eleição nos EUA - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 06/11


A véspera da eleição foi um dia frenético. Ambos os candidatos estiveram em Ohio, com 18 votos no Colégio Eleitoral e decisivo para a vitória. É um dos “estados volúveis”, sem clara inclinação democrata ou republicana. À cata dos indecisos, e também para convencer eleitores a interromper sua rotina para votar (o que não é obrigatório nos EUA), o presidente Obama esteve também em Wisconsin e Iowa, antes de seguir para sua base — Chicago. O ex-governador Romney foi a Virgínia, Flórida e New Hampshire, rumando depois para Boston.

Fim da campanha. A tensão é imensa; o prognóstico, temerário. Das duas últimas (e finais) pesquisas, a da NBC/Wall Street Journal apontou 48% para Obama, 47% para Romney — empate. A do Pew Research atribuiu 48% ao presidente e 45% ao republicano (margem de erro de 2,55 pontos). Democratas torcem para que ela reflita tendência admitida mesmo por alguns republicanos, como Karl Rove, um dos principais assessores de George W. Bush: a de que o furacão Sandy tenha bloqueado o crescimento de Romney e favorecido Obama, ao mostrá-lo no comando da ajuda aos estados mais atingidos: 69% dos americanos o aprovaram.

O presidente, que teve apoio de mais um grande jornal — o britânico “Financial Times” — tem bagagem para mostrar ao eleitorado: a reforma do sistema de saúde, incluindo 30 milhões de americanos no seguro saúde, feito comparável à criação do Medicaid e do Medicare há mais de 45 anos; gasto de US$ 787 bilhões em dinheiro público como estímulo para evitar uma nova Grande Depressão, o que conseguiu; bilhões para salvar a indústria automobilística e centenas de milhares de empregos, com sucesso; a mais abrangente reforma das leis que regem Wall Street, depois que a crise de 2008 evidenciou que as políticas de desregulamentação implementadas pelos republicanos desde Ronald Reagan (sem excluir Clinton) levaram o capitalismo a um ponto explosivo.

Mas Obama falhou ao não conseguir convencer os americanos da importância dessas realizações e não se manteve à altura da esperança por ele mesmo criada em 2008, mostrando-se um presidente excessivamente formal e distante, parecendo mesmo confiar em sua suposta superioridade. Só foi acordar no primeiro debate com o ágil Romney, que o surrou.

O republicano, apesar de notórias fragilidades, tem armas de grande poder eleitoral: os ainda numerosos pontos fracos da recuperação econômica, que ele destaca, ao mesmo tempo que se diz instrumento da mudança, o que pode pegar muitos eleitores pelo bolso; e um mantra cheio de apelo para o americano médio: “Você acredita numa sociedade centrada no governo, que dá mais e mais benefícios? Ou numa sociedade empreendedora em que as pessoas possam alcançar seus sonhos?” A palavra final caberá às urnas. E/ou ao Colégio Eleitoral.

Leia mais sobre esse assunto em

''Refis da Crise'', de novo? - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 06/11


Se chegou a ser montada, fracassou inteiramente a estratégia do governo para barrar, na Câmara dos Deputados, a emenda que permite a reabertura do prazo para os contribuintes aderirem ao mais recente plano de renegociação de dívidas tributárias em condições excepcionais, conhecido como "Refis da Crise". Na primeira votação em plenário na volta dos deputados a Brasília depois das eleições municipais, a Câmara, contrariando a orientação do governo à sua base, aprovou o projeto de conversão da Medida Provisória (MP) n.º 574, que, entre outras providências, dá novo prazo para contribuintes em atraso aderirem ao programa especial de renegociação da dívida.

Originalmente, a MP 574 estabelecia medidas para estimular os governos estaduais e do Distrito Federal e as prefeituras, bem como suas autarquias e fundações, a regularizar os recolhimentos relativos ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep). Por meio de uma emenda habilmente inserida pelo deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), e aprovada pela Câmara, o projeto de conversão estende de 28 de setembro de 2012 para 31 de janeiro de 2013 o prazo para os contribuintes em atraso aderirem ao chamado "Refis da Crise".

Esse programa foi instituído em caráter excepcional por meio de uma medida provisória, posteriormente convertida na Lei 11.941, de 2009, e permitiu o parcelamento das dívidas tributárias, com o objetivo de dar fôlego financeiro às empresas afetadas pela crise internacional iniciada no ano anterior. Na época, as dívidas vencidas até 30 de novembro de 2008 puderam ser parceladas em até 180 meses.

Como noticiou o Estado, a presidente Dilma Rousseff havia instruído a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, responsável pela articulação do governo no Congresso, a evitar a aprovação da emenda de Mabel, pois o governo não aceitaria a reabertura do programa de renegociação de dívidas tributárias.

Depois de vários planos como o "Refis da Crise", criados pelo governo Lula para que contribuintes em atraso renegociassem seus débitos em condições altamente vantajosas, o governo Dilma deu sinais de não querer repetir essa prática. Ela distorce a competição e pune os contribuintes que a duras penas recolheram pontualmente todos os tributos devidos, pois assegura aos maus pagadores grandes vantagens sobre aqueles que quitam seus compromissos em dia.

Sucessivos programas de renegociação da dívida tributária acabaram dando aos maus contribuintes a certeza de que não pagar impostos é vantajoso, pois, de tempos em tempos, um novo programa permite renegociar o débito com descontos de juros e multas, entre outros benefícios, e regularizar sua situação perante o Fisco. Na prática, logo após a regularização de sua situação fiscal, a maior parte dos contribuintes que aderem a esses programas deixa de pagar as parcelas da dívida renegociada. No caso do "Refis da Crise", dos 577 mil que aderiram a ele, 365 mil já o haviam abandonado em julho deste ano.

Alegando que a desistência se deveu em boa medida à desaceleração da economia, empresários e parlamentares vinham insistindo na reabertura do "Refis da Crise". Há projetos nesse sentido tramitando na Câmara e no Senado. O deputado Sandro Mabel foi habilidoso ao permitir a reabertura do prazo para a adesão ao programa por meio de uma emenda que está no meio de um artigo importante da MP original, o que dificulta a operação para barrar seus efeitos. A presidente não poderá vetar o artigo, pois isso retiraria do texto original uma de suas principais finalidades.

Talvez por isso o líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia, mesmo criticando duramente a emenda de Mabel - "estamos sangrando os cofres públicos para socorrer os maus pagadores", disse -, tenha evitado falar em veto. O governo conta com a possibilidade de derrubar a emenda no Senado, onde a MP terá de ser votada até a próxima sexta-feira, para não perder a validade. Mas, para isso, sua base terá de atuar de maneira mais competente do que na Câmara.