sábado, novembro 20, 2010

RUTH DE AQUINO

O blocão dos mascarados
RUTH DE AQUINO
REVISTA ÉPOCA

Época
RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br
O carnaval será só em março, mas o blocão dos mascarados, com o vice-presidente eleito, Michel Temer, de mestre-sala, já ensaia seus passos em direção à apoteose do Planalto. Tem tanto deputado e senador brigando para subir nos carros alegóricos do Congresso e do ministério que a porta-bandeira Dilma Rousseff começa a temer por sua segurança. Para ajudá-la a enfrentar os mascarados, Dilma quer a seu lado umas 30 rainhas de bateria e baianas – o pré-requisito é ser mulher. Esse samba-enredo tem tudo para atravessar antes do desfile.
Existe um fosso entre nossos políticos e a população. Um estudo da Escola de Direito de São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas) mostrou que, num ranking de dez instituições, as duas menos confiáveis são os partidos políticos e o Congresso Nacional. As mais bem cotadas são as Forças Armadas, o governo federal, a imprensa escrita e a Igreja Católica. Só 8% confiam hoje nos partidos políticos. Isso em ano eleitoral. Pelo despudor com que os partidos estão rasgando a fantasia nesta transição presidencial, desconfio que a próxima pesquisa os derrube para o Grupo B das escolas de samba.
O blocão, para quem não sabe, é a união do PMDB, PP, PR, PTB e PSC, como uma cartada para intimidar a presidente eleita, do PT, a pensar duas vezes antes de escolher seus destaques e abre-alas. Ninguém se conforma em ficar só de passista vendo a banda petista passar. Mesmo que o palco principal seja a Câmara, onde essas cinco legendas de centro-direita teriam 202 parlamentares, está na cara que o blocão almeja mais e mais alto. Na cara de Temer, é impossível vislumbrar qualquer expressão facial. Um bom teste é olhar dez fotos suas em situações completamente diversas. As imagens são sempre iguais, sem trair alegria, emoção ou contrariedade – apenas o mesmo ar compungido. Se fosse mulher, os fofoqueiros atribuiriam a injeções de Botox, que congela as expressões. O povo brasileiro não confia em político fantasiado de esfinge.
Com 70 anos, mas sem rugas de septuagenário, pai de cinco filhos, Temer passou incólume por acusações de envolvimento em escândalos e conseguiu ser vice de Dilma apesar da resistência do presidente Lula, que preferia Henrique Meirelles. Hoje, Temer é o “muy amigo” que morde e assopra. Em 2006, apoiou Alckmin. Apontado como o líder do blocão, é o mesmo que promete acertar o passo e garantir a harmonia.
Pegue fotos de Temer em dez situações. Seu rosto não trai a menor emoção. Dá para confiar nessa esfinge?
Nada disso desafinaria nossa vida se o blocão quisesse defender a população de mais impostos e golpes semelhantes. Uma tensão saudável no poder pode conduzir a negociações para o bem comum. Mas o samba da política é pesado, sem sintonia ou rimas. O que se quer é brilho e paetê. No caso, cargos e grana. Antes do champanhe do Réveillon, deputados querem aprovar o aumento de seus salários de R$ 16.500 mensais para R$ 26.700. Um salto de 61,83%. É ou não um atentado ao pudor? São ruins da cabeça e doentes do pé.
Dilma passou a usar óculos escuros e lê Team of rivals (Time de rivais), biografia de Abraham Lincoln que conta como o presidente dos Estados Unidos formou um gabinete com adversários. O líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza, do PT paulista, chamou o blocão de “tiro no pé”. Lula virou poeta: “Política é como o leito de um rio. Se deixar a água correr tranquilamente, tudo vai se colocando de acordo com o que é mais importante. Se as pessoas tentam, de forma conturbada, mexer na política, pode não ser muito bom”. O PMDB quer impor rodízio com o PT na presidência da Câmara até 2015. Mas, para Lula, rodízio é de churrasco.
O que o PMDB de José Sarney mais deseja agora é indicar o ministro que ocupará a vaga do STF, para desmontar a Lei da Ficha Limpa e salvar o mandato de Jader Barbalho – mantido inelegível pelo Supremo por ter renunciado em 2001 para escapar da cassação, acusado de desvios e corrupção. Eleito no Pará para o Senado, Jader chamou a decisão do Supremo de “patética”, uma “aberração”.
Durma-se com um baticumbum desses. O fogo é no seu barracão, Dilma. O preço da fantasia está ficando alto demais.

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