sábado, julho 20, 2013

Um governo atolado vai desemperrar a economia? - ROLF KUNTZ

ESTADÃO - 20/07

Tiririca estava errado. No Brasil, sempre dá para piorar, como têm provado com notável diligência a impropriamente chamada classe política e o governo da presidente Dilma Rousseff. Qual a distância, hoje, entre otimismo e pessimismo nas previsões econômicas? A economia brasileira crescerá em média 3,2% ao ano entre 2014 e 2018, segundo a nova bola de cristal operada em parceria pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pela instituição de pesquisas The Gonference Board, o indicador antecedente composto. No discurso oficial, um crescimento inferior a 4% ou 5% ao ano jamais foi admitido, até há pouco tempo, como padrão normal para o Brasil. Poderia ocorrer como consequência de choques externos ou em fases de ajuste muito forte, mas sempre como situação excepcional. Hoje, até uma expansão pouco superior a 3% por vários anos pode parecer improvável, quando se considera a crise de produtividade da economia nacional.
Não há cálculo seguro do potencial de crescimento do País, mas os números estimados vêm caindo nos últimos anos - da faixa de 3,5% a 4% até há pouco tempo para algo entre 2,5% e 3% nas últimas avaliações. O número de 2,5% foi indicado esta semana pela economista Alessandra Ribeiro, da consultoria Tendências, segundo o jornal Valor.
Calcular o produto potencial pode ser muito complicado, mas, apesar disso, economistas e formuladores de políticas têm excelentes motivos para levar em conta esse conceito. A existência de limites tem sido mostrada amplamente pela experiência. Pode-se ultrapassá-los de vez em quando, mas insistir na aventura acaba normalmente em desastre. Inflação e desequilíbrio externo são consequências bem conhecidas e muito frequentes na História do Brasil.
Inflação e desajuste crescente no balanço de pagamentos já estão presentes no cenário brasileiro, apesar do crescimento pífio dos últimos dois anos e meio. Ninguém deveria iludir-se com o recuo de alguns índices desde o mês passado. A redução dos preços dos alimentos tem efeito passageiro na formação dos indicadores, assim como a redução das tarifas de transporte coletivo. Grandes fatores inflacionários, como o desarranjo fiscal, a expansão do crédito e os aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade, foram apontados, mais uma vez, na ata da última reunião do Comitê de política monetária (Copom), divulgada na quinta-feira. A ata destoou claramente do discurso presidencial do dia anterior.
Os autores do texto, no entanto, apontaram a possibilidade de um arrefecimento da demanda se nada for feito para reverter a tempo a crise de confiança do setor empresarial e das famílias. Por enquanto, "a demanda doméstica tende a se apresentar relativamente robusta, especialmente o consumo das famílias", segundo a ata. Mas os sinais de alerta já estão acesos. O texto contém o suficiente para indicar o risco de uma estagnação mais ampla, mas seus autores poderiam ter ido mais longe. Se o consumo cair, o investimento continuar insuficiente e a indústria continuar em marcha lenta, como ficarão as já estropiadas finanças públicas?
Não há resposta para o problema do crescimento, no Brasil, sem a ação do governo, mas o governo está atolado na própria incompetência gerencial, na indigência de ideias de seus formuladores de políticas e num esquema pegajoso e sufocante de alianças políticas.
No Brasil, dizem especialistas, nenhum presidente pode governar sem acordos, às vezes com parceiros da pior espécie. Pode ser. Em muitos países coalizões são indispensáveis à operação do governo. Alianças, no entanto, são em geral precedidas de algum entendimento a respeito de objetivos e métodos. É o caso, em países da Europa, da formação de gabinetes para enfrentar a crise fiscal e financeira.
A peculiaridade brasileira é outra: programas são secundários e o fundamento das alianças é a partilha dos benefícios do poder. Não se divide o governo como responsabilidade, mas como butim. Esse padrão se fortaleceu com a disposição petista de aparelhar e lotear a máquina federal. Nada mais natural, quando um partido chega ao Palácio do Planalto com um projeto de poder e nenhum projeto real de governo.
Sem alianças em torno de um programa, o governo é forçado a negociar com a base a votação de cada projeto, como se nenhuma ideia geral desse um sentido comum às várias propostas. Não se pode sequer confiar na aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias, condicionada pelos companheiros à adoção de um impropriamente chamado orçamento impositivo - na prática, uma simples manobra para tornar obrigatória a liberação de verbas para emendas.
A um governo com essas condições de funcionamento - e comandado por uma presidente cada vez mais isolada - cabe a missão de promover a mudanças necessárias para destravar a economia, aumentar seu potencial de crescimento e impor ao País um ritmo de expansão mais parecido com o dos emergentes mais dinâmicos.
Nenhuma tarefa importante será cumprida se a presidente Dilma Rousseff e sua equipe forem incapazes de começar a arrumação das próprias contas. Para isso será necessário desfazer a confusão de incentivos temporários e permanentes, trocar as ações pontuais pelas chamadas políticas horizontais e cortar o vínculo incestuoso entre o Tesouro e os bancos controlados pela União.
Tudo isso deverá ser apenas o começo de uma lista enorme de mudanças. Elevar a eficiência na elaboração e na condução de projetos de infraestrutura será outro desafio tão duro quanto urgente. Sem isso, até como exportador de matérias-primas o País será cada vez menos competitivo.
Que dirão dessa agenda os marqueteiros eleitorais da presidente?
Sem o governo nenhum problema se resolverá, mas o próprio governo é o primeiro problema.

A inflação perde força - CELSO MING

O Estado de S.Paulo - 20/07

A inflação deu sinais fortes de desaceleração. A evolução do Índice de Preços ao Consumidor Amplo do dia 15 (IPCA-15), divulgado ontem, mostrou perda de força nos preços, fator que pode dar algum alento à combalida atividade econômica.

(Esse IPCA-15 é o mesmo IPCA, com a diferença de que a evolução dos preços em 30 dias não é fechada no final, mas no meio do mês: vai do dia 15 anterior ao dia 15 do mês de referência, aproximadamente.)

Ainda se nota algum efeito artificial, digamos assim. Um dos itens que mais contribuíram para a redução da inflação foi a retirada dos reajustes nas tarifas dos transportes coletivos nas grandes cidades, atraso que ainda deve provocar certa distorção. Em todo o caso, o recuo no mês foi bastante expressivo, de 0,55%.

A desaceleração também foi puxada pela redução dos preços dos alimentos (-0,18%, no mês, e +11,6% em 12 meses), em consequência da queda das cotações das commodities.

Em contraposição, permanece substancial o avanço dos preços no setor de serviços, de 0,69% em junho e de 8,6% em 12 meses. Já nas despesas com habitação, a alta foi de 0,60% em junho, embora em 12 meses tenha sido bem mais baixa (3,1%). A inflação também se mantém espalhada demais, na medida em que o índice de difusão (número de itens da cesta de consumo em alta) continua elevado (55,5%).

Como o Banco Central deixou claro na Ata do Copom divulgada quinta-feira, as atenções agora se voltam para o efeito sobre a inflação que começa a ser provocado pelo repasse do avanço das cotações do dólar no câmbio interno, de cerca de 10% em dois meses.

Esse não é o único fator que pressiona em direção ao aumento dos preços. Como também foi enfatizado pela Ata, a inflação está sendo alimentada pela política fiscal (receitas e despesas do governo) insuficientemente austera, que vem exigindo demais da política de juros, e pelo ainda forte aquecimento do mercado de trabalho.

É cedo para afirmar que a desaceleração levará o Banco Central a reduzir a dose da alta dos juros básicos (Selic). Não dá para dizer que o aperto de 1,25 ponto porcentual desde abril para o atual nível de 8,5% ao ano já esteja contribuindo para o arrefecimento da inflação, porque a política de juros leva de seis a nove meses para produzir efeito. Além disso, é preciso ver o que acontecerá nos próximos meses. O mercado, cujas projeções são aferidas pela Pesquisa Focus, do Banco Central, aponta para uma inflação anual próxima de 5,8% em 2013, nível ainda elevado demais quando confrontado com a meta de 4,5%.

Além disso, a principal tarefa do Banco Central, no momento, é voltar a conduzir as expectativas, prerrogativa prejudicada pela política monetária voluntarista que perdurou de agosto de 2011 a março deste ano. Nesse sentido, o Banco Central não pode correr o risco de aliviar prematuramente sua política, especialmente se o governo também desistir de cumprir sua meta de superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida), de 2,3% do PIB.

Transições chinesas MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 20/07

Além de crescer menos, a China crescerá de maneira diferente, mas o Brasil, se souber, poderá aproveitar o novo momento. Na transição, o Brasil tem sido afetado pela redução dos preços de soja e minério de ferro. O que acontece na China chega aqui pelo comércio. Os chineses têm para nós a importância de quase dois Mercosul, porque representam 16% da corrente de comércio. 

O crescimento chinês de 7,5% no segundo trimestre foi o menor para o período em 23 anos. O número foi um alívio porque se chegou a temer que fosse mais baixo. A redução que houve até agora já impactou os preços de soja e minério de ferro. Para se ter uma ideia, o preço do minério exportado pelo Brasil em julho foi 8% menor do que em junho. 

O embaixador Luiz Augusto de Castro Neves, presidente do Cebri, lembra que, apesar de tudo, a corrente de comércio Brasil-China este ano está 9% maior que no mesmo período de 2012. Ele e o economista Pedro da Motta Veiga, diretor do Cindes, acham que o Brasil tem uma vantagem também no novo modelo para o qual a China está indo. O gigante asiático cresceu puxado pelos investimentos e exportações e agora tenta voltar-se para o consumo interno. 

- Há janelas de oportunidades no novo modelo porque também produzimos alimentos, ao contrário de Chile e Peru, por exemplo - disse Castro Neves. 

- Os minérios vão perder, mas em compensação ela vai comprar mais alimentos - completa Motta Veiga. 

O número de 7,5% é alto, mas caiu muito desde o recorde de 14% de 2007. Nos últimos 10 anos, o salto chinês fez subir o preço das duas principais matérias-primas exportadas pelo Brasil. Entre 2002 e 2012, o preço do minério de ferro subiu mais de 400%, segundo o MDIC. Nos últimos dois anos, ficou abaixo do recorde. 

Há o risco de que a transição desacelere demais a economia. Um dos sinais foi a alta dos juros do interbancário, que indicou risco de crédito. O endividamento é de 200% do PIB. 

- Não são as famílias que estão endividadas. Ao contrário, elas poupam demais e muitas vezes a poupança tem rendimento negativo. São as empresas que estão endividadas - alerta Pedro da Motta Veiga. 

