segunda-feira, julho 23, 2012

Chantagem na reta final - REVISTA VEJA

REVISTA VEJA


Às vésperas do julgamento do mensalão, o empresário Marcos Valério ameaça de novo revelar detalhes de encontros secretos que teria mantido com o então presidente Lula antes do escândalo

Rodrigo Rangel


Pouca gente tem mais intimidade com o ex-presidente Lula do que o ex- metalúrgico Paulo Okamotto. Além de amigo pessoal, ele sempre atuou como uma espécie de assessor de luxo do ex-presidente, principalmente em assuntos que envolvem dinheiro. No Sindicato dos Metalúrgicos de São Ber­nardo, Lula foi presidente e Okamotto, diretor de finanças. Na primeira campa­nha presidencial disputada pelo petista,em 1989, Okamotto era o tesoureiro. Essa relação de confiança ganhou outra conotação quando se soube, durante o escândalo do mensalão, que Okamotto pagara do próprio bolso uma dívida do presidente. A operação levantou uma série de dúvidas, principalmente por­que a dívida foi saldada em dinheiro vivo e não havia registro algum do responsável pela quitação. Coube ao pró­prio Paulo Okamotto esclarecer o mis­tério: ele tinha em mãos uma procura­ção do presidente que lhe dava poderes para atuar em seu nome, O polivalente Okamotto anda às voltas com uma missão político-financeira muito mais complicada: foi encarregado de manter sob controle — e acima de tudo em si­lêncio — o empresário Marcos Valério. Às vésperas do julgamento do mensa­lão no Supremo Tribunal Federal, Valé­rio está chantageando o ex-presidente Lula e o PT.

Denunciado pelo procurador-geral da República como o operador do maior esquema de corrupção da história, Mar­cos Valério era dono de duas agências de publicidade , que escondiam uma câ­mara de compensação. Em 2002, na campanha que elegeu o ex-presidente Lula, a agência, entre outras coisas, providenciou o envio ao exterior de mais de 10 milhões de reais para pagar as despesas de campanha do PT — di­nheiro arrecadado no Brasil, provavel­mente de corrupção, e remetido para fora do país de maneira ilegal. No go­verno Lula, o esquema ganhou sofisti­cação. A agência passou a receber re­cursos diretamente dos cofres públicos, simulava prestação de serviços e regado da contabilidade da “organiza­ção criminosa”, Valério responde pelos crimes de corrupção ativa, peculato, la­vagem de dinheiro, formação de qua­drilha e evasão de divisas. Somadas, as penas podem chegar a 43 anos de pri­são. O empresário se diz guardião de um valioso e delicado segredo.

Em maio, quando os ministros do STF já debatiam a data de início do julgamento, petistas influentes foram mobilizados para conter a ofensiva de Marcos Valério. De Belo Horizonte, onde mora, o operador do mensalão fez chegar à cúpula do PT a ameaça: depois de refletir muito, teria final­mente decidido procurar o Ministério

Público para revelar alguns segredos — o principal deles, supos­tos detalhes de suas conversas com Lula em Brasília. O ex-presidente sempre negou a existência de qual­quer vínculo entre ele e o operador do mensalão antes, durante e depois do escândalo. Para mostrar que não estava blefando, como já fizera em outras ocasiões, o empresário disse que enviaria às autoridades um vídeo com um depoimento bombástico, gravado por ele em três cópias e escondi­do em lugares seguros. Seria parte do acordo de delação premiada com os procuradores. Seu arsenal também incluiria mensagens e documentos que provariam suas acusações. Paulo Okamotto, que hoje é diretor-presidente do Instituto Lula, foi um dos que recebe­ram o recado — prontamente decodifi­cado por um grupo de assessores próximos ao ex-presidente, que entrou em açâò para evitar turbulências na reta final do processo. Desde as primeiras chantagens de Valério, em 2005, o ex- tesoureiro era incumbido de interme­diar as conversas com o empresário, que cobrava proteção e dinheiro.

O advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, petista histórico e também integrante do círculo íntimo de Lula, foi destacado para descobrir se as amea­ças, desta vez, procediam. Ele procu­rou pessoas próximas a Marcos Valério, advogados, integrantes do Ministério Público, políticos e empresários. Ouviu a história sobre o depoimento em ví­deo, mas não encontrou uma única evi­dência de que ele realmente exista. Greenhalgh, há mais de um ano, é um dos encarregados de conversar com Marcos Valério. Ele se reuniu com o empresário algumas vezes em seu escritório em São Paulo. “O Greenhalgh é o pacificador, é quem sempre dá as garantias a ele”, disse a VEJA uma fon­te da confiança de Valério. O advogado não sabe se o vídeo existe ou não, po­rém descobriu que o tal acordo de dela­ção premiada era mais um blefe do em­presário. Um blefe calculado para gerar calafrios e advertir os petistas sobre an­tigos compromissos assumidos. Segun­do um assessor do empresário, a cúpula do partido prometeu que lançaria mão de todos os instrumentos possíveis para livrá-lo da cadeia.

Procurado, o advogado Greenhalgh não retornou as ligações. Paulo Okamotto admitiu ter participado de reuniões com Marcos Valério, mas disse que isso nada tem a ver com ameaças ou chanta­gens: “Ele queria me encontrar porque às vezes queria saber das coisas. Em ge­ral, ele quer saber como está a política, preocupado com algumas coisas”. O mensaleiro escolheu como consultor o melhor amigo do ex-presidente que chantageia há sete anos. Indagado se a consultoria também envolvia assuntos financeiros, Okamotto explicou: “Ele tem uma pendência lá com o partido, uma pendência lá de empréstimo, coisa de partido”, referindo- se ao processo em que Valério cobra judicial­mente 55 milhões de reais do PT, como paga­mento dos empréstimos fictícios que abasteceram o mensalão. E concluiu, em tom enigmático: “O Marcos Valério tinha re­lação com o partido, ele fez coisas com o partido.Eu nunca acompanhei isso. Então, quem pariu Mateus que o embale, né, meu querido?!”.

Não é a primeira vez que o operador do mensalão ameaça envolver o ex-presidente Lu­la no caso. Em 2005, quando começa­ram a surgir provas contundentes do en­volvimento de Marcos Valério no esque­ma, e suas ligações umbilicais com o PT, o empresário ligou para o então pre­sidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha, disse que faria um acordo de de­lação premiada e advertiu: “Avisa ao barbudo que tenho bala contra ele”, Ameaçou, também, revelar o nome das empresas que abasteceram o caixa dois da campanha de Lula em 2002 e fulmi­nar ministros que haviam recebido parte do dinheiro. Pelo seu silêncio, Valério impôs algumas condições. Queria garantias de que não seria preso e uma bolada de 200 milhões de reais. As de­núncias nunca se materializa­ram. Em 2010, Marcos Valé­rio fez uma confidência no gabinete de uma autoridade de Brasília: “O Delúbio (Soares) me levou para um futebol no palácio”. A auto­ridade tentou mostrar indi­ferença diante do que aca­bara de ouvir, mas sabia muito bem o que aquilo significava. O objetivo era apenas enviar mais um re­cado. Delúbio garante que essa visita nunca existiu.

Pouco antes de deixar a Presidência, Lula disse que se dedicaria a provar que o mensalão não existiu. Mas, em flagrante contradição, em 2005, no ápice do escândalo, o então presidente se pe­nitenciou: “Eu me sinto traído. Traído por práticas inaceitáveis das quais nunca tive conhecimento. Não tenho nenhuma vergonha de dizer ao povo brasileiro que nós temos de pedir desculpas. O PT tem de pedir desculpas”. Apesar de reconhe­cer o crime, a estratégia já naquela épo­ca era afirmar que toda a fraude aconte­ceu sem que o líder máximo do partido soubesse. Teoria que o próprio Lula aca­bou por fragilizar em depoimento ao Supremo Tribunal Federal, quando con­firmou que realmente fora advertido pe­lo deputado Roberto Jefferson sobre a existência do mensalão antes de o escândalo eclodir. Segundo o próprio Lula, na ocasião estavam presentes os minis­tros Aldo Rebelo e Walfrido Mares Guia e o deputado Arlindo Chinaglia — o mesmo que Jefferson acusou na semana passada de ter lhe oferecido vantagens para que ele não denunciasse a fraude. Arlindo Chinaglia disse que isso não é verdade. Na reta final, blefando ou não, é no mínimo estranho que, sete anos de­pois do mensalão, Marcos Valério con­tinue ameaçando o PT — e o PT conti­nue assombrado com as ameaças de Marcos Valério.

A nossa Broadway - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 23/07

O economista Carlos Lessa, 75 anos, leu a matéria de Luís Felipe Reis, no GLOBO, sobre musicais. Nacionalista exaltado, o ex-presidente do BNDES não se incomoda com o número de produções importadas:
— É assim mesmo. No caso das novelas começamos com “O direito de nascer”, do cubano Félix Caignet. Depois, nossa cultura se impôs.
Tomara.

Aliás...
O músico Rodrigo Lessa, filho de Lessa, aderiu à onda dos musicais.
Ambientado em Copacabana, “Avenida réveillon”, de Fátima Valença, terá canções de Lessa e de Manuela Trindade.

Inglês é o cacete
Dilma sancionou lei que obriga os órgãos públicos a apresentarem versão em português de documentos publicados em língua estrangeira.
O projeto é do senador Aloi-zio Mercadante ao constatar que abusavam do inglês.

Cirurgia infantil

O Hospital Rio de Janeiro, em Vila Valqueire, vai virar o Hospital estadual de Oncologia e Cirurgia Infantil — uma parceria de Cabral com o Instituto D’Or. “O Rio precisava de um hospital desses”, celebra o secretário Sérgio Cortes.

No mais

Faltam 11 dias para o julgamento do mensalão.

Eleições no Brasil
Em agosto, a Zahar lança “Eleições no Brasil: do Império aos nossos dias”, do cientista político Jairo Nicolau.
Para ele, veja só, a República, com o voto de cabresto, representou um retrocesso em relação ao Império.

A NATUREZA PADECE com tantos maus-tratos provocados pelo homem. Em Búzios, nosso paraíso na Região dos Lagos, árvores estão sendo sufocadas num dos muros do condomínio Summertime, em Geribá — veja na foto da leitora Vera Fontana. "Sinto um nó na garganta toda vez que passo por ali", afirma Vera, que é engenheira florestal. O biólogo Mário Moscatelli explica que os buracos no muro terão de ser adequados à passagem dos galhos. Assim como nós, árvores também precisam de liberdade

Andaimes psicossociais

Para quem tem dúvida da importância da Central Única de Favelas (Cufa) e do AfroReggae.
Pesquisa coordenada pela brasileira Sandra Jovchelovitch, do Centro de Psicologia Social da London School of Econo-mics, em parceria com a Unesco, classifica essas ONGs como “andaimes psicossociais”, que afastam do crime os jovens.

