quarta-feira, maio 18, 2016

Urgência e simbolismo - ROSÂNGELA BITTAR

VALOR ECONÔMICO - 18/05

O Ministério da Cultura era o maior aparelho do governo

Desde logo é bom sublinhar a incompreensão dos que, munidos de um receituário de governos formalmente constituídos, com seus prazos normais de montagem, exigem, do governo Michel Temer, acerto nas escolhas e resultados imediatos. Este é um governo de emergência, de salvação nacional, de soluções urgentes, destinado a fazer o gigante Brasil respirar mesmo que com a ajuda de aparelhos. Construção essa que já fez bonito, mas muito mesmo, ao formular um critério útil e objetivo para a composição do Ministério: a de fazer uma montagem necessária a ter o Congresso como aliado e aprovar instrumentos e remédios adequados. Portanto, o governo teria que ser, e foi, composto pelos partidos, com o compromisso das cúpulas e bancadas nesse Tour de Force da responsabilidade para levantar do chão.

Não é, ao contrário do que diz a propaganda negativa, "mais do mesmo". Não houve esse "mesmo". O governo Dilma Rousseff não governou porque não aprovou seu projeto em um Congresso de quadro partidário múltiplo e disforme na composição de sua base. Não fez um governo com os partidos, embora tivessem partido deles alguns ministros, mas houve sempre a aposta na divisão partidária, na representação fragmentada. Vai-se tentar, agora, fazer funcionar a coalizão.

Foi a formulação que se conseguiu fazer, na emergência, e era adequada aos fins. Não havia chance para elucubrações, respeito a simbolismos como as tão faladas questões de gênero, como é mais prudente definir. Um Ministério sem mulheres, negros, índios e outras minorias não foi sequer pensado. Se algum partido tivesse indicado uma mulher seria um lembrete da existência desse problema, mas ninguém indicou. Até que mulheres havia, por acaso, mas não foram mencionadas nem nas justificativas. A secretária Executiva doMEC, Maria Helena Guimarães, que deve ser mais ministra que o ministro, já estava empossada, bem como outras, mas ninguém se lembrou, evidenciando-se a ausência de ministras, pródigas no governo Dilma.

O governo deu as mais esfarrapadas desculpas, mas foi distração mesmo, isso não era uma preocupação. Teve a coragem de fazer a autocrítica (como havia feito com outras distorções aprovadas no afogadilho) e quando resolveu corrigir, a posteriori, atendendo aos reclamos, veio logo com Maria Silvia Bastos Marques para o BNDES, espécie de divindade na gestão pública, saudada com pompa em todos os quadrantes.

A extinção do Ministério da Cultura, porém, feriu um simbolismo duramente conquistado. Mas pelo menos não foi por acaso, por desconhecimento, foi um ato consciente. Seguirá em processo de transformação em uma Secretaria de Cultura dentro do MEC, com direção politicamente forte. Como o ministério da Educação tem um orçamento significativo, é até possivel que projetos culturais contem com mais apoio. Mas não é disso que se trata. O desfazimento da estrutura é uma iniciativa tão drástica que só poderia ter uma razão prudente. E tem.

O Ministério da Cultura foi reduzido de caso pensado. Deram razão às autoridades que diagnosticaram o problema e sugeriram a transformação aqueles funcionários que, aos gritos de "ministro golpista", receberam o novo ministro da Educação e Cultura, que lá foi se apresentar acreditando que o fazia aos servidores públicos.

O governo já havia descoberto ali um bunker de resistência, uma central de alimentação das redes sociais que atuam em propaganda e campanha eleitoral, um arsenal de instrumentos de mobilização de agentes culturais e outros com objetivos partidários. Com Marta Suplicy o aparelho ficou contido; com Ana de Holanda foi um massacre sobre ela e o grupo que a derrubou não sossegou enquanto não promoveu a reocupação do espaço pelos petistas de rede e burocratas da cultura. Sob o amplo guarda-chuva de Juca Ferreira.

O governo Temer identificou o ministério como um aparelho, com incentivo dirigido e propagação da campanha do golpe. Dali partia um bombardeio contra a nascente gestão. Se a vocação do governo Temer era unificar o Brasil, o objetivo não seria atingido com uma tropa do contra radicada em área tão vital.

A vocação de hegemonia e totalitarismo, a serviço da apropriação do Estado, estava impregnada no Ministério da Cultura, concluíram os analistas do governo. Haverá enxugamento de cargos, revisão de contratos e até de empenhos. Quem sabe consiga o governo Temer criar as condições para retomar logo o simbolismo do Ministério da Cultura do ponto de onde foi interrompido.

Henrique Meirelles aprecia o elemento surpresa, acha que o sigilo nas ações transmite, entre outras impressões, a de segurança. Não queria que fosse vazado o nome do presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, escolhido mas não convidado em definitivo até o último fim de semana. Também resistia um pouco a fazer a opção, queria esperar para pensar mais e ver se era possível alternativa a essa unanimidade. Mas Ilan já estava escolhido pelo presidente Michel Temer e tinha total simpatia dos jaburus, o grupo de ministros próximos que com ele se reuniam no Palácio residencial para formar o governo.

Meirelles talvez preferisse outro, embora nada tivesse contra Ilan, também seu amigo. O presidente foi se fixando em Ilan que passou de cotado a escolhido, até que, certo dia, o Valor publicou que era Ilan o homem do BC.

Em defesa do elemento surpresa, e para deixar a porta aberta a alternativas, como agiu com a equipe do Ministério da Fazenda, Meirelles reclamou do vazamento com os políticos a quem atribuía a divulgação da preferência. À pergunta sobre o que fazer para resgatar a indicação como uma novidade, foi aconselhado a tomar um de dois caminhos: se não fosse o Ilan, deveria fazer um desmentido categórico; se fosse, deveria relacionar vários outros nomes possíveis junto com o dele, retomando as dúvidas. Foi o que Meirelles fez até ontem, quando anunciou Ilan. Para surpresa geral.

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