O modelo até agora dependeu da exportação, o que manteve a moeda desvalorizada. Se o governo valorizar a moeda para estimular o consumo, pode perder o impulso externo sem que o consumo sustente o ritmo. A alta taxa de poupança chega a 50% do PIB: é boa para o investimento, mas freia os gastos. Sem aumento da rede de previdência será difícil mudar isso. Nada é simples na China. Na quarta, o Conselho de Segurança da Índia, chefiada pelo primeiro-ministro, decidiu criar uma força de 50 mil homens para ficar na fronteira porque concluiu que a China será ameaça maior que o Paquistão. 

Muitas mudanças e ameaças rondam nosso maior parceiro. Por enquanto, a balança comercial é favorável ao Brasil. Em 2011, tivemos saldo positivo de US$ 11,5 bi. Em 2012, US$ 6,9 bilhões. De janeiro a maio deste ano, mais US$ 2,6 bi. Temos que ficar de olhos em cada número chinês, porque tudo repercute no Brasil. 

Os Brics em Moscou - PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O GLOBO - 20/07

Escrevo de Moscou, onde estou para reuniões dos Brics e do G-20. Digito este texto num breve intervalo entre reuniões e temo que o artigo possa sair mais descosturado do que de costume.

No meu entender, o grande interesse para o Brasil nesses encontros em Moscou reside na coordenação entre os Brics. Os cinco países estão cada vez mais próximos em termos de avaliação do quadro econômico internacional e da governança global. Tenho participado da articulação dos Brics desde o início, em 2009. Venho notando que estamos conseguindo, mais e mais, trabalhar de forma conjunta — apesar das inevitáveis diferenças de perspectiva e interesse entre países tão diferentes quanto Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

Por exemplo, em Moscou avançamos consideravelmente na negociação de um Fundo Monetário dos Brics, que estamos chamando de Acordo Contingente de Reservas — Contingent Reserve Arrangement (CRA). Passo-a-passo, os Brics estão definindo os diferentes aspectos do CRA, inclusive detalhes operacionais. A coordenação dos trabalhos do CRA está a cargo do Brasil, como todos os países fortemente envolvidos.

Um processo semelhante está ocorrendo no que diz respeito ao Novo Banco de Desenvolvimento — New Development Bank (NDB), também conhecido como Banco dos Brics. Trata-se de tema ainda mais complexo do que o CRA, mas os ministros de Finanças dos Brics definiram com precisão o cronograma e o plano de trabalho para o NDB. A coordenação nesse caso cabe à África do Sul.

Os líderes dos Brics devem se reunir em setembro em São Petersburgo, à margem da cúpula do G-20. Na ocasião, entre outros assuntos, irão rever o progresso alcançado no CRA e no NDB, conforme estabelecido na cúpula dos Brics em Durban. Talvez possam fixar como meta a conclusão das negociações do CRA e do NDB até a próxima cúpula dos Brics, a ser realizada no Brasil em marco 2014. Embora os Brics ainda tenham muito trabalho pela frente, a conclusão das negociações na cúpula de 2014 é factível, pelo menos no caso do CRA.

Enquanto os Brics avançam, o G-20 não consegue sair do estado de quase coma em que se encontra desde a presidência da Franca de 2011. A presidência do México não conseguiu avançar em 2012. Neste ano, a presidência da Rússia parece estar indo pelo mesmo caminho. Passada a fase mais aguda da crise financeira e econômica dos países avançados, a solidariedade internacional arrefeceu. Não existe mais a mesma cooperação entre países avançados e emergentes, que marcou o G-20 desde fins de 2008 até 2010. O Brasil e os outros emergentes do G-20 continuam participando intensamente do processo, mas proliferam impasses e indefinições.

Democracias de mentira - ALEXANDRE VIDAL PORTO

FOLHA DE SP - 20/07

Democracia que não admite dissenso é só uma tirania eleita. Conhecemos várias, e nenhuma delas é bonita


Ser minoria é complicado. Não deveria, mas é. Os alunos de uma escola coreana em Kyoto aprenderam essa lição quando um grupo ultranacionalista japonês organizou protestos contra a utilização por eles, alunos, do parque adjacente à escola.

Para os manifestantes, o parque era só para japoneses. Filhos de estrangeiros não deveriam usá-lo.

Isso foi em 2008. Desde o começo deste ano, porém, a frequência das ações dos ultranacionalistas japoneses aumentou. Recentemente, houve manifestações em que se exigia a saída dos estrangeiros do país, sob pena de serem "massacrados".

A virulência fez com que o parlamentar Yoshifu Arita apresentasse projeto de lei criminalizando o discurso de ódio contra minorias.

A iniciativa do parlamentar é positiva. O nível da proteção estendida às minorias é indicativo da qualidade de um regime democrático.

O membro de uma minoria, seja ela étnica, política, religiosa ou sexual, tem direitos que não podem ser ameaçados ou suprimidos.

Um regime democrático que desrespeita os direitos das minorias se enfraquece. Foi o que aconteceu com Mohammed Mursi, o primeiro presidente eleito do Egito, deposto por militares no começo do mês.

Mursi e seu grupo político, a Irmandade Muçulmana, viram nas eleições uma oportunidade para impor ditames religiosos sobre toda a população, limitando os direitos individuais de quem não pensava como eles. Acabaram depostos, em resposta a milhões de pessoas que foram às ruas pedir sua saída.

Para quem controla a máquina estatal, suprimir minorias é fácil. A história está cheia de exemplos de líderes que, ao chegarem ao poder, governaram autocraticamente, desprezando visões oposicionistas.

Alguns, como Mursi, haviam sido eleitos por voto popular. Nesses casos, quem perde é a democracia.

Líderes eleitos governam para todos --para os que com eles concordem ou não. Achar que as urnas asseguram o direito de ignorar os eleitores derrotados é autoritário.

Trata-se de visão simplista, convenientemente deturpada, que considera a existência de eleições fator suficiente para conferir caráter democrático a um regime político.

Acontece que, para o verdadeiro exercício da democracia, eleições são só o começo. É preciso, também, o respeito a uma ordem constitucional pluralista, imprensa e instituições livres, e um sistema judiciário que aplique a lei com equidade.

Sobretudo, democracia pressupõe garantia aos direitos individuais. Sem isso, não adianta querer posar de democrático.

A intransigência que inviabilizou o governo de Mohammed Mursi e aleijou a democracia egípcia pode ser observada em diversos lugares.

Líderes eleitos com instintos autoritários parecem acreditar que a vitória alcançada nas urnas lhes confere permissão para suprimir direitos aos que a eles se opõem.

Com o objetivo de se eternizarem no poder, destroem o próprio sistema que os habilitou a governar.

Democracia que não admite dissenso é só uma tirania eleita. Conhecemos várias, e nenhuma delas é bonita de se ver.


Divã coletivo - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 20/07


Petistas que têm cargos no Executivo reativaram reuniões para avaliar a gestão. Elas eram comuns no governo Lula. Entre estes, há descontentamento com os rumos do governo Dilma. Eles pregam: reforma ministerial, mais integração entre suas pastas e autonomia para trabalhar. E preveem que o modelo Dilma/Belchior, de corte de custeio, vai travar ainda mais a atual administração.

Eles estavam lá
A primeira destas reuniões, de executivos petistas, foi aberta pelo presidente do PT, Rui Falcão. Mas ele não ficou para ouvir. A segunda, na presença do deputado Ricardo Berzoini, candidato a ministro das Relações Institucionais.

A pleno vapor
O governo está apostando todas as suas fichas no segundo semestre. Avaliam que o clima do país, hoje de apreensão, vai mudar. Acreditam que a economia vai melhorar. A presidente Dilma vai entregar 200 mil habitações do Minha Casa Minha Vida, que se diz no Planalto é tarefa para uma centena de viagens. Contabilizam também, na agenda positiva, a entrada de dinheiro em caixa com os leilões de rodovias e de 50 terminais de portos. Citam ainda a licitação internacional do Trem de Alta Velocidade e com os bilhões que vão entrar pelas mãos de quem se habilitar a explorar o campo petrolífero de Libra. E lembram que no PAC vai ter muita coisa para entregar.

“Paulinho, você vai mesmo concorrer contra o Rui (Falcão)? Faz um acordo. O PT não deveria ter uma disputa agora”
Luiz Inácio Lula Silva
Ex-presidente da República, num encontro com o deputado Paulo Teixeira (SP), candidato da Mensagem

Ele concordou
O líder do PT, José Guimarães (CE), que ontem desautorizou o coordenador da reforma política, Cândido Vaccarezza (PT-SP), estava na sala do presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), quando foi tomada a decisão. Lá, contam que Guimarães não só estava na reunião como concordou com a escolha de Vaccarezza.

Armadilha
O PT, dizem peemedebistas, caiu na armadilha de ficar com a coordenação da reforma política no Congresso. Tudo o que não acontecer, ficará na conta do partido da presidente Dilma.

O desabafo
Internado em São Paulo desde maio para tratar um câncer, o governador de Sergipe, Marcelo Déda (PT), foi surpreendido ontem por reforma no seu secretariado feita pelo seu vice, Jackson Barreto (PMDB). Ele protestou no Twitter: “Jackson nomeou o presidente da Codise à minha revelia. Estou triste e decepcionado. Minha saúde não me permite mais do que o desabafo”.

Bolsa de apostas
Mesmo com a presidente Dilma não realizando a reforma ministerial agora, como desejam setores do PT e do PMDB, há parlamentares trabalhando para que o ex-ministro Franklin Martins volte para o Planalto, mas para assumir a Casa Civil.

Sintonia fina
O presidente do PSD, Gilberto Kassab, fez elogios numa roda de parlamentares ao secretário-geral do partido, Saulo Queiroz, por este ter afirmado que não seria "decente" abandonar a presidente Dilma neste momento de dificuldades.

No PT, o sentimento é de frustração com a ausência da presidente Dilma na reunião do Diretório Nacional. Seria cobrada, mas receberia apoio.

Occupy Leblon - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 20/07

Aliados de Sérgio Cabral (PMDB) veem uma série de erros do governador do Rio na negociação com os manifestantes que ocupam a frente de seu prédio, no Leblon. O principal deles teria sido a retirada de ativistas, o que fez com que a ocupação recrudescesse. Para tentar reverter o desgaste, a ordem no governo é apontar a participação de criminosos nos protestos. Serviços de inteligência da polícia teriam detectado que até ex-policiais vinculados a milícias se infiltraram nos atos.

Zen 
A aliados, Cabral declarou que é preciso manter a serenidade diante de provocações, mas manifestou preocupação com os danos que atos de violência podem causar à imagem do Rio.