Segue...
O trabalho, que será apresentado no Espaço Criança Esperança, conclui que elas substituem a família, a iniciativa privada e o Estado. Que bom!

OSB na favela
A Orquestra Sinfônica Brasileira fechou parceria com o AfroReggae para cursos no Centro Cultural Waly Salomão, em Vigário Geral, no Rio.
As aulas começam dia 21 de agosto.

Gois em Londres I
Em tempo de Olimpíada, repare nos dizeres destas sacolas numa loja em Londres:
“Aluguei meu flat para família gorda americana”, “(Os atletas) estão todos cheios de esteroi-des” e “Levei só três horas para chegar ao trabalho esta manhã”.
Imagina na Copa.

Gois em Londres II
O Rio será a estrela do novo comercial da Embratur, que será veiculado em cem países. A cena final será na Praia de Copacabana, com turistas estrangeiros. A campanha vai ser lançada por Dilma, dia 25, em Londres.
Imagina na Copa.

Deu a louca
Sexta à tarde, uma escada rolante de descida, no desembarque internacional do Galeão, inverteu o rumo e começou a subir. Com todos de costas.
Imagina na Copa.

Cena carioca
Na Rua Uruguaiana, Centro do Rio, uma mulher gritava e socava o marido, sexta-feira.
De repente, um coro gaiato: “Tufão, Tufão, Tufão...”, numa referência ao corno manso de “Avenida Brasil”.
Imagina na Copa.

Deixa quieto - MELCHIADES FILHO

FOLHA DE SP - 23/07


BRASÍLIA - Com a aproximação do julgamento do mensalão, um dos colaboradores mais íntimos do ex-presidente Lula passou a se reunir com o publicitário que arquitetou o esquema de desvio de dinheiro público para a compra de apoio político ao governo do PT. Paulo Okamotto geriu o caixa do sindicato dos metalúrgicos quando o amigo ali mandava, serviu-lhe como tesoureiro de campanha e hoje cuida das finanças do Instituto Lula. Homem do dinheiro, portanto.

Em entrevista à revista "Veja", ele confirmou os encontros com Marcos Valério. Disse que atendia a pedidos do réu para discutir política -e só. Por que logo ele, braço direito de Lula, foi chamado? Mistério.

A missão furtiva indica que Valério é um fio desencapado a ser monitorado de perto. Dá corda às especulações de que o PT tem sido pressionado -ou chantageado- a não abandonar o ex-parceiro.

Motivos para preocupação não faltam. O publicitário operou as contas do mensalão. Para os procuradores que investigaram o caso, R$ 74 milhões foram drenados indevidamente dos cofres públicos, sob a justificativa de contratos fictícios. Para a PF, foram R$ 92 milhões.

Por vezes, os incriminados petistas parecem mais empenhados na defesa de Valério do que nas suas próprias. São vários os expedientes para tentar aliviar a barra do publicitário no campo legal. O mais recente foi a ação casada no Congresso e no TCU para "perdoar" um dos contratos com o Banco do Brasil fraudados pelo valerioduto -manobra desencadeada pelo então deputado petista, hoje ministro da Justiça e, nessa toada, futuro ministro do STF, José Eduardo Cardozo.

Para ajudar a ligar os pontos: Valério tem todos os seus bens penhorados, suas empresas congeladas e, como revela a Folha hoje, mais de R$ 80 milhões em dívidas. Mantém, no entanto, o padrão de vida: casa, carros e hábitos luxuosos.

Preços sem disfarce - MARIA INÊS DOLCI

FOLHA DE SP - 23/07



Quem se lembra, quando abastece o carro, que os impostos representam, em média, 38% dos preços dos combustíveis? Na conta de luz, caro leitor, além da energia, você paga dezenas de tributos e encargos setoriais.

Um deles é a RGR (Reserva Global de Reversão), criada em 1957 para cobrir indenizações com o fim de concessões de serviços de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Deveria ter acabado em 2002, foi esticada até 2010 e novamente postergada para 2035, sob a alegação de que seria importante para o cumprimento de metas do programa Luz para Todos e para a recuperação da rede elétrica.

Na verdade, governantes se apegam a tributos como pais aos filhos. Não se trata, contudo, de "amor desinteressado".

É por isso que todos os produtos que consumimos -alimentos, remédios, eletrodomésticos, roupas- e os serviços -energia elétrica, gás, telecomunicações- têm preços inflados pelos tributos.

O brasileiro trabalha cinco meses, em média, para pagar os mais de 80 tributos vigentes no país. Em 2011, R$ 1,5 trilhão engordou os cofres governamentais.

É claro que essa tributação encarece a produção brasileira, o que se reflete na desindustrialização e no crescimento mirrado previsto para o PIBinho deste ano: até 2%.

A carga tributária deveria se reverter em bons serviços públicos, especialmente saúde, educação e segurança. E em investimentos que aumentassem a produtividade e acelerassem o desenvolvimento brasileiro.

Nem preciso dizer o quão mal utilizado é o dinheiro público no Brasil -quem tiver dúvida sobre a malversação desses recursos deve ler as matérias que a Folha tem publicado sobre a Ferrovia Norte-Sul.

Enquanto isso, embolora nos escaninhos do Congresso Nacional o projeto de lei nº 1.472, de 2007, que determina a discriminação dos tributos nas notas fiscais de produtos e serviços.

De autoria do senador Renan Calheiros (PMDB/AL), a ele foram apensados (acrescentados) diversos projetos similares. Também houve, nos últimos cinco anos, requerimentos para inclusão do projeto de lei na ordem do dia do Congresso.

Fica claro, portanto, que muitos parlamentares se preocuparam com o tema e propuseram soluções. Mesmo assim, ainda não foi votado. Desde junho, já está em plenário, ou seja, pronto para ser votado -se não houver manobras postergatórias.

Você arriscaria um palpite para as razões pelas quais o PL não virou lei? Isso mesmo: porque não interessa aos governos (federal, estaduais e municipais), uma vez que a transparência tributária desnudaria o quanto os tributos encarecem nosso custo de vida.

Eleitores esclarecidos, evidentemente, perceberiam a importância de não votar em quem já criou ou aumentou impostos, taxas e contribuições.

Como defender o consumo consciente se nos escondem a composição dos preços do que compramos? É um desrespeito, na contramão do direito à informação, expresso no capítulo 3 do Código de Defesa do Consumidor. Lá está escrito que um dos direitos básicos do consumidor é "a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem".

Se o conhecimento dos tributos que incidem sobre cada produto ou serviço sacudiria o desinteresse dos brasileiros pela questão fiscal, outra medida simples aumentaria o poder de fogo dos consumidores: a obrigatoriedade de que as embalagens, além do preço específico, tivessem etiquetas padronizadas por quilo, litro ou metro.

Bastaria ampliar para todo o Brasil, por exemplo, acordo firmado em 2009 entre o Ministério Público e os supermercados do Rio de Janeiro. E, obviamente, fiscalizar o cumprimento das normas.

Afinal, saber qual o percentual de tributos em cada item que adquirimos e comparar preços antes de colocar produtos no carrinho do supermercado parecem direitos óbvios e inaliáveis em uma sociedade democrática. Parecem, mas, por aqui, não são.

MARIA CRISTINA FRIAS - MARIA CRISTINA FRIAS


FOLHA DE SP - 23/07

Moeda chinesa cresce em pagamento internacional

Apesar da desaceleração na economia da China nos últimos meses, a utilização de sua moeda em negociações internacionais está em alta.

O número de países que processam pagamentos em yuan subiu de 65 para 91 entre junho do ano passado e junho de 2012.

A quantidade de instituições financeiras saltou de 617 para 983 no período, segundo relatório a ser divulgado hoje pela Swift, que reúne bancos de todo o mundo.

A moeda é menos utilizada internacionalmente porque, até aproximadamente dez anos atrás, o mercado doméstico chinês era muito fechado aos investidores estrangeiros, segundo a Swift.

À medida que a moeda ganhou relevância, o crescimento em valor da presença do dinheiro chinês nos pagamentos globais foi superior a 17 vezes, entre outubro de 2010 e junho deste ano.

Nenhuma outra moeda registrou elevação semelhante. A média de expansão de outros países foi só de uma vez e meia. O único crescimento significativo foi o russo rublo, que subiu 3,2 vezes no período. Dólares e euros permanecem muito usados.

O Brasil e a China fizeram sua primeira transação comercial sem usar dólares, intercambiando reais e yuans, em 2009.

Na época, uma empresa brasileira de aparelhos de ar-condicionado depositou a quantia em reais no banco em São Paulo, valor que foi retirado três dias depois na China convertido em yuans. A remessa pagou peças importadas da China.

"O comércio chinês aumenta e parte disso é fechado em yuan. O governo da China está começando a tomar os primeiros passos para tornar o yuan uma moeda conversível. O volume de comércio reforça a trajetória em direção a isso e vice-versa", diz Antonio Manfredini, professor da FGV Eaesp.

Choque produtivo

A companhia norte-americana de equipamentos de segurança Taser, conhecida por produzir pistolas de choque, decidiu onde será localizada sua nova fábrica no Brasil.

A empresa traz ao país investimentos de US$ 6 milhões para a sua planta em Hortolândia, de acordo com a Investe São Paulo, agência de promoção de investimentos do Estado.

O anúncio sobre a unidade, que fabricará dispositivos não letais, será feito hoje, durante evento sobre segurança pública.

Faxina corporativa

A multinacional americana Jan-Pro, de limpeza comercial, investirá R$ 26 milhões para expandir sua atuação no Brasil.

Com o aporte, que será dividido igualmente entre 2012 e 2013, a companhia passará a ter unidades em todas as regiões do país e entrará no mercado de hospitais.

"Até o fim do ano teremos escritórios em Salvador, Brasília e Fortaleza. Cada um deles deve abrir quatro franquias por mês após o início da operação", diz Renato Ticoulat, executivo da empresa.

Para iniciar as operações em hospitais, a Jan-Pro comprará novos equipamentos e contratará enfermeiras. Entre os países em que a empresa já atua estão Canadá, Reino Unido e Austrália.

A principal concorrente da companhia é a Jani-King.

Números

US$ 240 milhões é o faturamento global da companhia

6 Estados com franquias (SP, PR, SC, MA, MG e RJ)

Impressão... Representantes setoriais se reuniram na última sexta, em SP, para discutir o andamento das medidas governamentais de estímulo à indústria. Cerca de 69% acreditam que as opiniões do empresariado são consideradas pelo governo ao anunciar novas medidas.

