quarta-feira, outubro 15, 2014

Provedores de serviços ambientais - MARINA GROSSI

CORREIO BRAZILIENSE - 15/10


Os números são astronômicos e, por si só, já justificariam a inclusão de forma integral dos valores de serviços ecossistêmicos nos orçamentos governamentais e nas planilhas de custo das empresas e de prestadores de serviço em geral. Ativos ambientais como água, regulação do clima, produtos e sementes naturais, entre outros, foram avaliados em US$ 125 trilhões em 2011, de acordo com estimativa mais recente divulgada este ano pela publicação Changes in the global value of ecosystem services (Costanza et al., 2014). As perdas desses ativos, provocadas por degradação ambiental e alteração do uso do solo, podem variar de US$ 4,3 trilhões a US$ 20,2 trilhões por ano.

A preocupação com os impactos econômicos e socioambientais da perda gradativa desses ativos tem motivado, no Brasil e no mundo, o aprofundamento das discussões em torno de projetos de Pagamento de Serviços Ambientais (PSA). Trata-se de mecanismo que estimula a preservação e recuperação ambiental capaz de produzir benefícios coletivos, mas que ainda não faz parte do arcabouço legal na grande maioria dos países, inclusive no Brasil. Há diferentes modelos de contratos de PSA, como, por exemplo, remunerar um fazendeiro para manter e/ou recuperar uma área de floresta no entorno da nascente de um rio. O contratante pode ser uma empresa ou mesmo uma instituição governamental.

Entre os serviços ambientais providos pela natureza e que hoje tornam-se alvo de projetos de conservação e de PSA estão: proteção de matas para manutenção de polinizadores (responsáveis por gerarem até US$ 200 bilhões para a agricultura); regulação do clima por intermédio do controle do desmatamento (cujo dano evitado pode evitar perdas de até US$ 3,7 trilhões até 2030); sequestro de carbono via recuperação, proteção e expansão de áreas verdes; proteção de encostas para evitar deslizamentos; e reflorestamento para a proteção de nascentes e perdas de recursos hídricos por erosão.

Os impactos e efeitos causados pela degradação ambiental, atingindo diretamente a provisão desses serviços ambientais, estão na agenda do noticiário. A redução dos volumes do sistema Cantareira e a seca da nascente do rio São Francisco são consequências de alterações na regulação da umidade e provisão de chuva. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) indicam que o desmatamento da Amazônia pode ser um dos fatores responsáveis pela significativa redução do volume de água dos chamados "rios voadores", que provocam secas e afetam as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Nessas regiões, estão localizados grandes consumidores de água, nas grandes concentrações urbanas, onde já há problemas de abastecimento, e importantes áreas de produção agrária e industrial.

Essas informações científicas demonstram o quanto é crucial o investimento em recuperação e manutenção de serviços ecossistêmicos, que podem ser viabilizados via PSA. Hoje, porém, por falta de legislação específica, não há praticamente estímulo legal para que as empresas instaladas no Brasil incorporem em seus processos produtivos o uso sustentável dos recursos naturais. Esse hiato legal explica, em parte, por que as ações voluntárias e inovadoras da parcela mais consciente do setor empresarial não ganham escala no mercado e ficam confinadas em suas respectivas cadeias de valor.

Para ampliar o debate e trazer a visão do setor empresarial a respeito, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) promoveu recentemente duas iniciativas. Por meio do posicionamento Pagamento por Serviços Ambientais: Recomendações para o Marco Regulatório Brasileiro, o CEBDS propõe um conjunto de medidas e sugestões para a implementação de uma política nacional de PSA, que será entregue aos relatores do principal Projeto de Leisobre o tema que tramita no Congresso.

Além desse documento, uma das propostas da Agenda CEBDS - Por um País Sustentável recomenda a regularização do PSA a partir de projetos apresentados pela iniciativa privada, por meio de incentivos ficais, como a dedução de impostos, nos padrões da bem-sucedida Lei Rouanet.

O CEBDS trabalha na certeza de que essas duas iniciativas vão ajudar a fortalecer a agenda do tema PSA no país, assim como agilizar e garantir que os marcos regulatórios atendam aos diversos atores (governo, empresas, proprietários de terra, comunidades). Essas ações serão capazes de estimular a criação de um novo modelo de negócios, o de provedores de serviços ambientais.

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