Quem avisa... 
Insistindo na vulnerabilidade da segurança do papa Francisco ao Brasil, o governo recomendou ontem pela segunda vez a emissários do Vaticano trazer o papamóvel blindado ao país. A proposta foi recusada.

Ansiolítico 1 
Pesquisa encomendada pelo governo, com 2.000 entrevistas, mostrou aprovação ao programa Mais Médicos, lançado na semana passada e bombardeado por entidades do setor.

Ansiolítico 2 
Segundo a pesquisa, 78% aprovam a criação do segundo ciclo, pelo qual estudantes de medicina têm de atuar dois anos no SUS antes de se formar. Já a contratação de médicos estrangeiros é mais polêmica: 51% são a favor e 45% contra.

Padrão global 
Usando a hashtag de "Amor à Vida" nas redes sociais, médicos contrariados com o Mais Médicos pedem hospitais do mesmo nível de excelência da instituição do personagem Cesar, vivido por Antonio Fagundes na novela da Globo.

Alfinetada 
Da ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil), sobre a comparação feita por peemedebistas entre ela e a Barbie: "Achei graça porque a boneca é mais querida e popular que muito deputado".

Vem... 
Deputados petistas tentarão aprovar uma moção na reunião de hoje do diretório nacional do partido para retirar Cândido Vaccarezza (PT) da coordenação do grupo de trabalho da reforma política na Câmara.

...pra rua 
A bancada alega que o PT precisa insistir na realização de um plebiscito ainda este ano, o que não é o foco da comissão. Até ontem, 40 dos 89 deputados do partido haviam assinado nota contra a permanência de Vaccarezza no grupo.

W.O. 
Nenhum deputado do PMDB prestigiou a visita de Dilma Rousseff ao Ceará, na quinta-feira. A bancada, afinada com o líder Eduardo Cunha (PMDB-RJ), boicotou deliberadamente a agenda.

Álibi 
O senador Eunício Oliveira (CE) justificou a ausência pela necessidade de acompanhar a filha em exames médicos nos EUA.

Sintonia... 
Em conversa ontem, Dilma e Joaquim Barbosa voltaram a falar de reforma política e da simpatia de ambos por uma lei de iniciativa popular sobre o tema, para valer ainda em 2014.

...fina 
Segundo interlocutores, o presidente do Supremo Tribunal Federal defende que um eventual projeto trate do recall, em que a sociedade poderia retirar o mandato de políticos eleitos.

Agenda 
Integrantes do PPS receberam notícia de que a assessoria técnica do TSE concluiu um parecer sobre a distribuição de tempo de TV e fundo partidário para novas siglas --pendência para concretizar a fusão com o PMN.

Numa nice 
PPS e PMN dizem que a distribuição de cargos no MD não é entrave à fusão e negociam apenas o prazo de registro da sigla.

com ANDRÉIA SADI e BRUNO BOGHOSSIAN

tiroteio
"Se Lula lesse jornal, saberia que o PSDB propôs o fim da reeleição para 2018. Aliás, quem tem medo da Dilma em 2014 é o PT."
DO LÍDER DO PSDB NA CÂMARA, CARLOS SAMPAIO (SP), sobre o ex-presidente ter dito que os tucanos querem o fim da reeleição por medo de enfrentar Dilma.

contraponto


Meu pirão primeiro

Em reunião da cúpula paulista do PMDB nos anos 80, o então deputado Aloysio Nunes Ferreira apresentou um pedido de intervenção no diretório do partido em um pequeno município do Estado. Para isso, precisou telefonar para o presidente nacional da sigla, Ulysses Guimarães.

Constrangido por incomodar o dirigente com um assunto aparentemente irrelevante, Aloysio pediu desculpas e disse que tomaria as providências. Ao perceber que a cidade em questão tinha lhe dado muitos votos na eleição anterior, Ulysses protestou:

--Nesse caso, eu peço vista! Vamos decidir com calma!

Democracia, a bandeira esquecida - ALBERTO DINES

GAZETA DO POVO - PR - 20/07

Mesmo quando distanciado do jogo partidário, há momentos em que o cidadão percebe que a política cruza o seu caminho. Isso não se dá exclusivamente na hora de depositar o voto na urna. A agenda eleitoral, como todas as rotinas, tem algo de automatizado. No Brasil vota-se porque o voto é obrigatório, mas as libações cívicas de junho e essas ressacas de julho – principalmente elas – configuram uma dessas tangências entre o caminhar desatento da pessoa física e o despertar dos instintos da pessoa cívica.

O motim da noite de quarta-feira no Rio, a poucos dias da visita do papa Francisco, não assustou apenas os cariocas pela violência das ações ou pela paralisia da polícia em exercer algum controle. Assustou o país inteiro pela gratuidade. Comparado com Paulo Maluf, o governador Sérgio Cabral Filho é um anjo impoluto. José Sarney, que já protagonizou os maiores despudores da nossa cena política, conseguiu safar-se e se manteve absolutamente invisível e intocado ao longo dessas quase oito semanas de desabafos e efervescência.

Os descalabros na administração carioca e fluminense justificariam ações políticas e sanções judiciais, mas não a baderna que se viu. A tentativa de invasão de uma das dependências da Rede Globo lembra os empastelamentos das redações e oficinas de jornais no passado. Existem maneiras mais democráticas de discordar e exercer a crítica ao desempenho da imprensa.

Estamos assistindo a uma escalada totalitária, essa é a verdade. Em junho as marchas eram geralmente pacíficas, às vezes desvirtuadas pela ação de gangues infiltradas na multidão. Agora as investidas são ostensivamente destruidoras, violentas. A surpreendente constatação da Secretaria de Segurança do Rio de que não está preparada para lidar com os protestos não é apenas um estímulo para ataques mais estúpidos; é também um convite às Forças Armadas para manter a ordem e a segurança pública quando parecerem ameaçadas.

O quadro é preocupante; não reconhecê-lo só favorece o clima de desentendimento e desagregação num momento em que a conjuntura econômica e a situação internacional se mostram tão adversas. A portentosa obra de engenharia chamada base aliada – em nome da qual se cometeram tantos desatinos – racha e se fragmenta a cada dia. O PMDB está confirmando os temores de que, ao menor sinal de perigo, pularia do barco. É a sua maestria, identidade: partido de náufragos e sobreviventes.

Com o seu faro para ocupar todos os espaços, o ex-presidente Lula reapareceu na hora H e finalmente rompeu o silêncio: não deixará Dilma Rousseff sozinha, estará nos palanques ao seu lado. É uma ótima notícia, inclusive para os adversários. Quando apelou aos jovens que o ouviam para não negarem a política (mesmo quando estiverem indignados com Dilma ou com ele), Lula estava falando em democracia.

Democracia é a palavra-chave, a bandeira esquecida que precisa ser urgentemente desfraldada para dar sentido às mudanças.

Gincana insana - KÁTIA ABREU

FOLHA DE SP - 20/07

É inaceitável que um único antropólogo da Funai decida sobre demarcações, acima dos Poderes da República


Há países cujo transtorno geopolítico é a limitação territorial, que, em algumas circunstâncias da história, os impeliu a guerras externas, em busca de ampliação de domínios.

A colonização portuguesa nos poupou dessa tragédia, garantindo-nos um país-continente de natureza exuberante. Mas, por conta própria, nós criamos outra: a gestão aleatória, desintegrada de nosso território, que nos leva a conflitos internos decorrentes da má administração desse patrimônio.

É impensável que o quinto maior país do planeta, o maior em extensão contínua de terras agricultáveis, ainda padeça desse tipo de anomalia. Briga-se por terra num país em que 62% do seu solo estão cobertos por vegetação nativa, tal como o encontraram os descobridores.

Nenhum outro país dispõe de tal patrimônio ambiental. Mesmo assim, ONGs com origem em países que dizimaram florestas e índios --e que disputam com o Brasil o mercado mundial do agronegócio-- sentem-se com autoridade para nos dar lições de moral nessas questões.

Em 27,7% do nosso território, produzimos uma das maiores e mais sofisticadas agriculturas do planeta, que, além de prover a população, abastece o mercado externo. O agro garante emprego formal a mais de 15 milhões de trabalhadores e responde por quase 25% do PIB. Nos últimos 12 meses, gerou 83,9 bilhões de dólares de superavit.

Os produtores rurais não reivindicam um hectare a mais. Ao contrário: segundo censos do IBGE, cederam 45 milhões de hectares para os mais diversos fins nos últimos 30 anos.

Com o novo Código Florestal, terão que recompor mais de 30 milhões de hectares, segundo o Ministério do Meio Ambiente.

Mesmo assim, continuam sendo o bode expiatório da questão fundiária. Aqueles que se dizem os únicos ambientalistas, defensores da causa indígena e organizações de sem terra insistem em apontar os produtores rurais como vilões, incentivando invasão e depredação de terras produtivas.

No início desse processo, que remonta ao governo FHC, falava-se em combate ao latifúndio improdutivo; hoje, o alvo são as terras produtivas. Isso num país em que pouco mais de 500 mil brasileiros índios ocupam 13% do território, enquanto cidades e infraestrutura, com quase 200 milhões de habitantes, ocupam apenas 2,5% das terras da nação.

Mantida a gincana pela ampliação e pela criação de terras indígenas e unidades de conservação (UC) sobre áreas de produção no ritmo dos governos FHC e Lula, como querem lideres de movimentos sociais, poderemos chegar a 2030 com a agropecuária fortemente comprometida.

Isso porque esta expansão ilimitada não se dá sobre, por exemplo, terras devolutas da União (17,6% do território), e sim sobre áreas da agropecuária, algumas das quais tituladas há mais de um século.

É desnecessário comentar sobre os danos que a insegurança jurídica causa à economia nacional, justamente no setor que tem sido seu sustentáculo.

Há duas semanas, chegou às mãos da presidente Dilma Rousseff uma "Carta Pública dos Povos Indígenas do Brasil", exigindo que Judiciário, Legislativo e órgãos técnicos do Executivo, como Embrapa, Ministério da Agricultura e Incra, fiquem de fora da demarcação das terras indígenas.

É inaceitável que um único antropólogo da Funai tenha a palavra final, acima dos Poderes da República. Um laudo antropológico não pode valer mais que imagens de satélite, escrituras públicas centenárias e testemunhos da população das áreas demarcadas.

O que o país precisa ""e com urgência!-- é de gestão integrada do uso do solo, que atenda a todos, sem afetar sua capacidade produtiva. É possível, sim, harmonizar as demandas dos brasileiros índios, sem terra e quilombolas, sem avançar nas áreas que sustentam a economia brasileira.