...empresarial Cerca de 75% consideram a velocidade do processo incompatível com a complexidade dos temas, diz a CNI. As reivindicações serão levadas ao governo em agosto.

Mar A movimentação de contêineres na Portonave, terminal portuário de Navegantes (SC), subiu 7,3% no primeiro semestre, ante igual período de 2011.

Invasão... Cerca de 1.500 empresários asiáticos são esperados para uma feira em agosto, em SP. Os executivos, dos quais 80% são chineses, representam 600 empresas interessadas em encontrar importadores e distribuidores brasileiros para seus produtos.

...chinesa Entre os principais setores das companhias participantes estão os de eletrônicos de consumo e de segurança, material de construção, têxtil, brindes, decoração e outros, de acordo com a EPS, empresa organizadora do evento.

Nome sujo

O número de títulos protestados em junho na cidade de São Paulo foi de 68.640 -queda de 17,4% na comparação com o mês anterior, de acordo com levantamento do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos.

Em relação a junho do ano passado, no entanto, houve alta de 19,9 %.

O cancelamento de protestos chegou a 21.289 títulos em junho, e o total bruto apresentado ficou em 175.501.

Do total de títulos protestados, apenas 8% foram cheques e 7%, notas promissórias. A maioria (71,4%) foi de duplicatas.

Inverno no nordeste

Campos do Jordão não está entre as dez cidades mais procuradas do país para férias de inverno, segundo estudo do buscador de viagens Mundi.

A pesquisa, que levou em conta as buscas realizadas entre março e junho, para a efetuação de reservas em julho, indicou alta da procura nos destinos do Nordeste.

A região tem seis das dez cidades mais buscadas.

A agência Hotel Urbano, porém, registrou aumento de 30% no interesse dos cariocas para ir a Campos do Jordão.

No que se refere a destinos internacionais, os mais procurados foram Buenos Aires e Santiago do Chile.

É eficiente? - HELDER REBOUÇAS


O Globo - 23/07


Ronald Dworkin, jurista americano, publicou, em 1977, a obra "Taking Rights Seriously", que nos traz, dentre outras coisas, uma reação ao uso da discricionariedade na aplicação das normas, sobretudo quando se supõe que há "lacunas" na lei. O autor procura mostrar que, se quisermos levar o direito a sério, devemos aplicá-lo com base nas regras e princípios do sistema jurídico, e não a partir das nossas razões subjetivas. Vejamos como isso se aplica ao caso do contingenciamento orçamentário.

A Lei Complementar n 101, de 2000, a LRF, admite o contingenciamento de despesas somente quando for verificado, ao fim de um bimestre, que a receita estimada não será realizada, podendo comprometer a meta de superávit do governo. Logo, a motivação dos decretos de contingenciamento é a perspectiva de frustração da receita orçamentária que possa deteriorar as metas fiscais. Com isso, as prognoses de que haverá queda nas receitas devem ser muito bem fundamentadas, sob pena de invalidar o ato que promoveu o contingenciamento. Em vários governos, pode-se demonstrar que as prognoses de frustração das receitas não têm se confirmado. Aliás, para o professor Gilmar Mendes, ministro do STF, não é tarefa estranha ao Judiciário avaliar a adequação das prognoses das normas, no controle de constitucionalidade.

Além disso, a administração pública federal tem utilizado, no contingenciamento, outras motivações distintas da expectativa de frustração de receitas, indicada na LRF. Por exemplo, em 2012, o Decreto n 7.680, de 17 de fevereiro de 2012, contingenciou R$ 55 bilhões, quando a expectativa governamental de declínio nas receitas era de apenas R$ 29,5 bilhões. Essa prática não é nova, tendo em vista que o Tribunal de Contas da União, no exame das contas do governo de 2007, apontou que, em vários exercícios financeiros, o contingenciamento decorreu, não apenas da "frustração" das receitas, mas da criação de despesas, do pagamento de compromissos de exercícios anteriores e da elevação da meta fiscal.

Em 2007 o economista Alexandre Manoel Ângelo, do Ipea, mostrou uma série de distorções econômicas e de gestão pública, causadas pelo acúmulo de "atrasos" nos pagamentos de despesas públicas, para o qual muito contribui o contingenciamento. Caberia, no mínimo, aferir se o modelo vigente de contingenciamento atende ao princípio constitucional da eficiência.

É dada ainda ao administrador grande margem de liberdade para escolher quais despesas serão preservadas ou "cortadas", porque o decreto de contingenciamento efetua limitações por ministério, e não por programas. Em cada pasta, portanto, o gestor define quais programas governamentais serão sacrificados ou não. Assim, resta avaliar se tais escolhas passam minimamente por um critério de racionalidade, sob pena de estarem minando até mesmo objetivos de governo.

No Estado democrático, paradigma a que se filia a nossa Constituição, resta imprópria a terminologia discricionariedade, porque o administrador público sempre estará vinculado a princípios constitucionais. No caso do contingenciamento orçamentário, isso significa que as escolhas de cortes deverão estar corretamente motivadas e não prejudicarão políticas públicas estratégicas. Levar o contingenciamento a sério, enfim, implica a aplicação correta da Lei de Responsabilidade Fiscal, com base nos princípios constitucionais que orientam a administração e as finanças públicas. Do contrário, longe do que ensina Dworkin, o contingenciamento deixará de ser importante mecanismo de gestão fiscal, para se transformar em simples ato de vontade do administrador.

Nas futuras discussões sobre diretrizes orçamentárias no Congresso Nacional, se deveria debater sobre os limites à discricionariedade do contingenciamento, melhorando a gestão financeira da União e a própria qualidade da despesa pública, fortalecendo as estratégias atuais de redução consistente das taxas de juros e de retomada dos investimentos

Nêmesis - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 23/07

Fosse eu religioso, minha espiritualidade seria a trágica dos gregos. Eles tinham razão


Nêmesis era a deusa grega da vingança. Ela tinha especial prazer em torturar heróis que caíam em "hybris" (desmedida) e pensavam ser outra coisa que mortais sob o domínio dos deuses e das moiras, senhoras divinas quase cegas que teciam o destino de todos.
Fosse eu religioso, minha espiritualidade seria a trágica dos gregos, apesar da grandiosa beleza do sistema bíblico. Não que eu ache "legal" o politeísmo, mas porque eu acho que a visão de mundo dos trágicos é a melhor. A piedade trágica, aquela despertada pela empatia entre nós e os infelizes heróis do teatro grego, é que levou Nelson Rodrigues a dizer que devíamos assistir ao teatro de joelhos.
A acusação feita aos trágicos é que eles negam o sentido último da vida, porque os deuses gregos eram uns loucos apaixonados e sem projeto moral para o mundo (o destino é sempre cego). Isso é verdade. O Deus de Israel, que para os cristãos encarnou no judeu Jesus, tem um projeto moral para o mundo, mesmo que não saibamos ao certo qual é. E isso nos acalma.
A tragédia marcou a cultura de forma profunda, os exemplos são inúmeros: Shakespeare, Gracian, Schopenhauer, Nietzsche, Camus, Cioran, Nelson Rodrigues, Philip Roth.
É desse último que quero falar hoje. Especificamente de seu livro mais recente, "Nêmesis", a história do jovem professor de educação física Bucky Cantor atravessando o grande surto de pólio nos EUA no verão de 1944.
Os heróis de Roth sempre são esmagados entre a vida pessoal, os vínculos afetivos e ideias, e grandes processos históricos ou "cósmicos" que têm um efeito aleatório na vida deles -e sempre destrutivo.
Como exemplos históricos, vemos a Guerra da Coreia, o macarthismo versus comunismo nos anos 1950 nos EUA, a contracultura, a canalhice do politicamente correto nas universidades americanas. Como exemplo cósmico, o envelhecimento, a perda das funções sexuais ou de memória, as pragas (como a pólio em "Nêmesis").
No caso desse romance, a praga da pólio ocupa o lugar de pragas atávicas que sempre significaram para nossos ancestrais a fúria dos deuses. E é contra Deus que Cantor se revoltará.
Mas Roth é um grande escritor, e a revolta do jovem Cantor será teologicamente sofisticada, e não mero ateísmo militante, porque o ateísmo militante é sempre infantil.
O cruzamento entre as intenções pessoais e o destino, histórico ou cósmico, dá o efeito de esmagamento e negação de projeto moral, na medida em que os heróis de Roth não conseguem discernir qualquer sentido que não seja a cegueira terrível do acaso ou o "terror da contingência", tal como diz o narrador de "Nêmesis".
A expressão "terror da contingência" é comum nos textos do historiador das religiões Mircea Eliade para descrever o que nos moveria ao desejo religioso de um sentido maior. Tememos o acaso porque ele nega qualquer providência sábia por trás das coisas. O acaso é cego.
Para Cantor, Deus é um "demiurgo". Essa expressão era comum em alguns textos heréticos do início do cristianismo (textos gnósticos) e significava que Deus é mal. E se Deus for mal, não há qualquer esperança.
Mas o narrador do romance pensa diferente. Sua hipótese sobre a vida e as decisões que Cantor tomará é mais psicanalítica (ele sofreria de uma "neurose de responsabilidade"), mas nem por isso menos teológica. Para o narrador, Cantor é excessivo em julgar a si mesmo responsável pela desgraça que destrói seus alunos. E por isso sofrerá, porque nenhum homem pode se julgar senhor do destino, já que esse não nos pertence.
Como a deusa em questão é a da vingança, Nêmesis, a desmedida de Cantor em se julgar responsável pelo destino de seus alunos será vista de outra forma: Cantor se julga um justo e um dedicado professor e, por isso, pagará um preço alto pela autoimagem de homem reto. Aí está sua desmedida.
Cantor é o Jó de Roth (o judeu Levov, protagonista de "Pastoral Americana", é outro Jó de Roth): Cantor e Jó se julgam justos. Mas Cantor é um Jó que não encontra, ao final, a piedade de Deus, mas a vingança de uma deusa cega à misericórdia.

Lágrimas de esguicho - MARCELO DE PAIVA ABREU


O Estado de S.Paulo - 23/07


A história do futebol brasileiro registra o caso de famoso jogador do Bangu que, apesar de nunca ter jogado em seleção, tinha talento: Décio Esteves. Não era exatamente um craque, mas ótimo jogador, que tinha como peculiaridade poder "jogar nas onze". Atuava nas mais diversas posições sem fazer feio. Sua versatilidade virou piada boba: "Décio Esteves, Estavas, Estarias...". Não há registro de muitos polivalentes Décios Esteves na história do futebol. Porque também no futebol se aplica o princípio smithiano da divisão do trabalho para maximizar o resultado.

