Faz tempo que atribuir preferências políticas à entidade chamada de "o mercado" é motivo de algum ridículo, seja pela ingenuidade, seja pela picaretagem da explicação.
No entanto, é fato que criaturas mascaradas de "o mercado" sopram histórias nos ouvidos de jornalistas, assim como, sem fantasias, existem pessoas ou grupos influentes da elite econômica que tratam de política e candidaturas.
Seria dispensável escrever essas obviedades constrangedoras se não fosse tão frequente ler que "o mercado" acha isso ou aquilo do último bocejo ou tique de Rodrigo Maia, por exemplo.
Antes de mais nada, do que se trata? Da vontade geral dos endinheirados? De opiniões monolíticas da gente graúda da finança? De uma metonímia gasta e confusa para empresários? A lembrança de alguns casos pode ilustrar de modo menos abstrato a tolice dessa conversa.
Em 2015, os dois maiores banqueiros do país se opunham à deposição de Dilma Rousseff. Roberto Setubal, presidente do Itaú, o disse em entrevista a esta Folha. Luiz Carlos Trabuco e o pessoal do Bradesco na prática davam assessoria informal a Dilma. Obviamente não eram adeptos do programa dilmiano, mas, em resumo grosso, eram avessos à bagunça de um impeachment e ao caráter geral bananeiro da coisa.
Na mesma época, não era bem o que se ouvia da turma mais animada do PFL, "Partido da Faria Lima", apelido sarcástico da finança paulistana, baseado no nome da avenida que é um centro financeiro da cidade. Queriam a cabeça de Dilma na ponta de uma estaca, o quanto antes, mas ficaram na moita, amuados ou até furiosos com Setubal e Trabuco, os pesos mais pesados da praça.
"O mercado" engloba empresários que não sejam da finança? Qual "empresariado"?
Os da Fiesp, adeptos de BNDES, de proteção à indústria nacional e desenvolvimentismo, como Benjamin Steinbruch (CSN etc.)? Os do Iedi dos tempos de Pedro Passos (Natura etc.), com um programa liberal ameno? Os da CNI, essa herança varguista, que nos dias finais do petismo até tomaram um banho de loja liberal, mas não muito? Os liderados por Jorge Gerdau, assessor oficial de Dilma e, logo depois, patrono informal das ruas antipetistas? O empresariado é mais Flavio Rocha, ex-político do PFL, PL, collorido e dono da Riachuelo, da direita dura e adepto de João Doria, ou mais Luiza Trajano?
Há claro, gente mais ou menos influente. Há por vezes articulações, em geral fluidas, a depender da temporada, da conjuntura, de relações muito pessoais e das candidaturas que, enfim, desculpe-se a obviedade, são filtradas na política partidária, e não por algum puro comitê da burguesia.
Armínio Fraga, PSDB por tanto tempo, conversa com nomes fora do furdunço podre da política. Pela carreira pública e de empresário, além de prestígio intelectual, pode fazer muitos amigos e influenciar pessoas, da finança à indústria. É "o mercado"? Muita gente graúda do mercado está no por ora infante Partido Novo, como Gustavo Franco e João Dionísio Amoêdo. Ou em outras praias mais secretas.
Muita gente graúda, a maioria, é adepta de reformas liberais e de uma candidatura viável que leve adiante e logo um programa assim. Óbvio. Quem? Por ora, como de costume, o que há mesmo é um mercado de hipóteses.
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