Para tanto, o governo anuncia que está criando o Núcleo de Inteligência Territorial (NIT) para cuidar da gestão integrada do uso do solo, já no Plano Safra 2013/2014. Uma notícia auspiciosa que pode inaugurar nova fase na história fundiária brasileira.

Governos existem para estabelecer limites em prol da convivência pacífica e civilizada. O agro, há tempos, conhece os seus.

A chanchada do Mercosul - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 20/07
Caudatários de uma ideologia em que a farsa substitui a história, os dirigentes de Brasil, Argentina, Venezuela e Uruguai acreditaram que fosse possível, na base do caradurismo, adulterar a narrativa dos acontecimentos para legitimar a entrada dos venezuelanos no Mercosul. Tal como na Rússia stalinista, em que personagens inconvenientes para a história oficial eram apagados das fotos, o Paraguai, que se opunha ao ingresso da Venezuela, foi "apagado" do bloco sul-americano, como se suas objeções nunca tivessem existido. Agora que o objetivo foi plenamente atingido - a Venezuela não apenas é membro do grupo, como o preside -, o Paraguai foi convidado a reaparecer na foto do Mercosul, para completar o roteiro burlesco costurado pela vanguarda bolivariana. Mas os paraguaios, teimosos, se recusam a participar dessa chanchada.

O Paraguai, sócio-fundador do Mercosul, foi suspenso do bloco em 29 de junho de 2012, como punição por ter afastado o presidente Fernando Lugo do cargo, num julgamento político que, embora relâmpago, não contrariou nenhum item da Constituição do país. Uma missão da Organização dos Estados Americanos (OEA) enviada ao Paraguai logo após o episódio constatou a normalidade democrática. Em seguida, o Conselho da OEA avaliou o assunto e a maioria dos embaixadores corroborou o relatório da missão, descartando, portanto, que tenha havido um "golpe".

Mas nada disso serenou o discurso inflamado da presidente Dilma Rousseff e de sua colega argentina, Cristina Kirchner. Ambas acusaram o Congresso paraguaio de ter promovido uma "ruptura da ordem democrática". Ao insistir nesse ponto, sem dúvida falacioso, Dilma e Cristina estavam construindo o argumento para afastar o Paraguai do Mercosul e, assim, permitir a entrada da Venezuela.

Trocando em miúdos, Brasil e Argentina, em nome da defesa da democracia, patrocinaram um atentado contra as instituições do Mercosul para favorecer um regime cujo autoritarismo é a principal marca. O tratado do bloco exige o voto unânime de seus fundadores para aceitar novos sócios. Como o Congresso paraguaio dava todas as indicações de que não aprovaria o ingresso da Venezuela chavista, Dilma e Cristina aproveitaram a oportunidade da crise política paraguaia para, num passe de mágica, eliminar o voto do país. Enquanto os paraguaios estavam suspensos, Brasil, Argentina e Uruguai abriram as portas do Mercosul para os venezuelanos, numa decisão cuja legalidade é obviamente contestável.

A situação esdrúxula criada pelos compromissos ideológicos de Dilma e Cristina com o bolivarianismo tende a paralisar um Mercosul já claudicante. A suspensão do Paraguai termina no próximo dia 15 de agosto, data da posse do presidente eleito Horacio Cartes, conforme ficou acertado em recente cúpula dos integrantes da união aduaneira. Mas o Senado do Paraguai já decidiu oficialmente que não reconhece o ingresso da Venezuela. Desse modo, o Mercosul -cujas decisões muitas vezes dependem de unanimidade - fará reuniões em que o presidente paraguaio não está autorizado, por seu Congresso, a nem sequer admitir a presença do colega venezuelano.

Não bastasse isso, enquanto o Paraguai cumpria a suspensão, a Venezuela assumiu a presidência do Mercosul - justamente na vez dos paraguaios. Os demais sócios argumentaram que, por estar de castigo, o Paraguai não poderia ocupar o posto. Atropelado, restou ao país exercer seu direito de espernear. "As últimas decisões do Mercosul não se ajustam ao direito internacional", declarou o chanceler paraguaio, José Félix Fernández, recorrendo a uma obviedade para dizer que seu país não aceitará, nas atuais circunstâncias, retornar ao bloco. Cartes, o presidente eleito, também já avisou que será difícil retomar a normalidade do Mercosul enquanto a Venezuela estiver nele. Pode ser que tudo afinal se ajeite, já que o poder do Paraguai é muito limitado, mas o fato é que a atual crise escancarou de vez a mediocridade do Mercosul.

Ajuste de contas - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 20/07

É desejável que a presidente decida-se por um corte de despesas, mas cálculo eleitoral poderá levá-la a evitar medidas austeras


O governo federal definirá até segunda-feira o tamanho do deficit de suas contas neste ano.

Ou seja, a despesa, como de costume, será maior do que a receita --o que resta é indicar qual a dimensão possível ou desejável desse desequilíbrio. Na linguagem oficial, a reprogramação financeira depende de contingenciamentos --gastos previstos no Orçamento que deixarão de ser realizados.

Em maio, Dilma Rousseff havia estabelecido que pouparia o equivalente a 2,3% do PIB, sem levar em conta a despesa com juros (considerados tais pagamentos, o governo entra no vermelho). Desde então, procura descobrir onde cortar a fim de atingir a meta.

Na presente situação, o motivo mais urgente do contingenciamento é a inflação. Trata-se de um contrassenso liberar mais gastos governamentais num momento em que o Banco Central eleva os juros com a finalidade de conter a alta de preços. As despesas adicionais, de resto, pouco fariam pela dinâmica da atividade econômica.

Devido a imprudências passadas, embora recentes, e ao lento crescimento da receita, é improvável que se atinja a meta de 2,3% do PIB. Há no governo quem defenda superavit primário menor a fim de evitar cortes em investimentos --o que, de acordo com esse ponto de vista, prejudicaria ainda mais o crescimento da economia.

Observe-se, porém, em primeiro lugar, que não é o gasto de investimento o que mais cresce, mas o de rubricas como aposentadorias, pensões, programas sociais e auxílios ao trabalhador.

Ou seja, o governo privilegia o consumo em vez do investimento, o que implica apenas mais inflação e menos aumento de produção.

Segundo, não está em discussão a redução de gastos (em relação a 2012), mas a diminuição do ritmo do aumento da despesa.

Terceiro, pelas mesmas razões, ressalte-se que o ínfimo crescimento adicional proporcionado por tais gastos --na hipótese de não haver o contingenciamento-- seria transitório e, repita-se, prejudicaria o trabalho de controle da inflação.

Verdade que a contenção de despesas tende a desacelerar ainda mais a atividade econômica. Infelizmente, esse será o preço a pagar por quase três anos de imprudência nos gastos públicos e leniência com a inflação, entre outras deficiências do governo.

Mas seria um primeiro passo para dar racionalidade à gestão da economia e, mais tarde, reavivar o crescimento do PIB, deprimido faz quase três anos.

Se o cálculo eleitoral prevenir tal medida de austeridade, decerto impopular, o início da recuperação brasileira ficará adiado para depois da eleição de 2014.

Remanso para Dilma - FERNANDO RODRIGUES

FOLHA DE SP - 20/07

BRASÍLIA - A presidente da República, governadores e prefeitos tiveram suas taxas de popularidade avariadas pelos protestos de junho, como mostrou a pesquisa Datafolha do final do mês passado.

Agora, dois outros levantamentos divulgados nesta semana mostram um grau de deterioração similar. No caso de Dilma Rousseff, as pesquisas da CNT e do Ibope indicam que a petista parece ter estacionado no patamar de 30% das intenções de votos na disputa pelo Planalto em 2014.

A primeira pesquisa a detectar a grande queda de Dilma foi a do Datafolha, cujos dados começaram a ser coletados em 27 de junho. Os levantamentos seguintes foram realizados de 7 a 10 deste mês (CNT) e de 11 a 14 (Ibope). Embora com metodologias diferentes, os três estudos colocam a atual presidente na mesma faixa dos 30% nos cenários mais prováveis da corrida sucessória.

Tudo indica que se formou um remanso para Dilma Rousseff. Ela parou de cair. Não há dados conhecidos para todos os governadores e prefeitos, mas o mais provável é que o remanso seja quase geral. Os brasileiros estavam irritados. Foram às ruas e protestaram. Desidrataram o nível de confiança que depositavam nos políticos. Agora, vão esperar um pouco para ver o que acontece.

Para Dilma, a notícia é boa e ruim ao mesmo tempo. A parte positiva é ter estancado a sua queda. A negativa é que está perigosamente estacionada numa faixa em que pode ser superada pela soma das intenções de voto dos demais adversários.

A oposição emerge ainda frágil e com um sinal amarelo para candidatos do establishment como Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB). Até porque, quem mais se beneficiou até agora da derrapada de Dilma foi um nome da terceira via, a verde Marina Silva e sua Rede.

Mal-entendido fatal - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 20/07
O presidente da seção do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, nega que tenha feito um pacto com o comandante da Polícia Militar para que não fosse usado gás lacrimogêneo ou bombas de dispersão nas manifestações, mas admitiu que fez algumas ponderações .

O comandante Erir Ribeiro da Costa Filho atribuiu a esse pretenso acordo com a OAB e movimentos de direitos humanos, como a Anistia Internacional, a perda de controle da situação na noite de quarta-feira no Rio, quando várias lojas foram saqueadas, equipamentos urbanos, depredados, e barricadas de fogo, colocadas ao longo da Avenida Ataulfo de Paiva, no Leblon, durante várias horas por ação de baderneiros, sem que a polícia interviesse.

Segundo Santa Cruz, as ponderações que fez, por conta especialmente do episódio da clínica médica em Laranjeiras invadida no domingo, com doentes terminais passando mal, foi sobre o uso cuidadoso principalmente do gás lacrimogêneo, e claro que preferíamos a utilização das armas não letais . E também sobre o momento da utilização .

Santa Cruz diz que ponderou com as autoridades que os Black Blocs (bandos de anarquistas que têm a depredação de prédios públicos e bancos como ação política) saem da manifestação, batem na polícia, recuam, e a polícia, ao jogar gás lacrimogêneo, apenas espalha o movimento .

Para ele, a OAB sempre teve uma posição muito firme de que qualquer manifestação que desbordasse em violência, fora da legalidade, deveria ser reprimida pela PM . Santa Cruz disse que teve o cuidado de ser muito claro na relação com a PM para evitar que a OAB fique naquela posição clássica, como se ela estivesse dando cobertura a qualquer tipo de ilegalidade. Paguei um preço alto em críticas pelo que aconteceu no Leblon .