Nos regimes presidencialistas, a expectativa é de que o presidente concentre poder decisório e conduza negociações políticas que viabilizem o seu governo. Isso com base em informações providas pelos seus ministros aptos a gerar recomendações em sua área de atuação. Idealmente o presidente decidiria sempre com base na avaliação de alternativas, levando em conta argumentos políticos e "técnicos".

Não é o que se vê hoje no Brasil. A presidente Dilma Rousseff pretende exercer bem mais do que a sua prerrogativa presidencial quanto ao poder decisório de última instância. De forma sistemática, tem interferido de tal forma na formulação de políticas em nível ministerial que não se beneficia da contribuição que poderia ser aportada pelo conhecimento especializado dos diferentes segmentos da máquina pública. É propensa a certezas, nem sempre providas da fundamentação adequada. E seu estilo abrasivo - para ser comedido na adjetivação - já é conhecido além das fronteiras.

Essas tendências centralizadoras, que têm tido como consequência a deterioração da qualidade do processo decisório público, podem ser detectadas em relação a diversos setores.

Na política econômica, a interferência presidencial tem resultado em unanimidade medíocre, com a adoção de uma colcha de retalhos de medidas discricionárias que beneficiam setores específicos. É difícil perceber qual é exatamente a política do governo e quais são os setores efetivamente prioritários. Em paralelo, em meio a grande desconfiança quanto a disciplinas comerciais multilaterais, têm prosperado medidas tributárias discriminatórias de importações. O Brasil tem sobrevivido a sanções internacionais porque concentrou tais medidas em setores oligopolizados que são comensais costumeiros na distribuição de favores governamentais ou capazes de negociar compensações adequadas.

No quadro dos investimentos em infraestrutura o que se vê lança sérias dúvidas quanto à reputação de perícia gerencial da presidente, alegadamente consolidada no governo anterior. De fato, a fama de "gerentona" teria sido crucial para explicar o "dedazo" de Lula na sua sucessão. O que se constata, entretanto, em meio ao notório "mar de lama", é a lamentável incapacidade de o governo cumprir as suas metas de investimento público. O que aconteceu com os supostos méritos gerencias da presidente?

Talvez seja em relação à política externa que a centralização rousseffiana tenha causado danos mais explícitos. A mudança de posição em relação aos direitos humanos no Irã foi, agora se sabe, uma finta inicial que despertou esperanças quanto à correção de curso em relação aos excessos da diplomacia lulista. O episódio paraguaio desfez essa impressão, em especial pelo açodamento para admitir a Venezuela na "janela" criada pela suspensão do Paraguai como membro do Mercosul. O registro de que o rolo compressor presidencial prevaleceu sobre a cautela do Itamaraty preserva, de certo modo, o profissionalismo da diplomacia brasileira, embora não contribua para exaltar a rigidez de princípios por que se pauta, ou deveria pautar-se.

A melhor interpretação seria a de que o chanceler estaria empenhado em extrair o melhor resultado possível de situação muito desfavorável, "the best of a bad job", ante a impetuosidade e a truculência presidenciais. Tais esperanças ficam muito atenuadas quando se lê espantoso artigo firmado por diplomata graduado, assessor da presidente e irmão do chanceler, que faria corar o mais entusiasmado defensor da diplomacia amorinista. Certamente faria Nelson Rodrigues chorar "lágrimas de esguicho". A traços francamente paranoicos - "a mania de diminuir o Brasil só pode ser medo de um país grande dar certo" - junta-se a indefectível denúncia do complexo de vira-latas que ditaria o alinhamento de nossa diplomacia "menos arrojada de antanho". Se metáfora canina é válida, pode-se perguntar como qualquer Kennel Clube classificaria o Irã ou a Venezuela. Houve até audácia para inepta incursão econômica com denúncia de pretenso conflito entre os que ainda preferem reduzir tarifas a reduzir pobreza. Como se a redução de tarifas não pudesse reduzir pobreza. Tudo em meio à louvação dos diplomatas brasileiros - que certamente não necessitam de elogios tão canhestros e autorreferidos - e a arroubos patrióticos (em mais de um sentido).

Para "jogar nas onze" é preciso ter talento, como tinha Décio Esteves. A presidente melhor faria se desse ouvidos a assessores e ministros capazes de lhe apresentar alternativas de ação, em vez de se deixar levar pela impetuosidade e por ideias preconcebidas.

Bronca de Dilma é com estilo Itamaraty - SERGIO LEO


Valor Econômico - 23/07


A distância abissal entre os estilos da presidente Dilma Rousseff e de seu ministro de Relações Exteriores, Antonio Patriota, pode confundir quem tenta interpretar os rumos da política externa brasileira. A questão relevante é outra, e mais profunda: Dilma detesta não o seu chanceler, mas a maneira tradicional de fazer diplomacia. E considera que o Itamaraty teve "excessiva autonomia" nos governos que a antecederam. Esse é um grande desafio dos diplomatas brasileiros, aos braços com um mundo já bem desafiador.

A relativa antipatia de Dilma com o Itamaraty vem dos tempos de sua gestão na Casa Civil de Lula, quando a diplomacia reivindicava poder sobre assuntos do Programa de Aceleração do crescimento (PAC), que envolviam obras de infraestrutura para além das fronteiras. Não ajudou muito o fato de que o então ministro de Relações Exteriores Celso Amorim mandava para reuniões com a então ministra representantes de escalões inferiores, e, em alguns temas, contornava a Casa Civil para levar assuntos diretamente ao presidente da República.

Dilma é centralizadora, quer resultados mais rápidos, e não se contenta com argumentos sobre legalidade internacional, por acreditar que a "realpolitik" dos grandes países abriga transgressões jurídicas justificadas a posteriori. O ataque das forças da Otan à Líbia, por exemplo, não teve amparo na resolução que determinou o bloqueio aéreo ao país de Muamar Gadafi, e hoje serve de argumento à Rússia e China para negarem resoluções da ONU contra o sírio Anwar Al Assad. Mas a derrubada do ditador líbio e as recentes eleições democráticas são consideradas resultados suficientes para legitimar a ação.

O ministro Patriota não deve perder o posto tão cedo

Até quando ainda disputava a eleição à Presidência, Dilma mostrou sua pouca inclinação a considerações diplomáticas. Ao lhe perguntarem o que pensava da ameaça de morte por apedrejamento, feita pela Justiça do Irã, a Sakineh Ashtiani, mulher acusada de adultério e assassinato do marido, Dilma condenou a medida e avisou que seu governo interviria em favor da iraniana.

Não consultou diplomatas para isso, e obrigou o Itamaraty a rever sua atuação nas Nações Unidas, onde rejeitava singularizar países, sob o argumento de que há um uso politizado do tema de direitos humanos na ONU, com as atenções voltadas contra uns governos e abafadas em relação a outros.

Muitos entenderam a ação de Dilma como uma guinada na política externa, que não houve. Era misto de convicção pessoal e pragmatismo eleitoral. Após uma adaptação para encaixar o caso Sakineh, a diplomacia seguiu como antes no tema dos direitos humanos, que, aliás, não parece ser o centro da atenções da presidente.

Dilma elegeu como principal foco de sua atuação externa a questão econômica. Entusiasma-se mais com os Brics, grupo formado por Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul, que com o Mercosul. Lê assiduamente o econômico "Financial Times", não o esquerdista "Le Monde Diplomatique", ou a diplomática "Foreign Affairs".

O Planalto tende a seguir abafando, em casos pontuais, considerações do Itamaraty, mas Patriota não terá o emprego ameaçado tão cedo. Não é de seu feitio dizer "não" à presidente - e é acompanhado nisso por quase todo o ministério. Seu estilo indica que se esforçará para reduzir atritos e se antecipar às preocupações da chefe (já sabedor da irritação dela com excessos da agenda diplomática, na Rio+20, em junho, só levou 10, de 54, demandas por encontros de chefes de Estado para avaliação de Dilma, que as acatou).

Dilma também sentiu, nos últimos dias, que os rumores frequentes sobre falta de sintonia com Patriota magoaram o Itamaraty. Mas agiu a seu modo, pragmaticamente. Patriota tinha uma viagem programada à África, com o vice-presidente Michel Temer, Dilma mandou que cancelasse, e o convocou a uma reunião de trabalho, que encantou o ministro pelo tom amigável. Trataram de Venezuela. Ela elogiou a ação recente do Itamaraty em relação à Síria, e acertaram detalhes da viagem dela a Londres, amanhã. Juntos, descartaram um encontro protocolar com o príncipe Charles, e decidiram que ela se encontrará com a oposição.

Questão pendente é a irritação da presidente com certas filigranas da vida diplomática, na qual os tempos são maiores que o de um mandato no Planalto. O pragmatismo traz um problema: o casuísmo hoje usado contra um país pode se voltar contra nós amanhã e restringir o espaço para a diplomacia eficaz. Que o digam os EUA, hoje ameaçados pelo Brasil, com apoio da OMC, de usar a "retaliação cruzada", com a suspensão de direitos de propriedade intelectual americanos em represália pelos subsídios ilegais americanos ao algodão. Quem inventou essa retaliação cruzada foram os americanos, para punir, com barreiras comerciais, eventuais ataques a seus direitos... de propriedade intelectual.

A diplomacia seguirá com o dever de dizer a Dilma que pega mal anunciar o rompimento de um acordo automotivo com o México, após dez anos de superávits em favor do Brasil, porque o comércio começou subitamente a registrar déficit. Ou de avisar que o direito internacional não permitiria realizar o desejo de apressar agora a entrada da Venezuela no Mercosul - mesmo com os objetivo nobres de explorar oportunidades econômicas de um mercado vorazmente importador, e trazer o país de Hugo Chávez para mais perto do modelo democrático defendido no Brasil.

O Brasil queria firmar um acordo de livre comércio com o México, e enfrentava resistência do setor privado mexicano. A revisão forçada do acordo automotivo, sob ameaça de revogá-lo, dá hoje bons argumentos contra os que nem querem saber de abrir alfândegas mexicanas ao Brasil.

No caso venezuelano, os documentos do Mercosul não permitiriam a entrada da Venezuela sem o voto do Paraguai, e as contorções jurídicas para superar esse obstáculo não ajudam a melhorar a abalada imagem do bloco sul-americano.

Dilma não vai mudar; nem pretende trocar de ministro. A diplomacia, como diria a própria presidente, que se vire.

