sexta-feira, junho 13, 2014

Leilões ao contrário - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 13/06

Já está decidido quem dará o maior lance nos próximos leilões de rodovias do Programa de Investimentos em Logística. Num país administrado com alguma competência seria um grupo ou consórcio privado, mas o caso do Brasil é diferente. O maior lance vai ser do governo. Para atrair empresas privadas, o setor público federal financiará, por meio de bancos estatais, até 70% do custo de cada projeto, segundo divulgou na terça-feira a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O plano envolverá o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Os empréstimos serão concedidos por 25 anos, com carência de até 5 e amortização em 20 anos. Os tomadores deverão pagar a Taxa de Juros de Longo prazo (TJLP, atualmente de 5%) mais 2% ao ano. Serão financiamentos subsidiados. Para captar recursos, o Tesouro paga no mínimo 11%, a taxa básica de juros, Selic, fixada pelo Banco Central (BC). Os bancos federais também deverão fornecer no prazo de 90 dias, como empréstimos-ponte, até 30% do total do financiamento para uso como capital de giro das concessionárias. A exigência de garantias será generosa. O conjunto poderá incluir, por exemplo, o penhor de ações da sociedade de propósito específico formada para cada concessão.

Os bancos privados nacionais têm pouco interesse em financiar empreendimentos de longo prazo, porque podem obter maior retorno em operações mais curtas e de menor risco. Mas isso é apenas um dos obstáculos. Tem sido igualmente difícil atrair grupos ou consórcios privados para projetos de construção e de administração de rodovias, porque as condições de rentabilidade têm sido pouco interessantes.

O governo precisa do capital privado para investimentos em infraestrutura e eliminação de gargalos econômicos, mas tem-se mostrado incapaz de entender um dado básico: empresas investem para ganhar dinheiro. Se achar essa ideia inaceitável, o governo terá de responsabilizar-se pelo financiamento das obras e pela gestão das estradas ou quaisquer bens construídos. Se quiser um investidor e gestor privado, terá de entender a lógica de seus negócios.

Sem condições de investir apenas com recursos próprios e sem disposição para aceitar a lógica do empreendimento privado, o setor público tem assumido uma posição mal definida e isso tem atrapalhado os leilões e atrasado as concessões.

A parceria tem ido mal em todos os setores. Os atrasos nas concessões de rodovias são conhecidos. Também são conhecidos os custos - tão elevados quanto desnecessários - impostos à Petrobrás, quando tem de participar das licitações de áreas de exploração. Esses custos seriam menores, se a política oficial fosse menos afetada por preconceitos estatistas.

O setor público federal já tem assumido compromissos muito pesados, por meio dos bancos estatais (e do Tesouro), para garantir financiamento às empresas concessionárias de equipamentos de infraestrutura. A situação é esdrúxula. Enquanto insiste no critério da modicidade tarifária, o governo tenta atrair o participante privado com a oferta de financiamento amplo, generoso e subsidiado.

Com isso, livra o usuário da instalação ou do serviço de utilidade pública de uma parcela do custo. Essa parcela é transferida para o contribuinte e também para clientes potenciais - e menos afortunados - do financiamento concedido pelos bancos sob controle da União.

O crédito subsidiado envolve endividamento do Tesouro, deterioração das contas federais e, no limite, menor espaço de manobra para execução de programas de interesse público. O comprometimento crescente dos bancos estatais também tem más consequências. Todo o setor bancário - e isso inclui o Banco do Brasil, a Caixa e o BNDES - tem de se adaptar, até 2019, a regras mais severas de segurança definidas pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), de Basileia, e aceitas pelas autoridades brasileiras. Os compromissos de longo prazo e os riscos assumidos pelas instituições federais tendem a engessá-las e a diminuir sua capacidade de operação - e sua utilidade - nos próximos anos.


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