Na terça-feira, diz Santa Cruz, o comandante da Polícia Militar pediu que os advogados ficassem entre os manifestantes e a polícia, e eu não concordei. Acho um absurdo colocar advogados como escudo . Houve a determinação, então, para que os advogados acompanhassem de trás as manifestações, relata Santa Cruz.

O presidente da OAB do Rio fez críticas à ação da Polícia Militar: Depois dessas badernas, nós estamos estranhando que não chega às delegacias no final da noite nenhum desses Black Blocs, ou chegam pouquíssimos .

Segundo ele, o que tem acontecido é que a PM, após se omitir, deixar que esses grupos atuem, passa no final da noite recolhendo pessoas, e já recolheu cadeirante, recolheu mendigos. Quando chegam à delegacia, a Polícia Civil, que tem desempenhado um bom papel, não tem condições de fazer a ocorrência dentro da lei .

Há informações de que a OAB está mandando advogados para as delegacias para soltar os presos, mas Felipe Santa Cruz diz que o que existe é um movimento que nasceu também espontaneamente no Facebook, chamado Habeas Corpus, formado por advogados.

Ele explica que parte do trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil tem sido acompanhar tecnicamente nas delegacias os casos de prisão, e há uma determinação nossa de que toda e qualquer ação ilegal deve ser combatida .

Santa Cruz diz que a OAB faz o acompanhamento das manifestações desde o seu início, e a preocupação era garantir a liberdade de manifestação, nunca a defesa desses baderneiros . Ele ressalta que fazem esse acompanhamento a convite da própria PM, para verificar se as leis estão sendo cumpridas e os direitos humanos, respeitados nos procedimentos policiais nas delegacias.

Mas basicamente atendendo à população que vem sendo presa sem razão nenhuma. Nós proibimos os advogados de trabalharem em nome da Ordem na defesa dos que são acusados formalmente de baderna. Claro que todos têm direito a advogados, mas devem procurar por conta própria .

De duas, uma: ou o comandante da PM, Erir da Costa Filho, levou a sério demais as ponderações do presidente da OAB do Rio, ou Felipe Santa Cruz transformou em meras ponderações o pacto com a Polícia Militar depois do resultado desastroso de sua mediação.
pois do resultado desastroso de sua mediação.

O novo atrapalha a teoria - ROSISKA DARCY DE OLIVEIRA

O GLOBO - 20/07

Cabe às autoridades identificar quem pratica atos criminosos, dizer à população quem são, impedir sua ação. Confundir os manifestantes com os baderneiros é dar ganho de causa a esses criminosos



No quebra-quebra da última quarta-feira no Leblon e em Ipanema, arruaceiros infiltrados em uma manifestação pacífica conseguiram envenená-la. Eram poucos, o estrago foi imenso. Os manifestantes são agora acusados por autoridades de serem manipulados, o que esvazia sua autenticidade e desvia o conteúdo das demandas da rua para a querela personalista. Como se as ruas nada fossem senão marionetes coadjuvantes da tragicomédia partidária. Essa acusação injusta desfigura um movimento cuja causa é nobre.

Os jovens têm o desafio e a responsabilidade de, sem ambiguidades, demarcar-se dos vândalos preservando a lição de democracia que vêm dando ao país. Violência não rima com liberdade.

É difícil entender o novo. O novo atrapalha a teoria.

Quem foi jovem em 68, com saudades de si mesmo, busca similitudes entre os manifestantes de hoje e aqueles de quase meio século atrás. Em vão. Não se é jovem duas vezes, a escultura do tempo é impiedosa. Os jovens de hoje nada têm a ver com aqueles, só a indignação.

Na efervescência em que vive o país, com partidos políticos e sindicatos agonizantes tentando um ultrapassado protagonismo, são os jovens, esses desconhecidos, que esboçam o futuro. Enquanto os partidos se aferram à tomada do poder, eles tomam a palavra e dão exemplo de exercício democrático em que o poder se distribui em múltiplas instâncias de participação.

Quem veio às ruas nesse último mês nasceu depois da queda do muro de Berlim e fez-se adulto quando aluíram as torres gêmeas. Não se define como esquerda ou direita. Não atende a convocatórias de fulano ou beltrano. São cidadãos da nação Facebook, um estado virtual sem fronteiras.

A rede é a grande revolução social que viram nascer e crescer, proeza tecnológica de que são contemporâneos onde se geram os valores de que estão imbuídos: partilha, liberdade de expressão e gratuidade. Diferentes no conteúdo, as manifestações, mundo afora, são similares na forma de organização e expressão porque emergem da cibercultura que é a cultura global contemporânea.

Pós-ideológicos, nossos jovens concentram suas exigências na liberdade, no bem viver e na condenação da corrupção. A liberdade herdada da luta de outras gerações, um patrimônio cujo valor mal avaliam; quando ameaçada, defendem.

Acusados de individualistas, vivem do compartilhamento da informação e, à sua maneira, têm uma vida em comum, posta a nu e acessível a todos, fazendo da transparência uma regra que querem válida em todos os espaços. Daí a ojeriza às zonas de sombra, à trapaça, que consideram a regra do jogo partidário.

Criados na liberdade de expressão absoluta, tocando às vezes as raias da irresponsabilidade, a irreverência juvenil encontrou na rede seu instrumento ideal, que lhes garante não só o direito de se exprimir, mas sobretudo o de ser ouvido, quiçá por milhões de interlocutores.

A gratuidade que experimentam no consumo dos bens culturais disponíveis na rede — ou o que percebem como tal, apesar de essa gratuidade ter valido ao criador do Facebook uma das maiores fortunas do mundo — se traduz na demanda radical de um mundo sem dono. Na contramão do “tudo tem seu preço”, a juventude “face” tudo disponibiliza, o que é seu e o que é dos outros, tem uma espantosa intimidade com a ideia de que tudo lhe pertence e de graça. O que exacerba sua indignação quando privada daquilo pelo que paga, ou pagam seus pais sob a forma de impostos.

São contra escolas sucateadas, a doença da saúde pública, a infelicidade feliciana e o transporte que não chega a lugar nenhum. Sua meta-demanda é o fim da corrupção. Não merecem a pecha de apolíticos. A rede não os faz individualistas, e sim autônomos e conectados. Capta e traz à tona, na palavra de cada um, tendências de opinião, cria solidariedades que se inscrevem nos seus cartazes.

Sua mobilização instantânea e geométrica provocou um curto-circuito no enferrujado motor das máquinas partidárias que entraram em pane e em pane continuam. Envelheceram no diálogo de surdos com essa população, esmagadoramente jovem, que de repente entrou em cena.

Considere-se um progresso, um retrocesso ou um progresso que contém riscos, nada muda o fato que as redes existem, são um ator político relevante, o Ágora da Pólis do século XXI.

Não há que pôr a culpa nos jovens. Cabe às autoridades identificar quem pratica atos criminosos, dizer à população quem são, impedir sua ação. Confundir os manifestantes com os baderneiros é dar ganho de causa a esses criminosos que tentam, na multidão, se confundir com eles.

Reaproximação - RICARDO MENDONÇA

FOLHA DE SP - 20/07

O ex-presidente Lula notou uma tendência. No "New York Times", escreveu que o PT precisa recuperar as ligações com os movimentos sociais. Não será fácil. Tome como exemplo um segmento específico, combate ao trabalho escravo, área em que a sigla reinava sozinha.

Assim como na política de transferência de renda, o marco inicial dessa ação não é petista. Foi em 1995 que FHC reconheceu oficialmente o problema diante da ONU. Nascia o grupo de fiscalização móvel, eficiente instrumento para libertar trabalhadores.

Mas, tal qual o Bolsa Família, foi sob Lula que a política ganhou corpo e alcance. Já em 2003, o total de pessoas resgatadas saltou para 5.223, mais que o dobro do recorde tucano. Em oito anos, foram 33.287 libertações, seis vezes mais que nos oito anteriores.

Além das operações, foi criada a lista suja de exploradores, permitindo que a circulação de mercadorias de origem escravagista fosse exposta. Bancos cortaram empréstimos. Empresas passaram a romper com fornecedores delituosos. Até o ultracapitalista Walmart aderiu.

No fim da gestão Lula, porém, ocorreu uma tentativa de enfraquecimento da política. A Advocacia-Geral da União fez um acordo inédito para impedir um retorno da Cosan à lista suja. Maior produtora de álcool do país, ela era a estrela da campanha do etanol.

Em 2012, novo susto. Ativistas perceberam uma articulação no governo para ajudar a construtora MRV --estrela do Minha Casa, Minha Vida-- a sair do cadastro. Com uma liminar, a firma acabou não precisando do favor. Nesse caso, o Judiciário foi rápido.

Enquanto isso, em São Paulo, algo novo surgia. O deputado estadual Carlos Bezerra Jr. (PSDB) aprovou uma lei que cassa inscrição estadual de empresa flagrada. Na prática, inviabiliza sua atuação. Para os entendidos, é a ação mais ousada contra o escravismo hoje. E o fim da primazia petista no setor.

Para regulamentar a lei, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, aproveitou um evento do Judiciário e de ONGs sobre o tema. É significativo que, confirmada no programa, a ministra petista Maria do Rosário (Direitos Humanos) não tenha aparecido.

Esse tipo de inversão em área que o PT surfava sozinho não é inédito. Ambientalistas e militantes da causa indígena desembarcaram junto com Marina Silva. Entre os gays, Marta Suplicy foi trocada pelo deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) como porta-voz. Sobre drogas, a nova referência é FHC.

Para a reaproximação que Lula quer, ativistas dirão que o petismo deve rever a opção pelo desenvolvimentismo a qualquer custo e certas alianças "pela governabilidade". Alguém acredita nisso?

Sonho ou frustração? - MARIO CEZAR FLORES

O ESTADO DE S. PAULO - 20/07

A sistemática postergação da reforma política sugere ser difícil corrigir decisivamente nosso modelo político vigente, cujas nuanças patrimonialistas, construídas ao longo da nossa História e vistas como convenientes por parte do mundo político, vêm sendo infladas na vigência da Constituição de 1988. As tímidas e limitadas iniciativas reformistas já aventadas têm esmaecido na discreta procrastinação das "boas intenções" ambíguas assimiladas pela indiferença do povo, e isso não mudará facilmente: para que a reforma avance é preciso que seus propulsores se sintam satisfeitos com a expectativa do julgamento positivo da História, aceitando com disposição cidadã eventuais dissabores políticos no curto prazo.