Do pescoço para baixo - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 23/07

RIO DE JANEIRO - Na quinta-feira, ativistas ucranianas tiraram a roupa numa praça de Moscou, protestando contra o preço do gás que a Rússia vende à Ucrânia. No mesmo dia, em Oviedo, Espanha, oito bombeiros, usando apenas capacete e botas, protestaram contra as medidas de austeridade impostas pelo governo. Por via das dúvidas, mostraram só os bumbuns -o nu frontal talvez diminuísse a solenidade do ato.

Em 2007, nos Alpes, 600 suíços tiraram a roupa para alertar contra o derretimento de uma geleira. Em 2008, argentinas vegetarianas se despiram contra o bife de chorizo. Em 2009, alemãs fizeram o mesmo contra a matança das focas. Em 2011, no Piauí, uma professora subiu num trio elétrico e radicalizou: ficou pelada contra o capitalismo.

Todos os dias, em alguma parte, alguém fica nu em protesto contra alguma coisa. A causa é sempre meritória: protesta-se contra a energia nuclear, o aquecimento, o desmatamento, a inflação, a fome, os políticos, ou pede-se a retirada de tropas americanas ou de invasores de territórios indígenas. Previamente informados, os fotógrafos acorrem e, horas depois, as imagens estão em todos os jornais, TVs e on-lines. Mas, como mostrar as partes ficou carne de vaca e ninguém vai nem sequer preso por isso, é duvidoso que o gesto ainda converta as grandes massas para a causa em questão.

Em 2010, houve uma linda manifestação: a da mulher que, com o rosto coberto por uma burca, desfilou seu corpo nu, com grande classe e dignidade, por uma praça de Barcelona, em protesto contra a execução por apedrejamento da iraniana Sakineh, acusada de adultério. Não era erótico nem político, só bonito.

A confirmar a frase de Nelson Rodrigues, segundo a qual "só o rosto é imoral -do pescoço para baixo, podíamos andar nus".

A setenta dias da eleição - RENATO JANINE RIBEIRO


Valor Econômico - 23/07


Faltam pouco mais de dois meses para as eleições municipais, em todo o País menos Brasília e Fernando de Noronha, e só mudará o quadro dos candidatos no caso, excepcional, de renúncia ou morte. Nas capitais dos Estados, o panorama não é positivo para o Partido dos Trabalhadores. A situação melhora se passarmos às cento e poucas cidades mais populosas, ou aos 5565 municípios brasileiros. Mas o que chama a atenção politicamente são as capitais. Em poucas delas o PT é competitivo. Renunciou a concorrer no Rio de Janeiro e em Curitiba. Está fraco em Porto Alegre. Só disputa a prefeitura de Belo Horizonte porque falhou a aliança com o PSB. No Recife e em Fortaleza, vai sem os aliados prováveis, PCdoB e o PSB. Ganhará em São Paulo apenas se seu representante saltar várias posições. Isso, para ficar nas maiores capitais.

Quem ganha, quem perde com isso?

Quem mais se arrisca com as candidaturas do PT é o ex-presidente Lula. Foram dele duas apostas de alto risco, ambas em São Paulo: a candidatura do desconhecido e não-favorito Fernando Haddad e a aliança com o velho inimigo Paulo Maluf. As duas decisões, monocráticas, impostas sem discussão, são bem diferentes entre si. Podemos divergir do nome de Haddad em nome da viabilidade política, mas não por questões morais. Na educação, mesmo pesquisadores anti-petistas respeitam e até elogiam o ex-ministro. Se os problemas do Enem fazem pairar sobre ele a suspeita de voluntarismo, não há o menor indício de que tenha sido desonesto. Já a lamentável aliança com Maluf desperta forte condenação moral. Não me impressiono quando a sentença é proferida pelos concorrentes do PT; os tucanos já se valeram de Maluf, inclusive num famoso outdoor com FHC, quando precisaram de seu tempo na televisão e de seus eleitores. Mas me preocupo com a opção nela mesma. Maluf e os petistas sempre estiveram em campos opostos da política paulista e paulistana. É verdade que ele hoje é uma sombra do que foi. Sequer pode sair do Brasil, único país em que está a salvo do mandado de prisão da Interpol. Sua importância está nos minutos de televisão. É pouco provável que seu nome, mesmo, traga votos. Ainda assim, as fotos dele com Lula e Haddad, para dizer o mínimo, constrangem.

Um cenário bom para Dilma, mas não para Lula

Lula, com suas opções paulistanas, está numa situação sem meio termo. Ou ganha, e muito, ou perde, e muito. Tudo depende da vitória ou derrota de Haddad. Se ele vencer as eleições - o que significa, em dez semanas, galgar dezenas de pontos na preferência dos votantes - Lula será o gênio eleitoral, intuitivo, do País. Terá conseguido, em dois pleitos sucessivos, levar à vitória um nome desconhecido, nunca testado em eleições e escolhido só por ele. A opção moral, mas imprudente, de lançar Haddad será saudada. A opção pouco moral, embora prudente, de unir-se a Maluf será esquecida.

Já se o candidato do PT perder o pleito paulistano, o prestígio de Lula sofrerá seu maior revés desde o sucesso presidencial. Lembro a carta que Francisco I, rei de França, escreveu à mãe em 1525, depois de aprisionado em Pávia pelos exércitos de Carlos V, imperador alemão e rei de Espanha: "Madame, tudo está perdido, menos a honra". (Por sinal, geralmente se omite que o rei acrescentou "e a vida", o que reduz a grandeza da frase). Pois é. Quando se vence, a honra passa a segundo plano. O grande exemplo foi a vitória de Collor na eleição de 1989, recorrendo na última hora a uma acusação sórdida a Lula. Venceu. Mesmo assim, sua imagem ficou maculada. A oposição jamais reconheceu a legitimidade de quem ganhara, mercê de expediente tão duvidoso. O "impeachment" de Collor, três anos depois, teve outra causa - o malogro do combate à inflação. Mas foi fortemente adjetivado pela aversão que parte significativa da sociedade brasileira sentia pela cena primitiva de seu acesso ao poder.

Uma aliança com um político hoje em desaceleração não tem o mesmo peso que o episódio de Collor em 1989. Mas resta que, se a aposta de Lula der errado, sua imagem - tão boa, depois de dois mandatos em lua de mel com o Brasil - pagará um preço.

E a presidenta Dilma Rousseff? Até o momento, ela conseguiu marcar uma distância, simpática aos olhos do eleitorado, perante os partidos políticos. Vários ministros seus foram acusados de práticas pouco éticas, no primeiro ano de mandato. Nada ou pouco foi provado que fosse criminoso. Mas ela afastou rapidamente os nomes queimados.

Poucos observam que, em função disso, pararam as acusações. Ao longo de 2011, cada vez que caía um ministro, outro era atacado. Este ano, a cena mudou. Os ataques se voltaram contra Lula e se associaram às eleições municipais. A presidenta se preserva e está preservada. Nos setenta dias que faltam para o primeiro turno, e nos três meses que nos separam do resultado final nos municípios em que houver segunda volta de votação, isso pode se modificar. Dilma pode arregaçar as mangas, pedir votos, ir para a arena política. Tem, como todo cidadão e como todo político, pleno direito de fazê-lo. Mas, por enquanto, estamos numa situação em que ela parece apta a colher os bônus das eleições sem pagar os ônus de suas preferências eleitorais. Terá, porém, que medir se as vantagens dessa posição, digamos, de magistrado, compensam algumas derrotas que serão possíveis, caso não desça à planície das urnas. Por ora, contudo, o que temos é uma possível depreciação do renome de Lula e uma valorização do nome Dilma Rousseff. Ele polariza de frente com o PSDB, ela joga discretamente em todas as frentes. O balanço depende, para ela, dos eleitores brasileiros; para Lula, dos paulistanos.

Aceno para os 'azuis' - VERA MAGALHÃES


FOLHA DE SP - 23/07


Estimulado pelo novo Datafolha, Celso Russomanno fará hoje lance ousado para cativar o eleitorado tradicionalmente tucano da capital. O candidato do PRB anunciará o petebista Campos Machado, aliado histórico de Geraldo Alckmin, como presidente do seu conselho político. Com o gesto, pretende seduzir público simpático ao PSDB, mas reticente a José Serra, além de setores do partido descontentes com os superpoderes de Gilberto Kassab na campanha do ex-governador.

Tabelinha Embora Russomanno negue que a estratégia seja combinada com o PT, operadores de Fernando Haddad se aproximaram do PTB e ainda lamentam o fracasso das tratativas que buscavam fazer de Luiz Flávio D'Urso vice na chapa petista.

Queda livre O candidato do PRB sofreu um tombo anteontem, quando pedalava em Três Passos (RS). Levou vários pontos no braço e suspendeu sua agenda de ontem. "Os adversários não me derrubam nas pesquisas, mas um buraco cheio de areia me jogou no chão", ironiza Russomanno. Ele diz ter 22 bicicletas em sua garagem.

Flashback Em julho de 2008, Kassab, vencedor da eleição, tinha 11% das intenções de voto no Datafolha. Alckmin somava 32% e nem sequer foi ao segundo turno.

Estetoscópio A consolidação da saúde pública como problema central a ser enfrentado pelo novo prefeito, atestada pelo Datafolha, fará o marketing de José Serra reeditar na disputa municipal a estratégia da campanha presidencial de 2010, quando foi apresentado como o "melhor ministro da Saúde" do país.

Purificação Ao lado do ministro Alexandre Padilha (Saúde), Gabriel Chalita (PMDB) esteve ontem na sede da Canção Nova, em Cachoeira Paulista. Participou do PHN, movimento criado pela Renovação Carismática Católica para "combater o pecado entre os jovens".

Vai ou racha Estrategistas dos dois principais candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte consideram que a eleição na capital mineira deve se resolver no primeiro turno, graças à extrema polarização entre Márcio Lacerda (PSB) e Patrus Ananias (PT).

Olímpica Em seu programa semanal de rádio, Dilma Rousseff saudará hoje a delegação brasileira em Londres mencionando o programa Bolsa Atleta, considerado o maior do mundo no gênero. Dos 249 atletas do Brasil que participarão da Olimpíada, 111 recebem recursos federais pelo projeto. A presidente viaja amanhã para a abertura dos Jogos.

Tabu 1 Petistas reagiram ao conteúdo de e-mail enviado pelo STF para jornalistas, abrindo credenciamento para o julgamento da chamada "ação penal 470". No texto da mensagem, a assessoria do Supremo refere-se literalmente ao "mensalão", expressão contestada por Lula.

Tabu 2 "É juízo de valor", afirma um advogado que milita no caso. A queixa também recai sobre a TV Justiça, que exibirá as sessões previstas para terem início em 3 agosto. A emissora já adotou o termo em seus noticiários.

