sábado, agosto 09, 2014

À margem da lei - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 09/08

No princípio, eu me assustei como cidadã. Era difícil acreditar que da Presidência da República foram postados ataques caluniosos a pessoas, porque na democracia o aparato do Estado não pode ser usado pelo governo para atingir seus supostos adversários. A propósito: não sou adversária do governo; sou jornalista e exerço meu ofício de forma independente.

Só no segundo momento é que pensei no fato de que os ataques eram contra mim e meu colega Carlos Alberto Sardenberg. Ninguém, evidentemente, tem que concordar com o que eu escrevo ou falo no rádio e na televisão. Há, em qualquer democracia, um debate público, e eu gosto de estar nele. Mas postaram mentiras, e isso pertence ao capítulo da calúnia e difamação.

Tenho 40 anos de vida profissional e um currículo do qual me orgulho por ter lutado por ele, minuto a minuto. Acordo de madrugada, vou dormir tarde, estudo diariamente, falo com pessoas diversas, apuro, confiro dados, para que cada opinião seja baseada em fatos. Alguns temas são áridos, mas gosto de mergulhar neles para traduzi-los para o público.

Na primeira vez que um amigo me mostrou o perfil cheio de ataques na Wikipedia fiquei convencida de que era coisa de desocupados. Saber que funcionários públicos, computadores do governo, foram usados na Presidência da República para um trabalho sórdido assim foi um espanto. Uma das regras mais caras do Estado de Direito é que o grupo político que está no governo não pode usar os recursos do Estado contra pessoas das quais não gosta.

O início da minha vida profissional foi tumultuado pela perseguição da ditadura. No Espírito Santo, fui demitida de um jornal por ordem do governador Élcio Álvares. Em Brasília, fui expulsa do gabinete do então ministro Shigeaki Ueki, durante uma coletiva, porque ele não gostava das minhas perguntas e reportagens. O Palácio do Planalto não me dava credencial porque eu havia sido presa e processada pela Lei de Segurança Nacional. Aquele governo usava o Estado contra seus inimigos. E eu era, sim, inimiga do regime.

Na democracia, em todos os governos, ouvi reclamações de ministros e autoridades que eventualmente não gostaram de comentários ou colunas que fiz. Mas eram reclamações apenas, algumas me ajudaram a entender melhor um tema; outras eram desprovidas de razão. Desta vez, foi bem diferente; a atitude só é comparável com a que acontece em governos autoritários.

O Planalto afirma que não tem como saber quem foi. É ingenuidade acreditar que uma pessoa isolada, enlouquecida, resolveu, do IP da sede do governo, achincalhar jornalistas. A tese do regime militar de que os excessos eram cometidos pelos "bolsões sinceros, porém radicais" nunca fez sentido. Alguém deu ordem para que isso fosse executado. É uma política. Não é um caso fortuito. E o alvo não sou eu ou o Sardenberg. Este governo desde o princípio não soube lidar com as críticas, não entende e não gosta da imprensa independente. Tentou-se no início do primeiro mandato Lula reprimir os jornalistas através de conselhos e controles. A ideia jamais foi abandonada. Agora querem o "controle social da mídia", um eufemismo para suprimir a liberdade de imprensa.

Sim, eu faço críticas à política econômica do governo porque ela tem posto em risco avanços duramente conquistados, tem tirado transparência dos dados fiscais, tem um desempenho lamentável, tem criado passivos a serem pagos nos futuros governos e por toda a sociedade. Isso não me transforma em inimiga. E, ainda que eu fosse, constitucionalmente o governo não tem o direito de fazer o que fez. É ilegal e imoral.


Um comentário:

Nehemias Fernandes Jaques disse...

sábado, 9 de agosto de 2014
A ligação entre “Quêdo” e Aécio, com as imagens que a Época tirou da web.

8 de agosto de 2014 | 20:53 Autor: Fernando Britoepoca ligacoes
A excepcional reportagem de Joaquim de Carvalho, hoje, no Diário do Centro do Mundo, revelando as ligações entre Aécio Neves e seu primo, Trancredo Aladim Tolentino merece alguns complementos, que este Tijolaço tem o prazer de oferecer ao trabalho competentíssimo que realizou.
O primeiro deles é a imagem da página da revista Época, que identifica Aécio Neves como proprietário da cachaça “Mingote”, que só sobrevive sem as imagens no site da revista (veja aqui).
Parte da imagem está lá em cima e a página inteira, em pdf, aqui.
Nada de errado em produzir ou gostar de uma boa pinga. Também gosto e, assim como ocorre com Aécio ou Lula, ninguém tenha nada com isso, se não sair por aí trocando as pernas ou vá dirigir.
O fato, porém, é que a referida cachaça é produzida na Fazenda da Mata, em Cláudio, que pertence – como consta de sua declaração, em 50% – ao candidato do PSDB;
E é comercializada pela empresa Tolentino & Tolentino, que é de seu primo Tancredo Tolentino.
Que é o administrador dos alambiques da família, que, por sua vez, ficam na fazenda de Aécio.
Do site da Mingote na internet:
“Essa é uma cachaça pura, envelhecida por cinco anos em barris de amendoim com mais de 50 anos de uso”, como relata, o primo do governador, Tancredo Tolentino, atual administrador dos alambiques da família. Aécio é um entusiasmado com a produção da cachaça nas terras da família. Pelo menos um litro da aguardente ele presenteia diariamente, a amigos, políticos e turistas em visita a Minas Gerais. Em Brasília, já foram vários os políticos agraciados com a autêntica bebida mineira. A maioria recebe um exemplar da Mingote, porque a cachaça Mathusalem está com as unidades contadas. “A cachaça que leva o nome da propriedade, Fazenda da Mata, também está em alta cotação. Já não é mais comercializada, por ter pouquíssima quantidade, sendo esta reservada ao consumo familiar.”
Mas, salvo se há uma profusão de Tancredos outros na família, este Tancredo é o Tancredo Aladim preso e processado por intermediar propinas para um desembargador indicado por Aécio Neves quando governador, como revela Joaquim de Carvalho?
No final do post, coloco o vídeo veiculado pelo Viomundo onde se reproduz a reportagem do Fantástico sobre o caso, obvio que sem nenhuma menção ao parentesco do cidadão com Aécio.
Neste caso, obviamente, as ligações vão além de um parentesco eventual, mas envolvem, também, negócios. No mínimo ele gerir alambiques numa propriedade de Aécio, a Fazenda da Mata (que é o imóvel rural declarado por Aécio, em princípio, salvo se ele tiver outra fazenda ali).
Mais: se a destilaria da família, seus alambiques, é onde se produz a “Mingote”, funciona na Fazenda da Mata, foi lá que se registraram as situações de trabalho irregular de menores que levaram ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado entre a Tolentino & Tolentino Ltda., nome empresarial da cachaçaria e que pode ser lido aqui?
Imaginem se uma prima da Presidenta Dilma Rousseff que, numa propriedade da Presidenta, empregasse menores de forma irregular?
E que ela tivesse aparecido, tempos atrás, como sócia desta atividade numa revista como a Época?