quinta-feira, outubro 05, 2017

Custo-benefício - ZEINA LATIF

O Estado de S.Paulo - 05/10

O conceito “relação custo-benefício” é ensinado aos alunos de Economia nos primeiros semestres da faculdade. Como os recursos são escassos, os governantes precisam levar em conta os impactos de cada opção de política pública nas suas escolhas. Não fazê-lo implica má alocação de recursos e menor bem-estar social.

Não há no Brasil uma tradição de fazer avaliação de custo-benefício das políticas públicas. Os próprios economistas costumam ignorar essa lição quando propõem aumentar os gastos do governo sem critérios, ignorando as restrições orçamentárias e as consequências para a economia. Na maioria das vezes, gastamos os recursos públicos às cegas, sem estabelecer metas e prazos. Somos perdulários.

O problema é que não há mais como deixar a fatura para as próximas gerações. A “regra de ouro”, prevista na Constituição, proíbe a emissão de dívida pública para pagar gastos correntes (como aposentadorias, salários e remédios), sendo que o Tesouro Nacional já está esbarrando nessa restrição. Aumentar impostos, além de difícil politicamente, não resolveria o problema, inclusive porque a “regra do teto” (limita o crescimento dos gastos à inflação do ano anterior) ficará cada vez mais restritiva já nos próximos anos. É necessário cortar gastos urgentemente, com a devida atenção para a relação custo-benefício de cada política pública.

Essa avaliação das políticas governamentais é mais complexa do que a racionalidade do setor privado, pois envolve não apenas seu custo monetário e o benefício no bem-estar social, mas também suas implicações políticas. O cálculo é também político.

Investimento em saneamento, por exemplo, produz uma tremenda melhora na vida e na saúde das pessoas. Trata-se, porém, de um investimento pouco considerado pelos governantes, pela sua pouca visibilidade; diferente de construir uma ponte ou um hospital. Enquanto isso, benefícios fiscais e crédito subsidiado rendem apoio político de grupos de interesse beneficiados, apesar de pouco transparentes para o restante da sociedade.

O mesmo vale para reformas estruturais. A reforma da Previdência ainda que seja crucial para o País, enfrenta grande resistência, pela proximidade da campanha eleitoral de 2018. Para o Congresso, o desgaste de fazer agora é muito elevado, até porque o governo se mostra pouco empenhado, indicando haver outras prioridades para a agenda legislativa. Por que o Congresso arcaria sozinho com o custo?

Ocorre que, passada a eleição, o cenário sem reformas fiscais é tão devastador, inclusive do ponto de vista político, que não faz sentido adiá-las. A devastação não seria para daqui dez anos. Seria para já.

Solicitar ao Congresso a flexibilização das regras de ouro e do teto, que são constitucionais, em vez de promover reformas estruturantes, pode parecer uma saída fácil, mas não é. Não mesmo. A consequência de uma perspectiva de retorno à trajetória do governo Dilma poderá ser tão virulenta, com impacto na taxa de câmbio e nos juros, que faria qualquer gestor mudar de ideia rapidamente. O quadro fiscal é suficientemente grave para justificar tremenda reação.

Entre flexibilizar as amarras constitucionais dos gastos e avançar com as reformas, o custo-benefício estará cada vez mais favorável para o segundo.

Difícil repetir tantos erros como nos últimos anos. O desastre veio de uma não política que contava com apoio de importantes segmentos do setor produtivo e com o descuido de órgãos de controle.

Aprendemos com a crise. Políticos são pragmáticos e nossas instituições de controle têm funcionado melhor. O papel das lideranças do setor privado, no entanto, será crucial para empurrar a classe política na direção das reformas. Ajudará a reduzir o custo-benefício das reformas.

A pressão da sociedade ajuda a moldar a agenda econômica, sendo maior a responsabilidade da elite. Não convém esperar dos governantes mais do que eles podem entregar.

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