Na ponta... Na véspera do recesso, Ricardo Ferraço (PMDB-ES) apresentou na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado um projeto que retira a cobrança do Luz para Todos da conta de energia do consumidor, que subsidia o programa. A proposta transfere o encargo para o Orçamento da União.

... do lápis Segundo cálculos do senador, o texto, se aprovado, significaria um impacto de 1,5% a mais nas contas públicas, mas uma economia de 15% nas contas de luz de consumidores e empresas.

Tiroteio

Logo veremos Serra se livrar de Kassab na campanha, como fez com FHC em 2002. Só o prefeito acha que seu governo é 'nota 10'.

DO DEPUTADO FEDERAL CARLOS ZARATTINI (SP), sobre o Datafolha que dá à gestão paulistana nota média de 4,4, a menor entre as capitais pesquisadas.

Contraponto

Carga pesada

Durante sessão da Câmara, na segunda-feira passada, Anthony Garotinho (PR-RJ) anunciava que entregaria aos membros da CPI do Cachoeira 68 kg de documentos com o que chamou de "provas contundentes" da relação do governador fluminense Sérgio Cabral (PMDB) com a construtora Delta. Miro Teixeira (PDT-RJ) pediu a palavra ao presidente, Marco Maia (PT-RS), e disse:

-Presidente, eu peço apenas ao deputado Garotinho que faça a gentileza de mandar entregar o material direto no meu gabinete. Eu já não tenho mais idade para carregar esse peso todo nas costas...

A boa notícia, um alerta e os impostos - ROBERTO ABDENUR


O ESTADÃO - 23/07


Traz uma boa notícia o Índice de Economia Subterrânea (IES), estudo que estima os valores de atividades deliberadamente não declaradas aos poderes públicos com o objetivo de sonegar impostos e das de quem se encontra na informalidade por força da tributação e da burocracia excessivas. Em 2011 ele representou 16,8% do produto interno bruto (PIB), o que corresponde a R$ 695,7 bilhões.

A notícia é muito boa porque, no ano anterior, o tamanho estimado do IES foi de 17,7% do PIB, ou R$ 715,1 bilhões. O estudo sobre o IES vem sendo realizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, em conjunto com o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) desde 2003, quando a economia subterrânea foi estimada em 21% do PIB.

Entre 2004 e 2006 o tamanho estimado dessa economia ficou em torno de 20%. Em 2007 baixou para 19,5%, como resultado do aumento do trabalho formal. A situação econômica do País, o crescimento da classe C e as boas perspectivas para o futuro comprovavam a tendência de formalização do emprego. Em 2008 e 2009, o IES foi de 18,7% e 18,5%, respectivamente, o que seguiu confirmando a tendência de redução das atividades que correm à margem da economia formal.

Aí vem o alerta. Chegar aos níveis dos países desenvolvidos - onde o IES fica ao redor de 10% - parece distante, apesar do número de 2011 (16,8%). É que a tendência de queda pode estar chegando temporariamente ao limite no Brasil, em razão da perda do dinamismo da economia e da redução do ritmo de aumento do crédito.

A perda do dinamismo da economia traduz-se pela perspectiva de um PIB menor. Isso tende a afetar o mercado de trabalho, o que agrava o endividamento das famílias e dificulta o crédito. Passou o momento de deslumbramento com o consumo da nova classe média, ao se perceber que tudo dependia de numerosas prestações a serem honradas.

Ademais da desaceleração da economia, a alta carga tributária também é fator de informalização das atividades no País. O atual sistema tributário eleva o custo da produção da indústria, prejudica a competitividade interna e externa, desestimula os investimentos, diminui o consumo, aumenta o desemprego, estimula a sonegação fiscal e, como resultado geral, contribui para a informalidade e a economia subterrânea.

Comparando carga tributária e PIB per capita, o Brasil fica muito mal colocado, segundo dados do Banco Mundial. Os tributos no País (36% do PIB) estão no mesmo nível da Rússia, Irlanda e Austrália e superam Estados Unidos e Coreia do Sul. Mas esses países têm PIB per capita maior (de três a cinco vezes) que o nosso. Por outro lado, nossos impostos superam os de países como China e Índia, além de Argentina e México, que têm PIB per capita mais semelhante ao brasileiro e conosco competem.

A cobrança de tributos é vital para o Estado, mas o sistema tributário deve estar em harmonia com outros fatores inerentes à atividade econômica. No Brasil, além da carga tributária elevada, o problema reside na complexidade para o pagamento de impostos e na rigidez da legislação para quem atua na legalidade.

Outro estudo do Banco Mundial, denominado Paying Taxes, mostrou que, em 2008, uma empresa-padrão gastava nada menos que 2.600 horas no ano para pagar os impostos básicos no Brasil. Foi o pior resultado em todo o mundo. Nos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, eram 12 horas; na Suíça, 63; na Venezuela, 864.

O tempo gasto é consequência direta da complexidade da legislação tributária, que de 1988 a 2005 teve incríveis 3,4 milhões de normas editadas. A demora na simplificação e racionalização do sistema tributário tem sido um dos maiores obstáculos à modernização da economia brasileira. Na medida em que tal complexidade é usada como justificativa para a sonegação de impostos, beneficia transgressores, deteriora o ambiente de negócios, afasta investimentos e reduz o potencial de crescimento do País.

Um sistema mais simples, ao contrário, fomenta o setor produtivo, incentiva o consumo, promove o emprego formal, eleva a renda dos trabalhadores, diminui a sonegação fiscal e reduz a informalidade. Não se trata, na presente etapa, de promover uma ampla reforma tributária - que pode exigir anos de debates e ajustes -, mas de estudar propostas pontuais que poderão ter resultados quase imediatos. Entre essas propostas estão a unificação de impostos e taxas com os mesmos base de cálculo e fato gerador, como bens e serviços (IPI, ICMS, ISS), faturamento (PIS, Cofins), renda (IR, Contribuição Social) ou importação (IPI, ICMS, ISS, Cofins, tarifas).

Diante da tendência apontada pelo Índice de Economia Subterrânea e do cenário global, é preciso, agora, um esforço conjunto - dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário com a sociedade - para estimular a formalidade na economia brasileira.

Vivemos um momento ímpar em nossa história econômica, propício para a revisão de uma série de regras que, historicamente, impedem o crescimento saudável da nossa economia. O louvável esforço da presidente Dilma Rousseff para pôr fim à chamada guerra fiscal e avançar na modernização das regras tributárias, bem como a instituição do microempresário individual - apenas para citar dois fatos recentes -, são exemplos dentre inúmeras propostas que devem ser avaliadas e postas em prática.

Está claro que só existe um caminho para reduzir o tamanho da economia subterrânea. E esse caminho consta de cinco medidas: aprimorar o sistema tributário, reduzir a sonegação fiscal, reduzir o comércio ilegal e a pirataria, reduzir a economia informal e, não menos importante, combater a corrupção. Temos avançado nessas frentes, mas ainda há muito por fazer.

Falta alguém - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 23/07

Marcos Valério, um dos cérebros do mensalão, voltou a ameaçar Lula, segundo a "Veja" desta semana. Em pânico com a possibilidade de vir a ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal, que começará a julgar no dia 2 de agosto os 38 réus do mensalão, Valério se disse disposto a contar que esteve com Lula várias vezes, o que Lula sempre negou.

Foi Paulo Okamoto, uma espécie de diligente tesoureiro informal da família Lula, que dobrou Valério. Naturalmente, Okamoto nega que Valério tenha feito qualquer ameaça a Lula. Ou dito que antes do estouro do escândalo do mensalão estivera com ele na Granja do Torto, uma das residências oficiais do presidente da República.

"[Valério] queria me encontrar porque às vezes quer saber das coisas. Em geral, ele quer saber como está a política, preocupado com algumas coisas", justificou Okamoto. Foi claro? Adiante. Coube também ao advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, outra peça importante da engrenagem do PT, agir para sossegar o espírito atribulado de Valério.

Ponham-se no lugar do ex-publicitário mineiro. Era rico, riquíssimo antes de se meter com o PT de Delúbio Soares, Genoino e José Dirceu. Tinha duas agências de propaganda. E inventara uma forma de lavar dinheiro por meio de bancos para engordar o caixa 2 de políticos às vésperas de eleições. Eduardo Azeredo, do PSDB, foi um .

Procurado para fazer pelo PT o que fizera por Azeredo, imaginou ter tirado a sorte grande. O governo Lula estava nos seus meses iniciais. E a turma à frente do partido em busca do tempo perdido. De repente, todas as portas se abriram para Valério. E ele passou a "fartar os olhos" admirando o dinheiro que entupia as suas burras.

Teria dado certo - não fosse o tresloucado gesto de Roberto Jefferson, presidente do PTB, que por pouco não pôs o governo a pique. Em um sábado de junho de 2005, depois de tomar uns goles a mais na Granja do Torto, Lula falou em renunciar ao mandato. Ficara sabendo que Valério admitira envolvê-lo no escândalo.

José Dirceu, então chefe da Casa Civil da presidência da República, foi chamado às pressas em São Paulo. Esca-lado para dar um jeito em Valério, deu sem fazer barulho. Naquele dia postei em meu blog que Lula falara em renúncia - embora eu não soubesse por quê. Nunca recebi tantos desmentidos de porta-vozes.

Ainda no segundo semestre de 2006, Valério voltou a atacar. Procurou um político de forte prestígio junto a Lula. Queixou-se de estar quebrado. Acumulava dívidas sem poder honrá-las. Seus bens haviam sido bloqueados. Caso não fosse socorrido, daria um tiro na cabeça ou faria com a Justiça um acordo de delação premia.

O político pediu uma audiência a Lula. Recebido no gabinete presidencial do terceiro andar do Palácio do Planalto, o político reproduziu para Lula o que ouvira de Valério. Em silêncio, Lula virou-se para uma das janelas do gabinete que lhe permitia observar parte do intenso movimento nas vizinhanças do palácio.

Então perguntou ao visitan-te: "Você falou sobre isso com Okamoto?" O visitante respondeu que não. E Lula mais não disse e nem lhe foi perguntado. Seria desnecessário. O diligente Okamoto, aquele que pouco antes pa-gara do próprio bolso cerca de R$ 30 mil devidos por Lula ao PT, apascentou Valério.

Falta alguém em Nuremberg! Quero dizer: falta alguém na denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República sobre a "organização criminosa" que tentou se apossar do aparelho do Estado. Desviou-se dinheiro público - e não foi pouco. Pagou-se para que deputados votassem como queria o governo. Comprou-se o apoio de partidos.

