O pedido de recuperação judicial da Oi não chama a atenção apenas pelo montante de suas dívidas: mais de R$ 65 bilhões a cerca de 13 mil credores. Também merece destaque por causa da inépcia dos órgãos fiscalizadores, que não detectaram a tempo os problemas financeiros da maior operadora de comunicações do País, e das dificuldades jurídicas que surgirão durante o processo de recuperação, pois a empresa é concessionária de um serviço público essencial, sendo a única operadora de telefonia fixa em 2.980 municípios.
As dificuldades financeiras da Oi mostram o preço que o País vai pagar pelo aparelhamento das agências reguladoras nos treze anos e meio de governos petistas. Encarregada de fiscalizar o equilíbrio econômico-financeiro dos agentes públicos e privados do setor, entre outras atribuições, a Agência Nacional de Telecomunicações deveria ter agido a tempo não só para proteger os 70 milhões de clientes da operadora, mas também para evitar que os fornecedores da empresa enfrentem os problemas do calote.
Além disso, como é uma empresa de capital aberto, a Oi também deveria ter estado sob o escrutínio da Comissão de Valores Mobiliários – a autarquia encarregada de disciplinar e fiscalizar sociedades anônimas com títulos negociados em bolsas de valores. Os cotistas de fundos que investiram em ações e debêntures da Oi podem sofrer vultosos prejuízos. Nos últimos meses, as ações da operadora caíram 50%.
No plano jurídico, a recuperação judicial da Oi envolve percalços e armadilhas. Diante da pulverização de credores, a empresa terá de propor quem receberá à vista e quem receberá de forma parcelada, quem receberá integralmente e quem terá desconto na dívida. A fixação de critérios está sujeita a pressões, e a Justiça não está preparada para um processo de recuperação tão vultoso. Para ser homologado por um tribunal, o plano de recuperação precisa ser aprovado pela maioria das classes de credores, como os que têm garantias reais e os que não têm.
Outro problema jurídico está no fato de a Oi ser concessionária de serviço público, detendo diferentes outorgas e autorizações para atender aos segmentos de telefonia móvel, fixa e internet. Em vigor desde 2005, a Lei de Recuperação de Empresas extinguiu a figura jurídica da concordata e, para evitar falências e preservar empregos, autoriza a dilação do pagamento de dívidas e permite que o devedor negocie com os credores redução do valor a ser pago. Mas, no caso das concessionárias de serviço público, a lei estabelece que elas perdem a concessão e que seus bens sejam revertidos à União.
O problema é que, além do risco de descontinuidade na prestação de serviços essenciais, prejudicando os consumidores, a perda da concessão prevista pela Lei de Recuperação choca-se com outros textos legais, como a Lei 8.987/95, que estabelece as regras gerais de concessão de prestação de serviços públicos. No início da década, quando surgiu o primeiro processo de recuperação de uma concessionária de serviço público, envolvendo uma distribuidora de energia elétrica, a continuidade da concessão foi mantida pela Justiça, em nome do interesse público. Pouco tempo depois, na mesma linha, o governo federal baixou a Medida Provisória n.º 577, garantindo a continuidade da concessão a concessionárias do setor elétrico com dificuldades financeiras.
No caso da recuperação judicial da Oi, a dúvida é saber se regras previstas para o setor elétrico poderão, por analogia, ser aplicadas ao setor de telefonia. E por mais que o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Telecomunicações tenha divulgado nota defendendo a revisão da Lei Geral de Telecomunicações, para permitir que as concessionárias de serviço público não tenham de devolver bens ao fim dos contratos, o que aumentaria de modo significativo seu patrimônio, esse é um processo difícil e complexo – até porque, do modo como for tratada, a alteração na regra de reversibilidade dos bens pode acabar favorecendo controladores e gestores ineptos, em detrimento de contribuintes.
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