Se a doutora acreditava no que disse ao tomar posse, o país está frito, se não acreditava, tanto melhor
Há um ano a doutora Dilma assumiu seu segundo mandato e discursou no Congresso. Já não precisava propagar as lorotas típicas das campanhas eleitorais. Vencera a eleição e, com a escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, admitira a gravidade da crise econômica em que jogara o país.
Quem relê esse discurso fica com a pior das sensações. Sai do pesadelo de 2015 com a impressão de que entrará em outro, o de 2016. Não só pelo agravamento da situação econômica, política e administrativa do país, mas pela percepção de que a doutora vive em outro mundo ou julga-se com poderes suficientes para oferecer à população uma vida de fantasias.
Ela disse:
“Em todos os anos do meu primeiro mandato, a inflação permaneceu abaixo do teto da meta e assim vai continuar.”
Segundo as últimas projeções do mercado, ela fechará 2015 acima dos 10%, longe do teto de 6,5% e a maior taxa desde 2002. O estouro da meta era pedra cantada.
“A taxa de desemprego está nos menores patamares já vivenciados na história de nosso país.”
Ótimo, para discurso de despedida. O terceiro trimestre de 2015 fechou com a taxa de desemprego em 8,9%, a maior desde 2012, quando o IBGE começou a calculá-la com uma nova metodologia. Outra pedra cantada.
“As mudanças que o país espera para os próximos quatro anos dependem muito da estabilidade e da credibilidade da economia.”
No primeiro ano de seu novo mandato, o Brasil perdeu o grau de investimento. Em janeiro havia o risco. Nos meses seguintes, o governo tornou o rebaixamento inevitável.
Com a faixa no peito, repetiu platitudes:
“Sei o quanto estou disposta a mobilizar todo o povo brasileiro nesse esforço para uma nova arrancada do nosso querido Brasil.”
“Mais que ninguém sei que o Brasil precisa voltar a crescer.”
As duas frases diziam nada, pois um país não cresce ou deixa de crescer por falta de disposição dos governantes. A disposição da doutora levou-a a uma arrancada, em marcha a ré. A economia encolheu em 2015 e encolherá de novo em 2016.
“A luta que vimos empreendendo contra a corrupção e, principalmente, contra a impunidade, ganhará ainda mais força com o pacote de medidas que me comprometi durante a campanha, e me comprometo a submeter à apreciação do Congresso Nacional ainda neste primeiro semestre.”
No segundo semestre, ela baixou a Medida Provisória 703, refrescando a vida das empreiteiras apanhadas na Lava-Jato. Favorecendo a impunidade, ela permite que as empresas voltem a receber contratos do governo sem que seja necessário admitirem “sua participação no ilícito”, como exigia a lei 12.846, assinada em agosto de 2013 por Dilma Rousseff.
Quando a doutora tomou posse, ela sabia que o “nosso querido Brasil” estava patinando, longe de uma arrancada. Não precisava ter dito o que disse.
Em outros momentos do seu discurso, fez gentilezas e promessas que devem tê-la levado ao arrependimento:
“Sei que conto com o apoio do meu querido vice-presidente Michel Temer, parceiro de todas as horas.”
Esqueça-se que “nosso lema será: Brasil, pátria educadora!”
Dilma Rousseff concluiu seu discurso com uma nota poética:
“Esta chave pode ser resumida num verso com sabor de oração: ‘O impossível se faz já; só os milagres ficam para depois’.”
Entre o impossível e o milagre, deixou de fazer o possível.
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