“Passou a hora de dizer a verdade” CARLINHOS CACHOEIRA, ex-bicheiro, preso pela Operação Saqueador, aspirante a delator
Ao preço de queimar a língua ou os dedos, digo que a corrupção política deverá ceder um pouco, mas não muito, tão logo a Lava-Jato se torne uma vaga lembrança. Para que não fosse assim, o Congresso deveria aprovar uma abrangente reforma política capaz de aproximar a vontade do eleitor ao votar e o resultado final das eleições. Bastaria? Certamente que não. Mas sem dúvida seria um passo adiante.
MAS COM ESTE Congresso? Com este governo que deixará de ser interino, mas que nem por isso deixará de ser conservador? Sempre que se reclamava da má qualidade do Congresso ao deputado Ulysses Guimarães, condestável da República nos anos que se seguiram ao fim da ditadura militar de 64, ele respondia: “É porque vocês ainda não viram o próximo”. Estava certo.
A POLÍTICA ENTRE nós degradou-se desde então. E faltam sinais convincentes de que se recuperará. Estreitou-se no Parlamento o espaço para a discussão de ideias. Ele abdicou da tarefa de propor leis. Limita-se a dizer sim ou não às que emanam do Executivo. Política virou um negócio para enriquecer os que a praticam. O Judiciário ganhou um protagonismo excessivo e perigoso.
EM NOVEMBRO do ano passado, pela primeira vez desde 1990, a corrupção alcançou o lugar mais alto do pódio das preocupações dos brasileiros. Com 34%, ela superou a Saúde (16%), o desemprego (10%), e a Educação e a Segurança, empatadas (8%), segundo pesquisa Datafolha. No final de janeiro último, a corrupção continuou no alto, mas o combate a ela cedeu a prioridade para Saúde e inflação.
“OS ELEITORES NÃO castigam a corrupção” como deveriam fazê-lo nem aqui nem em nenhuma outra parte do mundo. “A pesquisa acadêmica mundial concorda que o voto não é uma ferramenta satisfatória de controle político”, observa Jordi Pérez Colomé em reportagem publicada pelo jornal “El País” a propósito dos resultados da recente eleição espanhola para a formação de um novo governo.
GANHOU, ALI, o Partido Popular, apesar de atingido nos últimos anos por pesadas denúncias de corrupção. “Não somos um país diferente. O nível de penalização da corrupção aqui é similar ao de outros países”, diz Elena Costas, professora da Universidade Autônoma de Barcelona. Ela e outros acadêmicos listaram alguns motivos para isso, nada estranhos à realidade brasileira.
PARA COSTAS, “só se tem um voto e quer se dizer muitas coisas. A corrupção não é castigada porque nos afeta pouco. Quando um cidadão decide seu voto valoriza sua ideologia, seus impostos, os candidatos alternativos ou quem vai construir uma ciclovia. A corrupção pode ser um fator, mas é difícil que seja o principal, e seguramente não é o único”.
PARA GONZALO RIVERO, doutor em Política pela Universidade de Nova York, “o voto é ideológico e partidário. Se protegeram sua pensão e sua poupança, você agradece votando”. Acrescenta Jordi Muñoz, professor da Universidade de Barcelona: “Os seguidores de um partido tendem a ver a corrupção desse partido como menos grave”. Ou como algo comum a todos os partidos. (Alô, alô, PT!)
OS ESTUDIOSOS OUVIDOS ressaltam que há vezes em que a corrupção se impõe, mas esses “são casos extraordinários” que exigem intervenção judicial em grande escala e uma cobertura total dos meios de comunicação. Aconteceu na Itália com a Operação Mãos Limpas. Em resumo: “Os políticos corruptos perdem votos, mas não o bastante para deixarem de governar”, reconhece Costas.
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