RIO DE JANEIRO - Em outubro de 1918, a uma média de mil por dia, as pessoas começaram a cair mortas nas ruas do Rio. Era a "Gripe Espanhola", a epidemia que chegara nos navios vindos da Europa, dizimando famílias, grupos, multidões. Os médicos não sabiam o que fazer. Os mortos eram atirados nas caçambas das carroças e enterrados em valas comuns. Até que os médicos, carroceiros e coveiros começaram a morrer também. Parecia o fim. De repente, no 15º dia, assim como surgiu, a gripe foi embora. A população adquirira anticorpos. Aos poucos, as pessoas saíram de casa e a cidade voltou à vida.
Quatro meses depois, o Carnaval de 1919 foi o maior que o Rio conheceu até então –o Carnaval da ressurreição, em que era obrigatório brincar porque talvez não houvesse outro. Ao som de orquestras, mulheres de boca pintada e umbigo à mostra dançavam em carros abertos, abraçadas a rapazes de quepe e calça branca, e flertavam com os outros homens na calçada. O Rio enlouquecera. Nelson Rodrigues, então criança, depois descreveria aqueles umbigos como a vingança da cidade contra a "Espanhola".
Corta para 2015. Diante deste deprimente Natal –comércio às moscas, inflação, demissões, desemprego, pedaladas, corrupção, mentiras, projetos abandonados, encolhimento da economia, fuga dos investimentos, alta do dólar, calotes no crédito, rebaixamento internacional, real na pior e outras mazelas, além de tragédias como a zika, a chikungunya, a morte do rio Doce e os incêndios na Chapada Diamantina, na Amazônia e no Museu da Língua Portuguesa–, as pessoas estão se dividindo em duas correntes.
Para muitas, o Carnaval de 2016 será fabuloso –pelo medo de que, nessa disparada rumo ao buraco,logo não haja mais Brasil ou Carnaval.
Para outras, o Carnaval de rua para valer é o que começará em março.
Nenhum comentário:
Postar um comentário