Nada será capaz de reparar o mal produzido pelos que chegaram ao poder travestidos de legítimos hierarcas da decência - falsos hierarcas, como se revelariam mais tarde. Mas se a Justiça só enxergar inocentes entre eles, isso significará que também foram bem-sucedidos na tarefa de trucidar a esperança.

Mais um empurrão - MÔNICA BERGAMO


FOLHA DE SP - 23/07

O governo deve lançar neste segundo semestre novas medidas para tentar aumentar a competitividade na indústria. O foco será a redução de custos dos insumos. Entre eles, o preço da energia para grandes consumidores e o valor do gás, matéria-prima da indústria química. A presidente Dilma Rousseff mandou o Ministério da Fazenda estudar mudanças também no PIS/Cofins. A desoneração, no caso, seria linear e beneficiaria a todos os setores.

ENERGÉTICO

Até o final do ano, o governo quer definir também as regras para renovação das concessões de companhias geradoras como Cesp (Companhia Energética de São Paulo), Chesf (Companhia Hidroelétrica do São Francisco) e Furnas. Os contratos começam a vencer em 2013.

MODERNINHOS

Os tucanos José Serra e Andrea Matarazzo, candidatos a prefeito e vereador de SP, estão agendando encontros com empresários do centro e do Baixo Augusta. Pediram ajuda a Beto Lago, do Mercado Mundo Mix, que já tentou vaga na Câmara Municipal.

HAY QUE ENDURECER?

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares diz que não vai "endurecer o dedo" quando se defender no julgamento do mensalão, afirma o advogado Arnaldo Malheiros. Ainda que se diga que ele serviria de bode expiatório. "Delúbio costuma dizer que, no fim, sempre dá certo. E, se não deu certo, é porque não chegou ao fim", diz, parafraseando Fernando Sabino.

ME DÁ UM ASILO AÍ

Às vésperas do caso chegar ao Supremo Tribunal Federal, corre piada entre advogados do mensalão: José Dirceu teria se programado para assistir ao julgamento pela TV na Embaixada da Venezuela. Só para garantir asilo caso seja condenado.

SEM PELADAS

Campanha da Embratur para vender o Brasil no exterior usa imagens da Pinacoteca e do restaurante Capim Santo, em SP, para reforçar o turismo cultural e gastronômico. O vídeo começa com o amanhecer na Bahia, entardece em Brasília e anoitece em SP. Dilma Rousseff lança no dia 25, em Londres.

VAMOS PULAR

Começam em setembro as filmagens do longa "Quando Eu Era Vivo", de Marco Dutra, baseado no livro "A Arte de Produzir Efeito sem Causa", de Lourenço Mutarelli. Os protagonistas serão Antonio Fagundes, que fará o papel de um aposentado, e Sandy, que será sua inquilina. A cantora aceitou a proposta, mas ainda acerta detalhes de agenda para assinar o contrato com a produtora RT Features.

PELADONA NO PERU

A brasileira Vanessa de Oliveira, autora dos livros "O Diário de Marise" e "Ele te Traiu? Problema Dele!", ficou só de calcinha, com os seios à mostra, na frente do Palácio do Governo do Peru, na sexta, em Lima. Era um protesto contra a pirataria.

Convidada a lançar "Seduzir Clientes - O Lado Sexy do Marketing" numa feira literária, ela se deparou com versões piratas da obra sendo vendidas nas ruas. "O movimento foi em prol de todos os escritores do mundo que têm livros pirateados", diz.

A Elis no palco
Izabella Bicalho, 39, está em cartaz em São Paulo no musical "Tim Maia - Vale Tudo", em que interpreta a cantora Elis Regina. A atriz, que participou da microssérie "Gabriela" (TV Globo), estreia em 13 de agosto como cantora no espaço Off Set, na capital paulista.

Ela afirma que pretende conciliar as duas atividades e gravar um disco.

"Tenho que amadurecer meu repertório e desenvolver meu estilo como cantora para pensar depois em uma escolha [de carreira]", diz.

Noite pop

A top canadense Coco Rocha esteve no Brasil na semana passada para divulgar a campanha da Diesel. A grife, dirigida pelo italiano Renzo Rosso, promoveu festa no Ballroom, nos Jardins. Entre os convidados, a namorada de Rosso, Arianna Lessi, a chapeleira Graciella Starling, a apresentadora Marina Santa Helena e a estilista Betina Mojen.

Curto-circuito

O cantor Milton Nascimento apresenta o show "50 Anos de Voz nas Estradas" no dia 3 de agosto, às 22h, no HSBC Brasil. Classificação etária: 14 anos.

O Caos comemora um ano com festa na quinta, às 22h, no próprio bar e com shows no Studio SP. Classificação etária: 18 anos.

A peça"Pterodátilos", com Marco Nanini, tem duas apresentações na quarta e na quinta, às 21h, no Teatro Alfa. 16 anos.

Zeca Camargo e Rubens Ewald Filho falam na Casa do Saber, hoje, às 20h.

com ELIANE TRINDADE (colaboração), ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER, LÍGIA MESQUITA (interina) e OLÍVIA FLORÊNCIA

Jornalismo e violência - CARLOS ALBERTO DI FRANCO


O ESTADÃO - 23/07


Impressiona-me o crescente espaço destinado à violência nos meios de comunicação. Catástrofes, tragédias, crimes e agressões, recorrentes como as chuvaradas de verão, compõem uma pauta sombria e perturbadora. A violência não é uma invenção da mídia. Mas a sua espetacularização é um efeito colateral que deve ser evitado. Não se trata de sonegar informação. É preciso, contudo, contextualizá-la.

A overdose de violência na mídia pode gerar fatalismo e uma perigosa resignação. Não há o que fazer - imaginam inúmeros leitores, ouvintes, telespectadores e internautas -, acabamos todos paralisados sob o impacto de uma violência que se afirma como algo irrefreável e invencível.

Não é verdade. Podemos todos, jornalistas, formadores de opinião, estudantes, cidadãos, enfim, dar pequenos passos rumo à cidadania e à paz.

Os que estamos do lado de cá, os jornalistas, carregamos nossas idiossincrasias. Sobressai, entre elas, certa tendência ao catastrofismo. O rabo abana o cachorro. O mote, frequentemente usado para justificar o alarmismo de certas matérias, denota, no fundo, a nossa incapacidade para informar em tempos de normalidade. Mas, mesmo em épocas de crise - e estamos vivendo uma gravíssima crise de segurança pública -, é preciso não aumentar desnecessariamente a temperatura.

O jornalismo de qualidade reclama um especial cuidado no uso dos adjetivos. Caso contrário, a crise real pode ser amplificada pelos megafones do sensacionalismo. À gravidade da situação - inegável e evidente - acrescenta-se uma boa dose de espetáculo e, claro, uma indisfarçada busca de audiência. E o resultado final é a potencialização da crise.

Alguns setores da imprensa têm feito, de fato, uma opção preferencial pelo negativismo. O problema não está no noticiário da violência, e sim na miopia, na obsessão pelos aspectos sombrios da realidade. É cômodo e relativamente fácil provocar emoções. Informar com profundidade é outra conversa. Exige trabalho, competência e talento.

O que quero dizer é que a complexidade da violência não se combate com espetáculo, atitudes simplórias e reducionistas, mas com ações firmes das autoridades e, sobretudo, com mudanças de comportamento. Como salientou o antropólogo Roberto DaMatta, "se a discussão da onda de criminalidade que vivemos se reduzir à burrice de um cabo de guerra entre os bons, que reduzem tudo à educação e ao 'social', e os maus, que enxergam a partir do mundo real, o mundo da dor e dos menores e maiores assassinos, e sabem que todo ato criminoso é também um caso de polícia, então estaremos fazendo como as aranhas do velho Machado de Assis, querendo acabar com a fraude eleitoral mudando a forma das urnas". O que eu critico não é a denúncia da violência, mas o culto ao noticiário violento em detrimento de uma análise mais séria e profunda.

Precisamos, ademais, valorizar editorialmente inúmeras iniciativas que tentam construir avenidas ou ruelas de paz nas cidades sem alma. A bandeira a meio-pau sinalizando a violência não pode ocultar o esforço de entidades, universidades e pessoas isoladas que, diariamente, se empenham na recuperação de valores fundamentais: o humanismo, o respeito à vida, a solidariedade. São pautas magníficas. Embriões de grandes reportagens.

Denunciar o avanço da violência e a falência do Estado no seu combate é um dever ético. Não é, todavia, menos ético iluminar a cena de ações construtivas, frequentemente desconhecidas do grande público, que, sem alarde ou pirotecnias do marketing, colaboram, e muito, na construção da cidadania. É fácil fazer jornalismo de boletim de ocorrência. Não é tão fácil contar histórias reais, com rosto humano, que mostram o lado bom da vida.

A juventude, por exemplo, ao contrário do que fica pairando em algumas reportagens, não está tão à deriva. A delinquência está longe de representar a maioria esmagadora da população estudantil. A juventude real, perfilada em várias pesquisas e na eloquência dos fatos, está identificando valores como amizade, família, trabalho. Existe uma demanda reprimida de normalidade.

Superadas as fases do fundamentalismo ideológico, marca registrada dos anos 60 e 70, e o oba-oba produzido pela liberação dos anos 80 e 90, estamos entrando num período mais realista e consistente. A juventude batalhadora sabe que não se levanta um país na base do quebra-galho e do jogo de cintura. O futuro depende de esforços pessoais que se somam e começam a mudar pequenas coisas. É preciso fazer o que é correto, e não o que pega bem. Mudar os rumos exige, acima de tudo, a coragem de assumir mudanças pessoais.

A nova tendência tem raízes profundas. Os filhos da permissividade e do jeitinho sentem intensa necessidade de consistência profissional e de âncoras éticas. O Brasil do corporativismo, da impunidade do dinheiro e da força do sobrenome vai, aos poucos, abrindo espaço para a cultura do trabalho, da competência e do talento. O auê vai sendo substituído pela transpiração e o cartório vai sendo superado pela realidade do mercado. A juventude real, não a de proveta, imaginada por certa indústria cultural, manifesta crescente desejo de firmeza moral. Não quer a covarde concessão da velhice assanhada. Espera, sim, a palavra que orienta.

A violência está aí. E é brutal. Mas também é preciso dar o outro lado: o lado do bem. Não devemos ocultar as trevas. Mas temos o dever de mostrar as luzes que brilham no fim do túnel. A boa notícia também é informação. E, além disso, é uma resposta ética e editorial aos que pretendem fazer do jornalismo um refém da cultura da violência.

