Atraso do Brasil é obra de muito oportunismo e pouco estudo
Os defensores de um imposto sobre movimentações financeiras (IMF) afirmam que não há evidência de que as cadeias mais longas de produção serão proporcionalmente mais oneradas do que as cadeias curtas.
Um simples exemplo mostra o equívoco da afirmação. Suponha que a alíquota seja de 2,5% para quem vende e de 2,5% para quem compra.
Caso um setor gaste R$ 100 para produzir um bem, o preço mínimo para cobrir os custos e o imposto devido será de R$ 102,5. O consumidor, por sua vez, vai gastar R$ 105,06, quando se adiciona o imposto do comprador.
Suponha, porém, que o produtor venda o bem para o varejo, que então vai vendê-lo para o consumidor. O varejista terá gasto R$ 105,06 para adquirir o bem. Para que não tenha prejuízo, terá que vendê-lo por R$ 107,69. Já o custo total para o consumidor ficará em R$ 110,38.
Dessa forma, a introdução de uma etapa de comercialização entre o produtor e o consumidor aumenta de 5% para mais de 10% a carga tributária sobre o bem final. O problema se agrava nas cadeias com mais etapas de produção, como as da indústria.
O minério de ferro é extraído por meio de homens e máquinas, incidindo imposto sobre a compra desses insumos. Ao vender o minério para as siderúrgicas, será cobrada mais uma rodada de imposto.
O mesmo vai ocorrer quando a siderurgia vender o aço. O imposto vai incidir sobre todo o valor faturado, implicando mais uma cobrança de tributo sobre o ferro utilizado, que já pagou imposto ao ser extraído das minas e, mais uma vez, ao ser vendido para a siderurgia.
Com o IMF, a carga tributária passa a depender de como se organiza a produção. Considere duas empresas que produzem o mesmo bem, só que uma produz todos os seus insumos, enquanto a outra tem maior produtividade porque compra de fornecedores especializados. Pois bem, o bem produzido pela empresa mais eficiente terá maior carga tributária.
Os bens de capital modernos, que utilizam peças compradas de muitos fornecedores, passarão a pagar mais tributos do que os serviços de consultoria.
Por essa razão, muitos países optam pelo imposto sobre valor adicionado, que permite aos vendedores descontar do imposto devido o que já foi pago pelos seus fornecedores. Nesse caso, todos os bens e serviços têm a mesma carga tributária.
Felipe Restrepo analisou a evidência empírica sobre a adoção do IMF em países da América Latina. Seu trabalho, publicado este ano no Journal of International Money and Finance, conclui que houve aumento das transações em papel moeda, redução do crédito e queda do crescimento da indústria.
O atraso do Brasil é obra de muito oportunismo e pouco estudo.
Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia.
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