O conteúdo ideal da reforma política é complexo e abrangente. Alguns exemplos de temas polêmicos que conviria ser nela pensados: definição de parâmetros condicionadores de partidos doutrinária e pragmaticamente consistentes, e não meras legendas eleitorais e atores no conluio político; fidelidade partidária; representação proporcional mais arrazoada com a população dos Estados; sistema eleitoral (voto distrital/ misto/ proporcional); coligação partidária (haveria lógica em tê-la diferente Brasil afora se os partidos fossem consistentes...?); grilagem eleitoral (suplência, sobra de legenda...); financiamento das campanhas; reeleição (Executivo e Legislativo); o número de deputados (nos EUA são 435 deputados para uma população de 310 milhões, aqui são 513 para 193 milhões; nos EUA, dois senadores por Estado, aqui três) e vereadores.

Temas dessa natureza são em princípio inadequados à consulta direta ao povo (plebiscito) porque transcendem, compreensivelmente, sua capacidade de discernir sobre eles com convicção cívica bem fundamentada. Se houver esclarecimento objetivo (no longo prazo, papel da educação e no curto, da mídia), algumas questões talvez admitam perguntas e respostas simples, adequadas a plebiscito, mas a maioria não as admite e mesmo aquelas exigirão a formatação constitucional ou legal da opção definida na consulta popular.

Admitida a restrição ao ideal plebiscitário e obviamente excluída a solução via trauma revolucionário pelas mãos de "Vanguardas" dogmáticas, em regime constitucional democrático como o que vivemos a formulação do esboço da reforma e a decisão sobre seu conteúdo precisam ser conduzidas por assembleia representativa - no Brasil hoje, o Congresso Nacional. O esboço já poderia ter sido feito há muito tempo pelas comissões aventadas no início de 2011 no Senado e na Câmara dos Deputados. A paralisia (o esmaecimento...) de ambas não encoraja muito otimismo nesse encaminhamento constitucional, agora retomado em "segunda época" na Câmara, aos tropeços, que sugerem dificuldades para que se chegue a resultados positivos. Será possível chegar a eles na amplitude desejável? É um tanto otimista a esperança na revisão profunda, mas há que "torcer" para que ocorra.

Alternativa menos palatável: a formulação do esboço por grupo pluralístico competente, assessorado por especialistas temáticos. O grupo serviria ao processo como poderia ter servido a Comissão Afonso Arinos em 1987, que se valeu de contribuição diversa e capaz, cujo produto foi ignorado. Caber-lhe-ia esboçar a estrutura constitucional e legal da solução; deliberar, com o óbvio direito a mudar, seria encargo do Congresso. A hipótese parece ser uma versão de "vanguardismo" antidemocrático, mas a similitude é limitada porque o grupo deve ser aberto à diversidade (constituí-lo é o nó da alternativa, cujo trato excederia a dimensão razoável deste artigo).

Seja qual for o caminho, cabe à mídia exercer um papel vital, particularmente no encaminhamento constitucional clássico, aparentemente reiniciado: estimular a mobilização e a pressão atuante da opinião pública, para evitar que, de esperança, o processo vire "embromação" à Lampedusa (em O Leopardo) - algo como "Vamos mudar para que continue como antes".

A reforma política em profundidade é indispensável à produção de Executivos e Legislativos na qualidade exigida pela complexidade nacional e internacional. E condição para que a política seja atraente à emersão política de brasileiros de boa estatura cultural, íntegros e competentes, não estimulada no regime de 1964 e tampouco pela democracia pós-1985, dando ensejo a que o espaço político seja hoje permeado pela mediocridade e por discutível padrão ético. Na mão contrária, a reforma deve ser útil à rejeição de arrivistas, demagogos e "fichas-sujas", que transformam a política, de sacerdócio cívico, em farsa que os promove com vista à política como generoso meio de vida.

Há que reconhecer: será complicado fazer a reforma política de fato redentora. Mas se ela ocorrer, veremos o resgate da credibilidade da política, erodida há decênios, viveremos democraticamente uma ruptura modernizadora similar à que ocorreu revolucionariamente em 1930, então desembocando no autoritarismo. Estar-se-á propiciando ao País uma estrutura política capaz de "tocar" todo o processo revisor que se faz necessário, de formular e executar competentemente projetos nacionais expressivos, de funcionar no paradigma "servir ao País", em vez de "servir-se do País".

Em suma, estar-se-á criando uma classe política capaz de "construir condições para tornar possível o desejável" (frase de Fernando Henrique Cardoso), de conduzir o País a novo patamar de satisfação interna e de presença assertiva no planeta integrado, em que emergirão (já estão emergindo) muitos problemas nacionais e transnacionais exigentes de elites políticas cultas e competentes. O Brasil disporá da condução coerente com suas necessidades e sua dimensão relativa no mundo. Esse é o desafio político brasileiro, hoje.

Na reforma política, será possível chegar a resultados positivos na amplitude desejável?.

A vida encantadora das ruas - SÉRGIO MAGALHÃES

O GLOBO - 20/07

“Eu amo a rua”, diz João do Rio, em crônica que inaugura seu livro famoso; e acrescenta: “Esse sentimento de natureza toda íntima não vos seria revelado por mim se não julgasse que esse amor é partilhado por todos vós.” Amor que “une, nivela e agremia”, o “único que resiste às idades e às épocas”.

“A rua do alinhado das fachadas é um fator de vida das cidades” — “é a mais niveladora das obras humanas”, reitera. “A rua faz as celebridades e as revoltas.”

No início do século XX, quando essa crônica foi escrita, os pensadores do urbanismo ainda não haviam condenado a “rua corredor”, aquela “do alinhado das fachadas” de João do Rio. A condenação se deu pouco depois, enunciada pelo arquiteto franco-suíço Le Corbusier, e disseminou-se mundialmente como febre avassaladora. Na cidade funcional, tudo seria autônomo: morar, trabalhar, recrear, circular; cada função em seu lugar.

O lugar da circulação não seria “povoado”, mas preenchido por veículos e pela velocidade. Tal modelo foi algoz das ruas preexistentes: não acabou com elas, mas as transformou em lugares inóspitos ao convívio, barulhentos, desinteressantes. Os edifícios foram dispensados de manter relação de escala com a rua; independentes do lugar e da paisagem, atenderam muito bem ao lucro imobiliário.

Ainda são frutos desse modelo funcionalista os bairros homogêneos, os condomínios isolados, os shopping centers — e, logo, as autopistas, os elevados e a ausência de calçadas. Também os Centros sem moradia, vazios à noite e aos fins de semana. (Lembremos que, no Rio, por trinta anos foi proibido construir habitação na área central — em benefício dos novos bairros.)

Em especial, o isolamento entre funções urbanas exige o uso de condução para deslocamentos banais e leva ao aumento no tempo de viagem casa-trabalho, alcançando o impasse que hoje assombra nossas cidades.

No entanto, quando viaja ao exterior, em geral, o brasileiro busca cidades com espaços públicos bem estruturados, onde se caminha por ruas-corredores de calçadas bem mantidas, de usos diversificados. A escala urbana adequada, até em cidades de arranha-céus, como Nova York, garante ruas nas quais o convívio é realçado por inúmeras atividades ao nível do passante. Cidades como Paris ou Londres mantêm edifícios corporativos de alto nível empresarial integrados a áreas residenciais, comerciais e de serviços de pequena e média escala.

Quando as velhas ruas das cidades brasileiras se enchem de jovens a exigir mudanças, retomam momentaneamente a antiga vitalidade — e reivindicam uma qualidade urbana que sabemos ser possível; um outro paradigma urbanístico é desejado. A cidade da segregação, do isolamento, da falta de serviços, da “imobilidade” de custo proibitivo e da circulação sem vida — esta cidade não corresponde ao sonho contemporâneo.

Paradoxalmente, o desejo da cidade de hoje está cantado há cem anos por João do Rio, com ruas que unem, nivelam e agremiam em um amor compartilhado por todos. Ruas que têm alma.

Insegurança hospitalar - CLÁUDIA COLLUCCI

FOLHA DE SP - 20/07

SÃO PAULO - "Um doente tem mais probabilidade de morrer ao se internar num hospital do que no campo de batalha de Waterloo."

Ao comparar os perigos hospitalares ao confronto que marcou a última batalha de Napoleão, o obstetra escocês James Young Simpson (1811-1870) não exagerou.

Quase um século e meio depois, os hospitais continuam sendo um ambiente cheio de riscos ao paciente, onde frequentemente ocorrem mortes e danos que poderiam ter sido evitados se houvesse uma cultura preventiva.

O marco dessa discussão ocorreu em 1999, quando o Instituto de Medicina dos Estados Unidos publicou o relatório "To err is human" (Errar é humano), em que estimou em até 98 mil as mortes evitáveis nos hospitais norte-americanos.

Em 2009, a OMS recomendou aos hospitais a adoção de um checklist antes das cirurgias, capaz de reduzir em 47% a mortalidade e as complicações. Perguntar o nome do paciente e qual órgão será operado estão entre as recomendações.

Vários países mantêm programas exitosos de segurança do paciente, alguns apresentados em junho no QualiHosp (congresso sobre qualidade nos serviços de saúde).

O Brasil acordou tarde para o problema. Só neste ano, em 1º de abril, é que o Ministério da Saúde lançou um programa para prevenir e reduzir erros dentro dos hospitais.

São muitas as barreiras pela frente, começando pelo fato de que é difícil implantar normas de segurança do paciente dentro do caos vivido pela maioria dos hospitais brasileiros, por problemas de má gestão e de subfinanciamento.

Também será preciso mudar a cultura hospitalar de esconder o erro por medo da punição. Sem buscar soluções preventivas, os problemas se repetem e se agravam.

É um caminho longo, mas urgente e necessário. Só assim notícias de criança morrendo por receber vaselina na veia em vez de soro vão parar de ocupar as páginas dos jornais.

O fracasso da ‘nova matriz econômica’ - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 20/07

Para se ter uma economia com baixo nível de atividade, inflação alta e resistente, além de perda de dinamismo externo, foi feito um trabalho meticuloso



A prévia da inflação de julho, dada pelo IPCA-15, foi de 0,07% contra 0,38% em junho. Confirma-se, assim, a esperada diminuição da pressão inflacionária neste início de segundo semestre. Em bases anualizadas, o IPCA volta a ficar abaixo do teto da meta (6,5%) —, o que não significa que ele esteja “dentro da meta”, na verdade, de 4,5%, com dois pontos percentuais a mais ou a menos.