Sonho truncado - RUBENS RICUPERO

FOLHA DE SP - 23/07


O governo Obama termina onde começou: crise, desemprego, polarização e radicalização interna


O governo Obama termina onde começou: crise, desemprego, polarização e radicalização interna. É inegável que algo se fez: evitou-se a depressão e um desemprego muito pior. Ganhou-se a batalha do seguro-saúde. No essencial, porém, o governo falhou.

Não reverteu a divisão ideológica; perdeu a maioria no Congresso e, por consequência, a capacidade de dominar a agenda. Estancaram todas as suas propostas: reforma equitativa dos impostos; estímulos ao crescimento e emprego; renovação da infraestrutura; ambiente; imigração.

O sistema político oferece ao mundo espetáculo deprimente. A maioria ou quase do Congresso, da Suprema Corte, da mídia de massa obedece a orientação que não é conservadora, como gostam de dizer por eufemismo, mas francamente obscurantista e escravizada a interesses financeiros.

A principal diferença em relação ao "New Deal" dos anos 1930 não é que a crise e o desemprego continuem a resistir, como também sucedeu naquela época. Roosevelt ousou contestar o pensamento predominante com ideias e homens novos. Ajudado pela intensidade do choque, renovou a esperança, a confiança no país e conquistou maioria que duraria quase 20 anos.

Desta vez nem se tentou. Obama preferiu conciliar, governou com os homens e ideias que causaram a crise, apenas em versão água com açúcar. Buscou um consenso apaziguador que desmoralizou seus seguidores, enquanto os adversários lhe negavam pão e água. Fica a impressão de que só a direita pura e dura, tipo Reagan, é capaz de construir nos EUA maioria efetiva e decidida.

Hillary Clinton cresceu como secretária de Estado e cada vez domina mais a política externa. No Oriente Médio, melhorou-se muito a herança do governo anterior. Pôs-se fim à guerra no Iraque; o Afeganistão vai aos poucos sendo abandonado a seu destino; desfechou-se golpe sério no terrorismo com a morte de Bin Laden; o regime líbio foi derrubado a fogo lento, sem nova invasão a um país muçulmano. Da mesma forma que está ocorrendo com o regime sírio.

Fracassou, porém, o principal: o processo de paz entre Israel e palestinos, confiado a George Mitchell, que desistiu e voltou para casa. Sobre o Irã, problema número 2, só cabe dizer de positivo que se evitou a insanidade de nova guerra, resistindo à pressão do governo israelense.

Dissiparam-se as ilusões iniciais: não se fechou Guantánamo; a política de direitos humanos segue seletiva entre inimigos e aliados; o multilateralismo anunciado era o da colaboração de aliados confiáveis, Otan, Japão e Coreia do Sul, não o da ONU e agências internacionais, entregues a subservientes.

Esvaziou-se o G20 ao impedi-lo de reformar a sério o sistema financeiro. Nas negociações comerciais, na Rio+20, as posições americanas são tão retrógradas como no passado: considera-se êxito reiterar compromissos de 20 anos atrás.

A rigidez ideológica sobre Cuba ou a questão das drogas inviabilizaram um documento final em Cartagena. A Cúpula das Américas será lembrada pelas prevaricações sexuais dos seguranças de Obama.

Por enquanto, o sonho acabou. Quem acredita ainda que será melhor após as eleições de novembro?

Clichês da violência - VINICIUS MOTA


FOLHA DE SP - 23/07

SÃO PAULO - Um homem de 24 anos pratica um massacre num cinema dos Estados Unidos. Começam as explicações: "É a cultura das armas na sociedade americana"; "É a estética do justiçamento em Hollywood".

Tiras perseguem e matam um empresário na capital paulista porque, alegam, pensaram que ele sacava uma arma. Era seu telefone celular. Começam as explicações: "É a militarização da polícia"; "É a sociedade cada vez mais violenta".

O crime é alvo dileto das explicações universais. Não que estejam sempre erradas -como um relógio parado, têm sua taxa de acerto.

Quando a economia piora, o desemprego cresce e a desigualdade aumenta, reza o axioma, a violência sobe. Se as armas estão à disposição e o cinema valoriza a brutalidade, compõe-se então o caldo do capeta.

Todos esses fatores atuam de 2008 para cá nos Estados Unidos, que atravessam uma das piores agruras econômicas de sua história. No entanto a criminalidade atingiu, nesse período recente de desemprego, o mais baixo patamar em 40 anos.

No Estado de São Paulo, a taxa de homicídios caiu fortemente, enquanto os indicadores do emprego e da renda progrediram. Mas o fenômeno não se repetiu nos roubos e furtos. Outras regiões do país, que passaram por boom da renda até mais expressivo, nem sequer na taxa de assassinatos melhoraram.

Eficácia de prisões, polícia e Justiça e certos traços da população -como a proporção de jovens, mulheres e migrantes- melhoram a explicação das tendências mais gerais, coletivas. Fatores culturais influem, embora seja difícil objetivá-los.

Mas a receita do fracasso, e às vezes da picaretagem, é tomar barbaridades específicas como determinadas por vetores estruturais. Não foi o militarismo que matou o empresário paulista, nem a cultura das armas que massacrou no Colorado.

Foram indivíduos, plenamente responsáveis pelo que fizeram.

Visão estratégica da matriz energética - ADRIANO PIRES


O ESTADÃO - 23/07


O governo federal não tem uma visão estratégica da nossa matriz energética. O curioso e ao mesmo tempo preocupante é que vivemos um momento em que o que diferencia o Brasil de outros países, em particular, entre os Brics, é a nossa independência energética. Portanto, o mais difícil a natureza nos deu, basta que elaboremos políticas públicas para que a energia passe a ser, de fato, uma vantagem comparativa. Hoje estamos perdendo essa oportunidade e com isso comprometendo a competitividade da indústria brasileira.

No setor elétrico, chama a atenção a insistência do governo em manter os leilões de energia com caráter nacional e englobando todas as fontes. Outro ponto é o fato de o governo, no seu planejamento, afirmar que a expansão da oferta a partir de 2014 será feita, exclusivamente, com fontes renováveis.

A atual metodologia dos leilões teve importância no passado, assegurando a oferta de energia, uma vez que naquele momento a prioridade era evitar um novo racionamento.

A ideia, defendida por poucos membros do governo, de que é necessário manter a atual metodologia dos leilões em função da modicidade tarifária não é uma verdade e, mesmo que fosse, o argumento não é suficiente. Se considerarmos unicamente o aspecto preço da energia comercializada para o mercado cativo, realmente passa a impressão de se ter conseguido contratar energia a preços antes não imaginados. E de eólicas, mais ainda. Das demais fontes, nem tanto.

Mas seria o preço da energia o único parâmetro que se deveria levar em consideração nos leilões? E caso a resposta seja sim, será que esse parâmetro nos conduzirá à construção da matriz de energia elétrica de que o País vai precisar no futuro? É inteligente e estratégico abandonar fontes de geração que, por diferentes motivos, não estão sendo beneficiadas por subsídios específicos, financiamentos privilegiados e mesmo garantia de oferta, e com isso não têm preços competitivos? Seria estratégico não levar em consideração nos preços obtidos nos leilões a localização do mercado consumidor? Não estamos escondendo com isso o verdadeiro preço da energia?

Quanto a abandonar as fontes térmicas a partir de 2014, esse é um grave erro estratégico. O Brasil não pode e não deve abrir mão do gás natural e do carvão, até porque serão essas fontes que vão regularizar a energia produzida pelas usinas a fio de água. Aí entra outro questionamento: até que ponto o País vai ceder a pressões externas e de falsos ambientalistas, mantendo reservatórios a fio de água? A visão estratégica seria partirmos para leilões por fonte e regionais, implantando uma matriz hidrotérmica, rediscutir os reservatórios a fio de água, reduzir tributos e encargos setoriais.

No setor de gás natural, o desafio é aumentar a oferta, promover a concorrência, reduzir o preço e, com isso, contestar o monopólio da Petrobrás. A estratégia para alcançar esses objetivos seria os Estados, que possuem o monopólio da comercialização e distribuição, proporem políticas que incentivem, em particular, as distribuidoras de gás e as geradoras de energia elétrica a construir, por meio de consórcios, terminais de gás natural liguefeito para atender aos seus respectivos mercados. Além disso, os Estados que não promoveram licitações das áreas de concessão de distribuição de gás canalizado deveriam seguir o exemplo do Rio de Janeiro e de São Paulo, lançando programas de privatização. No curto prazo, a Petrobrás deveria passar a cobrar pelo gás natural associado a um valor menor, dado que é um subproduto do petróleo. Por exemplo: na Colômbia, o preço do gás natural associado vendido pela Ecopetrol é 50% do preço do gás não associado ao petróleo.

No setor de petróleo, a estratégia é a retomada dos leilões, mudar o rumo da política de conteúdo local, modificar o marco regulatório do pré-sal e a política de preços dos combustíveis. Nos oito anos de governo do presidente Lula, a Agência Nacional Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou apenas cinco leilões e a área exploratória, que alcançou um máximo de 341 mil quilômetros quadrados em 2009, será reduzida a 114 mil quilômetros quadrados no final de 2012. Isso acabará comprometendo o nível futuro de reservas e a produção de petróleo e gás natural, bem como o montante de royalties.

No conteúdo local, a estratégia seria voltar a adotar um arcabouço não mandatório, em que os objetivos principais são garantir a igualdade de condições de tratamento de empresas fornecedoras locais competitivas, incentivar o investimento em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e a transferência de tecnologia; retirar da lei da partilha o monopólio da Petrobrás na operação dos campos e os 30% mínimos nos leilões do pré-sal; e a política de preços dos combustíveis ter como meta a paridade com o mercado internacional.

No setor de etanol, a estratégia seria o governo, no curto prazo, permitir que a Petrobrás aumente o preço da gasolina. No médio e no longo prazos, promover uma desoneração tributária, acompanhada de melhores condições de financiamento. Em contrapartida, cobrar das empresas redução de custos, aumento de produtividade e investimentos em novas tecnologias.

SEGUNDA NOS JORNAIS


Globo: PT pagou o dobro da inflação a servidores
Folha: Ocupação de hospitais privados chega ao limite
Estadão: Desapropriações provocam disputa judicial e travam PAC
Correio: Saúde privada – ANS vai controlar aumentos dos planos coletivos
Valor: Queda de juros põe fundos de pensão em ‘encruzilhada’
Estado de Minas: Prefeituras mineiras na mira da PF
Jornal do Commercio: Polícia Civil para e restringe serviços
Zero Hora: Drible na Justiça – A cumplicidade dos clubes