sexta-feira, novembro 13, 2015

Questão de estilo - JOSÉ PAULO KUPFER

O GLOBO - 13/11

Poderia parecer uma troca de seis por meia dúzia, mas os perfis de Levy e Meirelles indicam que não é exatamente disso que se está tratando


O talk of the town do momento é a até agora suposta troca no comando da condução da economia do governo da presidente Dilma Rousseff. A conversa das esquinas econômicas é que, depois de insistir e insistir, o ex-presidente Lula estaria prestes a emplacar o ex-presidente do Banco Central em seus dois mandatos, o banqueiro Henrique Meirelles, na cadeira em que se senta, com algum desconforto, desde o início do segundo mandato de Dilma, o economista Joaquim Levy.

Pelo escolhido e pelas medidas que gostaria de ver em execução, parece que Lula acha ser possível repetir na segunda metade da década de 2010 a mágica econômica que funcionou nos anos 2000. Mas as coisas mudaram e, por exemplo, injetar crédito para estimular a demanda, com quer o ex-presidente, pode ter, nos dias de hoje, com desemprego, inflação e inadimplência em alta, o mesmo efeito de dar água a quem não tem sede — o risco é de produzir um afogamento.

Há uma série de argumentos para aplicar à falada substituição de ministros o carimbo de improvável. A principal seria a tácita entrega por Dilma da definição das diretrizes de seu governo ao padrinho político. Uma outra restrição ao arranjo arquitetado por Lula é a conhecida rejeição de Dilma a Meirelles, com quem a presidente manteve uma relação pontuada de arestas e de protocolar cordialidade nos tempos em que ambos trabalharam nos governos de Lula.

É útil, contudo, não esquecer que as necessidades da política são especializadas em driblar as improbabilidades. De qualquer maneira, à primeira vista, a substituição de Levy por Meirelles poderia parecer não fazer sentido. Na condução da economia, de fato, Meirelles tocaria a mesma música de Levy, quem sabe até com mais rigor ortodoxo, numa direção contrária ao que Lula e o PT vêm pedindo a Dilma. Mas, pensando bem, não seria exatamente trocar seis por meia dúzia. Há entre Levy e Meirelles uma diferença fundamental de estilo.

Levy é um técnico, com experiência em cargos públicos técnicos e com breve passagem ainda sem marcas distintivas pelo setor privado, em posição subalterna na administração de fundos de investimento do Bradesco. Seu jeito cordial não esconde momentos de forte tensão, uma certa agressividade no debate de temas econômicos e uma ausência de genuína animação — que pode ser confundida com falta de traquejo — no diálogo e nas negociações com políticos.

“Contratado” com a missão de promover um ajuste fiscal que evitasse a perda do “grau de investimento”, Levy, em meio ao ambiente contaminado pela perspectiva do impeachment de Dilma e sob boicote do Congresso, não entregou nem uma coisa nem outra. Também não encontrou caminhos para sair das cordas e oferecer horizontes à retomada do crescimento. Como ministro da Fazenda, em resumo, Levy tem se mostrado um honesto e esforçado secretário do Tesouro.

O perfil de Meirelles é quase o de um Levy invertido. Mesmo no comando de instituições financeiras globais, o ex-presidente do BC sempre teve atuação mais política do que técnica. Engenheiro de formação, fez carreira na subsidiária brasileira do Bank Boston, culminando com a ascensão ao comando de uma operação internacional da instituição. Não erraria quem o classificasse muito mais como um relações-públicas de alto nível, jeitoso no trato e com reconhecida capacidade de negociação política.

Presidente mais longevo no Banco Central da era de metas de inflação, Meirelles entrou e saiu do governo com Lula, colhendo, com o ex-presidente, os louros de um período de equilíbrio e crescimento econômico, sustentado pelo boom dascommodities e por alta liquidez nas finanças globais. Seu currículo à frente do BC, porém, tem também a marca negativa da elevação dos juros básicos em setembro de 2008, às vésperas da quebra do banco Lehman Brothers, e de sua manutenção até o fim daquele ano — segundo muitos, um erro que o obrigou a correr com cortes nas taxas, a partir de janeiro de 2009, e reduzir custos à economia tidos como desnecessários.

José Paulo Kupfer é jornalista

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