Desanuvia-se um pouco o cenário econômico, dentro de sua mediocridade. O ministro Guido Mantega acha que a economia poderá crescer este ano entre 2,5% e 3%. Como ministro da Fazenda é um otimista profissional, chegar aos 2,5% será um resultado muito bom, depois do 0,9% de 2012. O front inflacionário, por sua vez, continua insolúvel, até onde a vista alcança. Na melhor hipótese, fechará o ano nas redondezas dos 6%, talvez um pouco abaixo, se tudo der certo, e não será muito diferente em 2014, quando a presidente Dilma encerrará o mandato sem ter alcançado a meta de 4,5% — já elevada, até para os padrões de economias emergentes.

E há problemas pela frente, devido à contenção artificial de preços administrados — combustíveis, tarifas de transportes, por exemplo. Um dia, mostra a própria experiência brasileira, estes preços terão de ser descomprimidos, por razões fiscais. Com um óbvio efeito na inflação.

No plano das contas externas, há a ameaça de um déficit comercial, o primeiro desde 2000. Existem, por trás desta previsão — impensável há pouco tempo —, efeitos da queda de cotações de commodities, provocada pelo desaquecimento chinês, e da incapacidade brasileira de, por meio da redução consistente do “custo Brasil”, dotar a economia de capacidade de competição em outros segmentos, além das matérias-primas. Ao contrário, a reação tem sido o protecionismo defensivista. Não se irá a qualquer lugar por esta rota — como também mostra a história da economia brasileira, rica em experimentos heterodoxos fracassados.

Todo este quadro pouco animador deriva de um meticuloso projeto — hoje visivelmente fracassado — de desmontagem da política do “tripé” — câmbio flutuante, metas rígidas de inflação e de superávit primário —, substituído por uma “nova matriz econômica”. Sem que esta mudança fosse assumida formalmente.

A operação-desmonte do “tripé”, iniciada a partir do final do primeiro mandato de Lula, foi acelerada com Dilma na Presidência: queda de juros, sem maiores cuidados com a inflação e gastos públicos. O BC foi hábil em aproveitar o agravamento da crise europeia e cortar a Selic. Os exageros nos gastos e o turbinamento excessivo no consumo, somados ao desestímulo ao investidor privado devido a um intervencionismo preocupante do governo, produziram a atual conjuntura de baixo crescimento, inflação alta, escassos investimentos e pouco dinamismo exportador. O BC já começou a agir na luta contra a inflação. Falta o resto.

O Copom destoa de Dilma - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 20/07
A inflação continuará acima da meta em 2013 e o Banco Central (BC) manterá a política de aperto para frear e conduzir a alta de preços ao nível desejado, segundo a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada quinta-feira passada. Oito dias antes o comitê havia elevado os juros básicos de 8% para 8,5% ao ano. Em pontos muito importantes, o texto repete a ata da reunião anterior, mencionando inflação elevada e resistente e apresentando uma longa lista de fatores de risco - incluídas as contas públicas - para justificar a "continuidade do ritmo de ajuste das condições monetárias".
Na quarta-feira, numa arenga em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, a presidente havia descrito a inflação brasileira como um fenômeno de "caráter cíclico sazonal". É difícil dizer de onde ela tirou essa espantosa confusão entre sazonalidade e processo inflacionário. Mas um ponto é certo: ela se esqueceu de combinar com os dirigentes do BC o recado otimista sobre os preços e sobre a situação das contas fiscais.

Em seu discurso, a presidente mencionou a inflação nove vezes, num esforço para tranquilizar a opinião pública - ou os formadores de opinião? - e criticar quem fala em descontrole dos preços e das finanças públicas. A ata da reunião do Copom já deveria estar pronta nessa altura.

Talvez por isso, ou porque nenhuma pessoa responsável pudesse levar a sério a peroração presidencial, a ata descreve o balanço do setor público, nos parágrafos 22 e 30, como "em posição expansionista".
Pelo menos desde o ano passado os documentos do BC têm apontado os resultados fiscais como componentes importantes do quadro inflacionário. O desajuste das contas públicas favorece o descompasso entre a demanda e a oferta de bens e serviços. Além disso, a gestão das finanças do governo afeta a avaliação econômica e as expectativas em relação aos preços. Os autores das atas têm repetidamente batido nesses pontos.

Além disso, o documento repete a lista costumeira de fatores inflacionários: a expansão do crédito, a "estreita margem de ociosidade no mercado de trabalho", os aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade e os mecanismos remanescentes de indexação. O texto menciona, também, os efeitos de curto prazo da valorização do dólar.

Todos esses fatores são bem conhecidos e têm sido apontados no dia a dia por analistas independentes. Não há, na análise formulada pelo pessoal do Copom, nenhum elemento surpreendente ou fora do comum, com exceção, talvez, de um detalhe.

Ao contrário de altos funcionários do governo e de alguns especialistas do mercado, os economistas do BC parecem imunes ao otimismo gerado, em alguns meios, pelo recuo de alguns indicadores de preços. Esse aparente pessimismo é um bom sinal. A persistente inflação brasileira é um fenômeno bem mais complexo que a oscilação de alguns preços, mesmo alguns muito importantes, como os dos alimentos.

Embora os autores da ata mencionem alguns preços ou grupos de preços, como as cotações das commodities, a maior parte de sua análise se concentra nos fatores determinantes da demanda, como o crédito, a renda dos consumidores e o resultado das contas públicas. Seu critério, portanto, é exatamente oposto ao da presidente: fatores sazonais podem produzir efeitos de curto ou curtíssimo prazo, mas a inflação depende de outras variáveis.

A ata do Copom também chama a atenção para a importância das expectativas. O texto menciona "informações recentes" sobre a retomada do investimento e a continuidade do consumo privado, mas acrescenta uma ressalva: para preservar essa tendência positiva, o governo terá de reverter a perda de confiança dos empresários e das famílias. A piora das expectativas tem sido apontada por pesquisas com executivos e consumidores.

Para mudar esse quadro, a presidente continua apostando numa retórica mal ajambrada e em gestos improvisados, como a proposta de plebiscito e a imposição de serviço obrigatório aos médicos.

Precipitação inoportuna - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 20/07
As mesmas vozes das ruas que cobram a melhoria do sistema público de saúde preconizam que a pressa é inimiga da perfeição. Mas, na ânsia de conter as manifestações populares, o governo sacou, para jogar de cima para baixo, como os velhos pacotes embrulhados em gabinetes, um programa que estava em gestação havia pelo menos seis meses. Pior: usou a embalagem das medidas provisórias, instrumento pelo qual a Constituição concede ao presidente da República o poder de baixar ato unipessoal com força de lei, deixando ao Congresso Nacional o papel secundário de apenas posteriormente dar ou não a devida chancela. Mais grave ainda: o fez sem observar os pressupostos constitucionais de urgência e relevância.
Para justificar o inexplicável, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, disse que as mudanças apenas valerão a partir de 2015, havendo, portanto, tempo para que sejam amplamente debatidas. Por que, então, passar o carro na frente dos bois, para usar outra expressão popular, nesta hora em que o povo resolveu falar alto no país? Seguir à risca os preceitos da Carta Magna é obrigação inescapável de todo cidadão, que diria dos governantes. Mas, em vez de amadurecer o tema em conversas com a sociedade civil, sobretudo com as universidades, as categorias profissionais da área de saúde e o Congresso, o governo inverteu o processo. Com isso, conseguiu que a primeira consequência do Programa Mais Médicos fosse tornar-se mais um fator de perturbação.

Até a Polícia Federal já teve de ser convocada para pôr alguma ordem na lambança. Isso porque - embora as medidas sejam para 2015, como disse o ministro - as inscrições para participação estão abertas (aliás, encerram-se na próxima quinta-feira) e passaram de 11 mil em pouco mais de uma semana. Logo surgiram boatos nas redes sociais de que médicos estariam se inscrevendo com o intuito de desistirem depois, para tumultuar ainda mais o processo, numa tentativa de boicotar o programa. Resultado: além de abrir inquérito para investigar o caso, o governo já teve de mudar as regras, prevenindo-se contra eventuais sabotagens. Tanto desgaste certamente teria sido evitado com ampla e democrática discussão das providências nos foros adequados.

O atropelo acaba por prevalecer sobre a polêmica em torno das próprias medidas. Em relação ao Mais Médicos - que pretende distribuir melhor esses profissionais no território nacional, suprindo as áreas mais carentes, como o interior e as periferias dos grandes centros urbanos, além das regiões Norte e Nordeste -, a resistência é em torno da abertura do mercado a estrangeiros, sem a revalidação do diploma. De fato, a liberalidade é questionável. Afinal, a comprovação técnica é imprescindível. Já quanto ao Programa de Valorização da Atenção Básica (Provab), a exigência de dois anos de prestação de serviço obrigatório no Sistema Único de Saúde (SUS), mesmo remunerado, seria cabível para formandos em universidades oficiais, não para os da rede privada. Para esses últimos, a ampliação do curso deveria ser facultativa, um atrativo extra, pela experiência a mais e a garantia de emprego imediato.

A mágoa não faz bem à saúde - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 20/07

Na briga entre médicos e governo, está em jogo o lugar da medicina na vida brasileira


O caso da “exportação dos médicos” anda bem longe da bandeira branca, amor. Nem poderia ser diferente, em se tratando de um dos setores mais traumáticos, com perdão ao trocadilho, da sociedade brasileira. Mas pelo menos um saldo positivo pode ser apontado – todo esse arranca-rabo chama a atenção para a urgência de uma sociologia da saúde, questão sobre a qual o país deveria aproveitar a deixa e se debruçar.

Nos círculos acadêmicos, falar da determinância da saúde nas relações sociais é moeda corrente. Vale citar o belíssimo livro Carne e pedra, de Richard Sennett, que entre seus muitos méritos mostra que existe um nó entre ser saudável e ter vida pública. Saúde e doença teriam, sim, a ver não só com desenvolvimento econômico, mas com desenvolvimento político-social. Em miúdos, o sistema de saúde é o retrato escancarado da sociedade. A contar por Sennett, o sistema de saúde não deve ser analisado apenas por sua eficiência tecnocrata, mas por seu uso e significado. Importa nesse debate, sobretudo, a cultura de saúde. Nos dois itens, saímos mal na fotografia. Se do ponto de vista técnico nosso sistema é perdulário, do ponto de vista cultural reflete todos os abismos da sociedade brasileira. A análise, porém, é mais profunda. Embora desigual, o sistema de saúde virou uma espécie de trincheira para se proteger da sociedade da violência. A população espera do sistema algo mais que atendimento, remédios, receita. Quer palavra. Quer hospitalidade.

