terça-feira, fevereiro 17, 2015

A Ferj confunde arbitral com arbitrário - MARCIO BRAGA

O GLOBO - 17/02


Há muito tempo que a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj) não passa de uma entidade parasita autoritária. Retém um pedaço do dinheiro da televisão e confisca quase todos os recursos das placas de publicidade estática do Campeonato Carioca.

E ainda extorque dos clubes 10% da receita bruta de todos os jogos, ao arrepio do seu próprio estatuto, que prevê no máximo 10% da renda líquida. É a Federação que mais morde os clubes no Brasil. Ao menos se promovesse um bom campeonato...

Em 2014, 90% dos jogos organizados pela Ferj causaram prejuízos aos times e apenas quatro partidas levaram mais de 15 mil pessoas aos estádios. Mais da metade dos jogos teve menos de 500 torcedores.

Para os que achavam que 2015 não poderia ser pior, a Ferj se superou. Impôs aos clubes a Lei da Mordaça e tabelou os ingressos. A ameaça de multar quem criticar o campeonato é um vício de origem ditatorial do sistema clubes-federações, criado pelo Estado Novo em 1941.

O Brasil já se libertou dos grilhões da ditadura há mais de duas décadas. O esporte ainda continua preso a essa estrutura engessada, arcaica e autoritária. A Constituição de 1988, que tive a honra de subscrever como constituinte, garante a liberdade de expressão.

A Ferj presta um desserviço à democracia com essa postura. Deveria se preocupar em resolver os problemas que dão origem às críticas, ao invés de tentar coibi-las desta forma.

Outra violência da Ferj é o tabelamento do preço dos ingressos. Além de afrontar o princípio constitucional da livre iniciativa e o próprio Estatuto do Torcedor, ameaça o programa de sócio-torcedor dos clubes, que vem sendo construído a duras penas com AmBev, Unilever, TIM e outras grandes empresas, junto com as maiores redes de supermercados do Brasil.

Até agora os clubes já arrecadaram mais de R$ 200 milhões e a perspectiva é de crescimento exponencial: em dois anos o Brasil saiu de 150 mil sócios-torcedores para quase 1 milhão.

Talvez a Ferj não se importe com o programa de sócio-torcedor dos clubes porque desse dinheiro ainda não consegue tungar nada, ao contrário do que acontece com a renda dos jogos, a receita das placas e o dinheiro da TV.

Para completar a novela, o presidente da Ferj reagiu aos protestos do Flamengo agredindo com violência o presidente do clube no último Conselho Arbitral. Isso é inaceitável. Denota desequilíbrio emocional incompatível com a função. Mas, para quem confunde arbitral com arbitrário, vale tudo.

A propósito, o presidente da Ferj entendeu que a nota oficial dos clubes o chamava de ladrão. Como se deve chamar alguém que nos rouba o sonho de um futebol melhor com uma gestão desastrosa dessas?

Clubes, atletas, torcedores precisam se unir contra essa opressão. A Constituição garante autonomia de organização e funcionamento para as entidades esportivas. Até agora, esse dispositivo só valeu para o autoritarismo da CBF e Federações.

Desde a redemocratização o governo vem sendo omisso. A ditadura criou o sistema. Não se pode esperar que clubes e atletas consigam se libertar sozinhos. É hora de um choque de democracia, que pode começar com a criação das ligas, como ocorreu na Europa há muitos anos.

Abaixo a ditadura !

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