O dólar já passou a ser o novo perigo inflacionário que entrou nos radares dos analistas. E até do Banco Central, pelo que se depreende da Ata do Copom. O dólar subindo mais do que o previsto tem impacto no índice de preços, que já subiu por outros reajustes, como o da energia. Por enquanto, a previsão mais frequente é que os juros não vão cair, mas também não vão subir mais até o fim do ano.
Há quem diga que o dólar já fez estragos suficientes e pode haver novo aumento de juros, mas é cedo para dizer com segurança. O que a Ata da última reunião, divulgada ontem, informa é que os preços administrados terão um aumento maior do que o Banco Central previa há um mês e meio. No último encontro, calculava que subiria 12,7%. Agora, acha que esses preços subirão, em média, 14,8%.
Curioso é o eufemismo do Banco Central para falar da recessão brasileira. Diz que "o processo de ajustamento macroeconômico" leva a um "crescimento abaixo do potencial" e que há um "processo de distensão no mercado de trabalho". O Brasil está, na verdade encolhendo, e não crescendo abaixo do potencial, e no ano que vem não se espera crescimento. Isso não será efeito do ajuste, mas do desajuste feito anteriormente.
Para o ano que vem, o BC está otimista em relação à inflação. Na Ata, registra que está se fortalecendo o cenário de convergência para 4,5% no final de 2016. Diz que o efeito defasado da alta de juros ajudará no esforço para se atingir o centro da meta e ressalta que as projeções dos analistas são de desaceleração do índice.
Essa é a boa notícia no meio de um cenário nebuloso. As expectativas são de que no ano que vem se conseguirá derrubar vários pontos no IPCA. A taxa terminará acima de 9% este ano, e as projeções do mercado, capturadas pela pesquisa Focus, são de que ela chegará ao final do ano que vem em 5,4%.
A última reunião do Copom aconteceu logo depois da decisão do governo de reduzir a meta de superávit primário. Na época, muitas previsões eram que os juros subiriam 0,25%. A partir da decisão, as projeções subiram para 0,5%, o que, de fato, aconteceu. O BC admitiu ontem que essa piora do quadro fiscal é prejudicial ao controle da inflação.
Hoje, o IBGE divulga a inflação de julho, e a expectativa é que a taxa seja menor do que a de junho. O problema é que, ainda assim, será muito mais alta do que julho de 2014, que foi de 0,01%, e isso fará o índice acumulado em 12 meses escalar de 8,89% para perto de 9,5%. Quanto mais tempo a inflação ficar nesse patamar, mais ela se fortalece pela indexação; mais renda tira dos trabalhadores; mais desconfiança leva aos empresários.
O novo problema agora é o dólar porque ele passa a ser um novo fator a se juntar a vários outros que têm pressionado os índices de preços. Há poucos meses, foi a crise hídrica que afetou as lavouras e aumentou o custo dos alimentos. Também houve o impacto do preço da energia, que o BC calcula que aumentará 50% este ano. As pressões têm se revezado sobre o índice, e por isso a taxa de juros foi elevada.
A preocupação do BC com o câmbio levou o diretor da Política Monetária, Aldo Mendes, a dizer ao "Valor Econômico" que considera a cotação "esticada demais", fora dos fundamentos. Isso fez a moeda cair em relação à máxima do dia. Há uma semana, o dólar valia R$ 3,33, no dia da última reunião do Copom. Ontem, chegou a ser vendido por R$ 3,57 e fechou em R$ 3,53. Os cenários de referência de mercado, analisados também pelo Banco Central, estimam a moeda em R$ 3,25. Ou seja, tanto o Copom quanto os bancos e as consultorias terão que refazer as projeções de inflação caso o dólar se mantenha no patamar atual.
Essa alta também tem impacto sobre os custos e as dívidas das empresas. A Petrobras divulgou uma queda de 90% no seu lucro do segundo trimestre porque, entre outros motivos, o dólar mais caro encarece os derivados que importa. A sua dívida bruta subiu 18% desde dezembro, saltando de R$ 350 bilhões para R$ 415 bi. Cerca de 80% da dívida está em moeda estrangeira.
Mas a mais importante fonte de incerteza na conjuntura atual, entretanto, é a crise política, porque ela aumenta o risco de perda do grau de investimento. Isso reduz a entrada de investidores e eleva a pressão sobre o câmbio. Existem outros motivos que influenciam no dólar, como a recuperação da economia americana, com provável alta de juros, e a desaceleração da China. O principal fator, no entanto, é a incerteza interna.
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