Tome-se como exemplo a rede de unidades de saúde de Curitiba. Trata-se de uma das máquinas mais incríveis de administração pública, geração de dados, votos – ou perda deles, como se viu na última eleição – e convivência. Os agentes de saúde passam todos os dias pelos quarteirões, divididos em zonas censitárias, nos moldes do IBGE, e marcam nos formulários em que pé andam as famílias. Sabem se há uma adolescente grávida, um agregado que veio do Norte, uma morte recente, um contaminado pelo HIV. Mais – agentes anotam se a família lê jornal, se há cachorro na casa, mais uma ou duas pessoas na casa do que quartos e camas, se as paredes estão em boas condições, o desemprego do João, o casamento da Maria. Nenhum outro setor tem tanta informação atualizada, em tempo real, quanto a saúde. Calcula-se haver mais de 1,5 milhão de fichas únicas. Graças a esse maravilhoso sistema de estatística, as unidades podem, por exemplo, resolver o enigma de quantos carrinheiros há na capital paranaense. E contar para nós quantas pessoas sofrem doenças provocadas por más condições sanitárias.

Infelizmente, por falta de visão ou coragem, esses dados e outros tantos não são públicos, o que inibe a percepção da força de super-herói dos quadrinhos que resiste no sistema de saúde. Um levantamento bem apurado pode mostrar que as unidades e similares recebem mais gente que as praças públicas e que são utilizados, sim, como espaços de proteção. Unidades têm guardas, grades, funcionários públicos e oferecem atividades de lazer – principalmente para idosos. Se não são um ninho, quase.

Com todo esse potencial, não causa espanto que o sistema de saúde seja alvo de tantas tensões sociais. Seu significado pode não ultrapassar o senso comum, um lugar para tratar a doença, mas seus efeitos são notáveis. Mal não faria se ganhasse vulto na chamada sociedade do conhecimento a percepção da sociedade da saúde. A cultura elaborada saiu na frente e percebeu esse filtro não é de hoje. São inúmeros os seriados americanos que têm como cenário os hospitais. A novela brasileira parece ter descoberto o filão. Esses espaços despertam a curiosidade, são propícios para o folhetim, mas só cabem na ficção porque ocupam lugar grandiloquente na realidade.

Na vida real, ainda há muito choro e ranger de dentes quando o assunto é o sistema de saúde. Cada vez mais os médicos são vistos com reserva. A formação humana deles de fato transcende à recebida por um mecânico de automóveis? Os planos de saúde – do mesmo modo – são descritos como as piores tiranias. A hospitalização e a hospitalidade não andam no mesmo passo. A população vê com um pé atrás a insatisfação dos médicos, que se sentem injustiçados diante das últimas do governo. Há um ruído no meio do caminho, uma relação de amor e ódio. As grandes cidades e o estresse que geram, as epidemias de hipertensão e diabete, e – tragédia – o avanço do sofrimento psíquico, tal como previu Jung no século passado, fazem com que desejemos a saúde como nunca. Mas nos sentimos parte de uma paixão não correspondida. Mágoas, como se sabe, são péssimas conselheiras.

Excessos e limites - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 20/07

As cenas de depredação de estabelecimentos comerciais e equipamentos públicos que marcaram as recentes manifestações contra o governador Sérgio Cabral, no Rio, já haviam aparecido anteriormente em diferentes cidades brasileiras, como São Paulo e Brasília.

Tais atos de violência, praticados por pessoas muitas vezes ocultas sob máscaras ou capuzes, não podem passar em branco. Num país em que vigora o Estado de Direito, as autoridades e a polícia têm o dever de assegurar a liberdade de manifestação pacífica, mas igualmente de fazer respeitar os limites impostos pela lei.

É inaceitável que forças de segurança mantidas pelo contribuinte simplesmente se mostrem incapazes de cumprir essa missão.

Mas é o que se tem visto há décadas em todo o país: policiais mal pagos e despreparados, não raro propensos a agir de maneira arbitrária e ilegal, que muitas vezes despertam mais o receio do que a confiança dos cidadãos.

Que uma margem de insubordinação e desafio ao "status quo" faça parte de protestos, já se sabe há muito tempo --não foi, afinal, em junho que o Brasil presenciou pela primeira vez manifestantes marchando nas ruas de suas cidades.

É constrangedor que o secretário de Segurança de um Estado com a importância do Rio de Janeiro declare que seus homens não sabem como se comportar nessas ocasiões. A quem deve recorrer, então, o proprietário de uma loja depredada ante os olhos da polícia? À segurança privada? Às milícias?

Atos públicos são, como é óbvio, parte da democracia e não podem ser tratados com a truculência praticada em alguns momentos da atual onda de manifestações. Bem diferente, contudo, é a omissão das autoridades, que parecem temer o ônus político de uma provável atuação desastrada na repressão aos excessos.

A organização de protestos ou acampamentos nas imediações de residências de governantes verifica-se, há anos, em outros países democráticos. Não haveria motivo para que não ocorresse também no Brasil.

Essa modalidade de pressão, todavia, não pode deixar de resguardar a integridade física dos que são alvo das insatisfações, bem como os direitos dos demais cidadãos.

Não é aceitável que vias públicas sejam bloqueadas a todo momento por pequenos grupos de manifestantes. Tampouco que moradores se vejam impedidos de entrar e sair de suas casas.

Alcançar esse equilíbrio faz parte do processo de amadurecimento democrático.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

ALÉM DOS EUA, 29 PAÍSES OPERARAM RÁDIO NO BRASIL

No bojo do escândalo de bisbilhotagem do governo dos EUA no Brasil, o DiariodoPoder.com.br descobriu que corre solta a cessão de rádios a estrangeiros. Desde 2000, pelo menos 29 países obtiveram autorização para acessar frequências da rede do país. Segundo a Agência Nacional das Telecomunicações, estrangeiros podem operar, temporariamente, estações brasileiras, durante visita oficial de representante ao Brasil.


BRASIL, PAÍS DE TODOS

Obtiveram autorização desde países europeus, como França, Itália, Alemanha, Suíça e Espanha, até países como Irã, Índia e África do Sul.


DE CABO A RABO

Além dos polos São Paulo e Rio de Janeiro, as capitais Brasília, Belém Campo Grande e Salvador tiveram redes liberadas para estrangeiros.


UM INTERESSE SÓ

Já o governo dos EUA preferiu explorar permanentemente, até 2019, 43 rádios em SP, RJ, Brasília e Recife. Pagaram ninharia de R$ 16,7mil


PAGODE RUSSO

O governo da Rússia seguiu o exemplo dos EUA e explora desde 16 de maio de 2007 uma frequência no Brasil. O valor da outorga: R$ 200.


LULA QUER DISTÂNCIA DO PAPA “DOS POBRES” NO RIO

O ex-presidente Lula não foi convidado, nem aceitaria, um encontro com o Papa Francisco, que chega na segunda (22) ao Rio, na primeira visita de seu pontificado – o primeiro de um sul-americano. O Instituto Lula diz que “agora ele é ex-presidente” e não vê razão para encontrar-se com o novo Papa, que comunga com ele a pauta de “opção pelos pobres”. O criador do Bolsa Família pretende ficar em São Paulo e ainda não sabe se vai emitir uma nota saudando Francisco.


MÁ COMPANHIA

Lula visitou as obras do Maracanã em fevereiro, para prestigiar o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), agora em total desgraça.


OREMOS

O papa argentino deverá saudar Lula, que visitou seu antecessor Bento 16 duas vezes e dele recebeu orações no auge da luta contra o câncer.


ECONOMIA

A PF esclarece que custou R$172 mil e não quase R$7 milhões a mudança de dois adidos removidos de Londres (Reino Unido) ao Brasil.


PIOR A EMENDA…

O governo cocaleiro da Bolívia deixou escapar na imprensa como precisa da CIA (serviço secreto americano): o avião da FAB deveria ter faixa “VIP” na fuselagem, para não ser revistado com cães farejadores.


TOMOU DORIL

Investigado no Itamaraty por assédio moral e sexual no consulado em Sidney (Austrália), o embaixador Américo Fontenelle está há 15 dias no Brasil, que não visita há mais de uma década. E não pretende voltar.


FOI ‘SÓ’ O RADAR

Voo Gol 1865 Salvador-Brasília ontem atrasou uma hora por problemas técnicos. O comandante ‘tranquilizou’ a todos dizendo que o defeito não era no avião, o radar do Cindacta Recife não estava funcionando.


ENTRE AFAGOS

Opositor da candidatura de Eduardo Campos (PSB) à Presidência, o governador socialista Cid Gomes (CE) reforçou a Dilma: “Espero vê-la inaugurando o Cinturão das Águas do Ceará em 2015”. A petista sorriu.


HORROR

Foi destaque na imprensa internacional o Mapa da Violência do Centro de Estudos Latino-Americano, mostrando que o Brasil é o 7º país mais violento do mundo, com 1,2 milhão de assassinatos entre 1980 e 2011.


EM BUSCA…

Articulada com o vice Michel Temer, a bancada do PMDB na Câmara vai elaborar um pacote de propostas para o governo Dilma, que deverá ser discutido em reuniões marcadas para os dias 9, 10 e 11 de agosto.


… DE RESPOSTAS

Para balizar as propostas, o ministro Moreira Franco (Aviação Civil) e o presidente da Fundação Ulisses Guimarães, Eliseu Padilha, deverão organizar um seminário com o ex-ministro e economista Delfim Neto.


PEGOU MAL

O governador Sérgio Cabral (PMDB) comprou briga com sua própria polícia e com os órgãos de Segurança do governo federal, após acusar “vândalos internacionais” pela depredação em bairros nobres do Rio.



PENSANDO BEM…

… Dilma não irá à missa inaugural do Papa porque mascarados não podem entrar.


LIÇÃO DE ESPECIALISTA

O advogado e ex-deputado Genival Tourinho acompanhou o conterrâneo Darcy Ribeiro num jantar com Santiago Dantas, em Paris, em 1977. O sommelier, com uma enorme placa de ouro no pescoço, sugeriu o vinho que considerava ideal para acompanhar o pedido, mas Santiago discordou da safra e travou com o especialista do restaurante uma discussão sobre a superioridade das uvas plantadas às margens esquerda ou direita do rio.

- Caipiras de Montes Claros – recorda Tourinho – testemunhamos, eu e Darcy, o sommelier francês se render aos argumentos de Santiago Dantas.

SÁBADO NOS JORNAIS

Globo: Jornada mundial da juventude: Papa na rua muda trânsito e segurança na segunda
Folha: Papa decide desfilar em carro aberto em área de protestos
Estadão: Cabral culpa grupos internacionais por atos e recusa ajuda
Correio: Francisco vai para onde o povo está
Zero Hora: Retrato da carência: Saúde básica da Capital tem só 50% de médicos
Jornal do Commercio: Agora é na base do guincho