sábado, julho 27, 2019

Desenvolvimento econômico e intervenção estatal (parte I) - MARCUS PESTANA

O TEMPO - MG - 27/07

No centro do debate contemporâneo, no Brasil e no mundo, está a discussão sobre o papel do Estado e o modelo de intervenção governamental. Por trás disso há elementos teóricos e políticos e evidências históricas. No plano teórico, o liberalismo disseminou a ideia de que o livre movimento das forças de mercados, tendo como sinalizador o sistema de preços relativos, promoveria por si o equilíbrio microeconômico e macroeconômico a partir das flutuações de oferta e demanda de bens e serviços e da moeda. Autores como Walras, Misses, Bohm-Bawerk e, depois, Hayek e Friedman acreditavam que o mercado deveria ser o grande maestro da economia.

Por outro lado, a evolução da economia demonstrou que a concorrência não era perfeita, que haveria grandes assimetrias de informações e posições entre empresas e consumidores, que monopólios e oligopólios nasceram e que o equilíbrio não era uma tendência natural.

A economia capitalista teria uma dinâmica cíclica, com períodos de expansão alternados com crises. Marx, Keynes, Schumpeter, Kontratieff, Kalecki explicaram de diversas maneiras os movimentos cíclicos da economia, exigindo a ação governamental para compensar as imperfeições no funcionamento do mercado.

Essas polêmicas não são meramente teóricas e contaminaram a dinâmica política na evolução do papel do Estado e no jogo de disputa pelo poder. No nascedouro do capitalismo, o papel do Estado era mínimo. Não havia sequer sistemas públicos de educação, saúde e previdência. E a intervenção econômica dos governos se limitava a assegurar a liberdade de mercado e a estabilidade da moeda.

A experiência histórica concreta delimitou, assim, grosso modo, com suas nuances e calibres, os três polos na disputa pela condução dos destinos da sociedade: o liberalismo, que continua advogando a total prevalência do mercado e a ineficiência de quase toda intervenção estatal; a social-democracia e seu Estado de bem-estar social, que admite o mercado como mais eficiente na orquestração da alocação dos fatores produtivos, mas enxerga as imperfeições de seu funcionamento e advoga a necessidade da intervenção governamental para combater desequilíbrios e desigualdades; e, o Estado máximo, que foi exercitado pela experiência do socialismo real e “deu com os burros n’água”.

A história parece ter dado razão aos que enxergavam não a tendência ao equilíbrio geral, mas os movimentos cíclicos da economia e a produção continuada de desigualdades, paralelos ao inegável e vigoroso avanço das forças produtivas promovido pela evolução do capitalismo.

A globalização reduziu radicalmente a margem de manobra dos Estados nacionais.

Como disse no último artigo, os paradigmas ideológicos estão problematizados. Vivemos um momento de instabilidade. A China “comunista” incorporou o mercado à sua vida. As reações protecionistas e nacionalistas presentes à direita e à esquerda – estranha convergência – presentes na ação de Trump, no Brexit, nas posições da extrema direita e da extrema esquerda europeias, ameaçam o horizonte com uma perspectiva regressiva e antiglobalista.

Na próxima semana, voltarei ao tema, tentando refletir sobre as repercussões desse debate no Brasil, que, a meu juízo, tem na sociedade e nas instituições uma cultura anticapitalista arraigada e uma viciada dependência da ação intervencionista do Estado

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